Artigo O ato de lecionar na atualidade diante dos novos

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O ato de lecionar na atualidade diante dos novos meios tecnológicos
Roberto Leite
Resumo
O presente texto expõe a temática do uso de celular em sala de aula. Inserido no
âmbito do lócus profissional da educação, esse equipamento é motivo de controvérsias entre
os atores educacionais. Entre as posições que concordam e as que discordam de sua
utilização, há uma artificialidade que não se reporta a qual é o instrumento para uma
motivação concreta pelo alunado, que é a contextualização, a problematização de uma
atividade escolar ou de um conteúdo disciplinar. Ao não questionamento sobre a liberação ou
proibição desse aparelho tecnológico omite-se ou não se conhecem o domínio e o fascínio
exercidos pelos ecrãs (telas), a subjetividade exacerbada na contemporaneidade, as possíveis
instrumentalizações para um efetivo letramento através de textos digitais etc.
Palavras-chave: Celular. Sala. Aula. Uso. Problematização. Imagem.
O ato de ensinar implica condições subjetivas e objetivas para uma melhor assimilação
e acomodação por parte do alunado. Conquanto um dos fatores não forem postos, poder-se-á
trazer situações de desfalque para o processo de aprendizagem.
Dentre os fatores subjetivos podemos citar a capacidade de empatia, de afeto, de
diálogo por parte do educador; e, no âmbito dos objetivos, citam-se os pontos vinculados às
situações físicas das salas de aula, os recursos audiovisuais disponíveis nas escolas, como
principalmente dos materiais didáticos (livros, apostilas, jogos educativos, textos-extras etc.).
Conquanto em relação à postura do professor, há um quase consenso que o afeto é um
elemento primordial na relação docente/discente, pois significa o ato de afetar na construção
da personalidade e da cognição; por outro lado, a falta de diálogo pode contribuir para um
relacionamento não satisfatório no processo de ensino-aprendizagem.
Conforme frisa Izabel Galvão (1995), a afetividade se vincula e se incorpora ao
processo cognitivo: “apesar de alternarem a dominância, afetividade e cognição não são
funções exteriores uma à outra. Ao reaparecer como atividade predominante, uma incorpora
as conquistas da anterior”. (1995, p.45)
Isto é, o afeto é um instrumento de não apenas aproximação com o aluno, mas a
própria capacidade dele ser afetado pela empatia do professor, pelo seu exemplo e pelos seus
valores. Já a relação dialógica é fundamental, pois se trata da dialética na prática diária.
Além desses expedientes físicos já citados, não se pode deixar de enumerar atualmente
os meios de novas tecnologias, como computadores, tablets, notebooks e até mesmo os
celulares.
Em relação aos procedimentos pelos três equipamentos de processamento de dados
citados há uma complacência e uma aceitação dita normal, mas em relação à telefonia móvel
a repulsa é assaz acentuada. Isso se deve em muito à função básica de um celular, que é a
comunicação interpessoal.
No entanto, os atuais celulares oferecem várias utilidades que não se restringem ao
telefonar em si. Até a leitura de um livro é algo possível em um telefone portátil. Experiências
com alunos demonstram ser plenamente aceitável o desenvolvimento de uma razoável prática
leitora com o uso desses equipamentos. Lógico que nada substitui um livro impresso, pelo
fato de ser prático tátil e interessante do ponto de vista cultural, mas os denominados E-books
se caracterizam como uma tendência de evolução que se iniciou com o papiro.
Para Ednei Santos (2003), a mudança da configuração do livro impresso já há algum
tempo que está se apresentando.
Há algum tempo, o livro vinha sofrendo interferências no modo de ser e de se
mostrar ao leitor. Muito de sua mudança física já vinha se configurando com o
avanço das tecnologias de impressão e diagramação de páginas. Hoje, vemos o livro
mudar de suporte ou mídia, e transformar-se em um novo corpo (SANTOS, 2003b,
p. 2)
Diante disso, como o educador deve se portar em relação aos novos meios digitais?
Adotar ou não um livro digital, um tablet ou mesmo um celular para atividades pedagógicas?
Estas questões permeiam o meio educacional na atualidade, sendo centro de discussões
acaloradas entre professores, gestores e pedagogos. Igualmente como todo tema polêmico, o
uso de celular em sala de aula vem provocando intranquilidade, desconfiança e
constrangimento constantes. Longe de ser algo que torne um ambiente saudável, o uso ou não
merece pelo menos um debate mais fundamentado, algo muito difícil para certa parcela do
professorado. Isso, pois, implica toda uma reflexão sobre a prática pedagógica posta pela
imensa maioria dos professores.
Assim como afirma Gadotti (2003), os meios tecnológicos criam novos paradigmas
para a construção do conhecimento.
As novas tecnologias criaram novos espaços do conhecimento. Agora, além da
escola, também a empresa, o espaço domiciliar e o espaço social tornaram-se educativos. Cada dia mais pessoas estudam em casa, pois podem, de lá, acessar o
ciberespaço da formação e da aprendizagem a distância, buscar “fora” – a
informação disponível nas redes de computadores interligados – serviços que
respondem às suas demandas de conhecimento. Por outro lado, a sociedade civil
(ONGs, associações, sindicatos, igrejas...) está se fortalecendo, não apenas como
espaço de trabalho, mas também como espaço de difusão e de reconstrução de
conhecimentos. (GADOTTI, 2003, p. 15).
Outrossim, o ato da docência necessita que os aspectos subjetivos e objetivos se
coadunem firmemente, sem esquecer também que é imprescindível que a missão seja
reconhecida e o professor tratado como um profissional, e não como um missionário, apesar
do ato de boniteza de um sonho, parafraseando Gadotti.
Enfim, não se deve esquecer a formação continuada para os educadores, que
reciclam e requalificam suas práticas docentes. Imbernón afirma que
Já sabemos que a capacidade profissional dos professores não termina na formação
técnica, disciplinar e conceitual, mas que alcança o terreno prático e as concepções
pelas quais se estabelece a sua ação pedagógica. A formação continuada deveria
apoiar, criar e potencializar uma reflexão real dos sujeitos sobre sua prática docente
nas instituições educacionais e em outras instituições , de modo que permitisse
examinar suas teorias implícitas, seus esquemas de funcionamento, suas atitudes
etc., estabelecendo de forma firme um processo constante de autoavaliação do que
se faz e por que se faz. Uma orientação formadora voltada para esse processo de
reflexão, e os pressupostos políticos subjacentes a ela, exige uma definição crítica da
organização e da metodologia da formação continuada dos professores, já que deve
ajudar os sujeitos a revisarem os pressupostos ideológicos e comportamentais que
estão na base de sua prática. (Imbernón, 2010, p.47)
A seguir, o enfoque sobre o domínio imagético que redunda no apego pelos
aparelhos tecnológicos no cotidiano e que recai sobre o que fazer na escola.
O domínio das imagens na era digital
O domínio imagético no mundo das linguagens é notório. Advindo esse processo
desde o século XVIII com a Revolução industrial, que impulsionou uma onda de invenções
como a Fotografia (1832), Cinema (1895), Televisão (1922), dentre outras mais recentes.
Todos esses meios de mensuração visual, vieram aprimorar o simulacro do real que era posto
apenas pelas artes visuais, principalmente o desenho e a pintura.
A priori, o surgimento do cinema implica uma impressão da realidade bem mais
convincente que as artes visuais, pois enquanto o primeiro encerra a imagem em movimento;
a segunda, posta as artes visuais de forma estática, apesar dos valores estéticos, históricos e
culturais.
No início, o cinema era uma espécie de teatro filmado, pois a câmera ficava parada,
sem angulação ou enquadramento. Em meados da década de 10, o cinema postula uma
linguagem mais própria com planos bem planejados.
Esses caçadores de imagens colocavam suas câmaras fixas num determinado lugar e
"registravam" o que estava na frente. Também quando teve início a ficção, a câmara
ficava fixa e registrava a cena. Acabada a cena, seguia-se outra. O filme era uma
sucessão de "quadros", entrecortados por letreiros que apresentavam diálogos e
davam outras informações que a tosca linguagem cinematográfica não conseguia
fornecer. A relação entre a tela e o espectador era a mesma do teatro. A câmara
filmava uma cena como se ela estivesse ocupando uma poltrona na plateia de um
teatro. (BERNADET, 2006, p. 32).
Com o advento do aparelho televisor, a sétima arte adota novos recursos, como o
cinema falado a partir de 1927 (O cantor de Jazz com Al Johnson), uso dos Star System
(estrelas exclusivas das grandes companhias), o cinemascope etc.
Em meados do século XX, surgem as novas estéticas que renovam o a linguagem do
cinema, como o Neorrealismo na Itália, Nouvelle Vague na França, o Cinema Novo no Brasil.
Novos olhares, novos fazeres para cinematografia, trazem uma diversificação e uma
diferenciação bem explícita à linguagem televisiva, à época.
O princípio dessa renovação estética é citado por Bernadet (2006) em seu livro O que
é cinema. Assim ele se aborda a questão:
o início desse movimento de renovação que se dá ao nível da temática, da
linguagem, dás preocupações sociais e das relações com o público pode ser datado
de 1945, quando começa o neorrealismo italiano. A Itália que,
cinematograficamente, fora conhecida pelos seus melodramas, suas divas dos anos
20 e 30, suas superproduções bíblicas, estava saindo do fascismo mussoliniano, da
monarquia e da guerra, destroçada. Sobre as ruínas, enquanto paulatinamente se
reergue um cinema comercial, desenvolve-se um cinema que cineastas e críticos
vinham preparando clandestinamente nos últimos anos do fascismo. Realizam-se
filmes voltados para a situação social italiana, rural e urbana, do pós-guerra.
Despojam-se enredos, personagens, cenografia, de todo o aparato imposto pelo
cinema de ficção tradicional. Os cineastas voltam-se para o dia-a-dia de proletários,
camponeses e pequena classe média. A rua e ambientes naturais substituem os
estúdios. Atores pouco conhecidos ou até não-profissionais aparecem no lugar de
vedetes célebres. A linguagem simplifica-se, procurando captar este cotidiano e
tentando ficar sempre apegada aos personagens e suas reações nas difíceis situações
cotidianas. (BERNADET, 2006, pp 93-94)
Em seu livro O ecrã global, Gilles Lipovetsky (2010) expõe o desenvolvimento da
linguagem cinematográfica, descrevendo que ela sempre se adequou às inovações
audiovisuais, mais propriamente da televisão, o videocassete (VHS); como até mesmo a
chegada dos processos digitais.
Isto se apresenta na medida em que cada nova mídia que surge, imputa a mesma, a
possibilidade de ser uma linguagem específica, como aconteceu com o cinema e a televisão.
O vídeo, também, possui uma estética diversa, assim como a própria fotografia, ou seja, cada
um com suas especificidades e códigos inerentes.
Em todos esses avanços tecnológicos, a tela se adapta ao desenvolvimento da
linguagem desta ou daquela natureza audiovisual; ora grande, ora pequena, ora analógica, ora
digital. O próprio cinema se renova, desfazendo uma previsão pessimista de que sucumbira
diante o advento de novos meios de profusão de imagens. Isso não ocorreu, nem ocorrerá;
pois antes de ser mais um meio de comunicação e entretenimento, trata-se de uma linguagem
artística, e, como tal, afeita a inovações estéticas.
Mesmo com o surgimento dos meios digitais, ele continua imponente, associando-se
a nas tecnologias, seja com a internet, seja com a utilização do recurso 3D (terceira dimensão),
que se torna uma novidade em termos de lazer. Isto é, a linguagem do cinema está sempre se
reinventando, tornando-a vida perene.
Todavia, como o ecrã influi e é influenciado pelo processo educacional? Uma bela
pergunta, na qual a resposta ou respostas ainda estão sendo postas a cada momento. Desde o
advento do cinema, para ficar adstrito ao conceito de tela como algo que se passa como uma
janela para o mundo, observa-se um admoestação gradual e intermitente no ínterim dos
processos de ensino-aprendizagem.
No âmbito dessa concepção, a educação sofre interferência, mas se adapta, mesmo
que em desvantagem de tempo. Quando o cinema e a televisão avançam tecnologicamente
numa progressão geométrica, os sistemas de ensino respondem numa progressão aritmética.
Enquanto já se utilizava há um bom tempo o videocassete, as escolas ainda estavam com o
retroprojetor; quando as salas de exibição adotam o recurso 3D, as escolas estão com o datashow. Não que esses instrumentais tecnológicos resolvam todas as mazelas educacionais,
contudo denota um atraso nos meios por onde se adentram os conhecimentos e conteúdos
propostos.
Por conseguinte, em se tratando de ecrãs mais recentes como o tablet e o celular,
estes estão em um situação de inclusão e exclusão, respectivamente. O tablet foi
experimentado em escolas particulares de Fortaleza, retornando resultados contraditórios
entre eficazes e ineficazes. Há alguns que defendem o equipamento como o substituto do
livro, ou melhor, como um recurso na qual os livros didático e paradidático estejam incluso.
Outros defendem que o mesmo interfere negativamente, quando alunos se distraem e tornamse desatentos em sala de aula. Apesar desse debate acerca desses meios eletroeletrônicos no
meio educacional, a certeza é que a escola está assaz defasada pertinente à era digital.
Portanto, a instituição escolar sempre vai ter que se coadunar com os avanços das
novas tecnologias. A grande dúvida é em que medida as novas gerações, que já nascem sob a
égide do celular e da internet, irão se comportar em relação a tudo isto. Por enquanto, há uma
grande rejeição pelo alunado ao modo como a didática está sendo implementada em sala de
aula, cabendo ao professorado insurgir por novos métodos e pedagogias que coloquem as
diversas linguagens à disposição dos estudantes, tentando contemplar de forma particular e
individualizada, e, concomitantemente de forma coletiva, o conjunto do alunado.
No tópico seguinte, uma abordagem sobre o conteúdo da internet e a relação com o
trabalho de ensino pelo professor.
A internet, redes sociais e o ato de lecionar.
O advento da internet nos anos 90 e mais precisamente das redes sociais na primeira
década do século XXI, trouxeram transformações no modo de relacionamento social, nas
formas de encarar os vários matizes: sociológicas, psicológicas, culturais, políticas,
educacionais etc. No âmbito econômico, também se verifica parâmetros comercias
engendrados por esse meio de comunicação, que é altamente interativo.
O caráter dessas mudanças são de naturezas diversas, como uma nova configuração
organizativa horizontalizada, sem líderes formais; hábitos reformulados no ínterim mais
íntimo (na verdade menos íntimo); privacidade assaz exposta, dentre outras. Mas há
perguntas que necessitam de respostas prementes: em que aspecto todas essas nuanças
interferem no processo ensino-aprendizagem? Em que situação a exposição da vida privadas
dos indivíduos é algo salutar? Como uma postagem tem e deve ser encarada pelos usuários
internautas?
Para responder essas interrogações, faz-se necessário uma reflexão isenta de
quaisquer influências pessoais, subjetivas; implica uma avaliação mais objetiva e impessoal
possíveis, que vislumbre inferir, comparar e projetar situações no passado, presente e futuro.
Diante disso, o surgimento da rede mundial de computadores em 1991,
primeiramente nas academias universitárias, e em seguida comercialmente em 1995,
possibilitou uma revolução nos costumes, relacionamentos e práticas até então resumidas num
contato face a face, que mais propriamente na denominada virtualidade. Isso entendido como
algo que pode ser real, sendo o virtual ainda inserido no interior da realidade concreta, e não o
irreal como muitos possam pensar e acreditar.
Navegar horas e horas se tornou habitual, como também viajar por lugares
inimagináveis, bibliotecas, museus, espaço virtuais; tudo isto sem sair praticamente de casa,
junto ao equipamento de informática. Aliado a essas facilidades apenas comparável ao
período das grandes invenções na transição do século XIX para o XX, em que a lâmpada
elétrica, o carro, o avião e o telefone modernizaram a vida dos indivíduos e trouxeram
inovações importantes no cotidiano do meio urbano.
Com isso, adveio o incremento das redes sociais em 2004. Tanto o Orkut,
Facebook, Sonico e outras menos conhecidas do grande público amealharam a participação
massiva de pessoas pelo mundo afora, sendo o Facebook de origem estadunidense e o Sonico
oriundo da Argentina, sendo baseada no idioma espanhol.
No Brasil, fez-se notar a ampla adesão ao Orkut, que de origem turca e alemã,
arrebanhou mais de 50% de internautas brasileiros até 2010. Porém, com o passar do tempo,
essa rede social foi perdendo sua funcionalidade básica de geração de novas amizades,
reencontros com antigos amigos e conhecidos, debates nos fóruns de comunidades; enfim, os
elementos imprescindíveis a esse gênero digital.
Já o Facebook, que surgiu em 2004 nos Estados Unidos, possui uma interface mais
interativa que a citada anteriormente, fazendo com que qualquer conteúdo posto na internet
possa ser compartilhado com outras pessoas. A priori, essa rede social possibilita realmente
uma interação bem mais acentuada, mas se ressente ultimamente de um rigor e disciplina nas
postagens realizadas pelos usuários. Observa-se que esse meio se transformou numa rede de
intrigas traduzindo todos os conflitos sociais, reverberando preconceitos recônditos, instintos
maléficos; não que outros meios não o façam, mas acredito que seja por causa da facilidade de
postagem e visualização das mesmas. Isso torna o ambiente virtual mais carregado.
A obra Redes de indignação e esperança de Manuell Castells (2013), entretanto,
traz-nos um discurso interessante sobre os recursos e um mundo de possibilidades inseridas
no meio virtual, embora ele me pareça muito otimista quanto aos ditames inclusos
digitalmente. Novas formas de organização e articulação políticas são exercidas por grupos de
interesse comum, mas muitas vezes sem uma configuração definida, sendo aquela ideia de
“tudo junto e misturado”, bem à moda pós-moderna.
Também na área da educação têm-se novos parâmetros engendrados com as novas
tecnologias, tanto na informática, como na telefonia celular etc. Paradigmas que revolucionam
o modo de relacionamento entre educadores e educandos, com a mediação dos professores no
sentido de orientar e dimensionar os conteúdos, não mais de propriedade exclusiva desses que
outrora eram os senhores do conhecimento; propiciar uma relação afetuosa (nunca uma
máquina poderá oferecer essa virtude essencialmente humana); bem como tentar inserir esses
recursos tecnológicos ao processo de aprendizagem.
Portanto em certo dia a atual estrutura escolar será alterada por ambientes distintos e
mais serenos, mas jamais a profissão professor será extinta. Jamais, repito, um aparelho frio e
antissocial fará do ser humano o oposto do que ele sempre foi posto na história da
humanidade, ou seja, um ser social.
O polêmico uso do celular em sala de aula
Há um ponto de vista embasado pelo senso comum que o uso de celular atrapalha e
condiciona muito mal o alunado em relação às questões de aprendizagem. Lógico que não vou
me ater aqui neste pequeno texto a ratificar ou não essa premissa, mas alguns educadores não
percebem que isso não é o fundamental, ou seja, utilizar ou não esses equipamentos
tecnológicos não se traduz em relevo primordial para o processo de ensino-aprendizagem, em
comparação que possui uma educação problematizadora, por exemplo.
Isto é, houve época em que não havia livro, mas não se deixava de ser ter educação,
ou mesmo antes do advento das salas de aula, havia um preceptor que acompanha um aluno
em sua residência. Com a evolução e o surgimento do livro didático e de outros recursos, e
mesmo assim, o ensino não satisfaz aos planejamentos educacionais.
Por conseguinte, tudo vai depender do tipo de uso que se faz do celular ou outros
dispositivo tecnológico: caso se possibilite no âmbito de uma educação que contextualize,
problematize; ou uma prática pedagógica que continue com os mesmos pressupostos da
concepção tradicional.
Nesse sentido, enquanto esse dilema da linha pedagógica e metodológica ficar
apenas nesse ínterim no seio apenas de conteúdos das disciplinas, sem, no entanto, fazer o
aluno um ser que constrói o conhecimento, ficar-se-á nessa querela: liberar ou não o uso do
celular.
Sobre essa dicotomia do usar ou não, assim se refere Ilana Snyder (2009):
Posições polares sobre o uso das novas tecnologias para propósitos educacionais são
familiares para todos nós. Em um extremo, há os promotores do último estouro
tecnológico inteligente, celebrações da vida online e predições da otimização do
ensino e aprendizagem quando a mais avançada tecnologia aparecer. No outro, há a
ninharia nostálgica a favor do livro e da cultura do livro, críticos violentos dos
computadores, dos vídeos-game e da internet, e expressões de pânico moral sobre os
perigos à espreita das crianças no ciberespaço. (SNYDER, 2009, p.25).
Por outro lado os que se opõem à utilização celular, sempre argumentam sobre a
existência legal da não permissão de seu uso. Trata-se de uma alegação verdadeira, mas
questionável do ponto de vista pedagógico.
O uso de meios tecnológicos para fins de letramento
O letramento é um expediente didático que se baseia na apropriação da leitura e da
escrita por parte de um indivíduo. Ou seja, a partir da alfabetização, o letramento perfaz no
sentido do entendimento de textos os mais variados possíveis: tirinhas, bulas de remédio,
cartazes, jornais, artigos etc.
Concomitante ao processo de letramento como sendo o procedimento de leitura e
compreensão em modo processual, inicia-se a prática leitora e gradualmente os níveis de
leitura se acentuam.
Primeiramente a leitura literal, o entendimento a partir do estritamente escrito (nível
1); em seguida, a leitura explícita como o exposto abertamente compreendido (nível 2); e, a
leitura implícita, o que o inteligível está oculto, sendo o inferir o procedimento adequado
(nível 3).
Segundo Freire (1989), “(...) o ato de estudar, enquanto ato curioso do sujeito diante
do mundo é expressão da forma de estar sendo dos seres humanos, como seres sociais,
históricos, seres fazedores, transformadores, que não apenas sabem mas sabem que sabem.”(
pp. 58-59)
No entanto, como se processa o letramento através da internet e das novas
tecnologias? Será que o letramento possa ser trabalhado por meio de uma postagem de uma
rede social? Perguntas que ficam como dúvidas na cabeça do mais instigados.
Em termos de espaço, o letramento digital extrapola o ambiente da escola formal,
como afirma Xavier (2005): “o letramento digital requer que o sujeito assuma uma nova
maneira de realizar as atividades de leitura e de escrita, que pedem diferentes abordagens
pedagógicas que ultrapassam os limites físicos das instituições de ensino [...]” (pp. 3-4)
A era do vazio e a individualidade acentuada na contemporaneidade
Valores e concepções pós-modernas norteiam nosso dia-a-dia em todos os lugares.
Seja na rua, na escola, no lazer; enfim, em qualquer ambiente social, o mundo parece estar de
cabeça para baixo, no falar de alguns. Percebe-se que esses novos paradigmas, a denominada
era do vazio, no dizer de Lipovetsky (2010), implica ressignificar as relações sociais,
inclusive o fazer educacional.
Por conseguinte, o individualismo, o narcisismo, uma postura egocêntrica vêm
demarcando um cenário preocupante, pois como dizia o filósofo Aristóteles, o homem é um
ser essencialmente social. Isto posto, há uma contradição entre a condição inerente ao ser
humano e essa postura cada vez mais ligada ao “eu”.
Essas condutas assaz individualistas advêm em muito por conta do uso constante de
novos meios tecnológicos, como o computador, a internet, o celular; numa escala cada vez
mais atomista. A condição humana almeja a liberdade, que se caracteriza pela autonomia com
responsabilidade; e não uma permissividade, que se apresenta com o fazer livre, sem limites e
de forma desatinada.
Alguns estudiosos dizem que há uma tendência progressiva ao isolamento dos
indivíduos, algo que se faz notar amplamente vários lugares, mesmo que supostamente
acompanhadas em um recinto, fecham-se a uma vida mais intestina, desencadeando posições
ideológicas mais irrealistas, fora de uma condição concreta de racionalidade.
Não é à toa, por isso, que muito se fala em bipolaridade e psicopatia, parecendo que
o mundo pós-moderno está implicando insanidades e realidades virtuais, como sendo reais. O
virtual não é o real em si, poderá vir a ser. A denominada realidade virtual, embora seja parte
do real; na verdade, está também próximo do irreal.
A era do vazio - que traz incertezas, crises existenciais e depressões, possibilita
inconstâncias durante o passar dos dias, corroborando para as situações bipolares: ora alegre,
ora triste; ora entusiasmado, ora desanimado. Também possibilita que apareçam com mais
frequência, pessoas com transtornos psíquicos com maior ou menor de psicopatia. Um mundo
que cada vez privilegia o seu uno, a atomização; acarreta, infelizmente, essas condições e
situações antissociais.
No âmbito da contemporaneidade, surgem expressões e termos que perscrutam
explicar as mudanças de paradigmas que atualmente estão postas. O termo globalização que
começa a ser utilizado nos anos 90, mas que historicamente é um fenômeno que acontece há
muito tempo; desde a invenção da imprensa, passando pelas grandes navegações, pela
Revolução Industrial, até chegar a atualidade com a era digital e a rede mundial de
computadores; reconstrói essas premissas que procuram chegar a conclusões explicativas
acerca de todas essas novas configurações de relacionamentos.
Uma vida mais retraída e de um ponto de vista individualizada, refaz prognósticos
para o meio educacional, impelindo a novas reflexões sobre teoria e prática pedagógicas.
Autores e pensadores da nova geração preconizam em suas impressões, reformulações nos
modos de ensinar e educar, priorizando relações mais lúdicas, além da incorporação das novas
tecnologias no cotidiano da escola.
O educador necessita dialogar com uma geração diversa da sua, com novas
inquietações, novas perspectivas e visões de mundo. Trabalhar o ensino-aprendizagem com se
fazia outrora, talvez seja ineficaz, tendo que considerar esses novos fatores diante de
planejamentos e metodologias em sala de aula. Como na arte contemporânea, o mundo das
ideias parece reinventar e colocar tudo no liquidificador, um tudo ao mesmo tempo agora.
Este é o grande dilema nos dias de hoje, como conciliar a dualidade
indivíduo/coletivo no interior do meio escolar; ou melhor, a individualização e ação coletiva
do fazer pedagógico. Seria realizar isto de forma concomitante, ou seria mais lógico e eficaz
caso se trabalhe em separado? Como se exteriorizará a subjetividade humana?
Essas perguntas terão as respostas adequadas com o desenrolar dos fatos presentes,
como também prognosticados para o futuro, que se coloca como incerto. Lógico que
teoricamente devemos preparar o terreno, ará-lo, adubá-lo, aguá-lo, para em seguida colher os
frutos com uma nova geração mais informada, despojada e capacitada.
Não tenho plena certeza do que afirmara o Gardner sobre as múltiplas inteligências
possíveis na condição humana possa ser traduzida ao fazer pedagógico, mas é um dos
caminhos a seguir, afora outros que postulam aqui e alhures.
Considerações finais
A temática sobre o uso ou não de celular é assaz polêmica. Os defensores e críticos
possuem seus discursos de modo querer justificar suas posições.
Entretanto fica patente que o mais relevante não seja coibir ou liberar a utilização
desse equipamento em sala de aula, e sim que ele possa ser incorporado ao processo de
aprendizagem; que faça parte da resolução de uma situação-problema disponibilizada pelo
educador.
Assim como outros dispositivos foram outrora proibidos, que ele seja permitido no
ínterim de um planejamento de aula, mas sem que se faça de sua liberação uma prática e fins
banais.
Portanto, considerando os tópicos que reforçam o domínio imagético no mundo das
linguagens, o possível letramento pelos meios digitais (web, e-books etc.) e a individualidade
acentuada na contemporaneidade, justifica-se sim a sua instrumentalização como recurso
pedagógico.
REFERÊNCIAS
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