CARTA MENSAL ANIvERSáRIO DE 15 ANOS DO PLANO REAL

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CARTA MENSAL
Junho de 2009
Por George Bezerra
Aniversário de 15 Anos do Plano Real, Avanços Mais Recentes da Economia
Brasileira e Perspectivas
Políticas econômicas heterodoxas e de forte centralismo econômico foram adotadas no Brasil desde meados da
década dos 60 e aprofundadas com a crise da década de 80. Os resultados de tais políticas foram crescentemente
desastrosos. Esta longa experiência de fracassos explica, em grande medida, porque as políticas cambial e monetária
foram se tornando mais ortodoxas a partir do Plano Real, que este mês completa 15 anos. Estas são lições ainda recentes
da nossa história econômica que jamais deveriam ser esquecidas.
O Plano Real foi muito bem concebido, produzindo, de início, importantes resultados, especialmente no campo da
inflação. Foi executada uma reforma monetária profunda, eliminou-se a maioria dos mecanismos de indexação, acabouse gradualmente com a criação descontrolada de moeda pelos bancos estaduais, melhorou-se a transparência das
contas públicas, etc. Infelizmente, ao longo do tempo algumas distorções graves foram minando a capacidade do Plano
de assegurar a retomada do crescimento sustentado, após a fase inicial tão bem sucedida de combate ao descontrole
inflacionário.
A ênfase no combate à inflação fez com que, entre 1994 e 1998, a taxa de câmbio e a taxa real de juros fossem usadas
de forma abusiva como instrumentos adicionais de combate ao aumento dos preços. Adicionalmente, o Plano Real, em
sua continuidade, falhou em um aspecto de importância decisiva: a política fiscal. Explicaremos um pouco melhor este
argumento.
Em 1993, o Resultado Primário do Setor Público registrava um superávit de 2,18% do PIB e a Carga Tributária Total
era de apenas 25,3% do PIB. Naquele ano a Balança Comercial registrou um superávit de US$ 13,34 bilhões e o Saldo em
Transações Correntes um déficit de apenas US$ 675,88 milhões. A relação Dívida Externa Líquida/Exportações foi de
2,4% e as Reservas Internacionais se situavam em US$ 32,2 bilhões.
TABELA 1 – INDICADORES ECONOMIA BRASILEIRA (1993-1998)
Indicadores - Economia Brasileira
Saldo da Balança
Comercial
(US$ M)
Saldo em TC
(US$ M)
Dívida Externa
Líquida /
Exportações
13.335,51
10.500,19
-3.466,37
-5.598,77
-6.759,23
-6.623,48
-675,88
-1.811,23
-18.383,71
-23.502,08
-30.452,26
-33.415,90
2,38%
86,11%
79,74%
68,77%
81,28%
135,14%
1993
1994
1995
1996
1997
1998
Reservas
Internacionais:
Liquidez
Internacional
(US$ M)
32.211,20
38.806,20
51.840,30
60.110,10
52.172,71
44.556,44
Carga Tributária
Total (%PIB)
25,30%
27,90%
28,44%
28,63%
28,58%
29,33%
Resultado Primário
do Setor Público
(%PIB)
2,18%
5,64%
0,26%
-0,10%
-0,96%
0,02%
Fonte: Ipeadata
Elaboração: Máxima Asset Management
Estas condições, razoáveis nas contas fiscais e favoráveis no setor externo, criaram uma base muito importante
para o lançamento do Plano Real, já que a dificuldade em reduzir a altíssima taxa de inflação repousava na baixíssima
credibilidade da política econômica, nas distorções do regime monetário e no sistema generalizado de indexação.
A queda brusca da inflação imediatamente após o lançamento do Plano Real exerceria necessariamente dois tipos de
pressão sobre o gasto público: a perda do imposto inflacionário e a corrosão dos gastos fixados em termos nominais nos
orçamentos (as receitas costumam estar mais atreladas à própria inflação). Além disso, a política de maior transparência
sobre a situação fiscal, a renegociação de dívidas e o equacionamento dos problemas dos bancos estaduais, e a retirada
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de vários outros “esqueletos” do fundo do armário explicaram, em certa medida, o aumento contínuo do gasto público e
da carga tributária verificados nos anos imediatamente seguintes ao lançamento do Plano, conforme se pode verificar
no Gráfico 1.
GRÁFICO 1 – CARGA TRIBUTÁRIA VERSUS NFSP (1994-1998)
29,50%
28,00%
29,00%
23,00%
18,00%
28,50%
13,00%
28,00%
8,00%
27,50%
3,00%
27,00%
-2,00%
1994
1995
1996
1997
1998
Carga Tributária Total (%PIB)
Necessidade de Financiamento do Setor Público (%PIB)
Fonte: IBGE – Sistema de Contas Nacionais. Referência 2000.
Elaboração: Máxima Asset Management
Dessa forma, com a instauração da âncora cambial a Balança de Mercadorias evoluiu de um superávit de mais de US$
13 bilhões para um déficit de US$ 6,6 milhões, entre 1993 e 1998. Em relação ao Balanço de Transações Correntes, o
mesmo elevou-se de um equilíbrio em 1993 para um déficit de mais de US$ 33,0 bilhões em 1998 (como percentagem
do PIB, o déficit em Transações Correntes chegou a aproximadamente 4% em 1998, contra quase zero em 1993).
Observa-se, portanto, que o principal objetivo do Plano Real foi atingido nos primeiros anos de sua instauração, uma
vez que o monstro da inflação descontrolada foi eliminado. Contudo, tal sucesso foi obtido com a troca de menos inflação
por uma rápida deterioração das contas externas, como pode ser observado no gráfico 2.
GRÁFICO 2 - Evolução do Déficit em Transações Correntes (US$ Bi)
$0
1993
1994
1995
1996
1997
1998
IPCA
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
($5)
($10)
($15)
($20)
($25)
($30)
($35)
($40)
2477,15%
916,46%
22,41%
9,56%
5,22%
1,66%
8,94%
5,97%
7,67%
12,53%
9,30%
7,60%
5,69%
3,14%
4,46%
5,90%
Fonte: IBGE, Sistema Nacional de Índices de Preços ao Consumidor e Banco Central do Brasil, Seção Balanço de Pagamentos.
Elaboração: Máxima Asset Management
www.maximaasset.com.br
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Rio de Janeiro
RJ
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Como resultado desta política macroeconômica desbalanceada, após uma forte recuperação da atividade econômica
nos seis primeiros meses após o lançamento do Plano a economia começou a desacelerar. No triênio 1996-1998 o
crescimento médio anual foi de apenas 2%, tendo sido levemente negativo em 1998.
Em janeiro de 1999 o governo se viu obrigado a flexibilizar sua política cambial.
O efeito mais negativo da desvalorização cambial foi seu impacto imediato sobre o déficit público e a dívida, já que o
governo havia colocado no mercado uma grande quantidade de títulos públicos e derivativos indexados à taxa de câmbio.
Apenas como resultado da desvalorização cambial a relação Dívida/PIB teve um acréscimo imediato de aproximadamente
7 pontos percentuais. No total, do final de 1998 para o final de 1999 ela aumentou de 42% para 51%.
Foi também adotado o regime de metas de inflação com câmbio flexível.
Iniciou-se uma gradual recuperação dos resultados da Balança Comercial, que evoluiu de um déficit de US$ 6,6 bilhões
em 1998 para um superávit de US$ 13,2 bilhões em 2002. Ao longo desse mesmo período, o déficit em Transações
Correntes caiu de US$ 33,4 bilhões para US$ 7,6 bilhões. Por outro lado, a inflação dá um grande salto em 1999 e assume
trajetória ascendente, após uma pequena queda em 2000, chegando a alcançar a elevada taxa de 12,0% em 2002,
conforme indicado no Gráfico 3.
Milhares
GRÁFICO 3 - Evolução do Déficit em Transações Correntes versus Inflação
$0
($5)
($10)
($15)
($20)
($25)
($30)
($35)
($40)
14,00%
1998
1999
2000
2001
2002
12,00%
10,00%
8,00%
6,00%
4,00%
2,00%
Déficit em Transações Correntes
Inflação - IPCA
0,00%
Fonte: IBGE, Sistema Nacional de Índices de Preços ao Consumidor e Banco Central do Brasil, Seção Balanço de Pagamentos.
Elaboração: Máxima Asset Management
As conquistas mais importantes do Plano Real e dos dois mandatos de Fernando Henrique Cardoso foram a
reforma monetária, o controle do monstro da inflação, a desindexação generalizada da economia, a criação da Lei de
Responsabilidade Fiscal e o aumento da transparência da administração pública. Entretanto, o objetivo mais importante
de retomada do crescimento econômico sustentado não foi alcançado e a relação Dívida Pública/PIB e a carga tributária
aumentaram fortemente, deixando uma herança pesada para as futuras gerações e governos.
Porém, faz-se necessário reconhecer que o governo FHC enfrentou condições externas muito adversas entre 1994 e
2002. Algumas das crises ocorridas neste período que impuseram um ônus considerável à gestão da política econômica
e dificultaram o crescimento: março de 1995: crise do México; outubro de 1997: crise asiática; setembro de 1998:
moratória da Rússia; maio de 2000: estouro da bolha do Nasdaq; dezembro de 2001: crise e moratória da Argentina.
Avanços Mais Recentes
Além da contínua melhoria da produtividade do setor privado brasileiro, uma grande ajuda para a melhora da economia
passou a vir de fora. De 2003 a 2005 o crescimento médio da economia mundial foi de 4,4% ao ano, quase 1 ponto
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percentual acima da média verificada no período 1994-2002. As taxas de juros internacionais se mantiveram no nível
mais baixo das últimas décadas e a liquidez manteve-se extremamente elevada.
A explosão da demanda por matérias primas, especialmente na China, elevou os preços das commodities a níveis
recordes. Isto favoreceu enormemente as exportações do Brasil e de vários países emergentes, permitindo um grande
crescimento das exportações e melhoria da Balança Comercial destes países. A combinação notavelmente virtuosa de
baixas taxas de juros e abundante liquidez no mundo, com a melhoria dos balanços de pagamentos em contas correntes
dos países emergentes, favoreceu o fluxo de investimentos e aplicações financeiras para estes países.
O Brasil, como grande exportador de commodities, e pelo tamanho e potencial da sua economia, beneficiou-se
sobremaneira deste ambiente externo em termos do seu Balanço de Pagamentos (e, conseqüentemente, condições de
endividamento externo).
Neste período, foi destacada a contribuição do aumento das exportações e do superávit comercial para a melhoria
dos indicadores da dívida pública total. Embora a relação Dívida Interna Líquida/PIB tenha aumentado de 41,2% em 2002
para 49,1% em 2005, a relação Dívida Externa Líquida/PIB sofreu a impressionante queda 14,3% para apenas 2,6% no
mesmo período. O resultado foi que a relação Dívida Líquida Total/PIB sofreu uma pequena queda de 55,5% em 2002 para
51,6% em 2005, após ter atingido 57,2% em 2003.
A partir de 2006 (notadamente no segundo semestre), a taxa de crescimento do PIB brasileiro começou a aumentar,
de modo que a média destas taxas no período 2006-2008 foi de 4,95%. Este maior crescimento da absorção doméstica,
combinado com a desvalorização da taxa de câmbio até meados de 2008, provocou uma redução dos superávits na
Balança Comercial de US$ 46,45 bilhões em 2006 para US$ 24,76 bilhões em 2008, enquanto o Saldo em Transações
Correntes evoluiu de um superávit de US$ 13,64 bilhões em 2006 para um déficit de US$ 28,30 bilhões em 2008.
A demanda doméstica passou a crescer a taxas significativamente maiores do que a da oferta doméstica, mas este
excesso de demanda era parcialmente suprido pelo aumento das importações líquidas, o que continha as pressões
sobre a inflação. Dessa forma, assim como se verificou nos primeiros anos do Plano Real, de 2006 a 2008 as condições
extremamente favoráveis do Balanço de Pagamentos vinham ajudando no controle da inflação. Além disso, tais condições
foram essenciais para que a Dívida Externa Líquida pública se tornasse negativa em 2006, e as reservas internacionais
atingissem o patamar recorde de US$ 208 bilhões ao final de 2008.
Impactos da Atual Crise Mundial
O impacto negativo mais forte da atual crise externa sobre o crescimento da economia brasileira se deu a partir de
setembro de 2008. De fato, a produção industrial cresceu 6,4% no período janeiro-setembro de 2008, e estava acelerando
na margem. Porém de setembro em diante, tal tendência foi fortemente invertida. No último trimestre de 2008 registrouse uma queda de 9,4%, se comparado com o período imediatamente anterior Em relação aos dados de janeiro de 2009,
o setor industrial recuou 17,2% em comparação com o mesmo período do ano anterior, representando a maior retração
dessa série desde 1991. Mesmo assim, a forte desvalorização do real ocorrida no final de 2008 contribuiu para uma
significativa queda adicional da relação Dívida/PIB neste ano, quando comparada à posição observada no final de 2007
(já que a parcela da dívida líquida indexada ao câmbio era credora).
A forma como a economia brasileira tem se comportado diante da crise, até o momento, tem sido, sob certos aspectos,
muito positiva. A taxa de câmbio do real para o dólar, após registrar uma forte desvalorização no final do ano passado,
já retornou a níveis pouco superiores ao período pré-crise. A perda de reservas internacionais durante o auge da crise
também foi bem menor que o esperado e recentemente o banco central já se tornou, novamente, comprador líquido da
moeda estrangeira, voltando a recompor as reservas (é bem possível que o nível das reservas internacionais no final de
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2009 venha a estar acima do observado no final de 2008). As taxas de juros estão em queda acentuada e a inflação sob
controle, com as expectativas bem comportadas em relação às metas. A atividade econômica já está em recuperação e
a queda do PIB em 2009, se acontecer, será de pequena monta.
Este notável desempenho da economia e da atuação do banco central diante da crise, até agora, melhorou ainda mais
a posição relativa do Brasil no cenário mundial, para os investidores internacionais.
Plano Real: uma obra inacabada e ainda sob risco de retrocessos.
Se avaliado apenas tendo-se em mente o objetivo de acabar com o descontrole da inflação que existia há décadas,
o Plano Real deve ser considerado um grande sucesso (o que não significa que a inflação deixou de ser, para sempre,
um risco para a economia brasileira). Se avaliado sob uma ótica mais ampla, que considere a eliminação dos principais
entraves que impedem a economia brasileira de crescer a taxas satisfatórias, no longo prazo, ainda seria, 15 anos após
o seu lançamento, uma obra inacabada. E ainda mais grave, parece-nos que começa a se elevar o risco de que a política
econômica em vigor possa vir a criar dificuldades crescentes para esta trajetória de crescimento sustentado.
Foram paralisadas as reformas estruturais, mantendo e agravando enormes distorções na área tributária e na
previdência pública (o sistema tributário brasileiro é um dos mais complicados e ineficientes do mundo). A carga
tributária em relação ao PIB era de 27,90% em 1994. Ao longo dos quinze anos seguintes esta carga tem subido de forma
praticamente contínua, tendo atingido quase 36% em 2008. Diante da crise externa, a combinação de queda de receitas
com aumentos de despesas vai piorar ainda mais estes indicadores. O governo anunciou uma redução do superávit
primário para 2009, mas ao mesmo tempo se comprometendo com nova elevação já em 2010. Há fortes indícios de
queda deste superávit poderá ser ainda maior em 2009 e que não haja a recuperação anunciada para 2010. É quase
certo que a carga tributária continuará subindo em 2009 e em 2010.
Até agora esta deterioração dos indicadores fiscais diante da crise externa – apesar da forte queda da taxa de juros
- tem sido bem aceita pela maioria dos analistas, sob o argumento de que ela está ocorrendo no mundo inteiro. Mas as
distorções da experiência brasileira e seus impactos negativos sobre o desempenho futuro da economia podem estar
sendo sub-estimados. De fato, os aumentos das despesas públicas têm sido de caráter permanente, o que descaracteriza
a natureza dessa política fiscal como “anti-cíclica”.
O Plano Real foi um enorme sucesso no campo da inflação, depois do fracasso de inúmeros “planos de estabilização”,
durante décadas. Infelizmente, não obstante a conquista de outros avanços importantes, 15 anos depois a política
econômica continua cometendo erros graves e se omitindo em questões de crucial importância para viabilizar o
desenvolvimento econômico sustentado.
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