POF: Um Novo Marco Marcelo Neri ([email protected]) Centro de Politicas Sociais e EPGE – Fundação Getulio Vargas “Com a redução do tamanho das famílias de 3,62 para 3,3 pessoas entre 2003 e 2009, a renda familiar per capita que é o que importa para medir bem estar, subiu o dobro da renda total: 21,7%” A nova Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF/IBGE) representa ponto de inflexão de como o Brasil e os brasileiros se vêem no espelho dos indicadores sociais. Depois dela enxergaremos detalhes nunca d’antes aqui observados em medidas clássicas de pobreza e desigualdade. O numerário pós‐POF será consumo e não mais renda. Um ganho, pois as pessoas extraem bem estar dos bens e serviços consumidos, e não do valor de seus contra‐cheques ou do dinheiro nos seus bolsos. Em 2010, não haverá PNAD, pois é ano de Censo e já em 2011 haverá uma revolução estatística com a integração da PNAD, PME e de uma mini‐POF em uma única pesquisa trimestral. Mais do que uma sopa de letras e números, o novo sistema de pesquisas domiciliares ibgeano privilegiará o consumo para integrar os efeitos de políticas públicas e ações privadas no mercado (financeiro, de trabalho etc.), ou fora dele (despesas não monetárias). Portanto, devemos desde já substituir a ênfase dada à renda pela em consumo. A POF dá um retrato das mudanças de prazo mais longo que o da PNAD, pois a primeira POF nacional fé de 1974/75 e a primeira PNAD hoje disponível é de 1976. Há ainda ganho de atualização dos dados, pois a última PNAD é do final de setembro de 2008 e a POF centrada em janeiro de 2009. A POF anterior é de 2002/03 o que nos permite captar o período de ouro cercado por duas crises, iniciado naquela associada às incertezas às eleições de 2002 quando um dólar chegou a custa quatro reais e o período pós‐crise externa de 2008. As POFs fornecem retrato de alta definição acerca das melhoras do bolso, da dispensa e da vida dos brasileiros. Em setembro último dois Prêmios Nobel em Economia, Amartya Sen e Joseph Stiglitz, apresentaram relatório sobre como medir o progresso e a riqueza das nações, resumido em quatro propostas centrais. Em todas elas a POF permite saltos metodológicos, senão vejamos: 1) Usar menos o PIB e mais médias de pesquisas domiciliares, em particular de consumo. A despesa familiar média divulgada pelo IBGE sobe 10,8% entre POFs. Com a redução do tamanho das famílias de 3,62 para 3,3 pessoas, a renda familiar per capita que é o que importa para o bem estar subiu o dobro da total: 21,7% i . 2) Medir desigualdades. Segundo a POF a renda dos 10% + pobres sobe 42,1% e as dos 10% + Ricos 13,3%. A desigualdade de consumo cai. Por exemplo, a distância entre famílias chefiadas por pessoas com mais de onze anos de estudo cai a metade de 400% para 207% entre POFs. A boa notícia é que a desigualdade de consumo brasileira embora ainda muito alta é menor que os dados de renda sugeriam. 3) A POF é a única pesquisa nacional a avaliar a evolução das percepções das pessoas sobre diversas dimensões de suas vidas num período em que o bolo cresceu com mais fermento para os mais pobres. A proporção de pessoas que consideravam sua alimentação insuficiente cai de 47,6% para 35%, queda de 24,3%. Ou ainda a proporção de famílias que concordavam com o dito de Millor Fernandes de que “o salário não permite chegar até o final do mês” caiu de 85% para 75%. De maneira geral, indicadores subjetivos e objetivos concordam que nossos problemas sociais são grandes, mas melhoraram, o que nos leva a última prescrição. 4) Avaliar a sustentabilidade das trajetórias de crescimento através do estoque dos vários tipos de ativos. A POF confere olhares mais precisos e profundos que as demais pesquisas sobre bens duráveis e de moradia (valor, estado de aquisição, financiamento etc.), ativos financeiros (detalhes dos ganhos de capitais e da renda financeira) e ambientais (poluição ambiental, sonora e mesmo violência na redondeza). Mais do que isso, a POF mede a altura e o peso das crianças que é um indicador que nem habitava os sonhos dos gestores públicos. Um país de crianças nanicas e subnutridas será no futuro econômica e socialmente nanico. Esta é apenas uma pequena amostra da riqueza da POF. Ela permite ir até onde outras pesquisas não foram, decifrar detalhes da vida privada das diferentes classes de brasileiros. Parabéns ao IBGE pelo excelente trabalho! i Se quisermos saber quanto aumentou a renda media de cada brasileiro e não de cada família brasileira neste período temos de levar em conta que os domicílios estão menores caem de 3,62 pessoas para 3,3 pessoas de 2002/03 para 2008/09 respectivamente. Ou seja, se as pessoas moram em mais domicílios de menor tamanho cada, a renda per capita (o equivalente ao PIB per capita) vai crescer mais que a familiar total.