ANÁLISE DA FRAGMENTAÇÃO FLORESTAL NO MUNICÍPIO DE MANAUS/AM Jenifer Pereira Castilho Marques Bolsista PIBIC/CNPq, Universidade Federal do Amazonas – UFAM [email protected] Eduardo da Silva Pinheiro Universidade Federal do Amazonas – UFAM [email protected] RESUMO Nas últimas décadas, a expansão urbana em Manaus tem resultado em uma crescente fragmentação das florestas, uma vez que essa expansão ocorreu em áreas de florestas primárias, sendo ocupadas de forma aleatória ou por empreendimentos imobiliários autorizados. O objetivo deste trabalho foi analisar o processo de fragmentação florestal no município de Manaus, AM em um período de 30 anos. As análises foram executadas a cada 10 anos, a partir de uma série de imagens LANDSAT de 1978, 1988, 1998 e 2008. As imagens foram registradas, equalizadas e elaborados mosaicos, segmentadas e classificadas para cada ano. O desflorestamento de Manaus é observado preferencialmente na área urbana e ao longo das rodovias BR-174. Desde a implantação da Zona Franca de Manaus a cidade experimentou um elevado crescimento populacional e uma redução na cobertura florestal. PALAVRAS-CHAVE: Fragmentação florestal; Geoprocessamento; População. INTRODUÇÃO O processo de expansão urbana em Manaus nas últimas décadas tem resultado numa crescente fragmentação das florestas visto que essa expansão deu-se em áreas de florestas primárias, sendo ocupadas de forma aleatória ou por empreendimentos imobiliários autorizados (ROVERE & CRESPO, 2002). Para Carneiro (1998), a partir do final da década 60 do século XX, a implantação da Zona Franca e do Pólo Industrial aliado ao aumento dos núcleos urbanos determinou um rápido crescimento populacional na cidade de Manaus. Conforme Magalhães & Crispim (2003), os fragmentos florestais são os principais componentes naturais na paisagem urbana e possuem uma relação no ambiente físico e biológico com os habitantes, interferindo diretamente nos índices de poluição do ar, conforto térmico, economia de energia e saúde física e mental da população. Um fragmento florestal pode ser entendido como sendo qualquer área de vegetação natural contínua, interrompida por barreiras Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 1 antrópicas (estradas, construções, culturas agrícolas, etc) ou naturais (lagos, outras formações vegetais, etc) capazes de diminuir significativamente o fluxo de animais, pólen e/ou sementes (VIANA, 1990). O processo de fragmentação florestal leva a consequente perda da biodiversidade de um ecossistema, a redução da cobertura florestal e o surgimento de “ilhas de florestas” remanescentes que ficam isolados por um entorno hostil (VIANA, 1990; LAURENCE et al. 2001). A manutenção de fragmentos remanescentes é de extrema importância para preservação da biodiversidade de um município, além disso, por vezes constituem um espaço presente em um sistema urbano cujas condições ecológicas interferem nos índices de poluição do ar, conforto térmico e refúgio para fauna e flora (TROPPMAIR, 2008). Estudos foram realizados com objetivo de analisar o processo de fragmentação florestal de Manaus (LIMA e NELSON, 2005; MATOS e SILVA, 2005, NOGUEIRA et al. 2007), contudo as pesquisas foram realizadas na área urbana. Esta pesquisa teve como objetivo analisar o processo de desflorestamento e fragmentação florestal em toda a área do município em um período de 30 anos (1978 a 2008). Além disso, analisar a influencia da implantação da Zona Franca de Manaus e o crescimento populacional no processo de redução da floresta do município. MATERIAL E MÉTODOS 1..1ÁREA DE ESTUDO O estudo foi realizado no município de Manaus, o qual possui uma área de 11.458,5 km2. A capital do Estado do Amazonas está localizada entre as coordenadas 1°55’39” a 3°13’46” de latitude Sul e 59°08’47” a 60°47’18” de longitude Oeste (Figura 1). Na região de Manaus, o clima é do tipo “Am” na classificação de Köppen (IBGE, 1978), com precipitação anual de 1.355 a 2.839 mm. A temperatura média oscila de 25,6 a 27,6 °C, com umidade relativa do ar variando de 84 a 90% ao longo do ano. Os meses mais chuvosos vão de dezembro a maio e os mais secos de agosto a novembro. No município a vegetação Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 2 predominante é a Floresta ombrófila densa das terras baixas, conhecida também como mata primária de terra firme com platôs, vertentes e baixios. Figura 1. Localização do município de Manaus no estado do Amazonas. 1..2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS Para a realização deste trabalho foi utilizada uma série histórica de imagens do satélite MSS/LANDSAT-3 (1978), órbitas/ponto (248/62, 248/61 e 247/62) e TM/LANDSAT-5 (1988 a 2008), órbitas/ponto 231/62, 231/61 e 230/62. Base de dados cartográficos com os dados de limites municipais e hidrografia disponibilizada pelo Serviço Geológico do Brasil. Dados censitários do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) referentes a Manaus. A série Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 3 histórica de imagens orbitais deveria começar antes na criação da Zona Franca final da década de 1960, contudo o primeiro satélite de sensoriamento remoto lançado pela National Aeronautics and Space Administration (NASA) foi o LANDSAT-1 em 1972, e a imagem disponível, no banco de dados do INPE, para Manaus é de 1978. Neste sentido, as análises foram executadas a cada 10 (dez) anos, a saber: 1978, 1988, 1998 e 2008. O processamento digital das imagens foi realizado utilizando os sistemas SPRING/INPE. O registro das imagens foi realizado pelo modelo polinomial de 1° grau e reamostragem por vizinho-mais-próximo. A base para o registro foi a imagem TM/LANDSAT-5 de 2008 que já estava corrigida. As imagens foram segmentadas pelo método denominado Crescimento de Regiões, com similaridade e a área de pixel iguais a 20 e 30, respectivamente. A classificação digital foi realizada a partir do classificador supervisionado Battacharya. Este classificador utiliza algoritmos de reconhecimento dos padrões espectrais com base numa amostra numa determinada área da imagem. O Battacharya mede a distância média entre as distribuições de probabilidades de classes espectrais (CÂMARA et al. 1996). O classificador rotula as classes temáticas, a partir de amostras de imagens segmentadas. Os dados censitários foram obtidos no IBGE referentes a Manaus (Tabela 1). Para cada ano (1978, 1988, 1998, 2008) foi calculada a população estimada com base nos censos de 1970, 1980, 1991 e 2000. De acordo com IBGE (2004), a população pode ser estimada por uma progressão geométrica, a saber: Pf= P0.(1+α)t Onde Pf= população final; P0= população oficial (ano base); α = taxa de crescimento anual; t= tempo em anos. RESULTADOS PARCIAIS No ano de 1978, Manaus contava com uma população de aproximadamente 600 mil habitantes e uma área total de 11.458,5 km2, sendo que 9.700,00 km2 do território do município eram de cobertura vegetal. Após 10 anos, verifica-se uma perda de 13.000 km2 de floresta e a população aumenta para 898 mil habitantes. No ano de 1998, a população ultrapassa 1.299,00 Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 4 habitantes e cerca de 58.000 km2 de vegetação é perdido. Nos últimos dez anos de análise verificou-se a maior perda de cobertura florestal, cerca de 176.000 km2 do território, enquanto que a população ultrapassa 1.600.000 milhões de habitantes. Nos 30 anos de análise identificou-se uma redução elevada da área coberta por floresta, cerca de 250.00 km2, paralelamente ao grande crescimento da população atingindo 1.738,00 habitantes em 2008 (Figura 3). Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 5 Figura 2. Município de Manaus, desflorestamento nos anos de 1978, 1988, 1998 e 2008. Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 6 O desflorestamento em Manaus está concentrado essencialmente na área urbana do município. Em 1978, o desflorestamento de Manaus é observado preferencialmente nas proximidades das margens do rio Negro e ao longo da rodovia BR-174 (Figura 2). Nos anos seguintes os mapas apontam para um crescimento deste desflorestamento em direção ao norte e leste da área urbana (Figura 2). O processo de desflorestamento pode estar, entre outros fatores, relacionado à expansão demográfica no município, conforme demonstra a Figura 3. A expansão urbana em Manaus ocorreu em sentido horizontal ocasionando um inchaço na cidade. Figura 3. Crescimento populacional de Manaus e redução da área coberta por floresta no município. Nas últimas décadas, o processo de ocupação de Manaus teve um crescimento exponencial atingindo 1.646.602 habitantes, em 2007 (IBGE, 2007), os dados censitários do IBGE também apontam um intenso crescimento populacional na área urbana, principalmente durante as décadas de 1980 e 1990. Um dos fatores a ser considerado é a implantação do Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 7 Distrito Industrial e a Zona Franca de Manaus. A Tabela 1 apresenta a população de Manaus desde 1970 a 2007. A Zona Franca de Manaus foi criada no final da década de 60, a partir dos Decretos 288 de 28/02/67 e Decreto-lei 291, de 28/02/67 com o objetivo de estimular a industrialização da cidade e sua área adjacente, bem como ampliar seu mercado de trabalho. Esses mecanismos legais criavam incentivos durante um período de trinta anos, até 1997. A reforma constitucional de 1988, no artigo 40 das Disposições Transitórias, manteve a Zona Franca de Manaus com suas características de livre comércio, exportação e importação e de incentivos fiscais, pelo prazo de 25 anos, ou seja, até o ano 2013. Com a implantação da Zona Franca e do Pólo Industrial de Manaus a cidade tornou-se grande atrativo para população do interior e de outros estados. Este fato ocasionou um êxodo populacional para a capital amazonense, o que propiciou um crescimento rápido, desordenado, na escala espacial territorial, ameaçando inclusive uns dos poucos espaços verdes da cidade. Segundo Assad (2006), esse crescimento populacional foi causado pelo gigantesco êxodo rural e pelo fluxo migratório para a capital, onde enormes contingentes populacionais abandonaram seus antigos locais, atraídas pelas expectativas de emprego e melhores condições de vida em geral resultantes da instalação da Zona Franca de Manaus. O elevado crescimento aliado a uma carência de política habitacional não permitiu que a cidade absorvesse e integrasse toda a população nos setores da economia, surgindo à necessidade de ampliar seus limites urbanos (CARNEIRO, 1998), como conseqüência diversas áreas cobertas por floresta deram lugar a novas ocupações humanas. Ainda, diversos locais da cidade foram ocupados por grandes condomínios fechados. Tabela 1. População de Manaus entre os anos de 1970 e 2007. 1970 1980 1991 2000 Urbana 2007 283.673 633.383 1.006.585 1.396.768 - Rural 27.949 21.54 4.916 9.067 - Total 311.622 654.923 1.011.501 1.405.835 Fonte: Adaptado de IBGE (2009). Realizado de 25 a 31 de julho de 2010. Porto Alegre - RS, 2010. ISBN 978-85-99907-02-3 8 1.646.602 Avalia-se que o crescimento populacional da cidade tem causado profundas alterações na paisagem, essencialmente da cobertura florestal. Até a década de 1970, a expansão demográfica da cidade de Manaus concentrava-se nas margens dos igarapés nas zonas Sul, Centro-Sul, Oeste e Centro-Oeste. Após a implantação da Zona Franca, a concentração da população começou a expandir-se para as zonas Leste e Norte da cidade. Para Oliveira e Schor (2008), o crescimento urbano expandiu-se para longe da margem do Rio Negro, esparramando-se pelos extensos platôs no sentido norte e leste, com a predominância das ocupações espontâneas conhecidas como “invasões”, e no sentido oeste, com a predominância de condomínios fechados e moradias de alto padrão. Na Figura 2, a comparação entre o mapa de 1978 e o de 2008, permite verificar que a mancha urbana cresce em direção à zona norte da cidade fazendo. REFERENCIAS BIBLIOGRÁFICAS ASSAD, T.M. A problemática das “invasões” na cidade de Manaus: Perspectivas de legalização fundiária à luz do estatuto da cidade. In: Anais XV Congresso Nacional do CONPED, Manaus/AM, 2006. 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