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Ensino da Língua Portuguesa: uma reflexão
sobre o Ideb
Celso Leopoldo PAGNAN1
Resumo: O presente artigo é resultado de pesquisa sobre o ensino da Língua Portuguesa, com foco na análise linguística, atrelada a um projeto desenvolvido na
Escola Estadual Barão do Rio Branco, de Londrina/PR. Consideramos também a
descrição e a análise do ensino de Língua Portuguesa em outras escolas, para ter
um quadro comparativo. Com as diversas ações em diferentes frentes, queremos
diagnosticar eventuais problemas e apontar soluções para que o Ideb (Índice de
Desenvolvimento da Educação Básica) da escola-alvo possa atingir um patamar
mais elevado. Para tanto, realizamos entrevistas com professores da escola para
traçar diagnóstico mais preciso, e tomamos por referência as médias obtidas pelo
Ideb e estudos sobre o ensino de Língua Portuguesa de Barbosa (2000) e Geraldi
(2011). O objetivo é diagnosticar eventuais falhas no processo ensino-aprendizagem, considerando as médias baixas no Ideb.
Palavras-chave: Língua Portuguesa. Análise Linguística. Ideb.
1
Celso Leopoldo Pagnan. Doutor em Letras pela Universidade Estadual Júlio de Mesquita Filho
(Unesp) – Assis/SP. Mestre em Literatura Brasileira pela Universidade de São Paulo (USP). Docente
do Programa de Mestrado em Metodologias para o Ensino de Linguagens e suas Tecnologias, na
Universidade Norte do Paraná (Unopar) – Londrina/PR. E-mail: <[email protected]>.
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The teaching of Portuguese: a reflection about
Ideb
Celso Leopoldo PAGNAN
Abstract: The present essay is the result of a research project on the teaching of
Portuguese, focusing on the linguistic analysis. It is part of a project developed
in the State School Barão do Rio Branco, and it aims at reflecting upon the
teacher’s doings in several areas. We also considered the description and analysis
of the teaching of Portuguese in other schools, in order to achieve a comparative
result. Through several actions in different fronts, we want to diagnose possible
problems and point to solutions so that the Basic Education Development Index
(IDEB, in Portuguese) of the target school may reach a higher standard. For that
end, we conducted interviews with teachers from the aforementioned school to
outline a more accurate diagnosis, using IDEB data and studies on the teaching
of Portuguese by Barbosa (2000) and Geraldi (2011) as references. The goal is to
diagnose possible flaws in the teaching and learning process considering the low
IDEB performance results.
Keywords: Portuguese Language. Linguistic Analysis. IDEB.
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1.  INTRODUÇÃO
O presente artigo é resultado de pesquisa desenvolvida na
Escola Estadual Barão do Rio Branco, de Londrina. Como objetivo,
queremos diagnosticar eventuais problemas e apontar soluções
a fim de que o Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação
Básica) dessa escola possa atingir um patamar mais elevado, para
além da média municipal e estadual. Uma das razões que nos
levaram a escolher, em especial, a citada Escola é exatamente por
apresentar um Ideb em ritmo crescente. Em 2005, apresentou, no
Ensino Fundamental II, média 4,3. Em 2007, subiu para 5,2. Em
2009, mais um crescimento, atingindo 5,3. E, em 2011, chegou à
nota 5,4. Porém, em 2013, voltou à média 5,2. Embora baixa, é
uma das maiores das escolas públicas da cidade de Londrina, cujo
Ideb no nível especificado é de 3,7. Apesar do resultado expressivo,
em termos comparativos, o fato é que ainda está aquém da média
mínima estabelecida pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Anísio Teixeira (Inep), a qual seria 6,0, e bem aquém
ainda de uma média que seria considerável, como 7,5. Conforme
divulgado pelo Inep (BRASIL, 2014), o Ideb é resultado dos
seguintes indicadores: aprovação escolar (dado obtido pelo Censo
Escolar), taxa de repetência e médias de desempenho no Saeb
(Sistema de Avaliação da Educação Básica) para as escolas estaduais
e institutos federais e a Prova Brasil, no caso dos municípios.
O objetivo do trabalho é diagnosticar as principais
dificuldades apresentadas pelos professores, advindas das questões
teóricas e suas aplicações práticas, e está dividido em duas partes.
Na primeira, retomamos duas teorias que se inter-relacionam e que
estão na base da concepção que norteia os Parâmetros Curriculares
Nacionais (doravante PCN): a sociointeracionista da linguagem e a
teoria dos gêneros textuais. Também apresentaremos o cenário geral
das médias do Ideb, cuja função é contextualizar nossa análise e
discussão. Embora tais teorias tenham mais de trinta anos no Brasil
(considerando o início da década de 80), após servirem de base para
os PCN, em 1997, vêm sendo implantada na rotina escolar.
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Na segunda parte, apresentaremos o resultado de entrevistas
realizadas com doze professores que atuam na área de língua portuguesa nas diversas turmas do Ensino Fundamental II e também do
Ensino Médio. Para chegar a uma visão amostral, solicitamos, com
a colaboração de alunos voluntários, que professores de outras três
escolas públicas também respondessem: Escola Estadual Professor
Lázaro Soares Pimentel, de Riversul/SP, Escola Estadual Roseli
Pioto, de Londrina, e Colégio Estadual Maria Helena Davatz, Distrito de Lerroville. A primeira teve, em 2013, 4,7 de média Ideb;
a segunda, 3,0; e a terceira, 3,9. Também, obtivemos respostas de
professores que atuam na rede particular de ensino. Embora não
tenham média individualizada do Ideb, a visão dos professores das
escolas particulares pode servir como contraponto.
É evidente que não se quer aqui fazer uma análise simplista
ou mecânica, isto é, que irá relacionar o conhecimento de teorias
modernas de ensino por parte dos professores ou o desconhecimento de tais teorias como meio de justificar um Ideb maior ou menor.
Queremos, sim, diagnosticar perfis de práticas escolares para colaborarmos com uma efetiva melhora no processo de ensino-aprendizagem e no desempenho dos alunos, que, em consequência, estarão mais bem preparados para o uso da língua nas mais diversas
situações comunicativas. Em artigo, Wittke (2012) também traçou
o cenário sobre o qual queremos tratar:
A atual realidade do ensino de língua materna mostra que
seu processo não está construindo os efeitos de ensino e
aprendizagem desejados, tanto na expectativa dos professores quanto dos alunos e mesmo da sociedade brasileira. Acreditamos que uma das maiores causas desse efeito
negativo seja o fato de que essa prática escolar não vem
sendo realizada por meio de exercícios produtivos e constantes de interação verbal, na medida em que o aluno fala
e escreve, o que acaba tornando a aula de língua uma atividade mecânica, destituída de sentido (WITTKE, 2012,
p. 1)
Pelo diagnóstico, Wittke (2012) considera a metodologia
construída com o advento do PCN correta, mas, ao que parece, não
seria exatamente aplicada em sala de aula, mantendo-se uma prática anterior e ultrapassada. O presente trabalho se insere no quadro
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teórico que busca problematizar a implementação das ideias propostas pelos Parâmetros Curriculares Nacionais no que diz respeito
ao ensino de língua portuguesa. O objetivo é, pois, o de refletir
sobre esse cenário em sala de aula.
2.  FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
Há trinta anos, desde que Geraldi (1984) organizou o famoso
livro O texto na sala de sala, muito se tem discutido e refletido a
respeito do ensino de Língua Portuguesa no Brasil. Voltando um
pouco mais no tempo ainda, tem-se o estudo de Maria Thereza Fraga Rocco (1981), que fez uma análise, com base na gramática do
texto, das redações dos vestibulandos da Fuvest, apontando problemas de coesão, coerência, bem como a construção de um discurso
indefinido, não muito claro. Na década seguinte, houve a publicação dos Parâmetros Curriculares Nacionais (1997), a que se seguiram as Diretrizes estaduais para o ensino de Língua Portuguesa e
demais disciplinas. O que se quer afirmar com esse breve recorte
histórico inicial é que, apesar de a teoria ter avançado muito, de
inúmeros trabalhos terem sido desenvolvidos, e de se ter modificado o foco teórico de gramática normativa, de ensino de caráter mais
metalinguístico, para um ensino epilinguístico, que visa capacitar o
aluno a fazer uso da língua nas mais diversas situações comunicativas e a saber reconhecer e usar os mais variados gêneros textuais, o
quadro descrito por Geraldi nos anos 80 parece continuar bastante
atual:
No inventário das deficiências que podem ser apontadas
como resultados do que já nos habituamos a chamar de
“crise do sistema educacional brasileiro”, ocupa lugar
privilegiado o baixo nível de desempenho linguístico demonstrado por estudantes na utilização da língua, quer na
modalidade oral, quer na modalidade escrita (GERALDI,
2011, p. 36).
A esse cenário ainda se deve acrescentar a incapacidade de
leitura, de intelecção daquilo que se lê. As médias do Ideb, com
exceções aqui ou ali, vêm comprovar isso, mesmo porque é exatamente essa a competência cobrada na Prova Brasil e na Saeb: a
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capacidade de ler e entender o que se lê. E por que o ensino não
consegue efetivamente permitir que todos tenham um desempenho
minimamente aceitável? A pergunta, que pode ter algo de retórico,
tem como objetivo expor uma situação cuja solução parece longe
de ser atingida. É importante também fazer a ressalva de que não
estamos afirmando que uma média alta em qualquer avaliação é
plenamente indicativa de que tudo vai bem na educação, que os
indivíduos estão prontos para redigir qualquer texto nos mais diversos gêneros ou são capazes de fazer interpretação adequada ao ler
um determinado texto. De qualquer modo, médias são referências,
pelas quais também podemos nos pautar.
Indicadores educacionais como o IDEB são desejáveis por
permitirem o monitoramento do sistema de ensino do País.
Sua importância, em termos de diagnóstico e norteamento
de ações políticas focalizadas na melhoria do sistema educacional, está em:
a) detectar escolas e/ou redes de ensino cujos alunos apresentem baixa performance em termos de rendimento e proficiência. (BRASIL, 2014, n.p.).
Tem havido grande esforço por parte de diversos pesquisadores para modificar esse quadro; porém, seja com base na percepção
subjetiva, seja com base nos resultados mais amplos (provas oficiais
e vestibulares), pode-se perceber que o desenvolvimento da habilidade de leitura e da capacidade da comunicação por escrito está aquém
do desejado. Antes, há que considerar alguns aspectos óbvios, mas
importantes para contextualizar o presente artigo. Grosso modo, a
avaliação tem como meta aferir quanto um aluno ou um grupo de
alunos aprendeu do conteúdo ministrado. Ora, considerando uma
avaliação de âmbito nacional, é preciso que todos os professores, todas as escolas estejam alinhadas com o que será cobrado na avaliação. Nesse cenário, o mundo ideal é aquele em que os conteúdos são
trabalhados ao longo do processo e, em consequência, a tendência é
os alunos atingirem uma boa média geral. Em contrapartida, de acordo com as necessidades locais, um professor de língua portuguesa
pode ser obrigado a trabalhar outro conteúdo que não aquele que será
cobrado nas avaliações oficiais. A tendência é a média diminuir. Por
fim, de acordo com os interesses da escola, também, uma turma pode
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ser devidamente preparada para realizar a avaliação oficial (como em
um curso preparatório para vestibulares e concursos). O resultado,
embora possa ser positivo, tende a mascarar o real nível de aprendizagem por parte dos alunos.
O nó górdio da questão, porém, parece ser outro. Em sua origem, os PCN deveriam, como o próprio termo diz, servir apenas de
parâmetro, não de conteúdo mínimo, cabendo, conforme o artigo
10 da Lei de Diretrizes e Bases (LDB), aos estados e municípios
organizarem o conteúdo mínimo. Ora, considerando esse aspecto,
a realização de uma prova única para todo o país representa uma
contradição aos próprios PCN, o que talvez explique em parte a
média geral baixa.
Em geral, observa-se que ainda existe uma lacuna entre o que
se ensina e o que seria necessário ensinar para atingir o objetivo
mais geral: capacitar os alunos a usarem a língua na sua forma oral
e escrita nas mais diversas situações de comunicação. Ao mesmo
tempo, constantes pesquisas procuram alternativas, buscando revelar novas possibilidades de ensino ao professor e à sociedade, e
são apresentadas por meio de propostas curriculares de estados e
municípios, principalmente para os níveis Fundamental e Médio,
visando à obtenção do melhoramento do ensino na escola pública. É preciso enfatizar que os PCN são um documento oficial, que
tem como objetivo servir como referência para os professores. Isso
acaba se justificando na medida em que o Brasil tem uma extensão
territorial muito grande, e cada estado é portador de características
específicas; e, dentro de um estado, a realidade encontrada na cidade não é igual à da zona rural, da mesma forma que a vida em
grandes centros não é igual à da periferia e assim por diante. Desse
modo, a pergunta a se responder é se aquilo que é cobrado nas avaliações é efetivamente ensinado ou, ainda, se é ensinado de acordo
com os parâmetros definidos pelo Inep, cujo objetivo:
É verificar se os alunos são capazes de apreender o texto
como construção de conhecimento em diferentes níveis
de compreensão, análise e interpretação. A alternativa por
esse foco parte da proposição de que ser competente no uso
da língua significa saber interagir, por meio de textos, em
qualquer situação de comunicação (BRASIL, 2014, n.p.).
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Para que possamos ter uma perspectiva de conjunto, vamos
apresentar as médias do Ideb, calculadas a partir dos resultados obtidos em notas oficiais de Língua Portuguesa e Matemática, além
de outros fatores, como média de aprovação em cada escola e taxa
de evasão. Segundo dados do próprio Inep, colhidos no QEdu, essas
duas taxas giram em torno de 1%, o que representa pouco efetivamente nas médias do Ideb. Não é o caso de analisar aqui as médias
das provas de Matemática; de qualquer modo, elas são maiores que
as de Língua Portuguesa devido à mediana estabelecida por ocasião
da primeira aplicação da prova em 2005.
Nos anos iniciais do Ensino Fundamental, tivemos a seguinte
evolução de média: 2005 – 3,8; 2007 – 4,2; 2009 – 4,6; 2011 – 5;
2013 – 5,2 (BRASIL, 2014).
Conforme se pode observar, nesse primeiro nível educacional, houve uma constante evolução na média aferida, o que representa um ganho. Porém, também é possível perceber que a média
não expressa uma pontuação efetivamente considerável. Queremos,
de qualquer modo, apenas tomar como ponto de partida esse dado,
pois o objetivo maior é refletir sobre o ensino nos níveis Fundamental II e Médio.
Já nos anos finais do Ensino Fundamental, tivemos a seguinte
evolução de médias: 2005 – 3,5; 2007 – 3,8; 2009 – 4,0; 2011 – 4,1;
2013 – 4,2 (BRASIL, 2014).
É a mesma situação apresentada no primeiro nível: uma
melhora progressiva entre os anos de 2005 e 2013, mas, nesse
caso específico, um tanto pior, pois nem se teria atingido a média
mínima para aprovação. A seguir, no Ensino Médio, temos um
cenário ainda pior, uma vez que a média em todos os anos avaliados
não atingiu 4,0. Pode-se perceber uma evolução de médias mais
tímida: 2005 – 3,4; 2007 – 3,5; 2009 – 3,6; 2011 – 3,7; 2013 – 3,7
(BRASIL, 2014).
É evidente que se pode observar uma progressão das médias
nas três etapas do ensino analisadas: 4º ano e 8º/9º ano, do Ensino
Fundamental e 3ª série do Ensino Médio, o que é positivo. Porém,
ainda muito aquém da média desejável, que seria 6,0, a qual, segundo estimativas do próprio Ideb, deverá ser atingida até 2021. Ou
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as avaliações estão em nível muito elevado ao que se é ensinado,
ou há uma progressiva piora na capacidade de aprendizagem dos
alunos... Embora se possa argumentar que a média é obtida considerando evasão e repetência, o que é mais comum nos níveis mais
avançados, o fato é que a média específica em Língua Portuguesa
também é baixa.
Ora, considerando os resultados oficiais, a quem se deve, então, atribuir a culpa? À metodologia? Aos professores? Aos alunos?
Ao sistema como um todo? O que queremos observar e demonstrar
é que a transposição da teoria à prática enfrenta problemas inerentes ao próprio processo de ensino-aprendizagem. Em outros termos,
substituir uma teoria por outra, substituir um conteúdo mínimo por
parâmetros não resolve todos os problemas educacionais.
Um aspecto importante a que é preciso fazer referência é que
o tipo de avaliação utilizada para se chegar à média do Ideb é a
de caráter somativo, que é a avaliação mais tradicional, arcaica e
também a mais comum na comunidade escolar como um todo. Nesse tipo de avaliação, objetiva-se medir, no sentido de mensurar, a
aprendizagem do aluno. O problema se configura na medida em
que são desconsideradas as particularidades, pois ela trata de forma
homogênea todos os educandos. Essa perspectiva, possivelmente,
não retrata a aprendizagem real, embora eleja determinadas capacidades e competências dos alunos (SACRISTÁN, 2000): no caso
específico, a competência da leitura, interpretação, bem como o reconhecimento dos gêneros textuais e suas características internas e
contextuais.
Na busca por estabelecer diferenciações entre o possível objetivo pedagógico esperado por um professor que privilegia uma
avaliação tradicional e uma avaliação formativa, recorremos aos
estudos de Hoffmann e Sella (2006). Segundo o estudioso, na primeira, aspectos como memorização, notas altas, valorização da
obediência e passividade do aluno são privilegiados. Na segunda,
privilegia-se a aprendizagem, a compreensão, o questionamento, o
conteúdo. Sintetizando, enquanto a avaliação tradicional prioriza
o ensino conteudístico, sedimentado na memorização, a avaliação
formativa elege a reflexão e a compreensão. Há que se fazer uma
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análise mais aprofundada das avaliações propostas pelo Saeb ou da
Prova Brasil. De qualquer modo, esse tipo de avaliação de abrangência nacional tende a priorizar o conteúdo apreendido, ainda que
possa conter questões de caráter reflexivo.
Apesar das aludidas contradições dos PCN e da realização de
provas de âmbito nacional (as quais em si mesmas têm seu mérito,
seu valor), há que se ressaltar o avanço no modo de conceber o ensino da Língua Portuguesa, contribuindo para a construção de uma
nova percepção do processo de ensino-aprendizagem da língua; no
caso, esse avanço é determinar que o estudo metalinguístico da língua, o estudo puramente gramatical, seria contraproducente para a
formação de usuários competentes no manuseio da língua. Chegou-se a isso a partir a partir de um processo que podemos dizer teve
início na década de 60.
No Brasil, os estudos sobre o texto tiveram seu início nos
anos 80 (embora a análise do discurso já revelasse uma visão mais
ampla nos anos 60 e que considerava a situação da comunicação
etc., e não apenas a construção sintática de uma frase), com o objetivo de pensar o estudo da língua de modo diverso do que fazia
até então o Estruturalismo. Entenda-se: era preciso sair de estudos baseados em frases (consequentemente, em aulas de Língua
Portuguesa que paravam nas orações e nas frases) e avançar em
direção ao texto. Neste momento, há a ideia de que é preciso tomar o texto como base para os estudos e para as aulas, de modo a
pensá-lo como prática social, realizada por meio dos gêneros do
discurso. Como referência histórica, até se chegar às teorias do texto, à Linguística Textual, houve dois momentos anteriores: ainda
nas décadas de 60 e 70, com a análise transfrática, cujo conceito
era estabelecer relações coesivas entre as frases de um texto, não
se limitando, pois, à análise sintática de uma única oração, de uma
única frase; depois, veio a fase da gramática gerativa, da qual derivaram as gramáticas textuais, cujo conceito girava em torno do
texto como unidade acabada, sem que se estabelecessem relações
com outros textos ou com o contexto de produção; finalmente, a
partir da Linguística Textual, chegou-se ao momento de estudar o
texto como “[...] resultado de operações comunicativas e processos
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linguísticos em situações sociocomunicativas” (BENTES, 2006, p.
247), formulando-se, desse modo, uma teoria do texto.
É evidente que para nós aqui interessam esses estudos como
metodologia de ensino. O que se quer afirmar, portanto, é que o
texto passou a ser objeto de ensino da Língua Portuguesa, pois é
no texto que se pode observar a língua como um processo interativo, dialógico, conforme Bakhtin (2003). É nos textos, pois, que
os gêneros do discurso encontram sua razão de ser. Conforme já se
afirmou, é essa visão sociointeracionista que orienta as propostas
dos PCN (1997) e das Diretrizes Curriculares do Estado do Paraná-DCE (2008).
Sem querer ser redundante, posto que diversos artigos científicos tendem a retomá-las, lembremos, de modo sintético, as concepções básicas da linguagem, segundo Geraldi (2011), para determinar com mais exatidão o sociointeracionismo e, principalmente,
contextualizar nossa discussão:
1)  Linguagem como expressão do pensamento: trata-se de
um princípio baseado na tradição gramatical, cujo rompimento se dá com Saussure.
2)  Linguagem como instrumento de comunicação: essa concepção está ligada à teoria da comunicação e vê a língua
como código (conjunto de signos que se combinam segundo regras) capaz de transmitir ao receptor certa mensagem.
Essa concepção serviu de parâmetro para fundamentar o
ensino de Língua Portuguesa nas décadas de 70 e 80.
3)  Linguagem como forma de interação: por meio da linguagem, o sujeito que fala pratica ações que não conseguiria
praticar a não ser falando; com ela, o falante age sobre o
ouvinte, constituindo compromissos e vínculos. Local de
relações sociais em que os falantes atuam como sujeitos.
É essa última concepção, pois, que está na base dos PCN, que
organizam os conteúdos de ensino em três eixos centrais – língua
oral: usos e formas; língua escrita: usos e formas; análise e reflexão
sobre a língua.
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Distancia-se, assim, da antiga forma de ensinar gramática,
cujo objetivo era o de levar o aluno a saber diferenciar o certo do
errado em língua. Mudam-se a terminologia e a concepção de gramática para análise e reflexão sobre a língua, o que, na prática,
significa a análise linguística. As atividades de análise linguística
desenvolvidas em sala de aula devem ser, sobretudo, de natureza
epilinguística e não metalinguística.
[...] não é possível tomar como unidades básicas do processo de ensino as que decorrem de uma análise de estratos,
letras/fonemas, sílabas, palavras, sintagmas, frases que,
descontextualizados, são normalmente tomados como
exemplos de estudo gramatical e pouco têm a ver com a
competência discursiva. Dentro desse marco, a unidade
básica do ensino só pode ser o texto (BRASIL, 1998, p.
23).
Análise linguística significa, portanto, considerar a gramática, não exclui-la, com textos em geral, especialmente os produzidos pelos próprios alunos. A prática de análise linguística vai além
do ensino da gramática tradicional, pois visa demonstrar ao aluno
como a linguagem se realiza no e pelo texto.
O uso da expressão “análise linguística” não se deve ao
mero gosto por novas terminologias. A análise linguística inclui tanto o trabalho sobre as questões tradicionais
da gramática quanto às questões amplas a propósito do
texto, entre as quais vale a pena citar: coesão e coerência
internas do texto; adequação do texto aos objetivos pretendidos; análise dos recursos expressivos utilizados (metáforas, metonímias, paráfrases, citações, discursos direto e
indireto etc.); organização e inclusão de informações etc.
Essencialmente, a prática de análise linguística não poderá
limitar-se à higienização do texto do aluno em seus aspectos gramaticais e ortográficos, limitando-se a “correções”.
Trata-se de trabalhar com o aluno o seu texto para que ele
atinja seus objetivos junto aos leitores a que se destina
(GERALDI, 2011, p. 74).
Nesse sentido, o texto passa a ser concebido como unidade
de significação e de ensino, elemento integrador das práticas de
leitura, de análise linguística e de produção/refacção textuais.
Devemos considerar, pois, que, na concepção interativa de
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linguagem, o discurso, quando produzido, manifesta-se por meio
de textos e todo o texto se organiza dentro de determinado gênero
discursivo. Diversos pesquisadores da área de Linguística Aplicada
vêm se dedicando a trazer sugestões de como efetivar, na prática, as
opções teóricas assumidas pelos PCN. Dentre tais opções, a noção
bakhtiniana de gêneros discursivos é a que tem recebido maior
atenção. Certamente, isso se deve porque, como lembra Barbosa
(2000, p. 152):
A noção de gênero permite incorporar elementos da ordem
do social e do histórico [...]; permite considerar a situação
de produção de um dado discurso [...]; abrange o conteúdo
temático [...], a construção composicional [...] e seu estilo
verbal [...]. Nesse sentido, a apropriação de um determinado gênero passa, necessariamente, pela vinculação deste
com seu contexto sócio-histórico-cultural de circulação.
Por exemplo, ao se tomar o texto como objeto de estudo, podemos pensar nos possíveis modos de trabalhá-lo (estratégias de
leitura variadas, produção) nas aulas de língua, com base nos estudos de Geraldi (2011), Ilari (1992), Possenti (2002), Travaglia
(2003), Marcuschi (2002), Antunes (2003), Dolz e Schneuwly
(2004), entre outros. O ensino de língua materna deve, portanto, ser
pautado pelos gêneros discursivos, tanto orais quanto escritos. Uma
das contribuições dos gêneros é ordenar e estabilizar as atividades
comunicativas do dia a dia. A grande diferença ao adotar os gêneros
discursivos é que são contemplados textos que, de fato, fazem parte
da realidade do aluno, cumprindo, dessa forma, uma das responsabilidades da escola: propiciar que o educando seja autor e produtor
do seu próprio texto. Feitas essas considerações teóricas, analisemos como o professor tende a relacionar na prática essas questões.
3.  ANÁLISE DAS ENTREVISTAS
Há certa dificuldade em conseguir que professores respondam questionários para efeitos de pesquisa. Talvez por medo de
se exporem, talvez por receio de que isso seja usado em prejuízo a seu trabalho ou como meio de contestar o que fazem. Assim,
embora tenhamos tentado obter vinte questionários, conseguimos
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pouco mais da metade disso. Se, do ponto de vista estatístico, não
se tem um valor conclusivo absoluto, pode-se, ao menos, fazer uma
análise por amostragem, sugerindo, pois, um caminho, um padrão
de respostas indicativo de uma prática ou de um discurso comum.
Por isso, não se tem aqui a pretensão de determinar com certeza
matemática a relação entre o discurso inovador do ensino de Língua Portuguesa, a prática efetiva em sala de aula e os resultados
oficiais. De qualquer modo, com base na fundamentação teórica e
nas respostas obtidas, é possível ter uma amostra da relação teoria/
prática e perceber quais as dificuldades reveladas pelos professores
em sua devida aplicação.
Foi solicitado aos professores que respondessem a nove questões, as quais versavam, basicamente, sobre a teoria e a prática da
análise linguística e do estudo dos gêneros textuais. Com as questões, quisemos determinar qual a visão dos professores sobre a teoria e como a colocavam em prática e se haveria ou não dificuldades
para tanto. A razão dessa linha de questionamento se dá porque são
aspectos expressos na matriz de referência de língua portuguesa,
cobrados tanto no Ensino Fundamental como no Médio, e que se
prestam às habilidades e competências cobradas nas avaliações oficiais, segundo o próprio Inep (BRASIL, 2014).
Analisemos, a seguir, as respostas das questões, estabelecendo as relações entre o que foi expresso na fundamentação e as respostas.
É sempre importante lembrar que, com tal pesquisa, queremos determinar por que o Ideb das escolas apresenta uma média
baixa (3,7 nas escolas de Londrina). É claro que, para uma resposta
definitiva, a pesquisa teria que ser bem mais abrangente, envolver
outras variáveis (interesse dos alunos, efetiva descrição de como
são realizadas as aulas, contexto socioeconômico dos alunos e da
própria escola etc.). Uma das hipóteses é que nem sempre há uma
aplicação efetiva das novas tendências do ensino de Língua Portuguesa, o que justificaria que os alunos não estariam devidamente
preparados para responderem corretamente as avaliações oficiais.
Tem-se a teoria, mas há a dificuldade de aplicá-la, o que resultaria
em médias abaixo do mínimo aceitável. Conforme já se afirmou,
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também não se pode, de maneira mecânica, estabelecer uma relação de causa e consequência entre uma resposta não adequada ou
adequada ao questionário proposto e uma média não elevada ou
elevada. Igualmente, não se pode aferir a qualidade do processo de
ensino-aprendizagem unicamente tomando por referências médias.
Mesmo porque, seguindo esse critério, bastaria treinar o aluno a
responder determinada avaliação e a média tenderia a subir. Certamente, tal atitude seria apenas um meio de burlar, por assim dizer,
o processo.
A primeira pergunta foi sobre o colégio onde o professor
atua. Como já especificamos na introdução do presente artigo, não
é o caso de se repetir aqui. A segunda foi sobre o tempo que atua no
magistério. Nesse caso, trata-se de um grupo heterogêneo, indo de
dois anos a vinte e seis anos de experiência em sala de aula. Apesar disso, houve algumas semelhanças nas respostas das perguntas-chave.
A terceira questão inquiriu se os docentes, alvo da pesquisa,
conheciam o termo análise linguística, e quase a totalidade (dez)
respondeu que sim, para, na sequência, explicarem, segundo sua
visão, o que significaria o termo. Nesse caso, a resposta era aberta
e as respostas ficaram um tanto variadas. Em rigor, quando Geraldi
usou o termo “análise linguística” (1984), tomou por referência o
texto produzido pelo aluno, para, a partir dele, o professor propor
exercícios de refacção textual, bem como para selecionar algum
problema de ordem gramatical, para trabalhar esse ponto em aulas
subsequentes. Segundo Geraldi (2011, p. 74), “Fundamenta essa
prática o princípio: ‘partir do erro para a autocorreção’”. Em outras
palavras, a análise linguística, como conceito, significava trabalhar
um conteúdo gramatical a partir das necessidades do aluno, não
como pura atividade metalinguística.
Em rigor, apenas uma resposta, talvez não por acaso, dada por
um professor de carreira mais longa, tratou especificamente sobre o
processo de refacção: “É uma forma de se trabalhar a gramática a
partir da produção do aluno, objetivando a reescrita”. Todas as demais respostas misturaram um pouco os conceitos, dando destaque
ao ensino de gêneros textuais. Claro que isso não ocorre por acaso,
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afinal o termo “análise linguística” foi tratado pelos PCN (1998)
como da Língua Portuguesa com base nos gêneros textuais.
Se considerarmos, pois, o conhecimento teórico do docente
que atua em diferentes escolas, ainda que um tenha respondido não
saber bem do que se trata, podemos afirmar que estão devidamente
preparados de acordo com os parâmetros do Ministério da Educação (MEC), o que fica ainda mais claro na questão quatro, para a
qual preparamos um gráfico, a fim de que se tenha uma visualização mais clara. Perguntamos aos docentes sobre a que aspectos
davam mais ênfase no ensino da língua portuguesa. Como era possível assinalar mais de uma resposta, houve um número bem maior
do que o público efetivamente entrevistado.
Perguntamos que alternativa mais bem descreveria o modo
com que ele, o professor, trabalha o ensino da Língua Portuguesa.
Dos doze professores, onze responderam que enfatizam o ensino
com gêneros textuais; do total, nove trabalham de modo acentuado
a gramática; sete desenvolvem a produção de texto; seis, a variação
linguística e seis desenvolvem atividades no âmbito da oralidade.
É preciso lembrar, mais uma vez, que eles poderiam assinalar mais
de uma alternativa.
Como se pode observar, há certa coerência entre o que foi
respondido na terceira e na quarta questão. Afinal, a opção ênfase
em gêneros textuais obteve a totalidade das respostas, ainda que a
ênfase em produção textual, que seria mais pertinente para a efetiva
prática da análise linguística, tenha sido assinalada por 60% dos docentes. Justifica-se a resposta se considerarmos que nem sempre o
professor de produção de texto é também o professor de língua portuguesa – em rigor, uma contradição daquilo que se propõe como
prática sociointeracionista da linguagem.
Quanto ao número expressivo de respostas em ênfase no ensino gramatical (ressalte-se, não é um mal em si mesmo), ele reflete
o que será mais explorado em outras questões.
A quinta questão tratou de modo específico sobre a importância da gramática normativa, do ensino metalinguístico, para que
o aluno consiga se comunicar melhor nas relações do cotidiano.
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Havia quatro opções de resposta, dentre as quais apenas duas foram
contempladas.
Há algumas considerações que podem ser feitas. Expressar-se bem é o objetivo almejado para o ensino de Língua Portuguesa,
porém o conhecimento técnico da gramática pode até ser inibidor
em algumas situações de comunicação, considerando a preocupação em não cometer desvios normativos. No entanto, as respostas
contempladas podem ser vistas como indicativo de uma prática que
está na origem arcaica do ensino de línguas e que é difícil simplesmente abolir. Diante dessa perspectiva, o ensino mais gramatical
não é excluído do conteúdo programático e, além disso, é visto de
modo significativo, pois aparece interligado à leitura e à produção
textual.
É preciso reafirmar: o ponto não é incluir ou excluir simplesmente o ensino gramatical. A questão é determinar com clareza
o objetivo dessa prática educacional e também perceber que, em
rigor, ela é pouca cobrada, apenas implicitamente nas avaliações
oficiais, incluindo Enem, que tem como componente da prova de
redação a correção gramatical.
Depois inquirimos sobre a importância que teria o ensino da
gramática normativa para a comunicação. Havia quatro alternativas: muita importância, com cinco respostas das doze possíveis;
média importância, apontada por seis professores; pouca importância, assinalada por um professor; nenhuma importância, a qual não
obteve adesão.
Outra questão versou a respeito da transposição da teoria à
pratica em sala de aula, particularmente no que diz respeito à análise linguística. Também era uma pergunta com resposta aberta.
Das dez respostas, oito deram ênfase ao ensino de gêneros textuais, à produção de texto, para, a partir dela, desenvolver determinado conteúdo, o que reforça as respostas de questões anteriores.
No entanto, antecipando a questão seguinte, professores relatam a
dificuldade de se aplicar a teoria de maneira plena em sala de aula.
Destaquemos algumas afirmações:
• “fica difícil enfatizar algo tão profundo relacionado à
linguística”.
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• “Mostro como a gramática funciona nos textos, mas
essa tarefa não é fácil”.
• “percebo que nas séries finais do ensino fundamental
nem sempre isso ocorre, talvez em função do próprio
conteúdo programático e da reduzida carga horária”.
• “parte-se dos textos, mas não ocorre em todas as aulas”.
Dificuldades como essas são apontadas igualmente na questão seguinte, em que se perguntou a respeito das dificuldades de se
transpor o que estuda a teoria à prática em sala de aula, referindo-se
ao conteúdo como um todo. Destaquemos algumas afirmações coligidas dos questionários respondidos pelos professores, separando-os por unidade significativa:
a) Realidade social:
“preparar as aulas de acordo com a realidade social dos
meus alunos”.
“realidade social local de cada escola, pois dependendo
do contexto, torna-se quase impossível fazer um
trabalho diferenciado”.
Como se pode perceber, o ponto aqui ultrapassa os aspectos
da sala de aula. É evidente que não se pode limitar a determinação
de uma média apenas com base no que foi ensinado e o que foi
aprendido. O Ideb considera taxas de evasão e de repetência, a fim
de compor a média seja localmente, seja globalmente. As respostas
nos levam à necessidade de considerar a situação socioeconômica
da escola e da clientela atendida. Neste artigo, porém, estamos nos
limitando aos aspectos mais pedagógicos e didáticos.
b) Variação linguística:
“Que o aluno entenda a variação linguística e saiba
diferenciar seu uso”.
“Muitas pessoas dentro da escola ainda não percebem
que isso [variação linguística] é importante e também
faz parte do ensino da língua. Muitos pensam que
ensinar língua portuguesa é ensinar regras gramaticais”.
“Eles escrevem como falam”.
Uma das habilidades exigidas do aluno é que ele saiba reconhecer a variedade linguística do português e perceber que cada
variação depende da situação comunicativa em que o indivíduo se
encontra. Porém, pelos depoimentos, podemos perceber que a vaLing. Acadêmica, Batatais, v. 5, n. 1, p. 9-32, jan./jun. 2015
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riação é vista pelo senso comum do aluno, que, por sua vez, reflete
o senso comum da população, como erro a ser combatido pela norma gramatical. Os depoimentos seguintes reforçam esse discurso
do senso comum.
c) Norma gramatical:
“Os próprios alunos cobram uma correção voltada para
a parte gramatical”.
“Muitas teorias, embora sejam construídas em bases
sólidas, não apresentam aplicabilidade, na medida
em que existem alguns fatores práticos que são
desconsiderados por quem as elabora. [Isso faz que]
métodos tradicionais, mesmo que supostamente
ultrapassados ou supostamente inadequados, sejam
mais funcionais”.
“Fazer com que a revisão gramatical ocorra sob as
novas propostas de reflexão linguística”.
Eis o nó górdio ao qual nos referimos anteriormente. As competências e habilidades cobradas pelas avaliações oficiais (Saeb,
Prova Brasil e mesmo o Enem) não tomam por parâmetro essencial
a gramática normativa, que aparece nas provas apenas como base
no discurso, não como essência. Há, assim, uma resistência por parte do aluno, que, ou por comodismo, ou por seguir o discurso do
senso comum, prefere o ensino gramatical, que o leva a decorar
regras e termos gramaticais, a um ensino que exige uma constante
reflexão para o uso eficiente da linguagem nas situações diversas.
É preciso, pois, considerar esse agravante: o “imaginário coletivo”.
Se o professor não aborda a gramática normativa na disciplina Língua Portuguesa, parece que não houve ensino de língua, ou seja,
ainda é necessário desmistificar o ensino de língua e mostrar que
língua é uma coisa, gramática é outra e que há diferentes abordagens possíveis. Ou seja, ainda persiste o mito de que estudar língua
é estudar a gramática tradicional, normativa.
Neves constata (2008, p. 68):
Os professores têm, ainda, muitas dúvidas acerca do que
deve ser feito em sala de aula, acerca de quais conteúdos
são mais relevantes, quais atividades são mais significativas. Na maioria dos casos, eles “pressentem” que algo está
errado, mas não sabem bem o que e como eles poderiam
“consertar”.
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Isso se verifica no depoimento dos docentes:
d) Refacção textual, gêneros textuais:
“Existe uma resistência por parte dos alunos em refazer
os textos”.
“Os alunos também encontram dificuldades em fazer
relação entre textos”.
“A sequência didática, tal como prega a teoria, não me
agrada muito (acho que é muito demorado)”.
“Criar atividades que exemplifiquem essas teorias”.
“Despertar o interesse dos alunos para essas abordagens
linguísticas”.
Como se pode observar, outro problema está na motivação
do aluno para aprender a pensar, aprender que o ensino vai além
de decorar determinadas fórmulas ou estruturas (o que garante a
aceitabilidade do ensino mais gramatical, que, apesar de exceções
aqui e acolá, determina o que está certo e o que está errado com
mais clareza), e que o processo formativo não se realiza de maneira
mecânica, isto é, estudar a matéria, decorar, aplicar em uma prova
e esquecer...
A última questão tratou sobre como o professor tende a trabalhar os gêneros textuais. Segundo os depoimentos, ele procura
seguir aquilo que a teoria veio construindo como proposta ao longo
do tempo, isto é, deve-se abordar diferentes gêneros nas mais variadas situações de uso. Podemos dividir as repostas em dois grupos:
a) Gêneros e realidade dos alunos:
“Faço com que os alunos percebam e notem a existência
do gênero no seu cotidiano e lugares de circulação”.
“Buscando contextualizar os gêneros trabalhados à
realidade dos alunos”.
“Da forma mais simples e voltada para a realidade dos
alunos”.
“Trabalho também com jornais e com textos dos
próprios alunos”.
“envolver os alunos em situações concretas de uso da
língua”.
“Apresentando o texto, suas particularidades, sua
importância [...] na vida do aluno”.
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Esse é o grande desafio da educação: mostrar a utilidade
prática do que se ensina, uma vez que muitas vezes o aluno não
consegue, por ele mesmo, estabelecer uma relação prática entre o
que vê na escola e o que vê em seu cotidiano.
b) Gêneros e metodologia:
“Através da análise de textos, explicando os diferentes
gêneros”.
“análise funcional, análise estrutural e, por fim, análise
linguística”.
“Sequência didática”.
“como seguimos uma apostila temos que cumprir os
objetivos”.
“os livros os quais as escolas adquiriram constavam uso
dos gêneros textuais. Porém, um uso, talvez desfalcado,
fazia apropriação de textos conforme cada gênero,
mas com foco principal na gramática ou exercícios
interpretativos”.
“O livro didático é estruturado de forma que os gêneros
textuais são os desenvolvedores do estudo das práticas
de linguagem”.
Outro grupo de respostas privilegiou a metodologia de ensino, ora com mais, ora com menos liberdade, pela necessidade de
seguir uma apostila ou livro ou ainda seguir as diretrizes da escola.
É evidente que há sempre a possibilidade de modificar, conforme
o objetivo, a proposta do livro ou da apostila, porém, devido à falta
de tempo, nem sempre isso é possível. Além do mais, é compreensível que pais e alunos cobrem o uso do material didático fornecido
ou adquirido.
4.  CONSIDERAÇÕES FINAIS
Em conhecido sermão, o da Sexagésima, padre Antônio Vieira analisa o porquê da palavra de Deus não fazer bons frutos. Para
tanto, pensa em três causas: ou seria culpa do pregador, ou seria
culpa de Deus, ou seria culpa dos ouvintes: “Fazer pouco fruto a
palavra de Deus no Mundo, pode proceder de um de três princípios: ou da parte do pregador, ou da parte do ouvinte, ou da parte
de Deus” (VIEIRA, 1965, p. 1). No sermão, o padre conclui que
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a culpa é do pregador, por usar de um estilo gongórico ou cultista
demais. Parafraseando tal sermão, sem chegar a uma afirmação tão
conclusiva, podemos também nos perguntar de quem é culpa de o
ensino de Língua Portuguesa produzir resultados tão inexpressivos
em termos de avaliação oficial: se é do professor (padre), do aluno
(ouvinte) ou da teoria (Deus). Em rigor, cada qual pode ter sua parcela em sua dimensão ampla, não individualizada. Nem sempre o
professor está totalmente preparado para conseguir transpor o que
estuda, transpor a teoria à prática da sala de aula; nem sempre o
aluno está em condições favoráveis (condições socioeconômicas,
crença no ensino e na utilidade dele etc.) para querer aprender o que
lhe ensinam ou ainda deseja aprender o que se ensina; nem sempre
há uma relação perfeita entre teoria e prática, entre teoria e o que é
cobrado como conteúdo nas avaliações oficiais, levando, assim, a
uma média baixa, tal e qual verificamos pelas médias do Ideb.
Machado (2009), por exemplo, discute os aspectos ideológicos presentes na redação dos PCN de Língua Portuguesa. O ponto
que nos interessa mais de perto é quando a pesquisadora analisa o
que o documento prescreve como solução para o ensino e o que fica
pressuposto quanto à atuação dos professores em sala de aula.
Nesses documentos, são os princípios gerais e a metodologia preconizada que são colocados como os verdadeiros
protagonistas ou motores de um ensino bem sucedido, enquanto os professores são postos no papel de meros co-adjuvantes, cujo trabalho essencial seria a mera aplicação
dos princípios e procedimentos propostos, com o que o
processo se desenvolveria de modo eficaz, quase que mecanicamente. (MACHADO, 2009, p. 61).
E o que fazer? Este é o desafio efetivo da educação e da prática da sala de aula. No caso específico do presente artigo, buscou-se
antes diagnosticar, ainda que com o apoio de dados de abrangência
local, uma situação que tende a se repetir no Brasil como um todo.
Ainda assim, como resposta, devemos pensar que a educação em
língua portuguesa deve, efetivamente, capacitar o aluno a ler, a depreender o sentido daquilo que lê; desse modo, ele usará a língua
de maneira plena.
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