“Talvez vocês se perguntem por que pintei cabras e peixes que

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“Talvez vocês se perguntem por que pintei cabras e peixes que voam,
violinistas de rosto verde trepados em telhados,
casas que bóiam no céu de cabeça para baixo,
namorados que sobrevoam a cidade…
Pintei meu mundo, minha vida,
aquilo que vi e aquilo que sonhei:
pintei minha Rússia querida,
a Vitebsk onde nasci,
o bairro dos judeus pobres onde cresci,
assim como os via quando era criança,
quando meu nome ainda era Moshe Segal.”
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Naquele bairro de Vitebsk, tudo me encantava:
os judeus com violinos, suas canções, suas preces; os pobres
casebres de madeira, as cabras, as vacas e as galinhas;
as peras geladas que papai trazia na volta do trabalho.
E mais ainda as luzes do shabbat, o sábado hebraico que começava na sexta-feira
à noite: na verdade, toda sexta-feira à noite brilhavam duas velas nas janelas.
— Para recordar o dia em que Deus descansou, depois de ter criado o mundo —
explicava mamãe.
Contava-se que, naquele dia de festa, dois anjos desciam do céu
para acompanhar o pai da família até sua casa após as orações na sinagoga.
Naquela noite, o céu de Vitebsk ecoava de cantos: shalom aleikhem, paz sobre vós,
dizia a canção para os anjos.
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Então, festejava-se: talharim, peixe recheado, carne com cenouras,
fruta cozida.
Depois das últimas orações, todos dormiam.
Todos, menos eu. Queria andar no telhado. Adorava subir lá.
Por que não? Até vovô subia para comer cenouras.
Sobre o telhado, tinha a lua. O ar azul. E minhas estrelas.
Sobre o telhado, podia sonhar e fantasiar, imaginar o que faria quando crescesse.
Certamente, não seria trabalhador braçal como papai, que passava os dias
transportando pesados barris de arenque. Muito menos açougueiro como vovô,
ou barbeiro como tio Zoussy. Não.
Sonhava com um futuro luminoso... Sonhava em ser famoso.
Eu tinha uma bela voz e me tornei cantor ajudante na sinagoga.
“É isso”, pensava, “serei cantor. Vou entrar no conservatório!”.
Eu tinha aprendido a tocar alguma coisa no violino.
“É isso”, pensava, “serei violinista. Vou entrar no conservatório”.
Os parentes me convidavam para dançar com minha irmã.
“É isso”, pensava, “serei bailarino, vou entrar...” não sabia onde.
Aquelas fantasias me faziam feliz.
Era como voar sobre Vitebsk, sobre a Rússia inteira.
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