Teoria da Pena 193 § 03.1 – PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA (OU DE OUTRA NATUREZA) Clara Moura Masiero1 Gabriela Schneider2 Sumário: 1. Referência Jurisprudencial. 2. O Caso. 3. Os Fundamentos da Decisão. 4. Problematização. 4.1. Noções Gerais. Prestação Pecuniária e Prestação de Outra Natureza. 4.2. Da Conversão da Pena Privativa de Liberdade em Prestação Pecuniária. 4.3. Da Reconversão da Prestação Pecuniária em Pena Privativa de Liberdade. 5. Referências. 1 REFERÊNCIA JURISPRUDENCIAL Superior Tribunal de Justiça. 5ª Turma. Habeas Corpus 196.756-SP. Rel. Min. Gilson Dipp. Data do julgamento: 11.10.2011. 2 O CASO Trata-se de um habeas corpus impetrado contra acórdão do TRF da 3ª Região que mantém decisão do juízo federal de converter as penas restritivas de direitos em pena privativa de liberdade, em regime semiaberto. O paciente foi condenado a quatro anos de reclusão, em regime inicialmente aberto, pela prática do delito de apropriação indébita tributária, mais multa. A pena corporal foi convertida em duas restritivas de direito, quais sejam: prestação de serviços à comunidade e pagamento de prestação pecuniária ao INSS. Com o trânsito em julgado da condenação, em 02 de março de 2009, foi realizada audiência admonitória para apresentar as condições 1 2 Mestranda em Ciências Criminais pela PUCRS. Pós-Graduada em Direito Penal Econômico e Europeu, pela Faculdade de Direito de Coimbra/IBCCRIM. Advogada. Mestranda em Direito, pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos – UNISINOS. PósGraduada em Direito Penal e Processual Penal pela mesma Universidade. Advogada. 194 Clara Moura Masiero / Gabriela Schneider relativas ao cumprimento das penas restritivas de direitos. Nessa ocasião, o paciente comprometeu-se ao cumprimento das condições. Em razão da não comprovação do cumprimento das penas restritivas de direitos, foi designada nova audiência admonitória para a manifestação do apenado no sentido de justificar o descumprimento das penas alternativas ou comprovar o cumprimento. Esta audiência realizou-se em 12 de junho de 2010 e, diante da ausência do paciente e do descumprimento injustificado das penas, a pena de prisão foi restabelecida, a ser descontada em regime aberto. Com isso, a magistrada determinou que o apenado fosse pessoalmente intimado de nova audiência, sob pena de conversão do regime aberto ao semiaberto. A nova audiência realizou-se no dia 02 de setembro de 2010, com a presença tão somente do advogado do ora paciente, o qual apresentou atestado médico para justificar a ausência do apenado (que não foi aceito por não referir a impossibilidade de comparecimento em juízo do paciente), e nada juntou para demonstrar o cumprimento das penas restritivas (tanto da prestação de serviços à comunidade quanto das prestações pecuniárias ao INSS). Diante disso, o julgador determinou a regressão para o regime semiaberto e expediu mandado de prisão. Irresignada, a defesa impetrou habeas corpus perante a Corte de origem, por constrangimento ilegal na regressão do regime imposto e cerceamento de defesa ao não dar prazo para a juntada de novo atestado médico. O Tribunal denegou a ordem. Daí o presente writ, no qual o impetrante sustenta a ausência de motivação apta a justificar a regressão do regime, sem a oitiva do acusado e, portanto, sem que ficasse demonstrado o cumprimento injustificado das penas restritivas. Assevera, ainda, que o paciente não foi intimado da primeira audiência, requerendo, também, a oportunidade para apresentar um atestado médico nos termos especificados na segunda audiência; além da possibilidade de comprovar a razão pelo descumprimento das penas restritivas de direito (prestação pecuniária e serviços à comunidade). 3 OS FUNDAMENTOS DA DECISÃO O entendimento do julgado foi de que a regressão de regime baseou-se, principalmente, no fato de o paciente não ter justificado o descumprimento das penas restritivas de direitos a ele impostas, não obstante terem sido oferecidas diversas oportunidades para que o fizesse, sem que possa se falar em cerceamento de defesa pelo simples fato de o Juízo das Execuções ter indeferido o pedido de apresentar um novo atestado em data posterior. Teoria da Pena 195 Descreve o acórdão que, no que tange à possibilidade de conversão da pena restritiva de direitos em pena corporal, o art. 118 da Lei de Execução Penal permite tal substituição quando o apenado não comparece, injustificadamente, à entidade ou ao programa em que deva prestar serviço ou recusa-se a prestar o serviço a ele imposto. E o art. 44, §4º, do Código Penal, preleciona que o descumprimento desmotivado da obrigação pelo apenado implica regressão ao regime prisional fixado na sentença. De acordo com o decisum, não houve constrangimento ilegal, pois diversas oportunidades foram dadas tanto ao paciente como ao seu defensor, para que apresentassem a comprovação do pagamento da prestação pecuniária (pagamento destinado ao INSS, o qual, segundo o Parquet, nunca ocorreu), bem como do cumprimento da prestação de serviços à comunidade. Destaca o acórdão, ainda, que atitudes que evidenciam verdadeiro desprezo à execução penal, como as descritas no presente caso, permitem não só a conversão da pena alternativa em privativa de liberdade mas também a imposição de regime mais gravoso do que o imposto na sentença condenatória. Com isso, a ordem foi denegada. 4 PROBLEMATIZAÇÃO Nota-se, a partir do julgado exposto acima, que as penas privativas de liberdade podem ser substituídas por restritivas de direitos. Isso é possível desde a reforma penal de 1984, momento em que se procurou adotar uma política criminal alternativa e descarcerizadora3, em face da evidência do fracasso da pena de prisão4. 3 Apesar da intenção descarcerizadora do instituto das penas restritivas de direitos, Cézar Roberto Bitencourt adverte para a possibilidade de “trazer embutido em suas entranhas o embrião da velha política criminal funcional vigente em nosso país, (...)”, pois pode servir como motivo para a exasperação das penas de muitas infrações, de modo a não possibilitar sua substituição. (BITENCOURT, Cézar Roberto. “Novas penas `alternativas` uma análise pragmática”. Revista Brasileira de Ciências Criminais, n. 28, p. 233-266, out./dez, 1999). E, de fato, dados oficiais do Ministério da Justiça informam que não houve diminuição do encarceramento no país desde a implantação das penas restritivas de direitos. Nas conclusões da pesquisa “Levantamento Nacional sobre Execução de Penas Alternativas”, realizada no Brasil entre dezembro de 2004 e janeiro de 2006 pelo Instituto Latino-Americano das Nações Unidas para Prevenção do Delito e Tratamento do Delinquente (ILANUD/Brasil), é afirmado que a pena alternativa, tal como prevista na legislação brasileira e aplicada pelo sistema de justiça, não implicou a diminuição do número de pessoas presas, pois o perfil do indivíduo submetido à pena restritiva de direito, em especial se levado em conta o tipo de Adquira já o seu exemplar! Teoria da Pena Coordenador: Paulo César Busato Organizador: Alexey Choi Caruncho ISBN: 978853624724-3 Número de Páginas: 520 R$ 149,70 * Preço sujeito à alteração sem aviso-prévio Encontre estas obras nas melhores livrarias ou faça seu pedido! (41) 3352-1200 - [email protected] www.jurua .com.br