VISÕES DO BRASIL HISTÓRIA, ANTROPOLOGIA E - HCTE

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VISÕES DO BRASIL
HISTÓRIA, ANTROPOLOGIA E IDEOLOGIA SOBRE O BRASIL
Professor Mércio Gomes
Ementa
Este curso pretende fazer uma revisão histórica e antropológica sobre como o
Brasil vem sendo visto e analisado, às vezes até projetado para ser algo
diferente do que é. Existe um “destino manifesto” para o Brasil? Conceitos
sociológicos e antropológicos serão analisados e revistos. Visitantes, políticos,
antropólogos e outros intelectuais terão suas obras revistas de acordo com
suas visões do Brasil. O curso será apresentado em ordem cronológica do
surgimentos dos temas e dos autores.
Programa
CONCEITOS BÁSICOS
Povo, cultura, subculturas e nação; estamento, classe e subclasses sociais.
Família, sociedade e estado. Modo de produção e formação social. Escravidão,
sujeição (servidão) e liberdade. Miscigenação: ascensão social, castificação e
racismo. Colonialismo, independência e dependência. Feudalismo, capitalismo e
socialismo. Patrimonialismo, patronalismo e clientelismo. Catolicismo, umbanda,
espiritismo e protestantismo.
Problemática filosófica: historicidade e ahistoricidade da cultura brasileira. O
despontar de uma nova cultura no mundo.
ANTECEDENTES HISTÓRICOS
A formação social brasileira despontou do relacionamento preordenadamente
desigual entre portugueses e índios, constituindo um sistema com dois
estamentos inimiscíveis: em cima, os brancos; abaixo os índios, a quem foram
incorporados os negros. Os brancos, em suas subclasses, se autoconstituem o
povo, agente livre e ativo perante a Coroa portuguesa; os índios escravos e os
formalmente livres e depois os negros escravos são gente sujigada, agente
passivo da história. Duas culturas vão se formando: uma dominante, controladora
da nação; outra dominada, semi-autônoma, precondicionada à subserviência, à
malemolência, exceto quando tratada com dureza demasiada, de onde explode
em rebeliões escatológicas. Entre elas vai se formando uma subcultura
intermediária, mameluca, fruto da miscigenação física e cultural entre brancos e
índios. Por sua condição liminar, essa cultura carrega elementos das duas
culturas formativas e seus membros partilham de interesses duplos, por vezes
ambíguos. Entretanto, os mamelucos socialmente raramente se alçam ao
estamento superior, e quando o fazem, têm por força que se despojar de suas
características anteriores, renegando sua mistura formativa original. Amaciando
as contradições e as distâncias sociais insuportáveis se insere o cristianismo
católico, tridentino, jesuítico, anti-reforma.
Subclasses nesses dois estamentos: Estamento superior: administradores
portugueses, exportadores luso-brasileiros, clero (especialmente missionários)
portugueses e europeus, colonos (fazendeiros, comerciantes e plantadores),
quase sempre luso-brasileiros, e artesãos brasileiros mestiços (gente urbana
livre); Estamento inferior: mamelucos, índios sufigados (caboclos), negros e
índios escravizados, índios autônomos (selvagens) e negros quilombolas. A
história social brasileira se faz pelo processo de desenvolvimento e
transfiguração dessas categorias. A história cultural se faz pela constituição de
identidade em cada estamento social e no todo da formação sociocultural.
Subsumido entre eles, e só a partir do século XX, irrompe em vários modos a
subcultura mameluca buscando um espaço de manifestação e afirmação.
TEMPOS DE CONSCIENTIZAÇÃO HISTÓRICA
1822-1889
José Bonifácio e a nova nação brasileira. A dicotomia entre estamentos deve ser
rompida: o estamento superior se identifica com a civilização para justificar a
instalação da nova Nação; negros e índios devem ser civilizados, isto é,
absorvidos dentro do estamento superior para ganharem nacionalidade. As
rebeliões nativistas e suas pretensões republicanas: Confederação do Equador,
Cabanagem, Balaiada e Farroupilha. Meados do século: os indianistas concebem
a nação como amálgama do ser branco e do ser índio, sendo o negro
desconsiderado. Naturalista Karl von Martius e a idéia das três raças (1843). A
consolidação do conservadorismo monárquico: fim do regime escravocrata é
postergado.
1890-1920
Fim da escravidão, fim da monarquia. A irrupção do republicanismo: os militares,
os positivistas, a classe média urbana e os cafeicultores paulistas. O positivismo
ortodoxo juntando nação e estado. As idéias evolucionistas e o racismo científico
provocam a grande depressão nacional: o Brasil não presta por causa do seu
povo. Sílvio Romero, a importância do negro e das tradições atrasadas.
Capistrano de Abreu e a idéia de sertanejo “capado e recapado”. Manoel Bonfim
e a idéia de colonização. Nina Rodrigues e a idéia “científica” de
degenerescência. O culturalismo alemão e a necessidade de juntar raça com
nação. Euclides da Cunha e a busca de uma raça brasileira (o sertanejo forte
versus o negro neurastênico). O mito do sertão como origem e raiz da nação.
Oliveira Viana e a aristocracia branca: o ideal de luta dos bandeirantes; os
mestiços superiores e a condenação dos inferiores. O nacionalismo de Alberto
Torres. Monteiro Lobato e o “povinho” no imaginário popular. A industrialização
em marcha. O movimento sindical em São Paulo.
1922-1954
O Movimento Modernista de 1922 e a renovação da linguagem brasileira. Nova
busca de identidade. Oswald de Andrade e a antropofagia. Mário de Andrade e a
busca de raízes históricas. O movimento tenentista, o movimento operário, o
comunismo, o catolicismo conservador e o fascismo. Gilberto Freyre, Casa
Grande e Senzala e o suspiro de alívio existencial brasileiro. O povo como ser
miscigenado e a democracia racial. Sérgio Buarque de Holanda e o homem
cordial: a incompatibilidade entre o estado e a família, o público e o privado, a
inadequação do brasileiro, a revolução social lenta e o mito da cordialidade
brasileira. As reformas sociais, econômicas e culturais da Revolução de 1930
como representação da aliança entre segmentos das elites tradicionais e da
classe média, com repercussão nas classes populares. A disputa entre
comunismo e integralismo, e a argúcia política de Getúlio Vargas. O surgimento
da cultura popular na música: a mistura de composições de negros e brancos.
Villa-Lobos, a Nação e os corais sinfônicos. A expressão negra no novo Carnaval
das Escolas de Samba. A glorificação do lúdico como meio e fim da identidade
nacional: o cinema popular e a chanchada. O encanto dos estrangeiros: Stefan
Zweig, Otto Maria Carpeaux, Vilém Flusser.
1955-1964(68)
A construção de Brasília e a expectativa de desenvolvimento econômico e
cultural. A classe média e a superação da cultura popular: a bossa nova e o
cinema novo. O fortalecimento da universidade e do espírito científico de
pesquisa. As ligas camponesas, o movimento operário urbano e o reformismo
janguista. O militarismo de direita, a reação conservadora e a Guerra Fria. A
incapacidade das forças progressistas de se aliarem.
1964(68)-1985
O golpe de 1964 e a derrota dos reformistas populistas. Os protestos políticos e
culturais: o movimento estudantil e o tropicalismo. A dureza política e o
crescimento econômico. O aumento da desigualdade entre classes via
financiamento de empresas privadas, diferenciação de salários e privilégios entre
trabalhadores e classe média, novos direitos previdenciários, financiamentos de
bancos oficiais à burguesia e à classe média. A urbanização intensa e violenta, o
revigoramento da indústria agro-pastoril e a inviabilização da reforma agrária. A
explosão demográfica. A consolidação da televisão como principal veículo de
massas. A incepção do protestantismo fundamentalista na subcultura mameluca.
A expansão universitária, o privilegiamento da classe média e o movimento
estudantil radical. Os desequilíbrios políticos: militarismo versus patriciado
político. O declínio econômico, o ressurgimento dos protestos e a abertura
política.
1985-2003
A valorização do multicultaralismo, das minorias, das novas formas de ser como
sobrevalorização da classe média e sua posição adquirida nos anos anteriores.
Ascensão e vitória do novo PT (trabalhismo cristão, classe média baixa e
trabalhadores sindicalizados) sobre o velho trabalhismo PDT (trabalhismo
positivista, classe trabalhadora). A incapacidade dos trabalhismos se juntarem
por serem culturalmente diversos. O fim do comunismo e de sua utopia brasileira.
PSDB, PMDB, PFL e quejandos e a habilidade de se manter no poder da aliança
das classes burguesa e aristocracia decadente. As políticas adaptativas ao novo
sistema mundial de Sarney, Collor, Itamar, FHC e Lula. O neoliberalismo, o
desmonte da economia estatal e do estado. A ameaça de tirar privilégios da
classe média. A dominação do setor internacionalizado da classe média
brasileira, que se aburguesa rapidamente. A desnacionalização da economia
brasileira. A reificação do Brasil pela economia. O colapso da auto-estima
brasileira. Comparação com a situação cem anos antes. Raça, a culpada em
1900; cultura, a culpada em 2000.
A era Lula e os seus desdobramentos
Mais além de um novo getulismo em ascensão? Aliança de trabalhadores
urbanos sindicalizados e elite empresarial e bancária com trabalhadores
desempregados e sem-terra. A implantação de políticas do movimento cultural
pós-ditadura: direitos humanos, direitos de minorias sociais e culturais, de
preferências sexuais. Consolidação do empresariado rural. Tendência de
diminuição da posição do trabalhador rural e colono assentado. Alavancagem da
auto-estima nacional. Renovação do papel econômico estatal. Busca de novo
papel internacional. Continuidade de grandes dilemas e impasses nacionais:
desigualdade social por desequilíbrio econômico e exclusão sociocultural;
descompasso educacional entre classe média e classes baixas; diminuta vontade
de mudança cultural drástica no que concerne a comportamento coletivo, respeito
à coisa pública, etiqueta de relacionamento, acatamento a leis no trânsito,
desconfiança
de
autoridades
em
geral,
desburocratização
em
geral,
reconhecimento de valor individual sobre familiar ou de classe.
Finalmentes
Como superar dilemas e sair dos impasses? Que projeto político poderá se
formar? Que alianças de classes são possíveis? Com qual setor da burguesia ou
da aristocracia decadente se pode confiar? Como redirecionar os tecnocratas
para uma nova visão econômica? Que nova cultura poderá surgir para dirigir os
anseios da sociedade quanto a uma melhor equidade econômica? Como diminuir
as diferenças econômicas pela valorização da cultura, a partir da cultura de
base? Como redirecionar a classe média para um projeto menos autocentrado?
Qual o papel político a ser exercido pelos atuais trabalhadores, o subproletariado,
e os sem-terra? Como refazer o Estado: reformulação de impostos; redistribuição
de atribuições entre estados e municípios; aumento da poupança interna;
ampliação do mercado interno. Como reeducar a sociedade? Como qualificar a
educação pública? Como defender a negritude e transcender o racismo sem cair
na proposta americana. A renovação da cordialidade e da auto-estima brasileiras.
AVALIAÇÃO
Alunos serão avaliados por três trabalhos, sendo dois realizados por
apresentação oral ao longo do curso e um final por escrito. Os alunos
escolherão com a concordância do professor os temas e autores a serem
analisados nesses trabalhos.
BIBLIOGRAFIA
A ser apresentada pelo professor no início das aulas.
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