artigo original uso alternativo do threshold em pacientes com

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ARTIGO ORIGINAL
USO ALTERNATIVO DO THRESHOLD EM PACIENTES COM
BRONCOESPASMO
Renata Calsaverini Leal1
RESUMO
Após anos de experiência com a asma, a área de reabilitação observou grande
eficácia do tratamento com threshold, apresentado como aparelho fisioterápico
ciclado a pressão, cujo objetivo é reeducar e fortalecer a musculatura inspiratória,
em forma de sessões. Mediante esta terapia, o asmático apresentaria maior
capacidade aeróbica e conforto respiratório no período inter-crise, mesmo em
situação de esforço. Contudo, este objetivo raramente seria alcançado devido a
uma situação antagonista: o broncoespasmo. Por isso foi desenvolvido o uso
alternativo do threshold, associado à terapia broncodilatadora.
Unitermos: Asma, Fisioterapia respiratória, Reeducação funcional respiratória
INTRODUÇÃO
O diafragma, músculo responsável por 60% do
volume corrente, requer atenção especial do
fisioterapeuta, visto que a estabilidade funcional
respiratória do paciente está diretamente ligada à
mecânica músculo-esquelética. Esta mecânica
caracteriza-se por uma excursão diafragmática
ampla, que, diante do diferencial de pressão tóraxabdome, exerça uma contração muscular eficaz
em conjunto com os músculos intercostais
externos que promovem elevação nas costelas,
ocasionando modificações nos diâmetros
torácicos e proporcionando liberdade de
expansão dos pulmões.
Através do exame muscular funcional,
gradua-se a força dos músculos respiratórios para
que se estabeleça um programa terapêutico
adequado. O exame é realizado pela palpação
do músculo durante a inspiração, classificandose em:
Grau 4 ou 5: vence a força da gravidade e
resistência externa aplicada;
Grau 3: vence a força da gravidade;
Grau 2: realiza o movimento a favor da
gravidade;
Grau 1: músculo com vestígio de contração;
Grau 0: músculo paralizado.
Busca-se o equilíbrio entre o grau
satisfatório de força muscular inspiratória e um
padrão misto, que consiste em execução do
movimento inspiratório expandindo principal-
1. Fisioterapeuta Pulmonar do Centro de Fisioterapia Especializada (Unidades I e II) - Aluna da Pós-Graduação da FAMERP.
Trabalho realizado na Faculdade de Medicina de São José do Rio Preto - FAMERP
Aceito para publicação em 10/02/00
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HB Científica / Vol. 7 nº 3 / Setembro - Dezembro 2000
LEAL RC Uso Alternativo do Threshold
mente a região de transição tóraco-abdominal,
mantendo um tônus leve de musculatura
acessória: peitoral, intercostais internos,
esternocleidomastoideo, grande dorsal, serrátil e
abdominais. Estes grupos musculares vão
auxiliar como musculatura secundária, sem
atingirem seus graus máximos de contração, com
o objetivo de expandir a caixa torácica na sua
totalidade.
Este padrão deve ser minuciosamente
orientado pelo fisioterapeuta que vai
complementar com orientação de uma freqüência
respiratória baixa sem turbulência de ar, com
modo respiratório que obedece um terço de
inspiração para dois terços de expiração
passiva, objetivando reeducação funcional
respiratória.
O threshold (carga linear pressórica para
treino muscular inspiratório) desempenha um
importante papel na terapia de reeducação
funcional respiratória, porém, foi observado em
pacientes com doença pulmonar prévia
caracterizando hiperreatividade brônquica ao
esforço (asma, alguns casos de DPOC e
bronquiectasias), que, durante o uso do aparelho
threshold, apresentam desconforto, surgimento
ou aumento de broncoespasmo e algumas vezes
incapacidade de realização da terapia com carga
linear pressórica devido ao quadro broncoespástico.
Em contrapartida, com o agravamento do
quadro, os asmáticos e alguns DPOCs requerem
tratamento com reeducação funcional respiratória
(usando o threshold) com o objetivo de promover
maior resistência às crises de dispnéia.
Diante de tal situação, possibilitou-se a
terapia com threshold em hiperreativos, através
da associação do aparelho à terapia inalatória com
broncodilatador, onde pode-se notar total
facilidade em exercer o esforço inspiratório
vencendo a pressão imposta pelo aparelho,
devidamente graduado pelo fisioterapeuta, sem
o surgimento do broncoespasmo.
HB Científica / Vol. 7 nº 3 / Setembro - Dezembro 2000
MATERIAL E MÉTODO
Trinta pacientes foram submetidos a exames
clínicos que partiram da observação do tórax, sua
conformação óssea e a atividade muscular,
objetivando constatar limitações estruturais de
mobilidade torácica e funcionalidade dos grupos
musculares, presença de tiragens e o tipo de
padrão respiratório. Em seguida, ausculta
pulmonar, afim de detectar ruídos adventícios e
murmurio vesicular com supostos pontos de
déficit ventilatório.
O pico de fluxo expiratório ocupa um
espaço importante para o fisiodiagnóstico, pois é
a partir deste teste que pode-se detectar
precisamente a limitação ao fluxo aéreo e
consequentemente
a
predisposição
à
hiperreatividade brônquica.
A partir destes exames, elege-se o tipo de
caso e sua indicação para o tratamento com o
threshold para treinar a musculatura inspiratória.
Determina-se, então, a carga a ser usada que
eqüivale de 20% a 40% da pressão
inspiratória máxima, valor encontrado pelo
manovacuômetro.
O tratamento é baseado em orientação
minuciosa e persistente do terapeuta para que o
paciente concientize-se do padrão respiratório
correto. O ritmo respiratório será controlado pelo
fisioterapeuta, assim como na cinesioterapia
fundamental abdomino-diafragmática1.
O tratamento com threshold, associado ao
broncodilatador, foi determinado em 10 a 20
sessões, com 30 minutos de duração. De modo
que foram utilizadas duas opções:
• Opção 1: Aparelho de carga linear
pressórica (threshold), acoplado ao recipiente
de inalação, através de uma intermediária em
“T”.
• Opção 2: Aparelho de carga linear
pressórica (threshold), acoplado à rede interna
de ar comprimido com umidificador através de
seu próprio adaptador de oxigênio.
149
LEAL RC Uso Alternativo do Threshold
Tabela 1: Tratamento com threshold convencional em pacientes com capacitação para cargas
evolutivas e/ou inter-crise.
A
14 anos - fem. - asma leve - 10 sessões
B
12 anos - mas. - bronquiectasias - 10 sessões
C
16 anos - fem. - asma leve - 10 sessões
D
18 anos - fem. - pneumonia c/ padrão vicioso - 10 sessões
E
40 anos - fem. - bronquite crônica - 20 sessões
F
27 anos - fem. - asma inter-crise - 10 sessões
G
78 anos - masc. - discreto enfisema em indivíduo bem condicionado - 10 sessões
H
27 anos - masc. - asma inter-crise - 10 sessões
I
15 anos - fem. - padrão vicioso sem alergia respiratória - 20 sessões
J
60 anos - masc. - antecedentes de asma em P. O. de revascularização do miocárdio - 20 sessões
Tabela 2: Tratamento com threshold (uso alternativo) em pacientes com baixa capacitação e/ou em
crise.
a
09 anos - masc. - asma infectada - 20 sessões (10 c/ threshold).
b
07 anos - masc. - asma moderada - 10 sessões
c
12 anos - masc. - asma infectada - 20 sessões (10 c/ threshold)
d
28 anos - fem. - asma severa - 30 sessões
e
73 anos - masc. - enfisema avançado - 20 sessões
f
36 anos - fem. - asma severa - 30 sessões
g
60 anos - fem. - bronquiectasias - 20 sessões
h
11 anos - masc. - asma moderada - 10 sessões
i
78 anos - masc. - enfisema (O2 dependente) - 10 sessões
j
70 anos - masc. - enfisema avançado - 20 sessões
k
27 anos - masc. - asma severa - 20 sessões
l
16 anos - masc. - asma moderada - 10 sessões
m
09 anos - fem. - asma moderada - 10 sessões
n
10 anos - masc. - asma infectada - 20 sessões
o
49 anos - fem. - asma infectada - 20 sessões
p
62 anos - fem. - bronquite crônica + asma - 20 sessões
q
17 anos - masc. - asma moderada - 10 sessões
r
62 anos - fem. - Enfisema avançado + alergia respiratória grave - 20 sessões
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LEAL RC Uso Alternativo do Threshold
Quadro 1. Demonstração da evolução da carga linear pressórica (threshold) para todos os casos com
indicação de treino muscular inspiratório, sem fator limitador, graças ao broncodilatador associado
ao grupo alternativo (hiperreativos).
GRUPO “CONVENCIONAL”
Início
Término
FEF1 (%)
carga (cmH2O)
FEF1 (%)
carga (cmH2O)
A
80%
13
80%
20
B
70%
11
80%
13
C
80%
15
80%
23
D
60%
20
85%
27
E
60,7%
19
61%
24
F
92%
22
92%
35
G
68%
17
70%
19
H
100%
22
100%
33
I
100%
20
100%
25
J
insuficiente
15
80%
21
GRUPO “ALTERNATIVO”
Início
a
b
c
d
e
f
g
h
i
j
k
l
m
n
o
p
q
r
s
t
FEF1 (%)
30%
60%
37%
insuficiente
50%
23%
70%
79%
insuficiente
73%
40%
50%
55%
55%
39%
insuficiente
85%
insuficiente
70%
64%
Término
carga (cmH2O)
07
07
07
07
07
07
11
11
07
07
07
07
11
07
07
07
15
07
11
07
FEF1 (%)
60%
68%
50%
50%
54%
60%
76%
80%
30%
69%
48%
80%
70%
77%
58%
32%
100%
30%
72%
60%
carga (cmH2O)
20
20
15
20
19
28
21
20
11
19
30
30
17
17
25
22
35
07
21
30
# Os valores encontrados no pico de fluxo expiratório (FEF1) estão sem a intervenção do broncodilatador
# Considera-se normal ou satisfatório o equivalente à 80% do FEF1 para cada biotipo.
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LEAL RC Uso Alternativo do Threshold
RESULTADOS
DISCUSSÃO E CONCLUSÃO
O presente estudo, baseado em método
O protocolo de tratamento para cada paciente é
comparativo,
podemos
direcionado de acordo com as variáveis de
proporcionar, aos hiperreativos brônquicos, o
obstrução por produção excessiva de muco de
mesmo tratamento indicado à todos aqueles que
aspectos diversos. O tratamento individualiza-
possuem déficit muscular respiratório de origem
se também, de acordo com o grau de lucidez do
primária.
paciente e da evolução e estágio da doença. Com
mostrou
que
Mesmo em período de dispnéia e
estes fatores clínicos limitadores, o treino da
broncoespasmo evidentes, viabilizou-se o treino
musculatura inspiratória, algumas vezes, é
e fortalecimento da musculatura inspiratória
iniciado entre a quinta e décima sessão.
(threshold com broncodilatador) com média de
Em se tratando de um paciente com pouca
167% de aumento linear da carga pressórica,
secreção
equilibrando aos 137% de aumento da carga em
controlada e bom grau de compreensão, passa-
pacientes sem broncoespasmo em tratamento
se, então, a introduzir o tratamento com o
convencional com o aparelho de carga
threshold alternativo (com broncodilatador) para
pressórica.
seus já conhecidos benefícios em coadjuvar na
A evolução natural do tratamento com
brônquica,
infecção
pulmonar
missão do fisioterapeuta em reeducar o padrão
threshold, baseado em aumento crescente de
respiratório.
carga de pelo menos 100%, ocorreu sem stress,
respiratória incorreta leva ao insucesso da terapia,
desconforto ou fracasso, graças à terapia
daí a importância do acompanhamento integral
broncodilatadora associada ao aparelho.
do fisioterapeuta. Toda alteração do volume
O controle do broncoespasmo possibilitou
um resultado de pico de fluxo de até 61,2%,
resultado favorável e próximo ao normal de
80%.
Todavia, uma performance
corrente e do ritmo respiratório representa
alteração do padrão respiratório3.
O tratamento fisioterápico para asmáticos
permaneceria limitado em desobstruir brônquios
O movimento diafragmático e a elevação
e aliviar dispnéia. Contudo, os objetivos da
das costelas ocasionam modificações nos
reabilitação para asmáticos sibilantes ganharam
diâmetros torácicos, proporcionando liberdade de
o recurso da resistência para musculatura
expansão dos pulmões 2 .
Este benefício,
inspiratória, permitindo uma crise de menor
proporcionado pelo threshold, é de suma
dimensão e prolongamento do período inter-crise,
importância para o asmático em suas atividades
como é de conhecimento dos fisioterapeutas
de vida diária, podendo até ser encaminhado à
especialistas, quanto aos objetivos do threshold
prática esportiva.
para treino e resistência.
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LEAL RC Uso Alternativo do Threshold
ESCALA CONCLUSIVA
Pico de Fluxo
Tratamento Convencional
Tratamento Alternativo
Intensidade (%)
Intensidade (%)
100
100
82
71
61,2
44
Tempo
(dias)
1 10
Média entre 10 pacientes
Relação (início/final do tratamento)
1 10
Tempo
(dias)
Média entre 20 pacientes
Relação (início/final do tratamento)
Uso do Threshold
Tratamento Convencional
Tratamento Alternativo
Intensidade (cmH2O)
Intensidade (cmH2O)
41
41
24
21,4
17,4
8,2
1 10
Média entre 10 pacientes
Relação (início/final do tratamento)
HB Científica / Vol. 7 nº 3 / Setembro - Dezembro 2000
Tempo
(dias)
1 10
Tempo
(dias)
Média entre 20 pacientes
Relação (início/final do tratamento)
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LEAL RC Uso Alternativo do Threshold
COMPARATIVO
Hiperreativos crônicos e/ou em crise de
broncoespasmo, submetidos em tratamento com
uso alternativo do threshold
maior necessidade do threshold
broncoespasmo inexistente durante o tratamento
fortalecimento
muscular
diafragmático
e
intercostais externos alcançados
propriocepção diafragmática alcançada
reeducação funcional respiratória alcançada
grau de dificuldade no início do tratamento
facilidade em executar o exercício no final do
tratamento
média de 161% de aumento de carga,
considerando-se 20 pacientes
Pacientes com doenças respiratórias diversas
com baixa ou nenhuma hiperreatividade
brônquica com capacitação para cargas
evolutivas de threshold sem broncodilatador
associado
menor necessidade do threshold
broncoespasmo inexistente durante o tratamento
fortalecimento
muscular
diafragmático
e
intercostais externos alcançados
propriocepção diafragmática alcançada
reeducação funcional respiratória alcançada
grau de dificuldade no início do tratamento
facilidade em executar o exercício no final do
tratamento
média de 137% de aumento de carga,
considerando-se 10 pacientes
Com o uso da inalação durante a aplicação do threshold, foi possível evoluir o tratamento em pacientes
com pico de fluxo incapacitante, assim como é possível evoluir o tratamento para os pacientes com
pouca reação brônquica.
PACIENTE HIPERREATIVO BRÔNQUICO
Respiração paradoxal e superficial / F. R. alta
Threshold convencional
• aumento do broncoespasmo
• desconforto respiratório
• uso de musculatura acessória
154
Threshold com uso alternativo
•
•
•
•
alívio do broncoespasmo
perfeita execução
conforto respiratório
padrão respiratório diafragmático predominante
Suspensão do tratamento
com o aparelho
Evolução do tratamento
Paciente continua vulnerável
à dispnéia de esforço
Bom, controle da dispnéia de esforço no
período intercrise (AVD normal ou até
prática esportiva)
HB Científica / Vol. 7 nº 3 / Setembro - Dezembro 2000
LEAL RC Uso Alternativo do Threshold
Endereço para correspondência:
Renata Calsaverini Leal
Rua: Dr. Cunha Júnior, 450 – Centro
CEP 15170-000
Tanabi-SP
ABSTRACT
ALTERNATIVE U SE
BRONCHOSPASM
OF
THRESHOLD
FOR
P ATIENTS SUFFERING
FROM
After years of experience dealing with asthma, the rehabilitation division has
observed great effectiveness of treatment with threshold, presented as a pressure
cycled device aimed at strengthening and reeducating the respiratory muscles.
Through the use of this treatment, the asthmatic patient would develop greater
aerobic capacity and more comfortable breathing during the period between crises
even during physical exercitation. However this objective is almost never reached
mainly due to bronchospasm. This prompted the development of the alternative
use of threshold associated with bronchodilator therapy.
Uniterms: Asthma, Respiratory therapy, Functional respiratory reeducation
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155
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