SAUDAÇÕES E AGRADECIMENTOS Primeiramente, quero saudar a todos e todas e, em especial, a diretoria eleita que toma posse nesta cerimônia e que será presidida por minha querida amiga e interlocutora Carmen Rial. Aliás, a Carmen também foi diretora e assessora de comunicações da gestão que se encerra. Desejo, desde já, aos colegas que iniciam seu mandato hoje uma excelente gestão de múltiplas realizações que, com certeza, deverão expandir fronteiras. Lembro que há dois anos, estivemos nesta mesma sala para o ritual de posse da nossa diretoria, cuja plataforma focalizava os Desafios Antropológicos Contemporâneos. Tínhamos como objetivo estimular análises críticas e propositivas sobre os dilemas, desafios e perspectivas que permeiam os atuais processos de expansão e transformação da antropologia no Brasil. Visávamos, assim, apresentar e problematizar não só as transformações e reconfigurações da antropologia como disciplina acadêmica per se, mas, também, as relações entre essas reconfigurações e as políticas científicas em voga, a formação de antropólogos e as demandas no mercado de trabalho, a política da antropologia e, ainda, a relação da pesquisa antropológica com a ação política. Para enfrentar esses desafios e, assim, continuar a promover excelência científica conjugada à ação social (características que distinguem a ABA), foi indispensável, para mim, contar com a constante colaboração e solidariedade de colegas de diretoria, comissões, comitês, assessorias, conselho diretor, staff administrativo, colegas da PUC-SP que sediaram a 28º RBA, comissão organizadora dessa 28º RBA e da Semana de Antropologia, bem como de associadas e associados. Foi também fundamental estabelecer convênios institucionais, assim como parcerias e cooperações com outras associações científicas nacionais e internacionais. Devo a essas colaborações e parcerias a concretização da nossa proposta de trabalho, assim como esta boa sensação de ter cumprido a minha missão na presidência da ABA. Por isso, além de saudar a nova diretoria, quero aproveitar esta ocasião, que também simboliza o término de nosso mandato, para expressar meus agradecimentos pelo trabalho coletivo desenvolvido e pela contínua colaboração que recebemos de todos e todas. Para estes agradecimentos, não pretendo reproduzir o relatório de atividades de nossa gestão que, aliás, já está a algum tempo disponível on line, mas, sim, indicar quão importante foi esse trabalho coletivo e essas parcerias, tanto no que se refere às demandas de ação social do dia a dia quanto às atividades de cunho científico e institucional, nessa conjuntura histórica aparentemente paradoxal na qual vivemos. Se, de um lado, o governo federal se esforça em dirimir a miséria e promover a inclusão social, instituindo também, entre outras ações políticas, a Comissão da Verdade; de outro lado, as políticas desenvolvimentistas em curso insistem na re-edição da era da “modernização” e da ênfase no “progresso” que caracterizavam o período militar e que estão ameaçando, cada vez mais, os direitos humanos, territoriais e ambientais das populações tradicionais. Dadas essas ameaças não é por acaso que a crítica ao desenvolvimentismo junto e as discussões sobre que tipo de desenvolvimento queremos para o nosso país, juntamente com o reconhecimento dos direitos dessas populações e de outras minorias, subscreveram nossas ações sociais e nossas reflexões e diálogos intelectuais. Vale lembrar que, tendo em vista essa conjuntura, tivemos a ousadia de realizar, em menos de três semanas após a nossa cerimônia de posse, o seminário A Hidroelétrica de Belo Monte e a Questão Indígena, em colaboração com a UnB e em parceria com o INESC e a Fundação Darcy Ribeiro, como reação ao licenciamento para o início das obras. Organizado pelo recém criado Comitê Povos Tradicionais, Meio Ambiente e Grandes Projetos com o apoio da Comissão de Assuntos Indígenas (CAI), esse evento contou com a participação de representantes dos povos indígenas, dos movimentos sociais, da subprocuradora Geral da República, nossa amiga Deborah Duprat, do Secretário Nacional de Articulação Social, junto à Secretaria - Geral da Presidência da República, Paulo Maldos, entre outros participantes. Ao dar espaço para a manifestação de diferentes visões sobre a UH Belo Monte e ao falar junto com as populações afetadas, estávamos seguindo um imperativo que a tradição antropológica no Brasil afirmou. Também estávamos dando continuidade às manifestações já iniciadas na gestão anterior nomeadamente o documento da CAI de outubro de 2009 sobre o descumprimento da Convenção 169, segundo a qual as populações afetadas devem ser adequadamente informadas e previamente consultadas sobre esse empreendimento e suas conseqüências, assim como à moção de repúdio aprovada na Assembléia Geral da ABA, realizada em Belém em agosto de 2010, sobre a forma pela qual os processos de implementação “de projetos de desenvolvimento e infraestrutura estavam sendo conduzidos no país à revelia dos princípios e fundamentos que deveriam nortear o planejamento estratégico das políticas estatais numa perspectiva democrática”. Mas, na nossa gestão, o caso Belo Monte tornou-se parte do cotidiano na ABA e das ações conjugadas da CAI e do Comitê Grandes Projetos. Esse caso demandou gestões nossas junto ao Congresso Nacional e à Secretaria Nacional da Presidência da República inclusive a elaboração de uma carta dirigida à Presidente da República, em parceria com a SBPC e subscrita por 20 sociedades científicas, para a qual infelizmente recebemos tão somente resposta burocrática. Foram também várias as entrevistas em rádio, TV e jornais concedidas tanto por João Pacheco de Oliveira (coordenador da CAI) quanto por Andrea Zhouri e Sonia Magalhães (respectivamente, coordenadora e sub-coordenadora do Comitê Povos Tradicionais, Meio Ambiente de Grandes Projetos,) além de outros seminários por elas realizados. Notícias sobre Belo Monte constaram de todos os nossos informativo estando entre as notícias mais acessadas em nossa página do facebook. Tema de debates em vários foros e simpósios realizados no âmbito de nossas atividades na REA, ANPOCS e SBPC e, ainda, na 28 RBA, resultou ainda em um dossiê, organizado por João Pacheco e Clarice Cohn, integrado por 18 textos escritos por antropólogos, economistas, engenheiros e indígenas que analisam sob múltiplos aspectos os impactos das obras da UH Belo Monte sobre as populações indígenas da região, a se lançado em forma de E-Book em março próximo. O caso Belo Monte é emblemático do atual desenvolvimentismo caracterizado pela retomada de grandes obras de infraestrutura, como as hidrelétricas na Amazônia. Enfrentamos no nosso cotidiano os desafios advindos dessas políticas desenvolvimentistas, inclusive as atuais recodificações em curso, que foram tema da conferência de abertura da 28º RBA proferida por Alfredo Wagner (que está entre as mais acessadas na nossa página do facebook) e os conflitos de terras que afetam as populações tradicionais, além das conhecidas Pequenas Centrais Hidrelétricas – as famosas PCH´s, que tem sido projetadas em grande número para instalação nos rios da Bacia Amazônica visando contornar os Estudos de Impacto Ambiental e outras exigências legais das UHE . Combinando diálogos críticos realizados em diferentes foros e ação social, a coletânea intitulada Desenvolvimento, reconhecimento de direitos e conflitos territoriais, organizada por Andrea Zhouri (coordenadora do Comitê Grandes Projetos) já está disponível em nosso site em forma de E-Book. Esse E-Book atualiza as discussões relacionadas a desenvolvimentismo e grandes projetos iniciadas por Silvio Coelho em um grupo de trabalho por ele criado no começo da década de 1980, ainda no período militar. Os autores dos textos que fazem parte de Desenvolvimento, reconhecimento de direitos e conflitos territoriais enfatizam a necessidade do reconhecimento de direitos, no contexto das investidas contra os direitos constitucionais dos povos indígenas e quilombolas expressas nas recorrentes tentativas da Comissão de Relações Exteriores e Defesas do Congresso Nacional para que as decisões referentes às demarcações de terras indígenas sejam realizadas pelo legislativo e não mais pela União através da FUNAI, assim como ameaças de se sustar a demarcação de terras quilombolas. Mais recentemente, a Portaria 303/ 2012 da Advocacia Geral da União permitindo intervenções militares e empreendimentos hidrelétricos, minerais e viários em terras indígenas sem consulta prévia aos povos, assim como a revisão dos territórios já demarcados e homologados, surgiu como uma nova e grande ameaça aos direitos adquiridos pelas populações indígenas. A ABA reagiu prontamente, através de uma nota assinada por mim e João Pacheco (CAI) que se constituiu na principal peça crítica a essa portaria. Vale observar que esta nossa manifestação obteve ampla repercussão em foros nacionais (como a reunião da SBPC realizada em São Luís, Maranhão), sendo, além do mais, subscrita por associações científicas nacionais (SBPC, ANPOCS, entre outras) e internacionais (IUAES, WCAA e 20 associações associadas a ela), além de representantes do congresso e dos movimentos sociais. A portaria teve seus efeitos legais suspensos e sua vigência adiada, mas a sua não revogação ainda paira como ameaça. Diálogos críticos e ação social também marcaram a pauta do Comitê Migrações Internacionais (criado em 2009) e dos novos comitês, respectivamente Gênero e Sexualidade, Deficiência e Acessibilidade, que, assim como Povos Tradicionais, Meio Ambiente e Grandes Projetos, foram criados por demanda. Indicam a importância das pesquisas sobre esses temas, assim como a necessidade de ação social , no que se refere, por exemplo, à lei de imigração em vigor – formulada ainda na ditadura, à nova proposta há anos esquecida no Congresso Nacional e que necessita de revisões, à ênfase atual em tráfico de seres humanos estimulada por organismos multilaterais e que tende a criminalizar a imigração, o código florestal e, nesse contexto, a expansão do agronegócio e da pecuária na Amazônia, que tem provocado não só o desmatamento e destruição dos recursos naturais como também a expropriação e expulsão das comunidades residentes nessas regiões de fronteira e, ainda, a questão do aborto e os direitos da pessoa. As apresentações e discussões realizadas conjuntamente pelos Comitês Migrações Internacionais e Gênero e Sexualidade problematizando o tráfico de seres humanos em fórum realizado em parceria ABA/ANPOCS resultaram no planejamento de um E-Book sobre a temática, organizado por Adriana Piscitelli e Maia Sprandel atualmente em fase de elaboração. Ademais, um seminário sobre o “estado das artes” dos estudos sobre gênero e sexualidade também resultará num dossiê a ser publicado um periódico. Por outro lado, além de reflexões críticas sobre deficiência e doenças raras, o Comitê Deficiência e Acessibilidade, coordenado por Adriana Dias, foi essencial em conseguir 90% de acessibilidade na última RBA. No contexto das demandas de ações políticas que recebemos no cotidiano da ABA decidimos criar um fórum para refletir critica e propositivamente sobre a mega noção de desenvolvimento e planejar uma agenda pública sobre desenvolvimento. Circunstancialmente, uma parceria estabelecida entre sociedades científicas da área de humanas (entre as quais a ABA) e o IPEA propiciou as condições para uma primeira reunião presencial dos membros desse fórum. Essa reunião propiciou a publicação de entrevista coletiva, intitulada “Os antropólogos e o desenvolvimento”, por ocasião do Rio+20, na Revista Desafios do Desenvolvimento, assim como num artigo sobre o estado das artes sobre os estudos de desenvolvimento que está sendo elaborado por Gustavo Lins Ribeiro, com base nas contribuições dos demais membros desse fórum. Nossa gestão notabilizou-se ademais pela organização dos assim chamados ‘pacotes de atividades’ com selo da ABA na RAM, ABANNE/REA, bem como em parcerias com a ANPOCS e SBPC em suas reuniões anuais. Com o propósito de divulgar internacionalmente a antropologia que se faz no Brasil, além do notável trabalho desenvolvido por Peter Fry e Carmen Rial na VIBRANT, organizamos painéis sobre a temática de nossa gestão (Challenges in Brazilian Anthropology)em reuniões da internacional Union of Anthropological and Ethnological Sciences (IUAES) e da American Association of Anthropology (AAA). Ainda lideramos a organização de um painel sobre deslocamentos e desigualdades na última reunião da AAA em San Francisco em conjunto com a AAA e EASA (European Association of Social Anthropology), dando assim continuidade às discussões sobre o tema iniciadas em pós- evento internacional no âmbito da 28º RBA. Vale notar que essa noção mais abrangente de deslocamentos/ desplazamientos/ displacements foi motivada pela minha exposição aos vários tipos de deslocamentos: remoções devido aos grandes projetos, remoções urbanas e higienização, refugiados e migrantes transnacionais como parte dos mesmos processos sociais nesta conjuntura do capitalismo global, Parcerias com a ANPOCS, ABCP, ABRI e SBS foram essenciais para demandas coletivas junto às fundações científicas, como a carta conjunta enviada ao CNPq solicitando inclusão das ciências sociais no projeto Ciências Sem Fronteiras. Ademais, ações conjuntas com sociedades científicas nacionais e internacionais subscreveram nossas demandas junto a órgãos do Governo Federal em prol dos direitos humanos e ambientais de populações tradicionais, não só das mobilizações dos povos tradicionais frente à construção da Hidroelétrica de Belo Monte, mas também em prol de reivindicações, como por exemplo dos Guarani Kaiowá pela devolução de suas terras. Outra dimensão constitutiva dos nossos desafios referiu-se à divulgação de nossa produção antropológica e ação social para audiências mais amplas inclusive para a grande media. Considero estratégica a interação entre educação, ciência e tecnologia e a divulgação científica já que permanece o fato de que a maioria da população parece desconhecer o que é antropologia e o que fazemos como antropólogos. Embora sejamos especialistas em traduzir os códigos culturais e os modos de vida das sociedades por nós estudadas, paradoxalmente deixamos, com raras exceções, de compartilhar esse conhecimento com audiências maiores, assim como deixamos de explicar o que é antropologia para os não antropólogos. A fim de reverter essa situação e na medida em que consideramos a divulgação científica constitutiva de nossa intervenção política e cultural, tornou-se imprescindível explorar e oferecer as condições para a promoção e popularização da antropologia do Brasil. Nesse sentido, procuramos nos valer de tecnologias de informação e comunicação, exposições e filmes etnográficos para divulgar a relevância da produção antropológica para a compreensão da vida contemporânea, o seu grande valor para se entender melhor a dimensão humana da ciência, tecnologia e inovação, bem como os significados de nossa intermediação política entre Estado, sociedade civil e movimentos sociais. Com esse intuito, envidamos esforços em nosso projeto editorial, através da criação de uma comissão, coordenada por Antonio Motta que se responsabilizou por um belíssimo projeto gráfico e cujo trabalho já resultou em 15 livros, entre impressos e E-Books (alguns no prelo). Também investimos em novas tecnologias, como facebook , twitter e youtube, como forma de ampliar nossa comunicação e nossos diálogos antropológicos, assim como em atividades dirigidas aos estudantes de graduação, exemplificada na organização de uma “ABA jovem” no âmbito da 28 RBA, firmando ainda um convênio com o Instituto Brasileiro de Museus (IBRAM), entre outras ações. Também, convocamos programas de graduação e pósgraduação em antropologia para participarem da Semana de Ciência e Tecnologia que, ocorreu em outubro de 2011 sob o tema mudanças climáticas, desastres naturais e prevenção de riscos. Realizamos ainda uma Semana de Antropologia na Cidade de São Paulo, no âmbito da 28º Reunião Brasileira de Antropologia, apresentando um conjunto de atividades paralelas dirigidas a um público amplo. Constituídas por seminários - entre os quais A antropologia vai aos museus: Os museus vão à antropologia, organizado em conjunto com o IBRAM - e mostras áudio -visuais (como a Mostra Brasil Plural organizada por Paulo Morgado do Comitê de Antropologia Visual e a Mostra de filmes de cineastas aborígines australianos, essas atividades incluíram parcerias com o Museu de Arte Moderna de São Paulo (MASP), Museu da Imagem e do Som, Museu do Futebol, Secretaria de Cultura da Cidade de São Paulo, Fundação Cultural Itaú e Matilha Cultural. Mas essas ações representam só um começo de uma estratégia de comunicação e divulgação que precisa ser mais bem elaborada e que, tenho certeza, o será na próxima gestão, cuja diretoria executiva com dois especialistas em antropologia visual: Carmen Rial e Renato Athias. Para além do excelente trabalho realizado pela nossa tesouraria que resultou em maiores benefícios aos nossos associados e associadas, propiciando inclusive descontos na aquisição de livros e revistas publicadas por inúmeras editoras, dois projetos da diretoria dedicaram atenção especial a dois projetos relevantes para o desempenho da nossa profissão, respectivamente ética na pesquisa e a regulamentação do ofício do antropólogo, o primeiro de responsabilidade de Luiz Fernando Dias Duarte e Cynthia Sarti e o segundo por Luiz Fernando Dias Duarte e Henyo Barreto, com a colaboração de Maia Sprandel . Conseguimos avançar em ambos!. Como todos sabem, a questão da ética na pesquisa antropológica é avaliada pelo CONEP no Ministério da Saúde. Num documento elaborado por Luiz Fernando Dias Duarte e aprovado pelas sociedades científicas de ciências sociais demandávamos a mudança de avaliação de ética de pesquisa nas ciências sociais do Ministério da Saúde para o Ministério de Ciência e Tecnologia. Não conseguimos ainda esta transferência, porém não desistiremos. Entrementes, hoje há um reconhecimento na CONEP sobre a necessidade de se levar em conta as especificidades da pesquisa nas ciências humanas, sendo que Cynthia Sarti nos representou nas discussões no âmbito da CONEP. Tanto a Cynthia como a Luiz Fernando continuarão a tratar dessa questão na próxima gestão e, espero, conseguiremos alcançar nossos objetivos. Também realizamos avanços no que tange à regulamentação do oficio do antropólogo/a como pode ser avaliado pelo relatório elaborado por Henyo Barreto em colaboração com Maia Sprandel, divulgado no nosso site e página de facebook, assim como na página antropólogos & antropologia. Com base na documentação apresentada, temos agora as condições de discutir concretamente os prós e os contras dessa regulamentação, o que será realizado na gestão da diretoria que assume hoje. Foi um privilégio presidir a ABA e contar com tantas colaborações, parcerias e a possibilidade de realizar um trabalho coletivo de reflexão crítica e ação social. Aprendi muito com essa experiência. Agora há necessidade de renovação. A nova diretoria continuará nosso trabalho e trará novas idéias e renovação. Muito obrigada a todas e todos. Bela Feldman-Bianco Presidente da ABA (2011-2012)