RECOMENDAÇÃO DA COMISSÃO MÉDICA DA UIAA VOL: 16

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THE INTERNATIONAL MOUNTAINEERING AND CLIMBING FEDERATION
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RECOMENDAÇÃO
DA
COMISSÃO MÉDICA DA UIAA
VOL: 16
Viagens em Altitude e Distúrbios
Neurológicos
Recomendado para Médicos, Pessoas Não-Médicas
Interessadas, e Operadores de Trekking ou Expedições
C. Angelini & G. Giardini
2009
TRADUÇÃO POR KATIA FERRAZ
V2-5
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Relatório Consensual da Comissão Médica da UIAA No.16: Viagens em Altitude e Distúrbios Neurológicos
1. Resumo
Esta revisão analisa vários distúrbios neurológicos e os problemas causados por
viagens em altitude elevada, principalmente a probabilidade de piora da doença
subjacente. As doenças neurológicas incluem enxaqueca e outros tipos de cefaleias,
isquemia cerebral transitória, doenças oclusivas das artérias cerebrais, hemorragia e
malformação vascular intracraniana, lesão expansiva intracraniana, esclerose
múltipla, neuropatias periféricas, doenças neuromusculares, e convulsões epiléticas.
Tentaremos classificar os riscos apresentados por cada doença, oferecer
recomendações com relação a avaliações médicas e aconselhamento a favor ou
contra a realização da viagem para altitudes elevadas, e propor medidas profiláticas
adequadas. Alguns casos individuais só poderão ser analisados após cuidadosos
exames e avaliação de risco, seja em uma clínica especializada em medicina de
montanha, ou por médicos com conhecimento em riscos causados por viagem e
altitudes elevadas. Também mencionaremos métodos de diagnóstico recémdesenvolvidos e tratamento de doenças neurológicas.
2. Introdução
Na avaliação de risco de exposição a altitude elevada, alguns distúrbios
neurológicos podem mostrar um déficit neurológico estável (ex: um AVC sofrido 5
anos atrás), progressivo (ex: esclerose lateral amiotrófica (ELA), demência vascular)
ou déficit neurológico em recuperação (ex: AVC recente). Estas últimas doenças
podem piorar em altitudes elevadas e portanto, algumas considerações fisiológicas
são úteis. Pessoas com boa aclimatação a altitude moderada parecem manter a
entrega de O2 cerebral e o metabolismo, conseguido através de ventilação, fluxo de
sangue cerebral e hemoglobinas. A ventilação e a entrega de oxigênio dependem da
resposta ventilatória hipóxia, sensibilidade ao CO2 e mudanças no equilíbrio de
fluidos. No entanto, a resposta individual é variável e pode ocorrer mal agudo de
montanha (AMS) ou edema cerebral (HACE), embora sua patogênese seja pouco
conhecida. Estudos metabólicos sugerem que com hipóxia de altitude elevada há o
comprometimento de neurotransmissores, e a barreira hematoencefálica em hipóxia
não funciona bem. Pode haver aumento no fluxo sanguíneo cerebral a altitudes
elevadas, mesmo se for difícil demonstrar, pois medidas cerebrais com o Doppler
não são confiáveis.
Outro fator contribuinte é a hipoxemia noturna: na primeira noite após a chegada em
altitude ocorre hipoxemia extrema durante o sono, e isso pode aumentar o possível
perigo para muitos pacientes caso tenham hipercapnia pré-existente ou uma
diminuição no estímulo ventilatório (ex. formas bulbares, pacientes com doença
neuromuscular). Tais pacientes podem estar em risco, e devem ser protegidos com
a administração de oxigênio.
3. Enxaqueca
Observa-se maior incidência de crises de enxaqueca em altitude. Todo montanhista
com enxaqueca sabe que a altitude aumenta a cefaleia em frequência e intensidade
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(Serrano-Duenas, 2007). O motivo pelo qual a altitude desencadeia enxaqueca é
claro, pois parece ativar o sistema trigeminovascular, além de aumentar o fluxo
sanguíneo. Tanto enxaqueca quanto AMS podem provavelmente resultar da
ativação do sistema trigeminovascular, que é um estímulo sensorial muito importante
(Sanchez del Rio e Moskowitz, 1999). Sinais gerados em altitude elevada que
podem ativar o sistema trigeminovascular incluem proteínas e neurotransmissores.
Uma cefaleia pode ser atribuída à ativação de uma via comum no sistema
trigeminovascular por estimulação biomecânica ou mecânica.
Com relação ao tratamento da enxaqueca, tanto aspirina ou triptanos podem ajudar,
desde que o paciente não seja intolerante à aspirina e já a tenha usado com
regularidade no passado. Os efeitos dos triptanos agem na vasoconstricção, e
possuem ação nos nervos serotoninérgicos do tronco cerebral. O uso de triptanos
parece ser seguro e estudos recentes também sugerem sua utilidade na prevenção
da AMS (Jafarian et al., 2008). Recomendações para pessoas com enxaqueca com
e sem aura estão resumidas na tabela 1.
Tabela 1: Enxaqueca
•
É fundamental que o diagnóstico de enxaqueca tenha sido feito por um
neurologista com experiência no tratamento de cefaleia
•
Qualquer paciente que sofra com enxaquecas pode piorar com a altitude,
tanto em frequência e/ou intensidade
•
É melhor se o paciente com enxaqueca carregar em sua mochila algum
medicamento com eficácia comprovada (aspirina, FANS ou triptanos) e um
segundo medicamento para prevenção se necessário (ex. flunarizina ou
amitriptilina)
•
Dados recentes demonstraram a segurança do uso de triptanos em altitude
Recomendações
No caso de enxaqueca com aura recomendamos realizar antes de viajar:
–
Ressonância magnética ponderada em difusão do crânio para
revelar se houve acidente vascular cerebral embólico subclínico
–
Exames de sangue para investigar perfil trombofílico.
Ecocardiograma para revelar forame oval patente (FOP) ou outros shunts direitaesquerda (também é um possível desencadeador de AMS ou HAPE)
4. Doença Cerebrovascular
4.1 AVC isquêmico
O AVC é a terceira causa de morte, e a primeira para incapacidade em países
desenvolvidos. A incidência global de AVC varia consideravelmente de 20/100.000 a
250/100.000. Na Itália um estudo recente mostrou uma leve redução da incidência
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de AVC (Corso, 2009). Cerca de um terço dos pacientes que sofrem AVC
conseguem manter a independência sem sequelas ou com sequelas leves, e
retomam suas atividades normais, inclusive viagens ou atividades recreacionais em
altitude, como esquiar ou fazer trekking (Tabela 2).
A literatura científica relatou estudos de casos de possível AVC grave em pessoas
saudáveis em altitude (Clarke, 1983; Sharma, 1990). Há pesquisas sobre a
incidência de sofrer o primeiro AVC na altitude, mas faltam estudos para avaliar a
incidência de AVCs recorrentes. Um estudo com soldados indianos mostra que a
hospitalização em altitude elevada para o primeiro AVC foi mais frequente
(13,7/1.000 versus 1,05/1.000) e que a incidência de AVC pode ter sido maior em
altitudes acima de 3500 m (Jha et al., 2002). Outro estudo sugere maior risco
relativo de AVC (RR 10, p<0,05) em habitantes de altitude elevada acima de 4.500
m comparado a pessoas que moram de 600 m ao nível do mar (Niaz, 2003). Vários
fatores que ocorrem em altitudes elevadas podem explicar o possível aumento de
risco, principalmente desidratação e policitemia com consequente “inspissatio
sanguinis” (Clarke, 2006). A hipóxia pode desencadear disfunção endotelial e
anormalidades de coagulação e agregação plaquetária (Le Roux et al., 1992). A
altitude pode induzir mais infartos para a hipóxia concomitante, portanto expor as
pessoas a um risco mais alto de morte (Clarke, 1983). Além disso, algumas
pesquisas sugerem efeito da hipóxia na circulação cerebral com reatividade
cerebrovascular alterada em campo (Van Osta et al., 2005) ou na câmara hipobárica
(Cauchy, 2001).
Tabela 2: Recomendações para pacientes com AVC isquêmico ou AIT (Ataque
Isquêmico Transitório)
AVC recente (<90 dias)
Pacientes com AVC
anterior
Não há dados de segurança suficientes sobre trekking
em altitudes elevadas, portanto, evite altitude
1. É essencial verificar o diagnóstico definitivo de AVC
(histórico clínico e evidência de neuroimagem).
2. Para cada tipo de AVC é necessário controlar os
fatores de risco (hipertensão arterial, hiperglicemia,
hipercolesterolemia, anticoagulação em fibrilação
atrial, e parar de fumar).
3. Para AVC aterotrombótico, recomendamos a
realização de um ultrassom de carótida menos de 6
meses antes da data da viagem, para evitar o risco
de complicação por placa ou estenose grave.
4. Para AVC cardioembolítico, recomendamos um
exame cardiológico e se necessário um
ecocardiograma. É preferível usar doses de
heparina de baixo peso molecular do que warfarina
em ambientes difíceis.
5. Somente quando for indicado para AVC
criptogênico deve-se buscar outros fatores de risco
como anomalias de coagulação ou forame oval
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patente.
6. Não faça trekking sozinho.
7. Uma deficiência moderada a grave (Escala de
Rankin >2) é uma contraindicação para ambiente
na montanha.
8. AIT muitas vezes é um diagnóstico clínico. Lembre
que a perda de consciência, tonturas, quedas,
episódios de amnésia ou confusão mental, quando
sintomas isolados, não são necessariamente
ataques isquêmicos transitórios. Não escale ou
caminhe sozinho em altitudes elevadas caso tenha
tido AIT no passado.
Ainda não está claro qual o risco de embolia em altitude. Em um estudo
experimental, a hipóxia hipobárica causou vegetação asséptica em válvulas
cardíacas de ratos após 36 horas de exposição (Nakanishi et al, 1997). Forame oval
patente (FOP) ou outros shunts direita-esquerda são possíveis fatores de risco para
AVC embólico em altitude (Wilson, 2009). Eles pioram durante o exercício (Imray,
2008) e foram diagnosticados em câmara hipobárica quando 3 pacientes sofreram
AITs em altitude extrema (Cauchy, 2001). A hipóxia pode induzir arritmias cardíacas
(Woods, 2008). É sabido que alterações na reatividade cerebrovascular podem
aumentar o risco de AVC (Terborg et al., 2000) em quase qualquer paciente com
fatores de risco pré-existentes, como hipertensão arterial (Ficzere et al., 2001),
diabetes mellitus (Fulesdi et al., 1997), estenose carotídea (Silvestrini et al., 2000),
em pessoas com leucoencefalopatia com substância branca evanescente (Molina et
al., 1999) e em um paciente com AVC prévio recente.
Do ponto de vista epidemiológico e clínico, o risco de um segundo AVC após um
primeiro AVC é alto por pelo menos um ano (Giles and Rothwell, 2009); após um
AIT, o risco de AVC e outros problemas vasculares inclusive morte vascular é de 8%
até 30 dias, e 9,2% até 90 dias (Hill et al., 2004; Johnston et al., 2000; Giles e
Rothwell, 2009). Além disso, pacientes que sofreram IAT anterior devem ser
informados que o melhor tratamento no caso de recorrência é a trombólise (quando
possível, o tratamento deve ser feito em unidade especializada em AVC, e essas
duas opções de tratamento podem ser muito difíceis de serem conseguidas em
altitude ou em ambiente adverso.
Por esses motivos, pessoas que sofreram doenças isquêmicas cerebrovasculares
sem sequelas devem ser aconselhadas com muito cuidado sobre viagens para
altitudes elevadas após minucioso exame e avaliação de risco, seja em uma clínica
especializada em medicina de montanha, por neurologistas, ou por médicos com
conhecimento em riscos causados por viagem e altitudes elevadas. Sabemos que
esses pacientes correm maior risco de desenvolver AVC nos 3 meses subsequentes
ao AIT sofrido (Hill et al., 2004). Portanto o diagnóstico de AVC deve ser correto e
recomendamos que esses pacientes busquem a opinião de um neurologista antes
de viajar para altitude. Todos os fatores de risco tratáveis devem ser tratados
primeiro, como estenose carotídea grave (hipertensão arterial, outras fontes de
embolia cardíaca, etc.). Também recomendamos verificar os níveis de colesterol
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HDL/LDL, proteína C-reativa e níveis de homocisteína, todos marcadores de danos
endoteliais. O paciente deve continuar o tratamento com antiagregantes plaquetários
e deve ser aconselhado a não exceder altitudes acima de 3000 m (Richalet and
Herry; 2006).
4.2: Ataque Isquêmico Transitório (AIT)
É definido como um déficit neurológico focal com duração de menos de 24 horas
(Johnston et al., 2000), embora evidências recentes diminuíram essa duração.
O diagnóstico precisa ser feito por um neurologista (vertigem ou síncope isolada não
são AITs). Portanto é recomendado que o montanhista com possível AIT primeiro
realize exames cerebrovasculares. Nas montanhas, uma alternativa pragmática é
começar o tratamento com aspirina, pois não há evidência clara de que o
mecanismo do AIT e subsequente AVC sejam diferentes em altitudes baixas ou
elevadas. O diagnóstico diferencial deve levar em conta trombose venosa cerebral.
Ao contrário desses eventos raros, a síncope é comum em altitudes elevadas, e o
diagnóstico diferencial para AIT e distúrbios convulsivos exigem critérios
neurológicos rigorosos.
4.3 AVC Hemorrágico
Os AVCs hemorrágicos muitas vezes são causados por hipertensão arterial e a
altitude pode aumentar a pressão sanguínea, que tem um efeito adverso tanto em
aneurismas cerebrais como em malformações arteriovenosas. Pacientes com tais
doenças devem ser aconselhados a evitar altitudes elevadas. Nenhum estudo
avaliou a incidência de frequência de hemorragia intracraniana em altitude elevada.
Pacientes com hemorragia lobar apresentam risco de recorrência pois ela resulta de
angiopatia amilóide. Estes pacientes não devem subir a altitudes elevadas por causa
da dificuldade de manejo de uma recorrência de hemorragia intracraniana em área
remota.
5. Tumores e outras lesões
Pacientes com lesões intracranianas são instáveis do ponto de vista neurológico e
não devem viajar a altitude (Baumgartner et al., 2007). Edemas cerebrais que
ocorrem a altitude se refletem em aumento do volume de água no tecido e inchaço
do endfeet glial perivascular.
Há relatos sobre tumores cerebrais tanto malignos como benignos, em que se
tornaram sintomáticos repentinamente, quando as pessoas foram expostas a altitude
elevada (Hackett, 2001). Isto pode ocorrer por causa de edemas, um aumento do
fluxo sanguíneo cerebral, ou aumento da pressão do líquido cefalorraquidiano. Um
problema parecido é apresentado pelos cistos aracnóides.
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6. Trauma cerebral, concussão cerebral, e disfunção metabólica
O tempo necessário para o cérebro se recuperar sozinho após um trauma cerebral
não é bem entendido ainda, especialmente em atitude elevada. Em tais casos, a
recuperação cerebral resultante de uma concussão provavelmente será lenta.
Evidências indiretas sugerem que é possível um aumento da ação de reforço da
permeabilidade hematoencefálica com radicais livres.
Para o paciente com lesão cerebral metabólica (como envenenamento por CO) ou
hipóxia cerebral anterior, ou disfunção metabólica após cirurgia cardiovascular, não
parece aconselhável ir a altitudes elevadas.
7. Esclerose múltipla
É considerado seguro para pacientes com EM subirem até 2500 metros.
Baumgartner et al. (2007) observou que pacientes com EM estavam seguros
durante acampamentos de verão no Colorado. Casos de EM podem desenvolver
novos sinais e sintomas neurológicos se os pacientes desenvolverem uma infecção.
O frio também pode ser um fator agravante em doenças desmielinizantes, portanto a
exposição prolongada a condições desfavoráveis não é recomendada. Embora
trabalhos recentes mostrem que não há evidência de comprometimento de
vasoreatividade cerebral em pacientes com EM, (Uzuner et al., 2007), a descrição
fisiopatológica de hipóxia relatou danos em lesões inflamatórias agudas (Bruck e
Stadelman, 2005) e sugere fortemente que os pacientes devem ser aconselhados a
evitar viajar para altitude para prevenir uma possível recidiva, mesmo quando os
sintomas são leves.
8. Distúrbios dos nervos periféricos e doenças neuromusculares
Em neuropatias sensitivo-motoras periféricas hereditárias ou adquiridas há
claramente um risco relacionado à relativa insensibilidade do pé durante a
caminhada ou escalada. Em neuropatia diabética há também uma anormalidade
microvascular. É importante que esses pacientes calcem sapatos confortáveis, que
não apertem, para ajudar a promover um fluxo sanguíneo constante para as
extremidades periféricas, pois a atividade dos músculos esqueléticos e temperatura
corpórea são fundamentais. Quando for comprar sapatos de escalada, encontre um
que se encaixe bem no formato do seu pé, inclusive nas deformidades existentes. O
tamanho do pé também pode aumentar um pouco em temperaturas altas, após
permanecer em pé por algumas horas, durante o ciclo menstrual ou em altitudes,
ocorre um leve edema nos pés das mulheres.
As recomendações são para manter esses pacientes hidratados, evitar imobilidade
para a prevenção de trombose venosa profunda e caminhar com meias confortáveis,
além de usar meias próprias para viagem aérea quando for voar. Não há evidência
de progressão nos danos periféricos anteriores em altitude. Acompanhamos um
paciente de 33 anos de idade que subiu para 8100 m no Monte Everest sem recidiva
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um ano após apresentar a síndrome de Guillain-Barré (dados pessoais, não
publicados). Paulson et al. (2002) descobriram que pacientes com Charcot Marie
Tooth apresentaram o risco de desenvolver disartria, falta de coordenação e
dificuldade em caminhar após esquiar a 8000 pés (~2400 m) nas montanhas do
Colorado (Paulson et al; 2002).
Muitos pacientes com distrofias musculares, como a distrofia muscular de Duchenne
ou distrofia miotônica e esclerose lateral amiotrófica podem apresentar
hipoventilação alveolar com hipoxemia e distúrbios do sono, inclusive apneia do
sono, com consequente hipoxemia noturna com saturação de oxigênio que chega a
75% ao nível do mar. É fácil imaginar que esses pacientes podem ter desaturação
ainda maior em altitude. Portanto, pacientes com distúrbios neuromusculares devem
ser examinados para constatar a presença de apneia do sono antes de viajar para
altitudes elevadas, e se for detectado algum distúrbio do sono, eles devem viajar
portando suporte ventilatório não-invasivo (Luks e Swenson, 2007).
9. Convulsões em altitude
Há relatos de casos novos de convulsões em altitude elevada fora das condições
normais de AMS ou HACE (Daleau et al., 2006), assim como a ocorrência de
convulsões com histórico antigo de síncopes sem tratamento (Basnyat, 1998), ou
tratados com medicamentos antiepiléticos (Basnyat, 2001). Dois trekkers no Nepal
apresentaram convulsões únicas de grande mal, com contrações tônico-clônicas,
mordida de língua e confusão pós ictal (Kupper e Classen 2002). Investigações
médicas
abrangentes
feitas
em
Katmandu,
inclusive
tomografia
e
eletroencefalograma, não revelaram nenhuma anormalidade e nenhum dos dois
sofreu convulsões nos anos seguintes. A fisiopatologia dessas convulsões únicas
provavelmente não estão relacionadas a AMS ou HACE já que os dois montanhistas
fizeram a aclimatação adequada. As convulsões podem resultar de qualquer evento
fisiológico que determina um aumento na excitabilidade neuronal inclusive falta de
sono, exaustão, desidratação, distúrbios eletrolíticos como hipocalcemia ou
hiponatremia. Hipóxia aguda grave pode causar uma convulsão epilética (Tabela 3).
Existem histórias de convulsões de novo em pessoas em altitude, mas podem ser
fatais (Basnyat, 1998). Observações sobre convulsões em altitude:

Tende a ser a primeira vez que apresentam síncopes

Ocorrem nos primeiros 2-3 dias após a chegada

Há uma sub-representação de abuso de álcool

As síncopes tendem a ter origem mais talâmica do que cortical
Para epiléticos confirmados é aconselhável que continuem a tomar seus
medicamentos antiepiléticos em altitude (Basnyat 2001), evitar falta de sono e
consumo de álcool, evitar drogas epileptogênicos; caso tenham abandonado o
tratamento, recomenda-se considerar voltar a tomar os medicamentos. Foi
observada exacerbação em pessoas com distúrbios convulsivos possivelmente
devido a altitude ou falta de sono, pelo menos em aqueles que não estavam
tomando medicação.
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Tabela 3: Epilepsia
•
Em situação de hipóxia, foram relatados casos de crises
de GM
•
Pacientes epiléticos precisam de monitoramento
contínuo do nível das drogas
•
Pacientes epiléticos devem evitar o consumo de álcool
•
Privação de sono pode ser perigoso
10. Conclusão e contraindicações
Além das diretrizes acima, declaramos as seguintes contraindicações para
exposição a altitudes elevadas:
1. Doenças instáveis – como AVCs recentes
2. neuropatia diabética
3. AIT no último mês
4. epilepsia
5. tumores cerebrais
6. Distúrbios neuromusculares com diminuição do FVC de >60% (Tabela 4)
Enxaqueca, quase com aura, pode ser uma contraindicação relativa. Portanto cada
caso precisa ser avaliado individualmente com cuidado antes de ir para altitude.
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Não parece haver risco de exposição em altitude elevada para pacientes com:
1. Doença desmielinizante até 2500 m
2. Problemas com nervos periféricos
3. Disfunção neurológica mínima
Tabela 4: Doenças desmielinizantes e distúrbios musculares/ do SNP



Neuropatias periféricas
Doenças
neuromusculares e
distúrbios neuromotores
Cold climate should be avoidedDeve-se evitar clima
frio
Não fazer trekking em montanha se a incapacidade
pela escala de RANKIN >2

Não fazer trekking se sentir vertigem ou ataxia

Não fazer trekking se tiver a doença de CharcotMarie Tooth: Tropeçar pode ser perigoso se houver a
presença de pé torto

Neuropatia diabética Isquemia de pequenos vasos
em diabetes; hipóxia pode ser uma contra-indicação

Diminuição do FVC >60% é uma contra-indicação
para viagens a altitude elevada por hipercapnia e
hipóxia

Diminuição do estímulo bulbar central: aumento do
risco de apnéia do sono com distrofia miotônica, ELA
e a glicogênese tipo 2 em adultos.
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Membros da Comissão Médica da UIAA (em ordem alfabética)
C. Angelini (Itália), B. Basnyat (Nepal), J. Bogg (Suécia), A.R. Chioconi (Argentina),
S. Ferrandis (Espanha), U. Gieseler (Alemanha), U. Hefti (Suiça), D. Hillebrandt
(R.U.), J. Holmgren (Suécia), M. Horii (Japão), D. Jean (França), A. Koukoutsi
(Grécia), J. Kubalova (República Tcheca), T. Kuepper (Alemanha), H. Meijer
(Holanda), J. Milledge (R.U.), A. Morrison (R.U.), H. Mosaedian (Irã), S. Omori
(Japão), I. Rotman (República Tcheca), V. Schoeffl (Alemanha), J. Shahbazi (Irã), J.
Windsor (R.U.)
O co-autor G.Giardini do Departamento de Neurologia e Medicina de Montanha, do
Hospital Aosta (Itália) trabalhou como autor convidado nesta comissão.
História deste relatório
Este documento foi baseado principalmente na palestra dada por C.Angelini na
conferência anual da da Comissão Médica da UIAA em Aviemore, Escócia, em
outibro de 2007. A versão aqui apresentada foi aprovada e consentida por escrito
em vez de reunião presencial em junho de 2009.
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