36 Revista Filosofia Capital ISSN 1982 6613 Vol. 4, Edição 9, Ano 2009. DISCUSSÕES ONTO-EPISTEMOLÓGICAS NO DE MAGISTRO DE AGOSTINHO DE HIPONA Érika Felipe de Albuquerque [email protected] Ceará - CE 2009 37 Revista Filosofia Capital ISSN 1982 6613 Vol. 4, Edição 9, Ano 2009. DISCUSSÕES ONTO-EPISTEMOLÓGICAS NO DE MAGISTRO DE AGOSTINHO DE HIPONA Érika Felipe de Albuquerque1 [email protected] RESUMO: Agostinho, em diálogo com Adeodato, elabora um discurso referente à linguagem no seu De Magistro. Especificando uma dialética ascendente da linguagem cuja função fundante é elevar o homem até Deus. Partindo da análise da finalidade da linguagem, constrói uma elucubração teo-filosófica sobre a função da mesma. Construindo magistralmente uma reflexão recheada de elementos sobre os Universais, posto que a querela enfrentada se desenrola ante a apreensão humana do conhecimento e os fins ao qual ele remete, tendo como ponto de partida e chegada o papel do Mestre e os elementos constitutivos com que investiga o processo de apreensão do conhecimento, vislumbrando a função do discurso ou da linguagem. Em linhas gerais, ousamos reconstruir a agonística agostianiana a respeito da linguagem, explorando os aspectos onto-epistemológico que balizam o De Magistro. Palavras-chave: Agostinho – De Magistro – Linguagem – Realismo moderado – Dialética ascendente. Introdução Escrito em Tagaste, pelos anos 388-391, O De Magistro de Agostinho discorre a respeito da linguagem. O ponto de partida e chegada da discussão gira em torno da finalidade do Mestre e comporta como discurso os elementos teo-filosóficos, cujo movimento paira sobre uma dialética ascendente do conhecimento. Agostinho questiona Adeodato, cuja dialética do discurso envolve-se em querelas que são pontos de destaque no medievo, a questão dos universais. Objetivando compreender a finalidade do discurso, ou melhor, da linguagem, Agostinho retoma a finalidade da palavra, a relação entre palavra e sinal e os aspectos cognitivos que se processam na mente humana balizada ou não pelo uso dos sinais, findando por relacionar sinais, realidade e Mestre. Ante estas discussões, o Bispo de Hipona, nos põe, mesmo que entre linhas, diante da teoria da iluminação, da prova noológica de Deus e da noção de Deus como fundamento da totalidade 1 Bacharel em Filosofia e Mestre em Filosofia pela Universidade Estadual do Ceará. Professora Substituta da Universidade Estadual do Ceará lotada na Faculdade de educação de Crateús no curso de química. Área de pesquisa: filosofia medieval orientanda do professor Dr. Jan Gerard Joseph durante a graduação e mestrado finaciada pelo programa Cnpq e Funcap, respectivamente. 38 Revista Filosofia Capital ISSN 1982 6613 Vol. 4, Edição 9, Ano 2009. dos entes, temas importantes de seu pensamento. Nosso objetivo inicial é elaborar uma releitura do texto Agostiniano, frente à perspectiva defendida por ele ante a querela dos universais, qual seja a do realismo moderado. Portanto, a linguagem se configura como um elemento balizador para que o Bispo de Hipona alce o vôo epistemológico frente o processo de aquisição do conhecimento. Por fim, elencar, palavra, sinal, mundo, pensamento e Deus, como Mestre, nos levam a empreender as veredas do diálogo em questão. Linguagem e Temporalidade Agostinho inicia seu texto indagando a respeito da função da linguagem: Por que falamos? Em que consiste, fundamentalmente, a fala? Como necessidade, intrinsecamente humana, a fala se dá como manifestação. Este dar-se como exteriorização do sinal da vontade humana se configura como som. O som desta forma é a ressonância no tempo de um querer humano que extrapola o âmbito do humano e quer alcançar algo mais, um além que não lhe é estranho, mas mediação do próprio falar. Como função mediadora, a palavra assume uma dupla função: ensino e rememoração. Como ensino, percebe-se que ao emitir algum som no tempo, sua ressonância remete a outrem que necessita de aprendizado, porém também emitimos som quando cantamos ou quando oramos. Nestes dois casos, percebemos que a entonação da voz não se configura como a intenção preliminar de um ensino que se põe como emissão de sons no tempo. Diz Agostinho que mesmo sem emitir som, falamos, pois, (...) nós falamos enquanto intimamente pensamos as próprias palavras em nossa mente; assim, com as palavras nada mais fazemos do que chamar atenção; entretanto a memória, a que as palavras aderem, em as agitando, faz com que venham à mente as próprias coisas, das quais as palavras são sinais. (1973, p. 324). Ora, Agostinho, deixa resplandecer a noção de fala e de ensino não do homem para o homem quando se fala, mas da necessidade ontológica da fala do homem para Deus que não tem necessidade de ensino, mas que aqui representa o referencial de escuta. Deus é escuta da fala do homem para com ele que se dá no silêncio do seu coração. Desta forma, o homem se comunica com Deus mediado pela oração, cuja finalidade é ser ouvida. Esta configuração da elevação da alma caracteriza uma dialética ascendente, cujo fim é instrutivo e de reconhecimento do humano com o divino e cuja essência é a abertura para a escuta, no silêncio instrutivo que é o consentimento da mente para aquele que contempla a Deus. 39 Revista Filosofia Capital ISSN 1982 6613 Vol. 4, Edição 9, Ano 2009. Esta propedêutica divina é manifestação da articulação sonora dos sinais que o homem possui, como algo que lhe é próprio e que baliza o reconhecimento da memória, ou a rememoração do que é mais divino no homem, expresso em sua interioridade. O homem interior se coloca na expressão de Agostinho como referencial teo-filosófico de compreensão da manifestação divina no Mundo. Segundo Mertens (2003) ao analisar as Confissões pergunta como se dá o alcance da luz através das confissões. Para ele, Agostinho entende a luz como sabedoria por meio da qual o homem é iluminado e alcança a verdade e, por conseguinte a Deus. “A confissão aparece como uma prática na qual a verdade de tudo que é (Deus) se presentifica. Confissão é o homem clarificando-se acerca da luz da sabedoria de Deus, ou melhor, iluminando-se através deste ato enquanto pratica a verdade.” (id., p. 348). Desta forma, para Agostinho Deus é entendido como fundamento de tudo que é real. E para além de uma lógica da demonstração da existência de Deus. A conotação teológica se mostra mais intensamente, pois que Deus mostra-se ao ser do homem, à medida que a lembrança, a memoração se dá como exercício da alma, no ato da confissão e do voltar-se para Deus, na tensão gerada entre esquecimento e recordação. A palavra, finda por adquirir uma realidade extra-mental, uma espiritualidade. A linguagem passa a se configurar como elemento, como meio onde se dá a manifestação do divino no homem. Passa a ser o elo, a aliança. A palavra como Verbo, como fonte infindável da criação, cujo centro de articulação se dá ascendentemente, parte do homem, de sua alma, de sua razão e, sobretudo de seu coração. Assim, Deus ensina não palavras, mas pelas palavras guardadas nos segredos da mente. A mente é expressa como o espaço sagrado, pois que locus, do pensamento de Deus explorado pelo homem, dado que se dá como expressão maior do homem, na escala dos seres criados. Deus, assim, cria do nada tudo que há. Esta Criação se desenrola pelo Verbo, palavra viva e ressonante no tempo. Tempo este que é sempre agoridade. Posto que Deus seja sempre tudo em todo lugar, não passivamente, mas sempre neste instante da Criação na agoridade, num dinamismo singular para os medievais. Palavras e Sinal – A Expressão da Realidade e Diálogo Divino Alguns questionamentos lingüísticos são postos por Agostinho, entre eles podemos enumerar: As palavras são sinais? O que sinalizam as palavras? É possível demonstrar algo sem o uso de sinal? É possível mostrar um sinal com outros sinais? Sozinhas, as palavras são 40 Revista Filosofia Capital ISSN 1982 6613 Vol. 4, Edição 9, Ano 2009. sinais? Existem sinais que se signifiquem reciprocamente? Todos os nomes são vocábulos e todos os vocábulos são nomes? Em síntese, qual a finalidade da palavra e qual sua relação com a realidade? Diante destes questionamentos a desenvoltura gramatical de Agostinho expressa em profundidade sua filosofia divina. Verificamos pontos chaves para a discussão a respeito do realismo moderado como resposta a um dos pontos chaves do medievo: a questão dos universais retomados de Platão e Aristóteles por Severino Boécio e Porfírio atingindo seu ápice na Baixa Idade Média com Abelardo, Anselmo, Tomás de Aquino e Ockham, dentre outros. Entende Agostinho, que palavra é sinal e que os sinais significam algo. Sugere análise de uma frase: “Se nada aos deuses agrada que fique de tão grande cidade.” (Vírgilio, Enéida, II, 659). Ora, Agostinho dá ênfase à idéia do nada (nihil), como poderia afirmar que todo sinal signifique algo se o nada, nada significa? O nada passa a ser o ponto central da nossa discussão ontológica – metafísica. Diz-se que o ser é e que o não-ser não é. O centro do pensamento metafísico é significar o nada, ora diz Agostinho o nada não pode ser um sinal porque nada significa, entretanto, mesmo sem nada significar diz algo, pois o nada é uma tentativa de “significar aquele estado da alma produzida quando não se vê a coisa, e, no entanto, descobre-se ou se pensa ter descoberto que a coisa não existe”? (Agostinho, 1973, p. 325) Ora, se não existe, como pode o pensamento pensá-lo? Se pode pensá-lo e a mente o expressa, este nada passa a significar algo, pois que é compreensível que nada pode ser expresso por ele. Sendo assim, o nada passa a ter uma existência ontológica, posto que é dito, portanto pensado e tudo aquilo que o pensamento pensa tem uma existência. Para Heidegger (1983, p. 43), o nada é o ponto central da metafísica. Entende que para os gregos, o nada tinha uma conotação de ausência, da matéria informe, incapaz de dar forma a um ente de forma figurativa. Para os medievais, Heidegger entende que o nada foi compreendido como o oposto ao ente verdadeiro que é Deus. Nos dois casos, Heidegger entende a ausência de lugar do nada, que paira sobre o ente e assim, ser e nada não tem o seu lugar, a não ser na gravitação do ente. O cerne da discussão passa a ser o nada, como questão metafísica central, posto que o existente adquire seu sentido na relação com o nada. Na semiótica de Agostinho, os sinais apontam para significados, estes significados se dão na relação do homem com a coisa significada, cuja elaboração cognitiva se dá em sua mente. O fato a se pensar é que se os 41 Revista Filosofia Capital ISSN 1982 6613 Vol. 4, Edição 9, Ano 2009. sinais significam algo, que algo é este a qual eles remetem? Para Agostinho, muitas coisas não dependem de sinais para serem explicadas, elas em si mesmos significam sem remeter a nada mais além daquilo que dizem. As substituições de sinais por sinônimos que possam clarificar sua expressão, não comportam em totalidade a demonstração de alguma coisa. Portanto, quando se discute sobre os sinais, se mostram que se podem mostrar uns sinais por meio de outros; mas quando se discute sobre as coisas que não são sinais, não se podem mostrar a não ser fazendo-o imediatamente após a pergunta – se for possível – ou dando algum sinal pelo qual possam ser compreendidas. (Agostinho, 1973, p. 329). O que Agostinho nos diz é que entende o caso da demonstração do sinal com outros sinais por meio dos aspectos da recordação e do ensino de sinais equivalentes e de sinas distintos. Pensa Agostinho que a exemplo da pedra, como um tipo de sinal, ela só pode ser pensada como sinal quando esta significar algo, mas que não pode ocupar-se dela, pedra, enquanto indução dela mesma, ou seja, enquanto atributo lógico singular. Desta forma, Agostinho designa de significáveis as coisas que podem ser significadas por sinais visíveis. Questionando sobre verbum, palavra, e sobre se ela significa nome e a que se refere aquilo que é proferido pela voz, Adeodato conclui: o que é significado com o nome também o é com a palavra, mas nem tudo que é que é significado com a palavra é significado com o nome, logo que estas não possam ser vistas, embora sejam audíveis. Agostinho diz haver uma diferença entre palavra e nome. Palavra seria um sinal de outro sinal que pode significar outro sinal e nome seria o sinal de outro sinal que não pode significar nenhum nome. Assim, é como dizer que “todo cavalo é animal, mas nem todo animal é cavalo, assim como toda palavra é sinal, mas nem todo sinal é palavra” (1973, p. 331). Portanto, sinal é tudo que significa algo e inclui a palavra. Para Agostinho, tudo que é proferido quando é percebido é enviado à memória para ficar conhecido. Desta forma, como expomos anteriormente, o verbo tem a função de ser ouvido, enquanto o nome favorece o conhecimento. Assim, o conhecer carece de nomeação, ao nomear algo tornamo-lo cognoscível. Temos claro, portanto, que as palavras são o resultado de sons e de letras e que o nome é aquilo com que nomeamos esta coisa. Também afirma gostinho que não há diferença entre vocábulos e nomes, pois o nome significa a si mesmo junto com outros nomes que significa estes outros nomes significados, chama o teo-filósofo de vocábulo. Assim, temos quanto à semiótica presente no texto de Agostinho que: a) A função da 42 Revista Filosofia Capital ISSN 1982 6613 Vol. 4, Edição 9, Ano 2009. fala é ou para ensinar ou para recordar e que cantar não é propriamente falar e rezar é uma admoestação a si ou aos outros; b) Que as palavras são sinais e que estes sinais não existem sem significar algo, assim como o gesto sinaliza as coisas visíveis e outras; c) Trata também de como se podem indicar sem sinal as mesmas coisas que se indicam por sinal, somente depois de ser interrogado, ficando explícito que se mostram sinais com sinais que eles significam d) Foi dito também que existem sinais que se significam reciprocamente, tendo uns o mesmo valor, outros são iguais e outros ainda são idênticos; e) Que há diferença entre palavra e sinal, mas não entre palavra e nome, sendo que estes não são idênticos. Saindo um pouco das análises lingüísticas de Agostinho temos que o pano de fundo de sua discussão central se desenvolve entre a relação: a realidade, o sinal e o Mestre. É dito por Agostinho que os sinais reivindicam para si a realidade que significam. Assim, quando interrogo sobre homem não digo que ele significa as sílabas – ho e mem, mas remeto minha mente ao que o nome, homem significa. (...) Com efeito, se te perguntasse o que é “homem”? ”responderias, talvez “ animal”, porém se te perguntasse que parte da oração é “homem” de nenhum outro modo me poderias me responder bem, senão dizendo: “ nome”; assim concluímos que “homem” é nome e animal: o primeiro( ser nome) se diz enquanto é sinal; o segundo (ser animal) enquanto indica a coisa significada. (Agostinho,1973, p. 343). Percebemos desta forma que, ao se ouvir duas sílabas não se dão para, somente com elas, relaciona-la com o que elas significam, ou seja, sozinhas elas nada dizem. A apreensão cognitiva só se dá por meio da relação dos sons com o significado do nome pronunciado que ao ser levado à mente passa a adquirir um valor ontológico para o sujeito. O valor ontológico da linguagem passa a significar para Agostinho não só por sua conotação lógica ou analítica, mas pela relação desta com o atributo metafísico da significação. Esta elaboração conceitual dos sinais remete a questão central do texto de Agostinho: Qual a finalidade da linguagem? Ora, a linguagem tem por fim o ensino, sabendo que o nome em si tem menos importância do que o que ele significa de fato. O exemplo da palavra “vício”. (...) este nome trissílabo” vitium”( vício), quando o pronunciamos, é melhor como som, do que aquilo que significa; no entanto, o conhecimento do simples nome é muito inferior ao conhecimento dos vícios. Assim, ainda que tu estabeleças e consideres aqui também os quatro termos: nome e coisa, conhecimento do nome e conhecimento da coisa, com razão nós antecipamos o primeiro ao segundo. (Agostinho, 1973, p. 345). O que Agostinho diz é que as palavras nada ensinam. Estes sinais nos oferecem o 43 Revista Filosofia Capital ISSN 1982 6613 Vol. 4, Edição 9, Ano 2009. valor da palavra. Por meio da sonorização das letras tomamos conhecimento do significado da coisa expresso pela sonorização deste nome, mas este conhecimento não nos dá o valor da coisa em si significada. Esta tese nos aponta que a relação entre linguagem e realidade se dá em termos de um realismo moderado, cuja centralidade é posta sobre a existência dos termos em si mesmos, ante rem , “Com as palavras não aprendemos senão palavras” (1973, p. 350) também se configurando nas coisas imanentes, in re. “Só depois de conhecer as coisas se consegue, portanto, o conhecimento completo das palavras” (idem): e como conceito mental, post rem. “Ao serem proferidas (...) se o sabemos [o que significam], não foram elas que no-lo ensinaram, apenas o recordaram; se não o sabemos, nem sequer o recordam, mas, talvez, nos incite a procurá-la.” (id., p. 350/351) Eu Interior e Verdade: A Possibilidade de Deus Sinal - A Guisa de Conclusão. A verdade para Agostinho é algo tangível. O mundo e todas as coisas têm certa unidade, ordem e forma, porque são vestígios da Trindade. Existe uma hierarquia nas coisas criadas e sujeitas ao tempo. O homem pode retornar a Deus por meio dos graus de perfeição que existe no mundo. Assim, o mundo faz parte de Deus e o homem se faz imagem e semelhança de Deus. A idéia de pessoa, se individual e singular é desenvolvida por Agostinho. Sabe-se que o Homem pode pensar Deus naturalmente, pois que naturalmente o tem em sua natureza, assim como está presente em tudo que há. Desta forma, Deus não precisa de definição alguma, pois ele é aquele que é, é verdade e vida eterna. Nesta concepção o homem se faz criatura. O mundo sendo criado segundo a razão, ou melhor, idéia que estão na mente de Deus, põe o homem como um ente da mente de Deus, onde sua atuação se dá por meio da Criação do Nada, onde nenhuma matéria pré-existente mantém este elo na criação. Assim, existe a idéia de razão seminal, isto quer dizer que Deus põe as razões seminais nas coisas, como potências que se desenvolvem ao longo do tempo. Desta forma há uma atualização das razões seminais existentes na criatura. Diz Reale sobre este conceito de Agostinho: Deus, com efeito, criou o mundo conforme a razão e, portanto, criou cada coisa conforme um modelo que ele próprio produziu como seu pensamento, e as idéias são justamente este pensamento-modelo de Deus, e como tais são; a verdadeira realidade, ou seja, eternas e imutáveis, e por participação dela 44 Revista Filosofia Capital ISSN 1982 6613 Vol. 4, Edição 9, Ano 2009. existem todas as coisas. (2003, p. 95). Portanto, a idéia de participação se faz como uma das principais categorias Agostiniana. Pensamos que a idéia de participação favorece as teorias desenvolvidas e sistematizadas pelo filósofo em questão para redimensionar a idéia grega de criação por meio das contribuições filosóficas de Platão, postas na obra “Timeu”. O que de fato salta aos olhos é que a Alma é co-participante da Verdade. O que possibilita o desenvolvimento gnosiológico do autor. A idéia de luz que, materialmente, permite ao homem enxergar as coisas visíveis, perpassa a concepção de iluminação. Esta Iluminação adquire sua expressão maior quando Agostinho desenvolve as discussões lingüísticas no De Magistro. O realismo moderado de Agostinho está pautado na concepção onto-epistemológica, cuja essencialidade se dá mediante a relação entre conhecimento humano, ao conhecer o homem é capaz de captar as Idéias. Idéias estas que tem sua existência na mente de Deus como verdades eternas e inteligíveis. “O intelecto humano, portanto, encontra a verdade como “objeto” superior a ele, com ele julga, mas por ela é julgado. A verdade é a medida de todas as coisas e o próprio intelecto é medido em relação a ela.” (Reale, 2003, p. 90). Desta forma, Agostinho diz que podemos conhecer mediante dois movimentos: os sensíveis e os inteligíveis. A verdade das coisas, segundo o teo-filoósfo não se dá mediante a preensão das palavras, mas pelas próprias coisas que se revela interiormente por Deus. Assim, Quando, pois, se trata das coisas que percebemos pela mente, isto é, através do intelecto e da razão, estamos falando ainda em coisas que vemos como presentes naquela luz interior da verdade, pela qual é iluminado e de frui o homem interior; mas também neste caso quem nos ouve conhece o que eu digo por sua própria contemplação e não através das minhas palavras, desde que ele também veja por si a mesma coisa com olhos interiores e simples. (Agostinho, 1973, p. 352). Deus sinaliza a verdade, e as coisas nada mais são na concepção agostiniana que sinais de Deus, imagem da Trindade constitutiva do mundo. Portanto, as palavras indicam a verdade, e o homem indica por meio de seu intelecto e razão a capacidade criadora de Deus. O Mundo, O Homem e Deus são as três faces onto-epistemológicas da semiótica agostiniana. Enfim, atingir a verdade se dá na teoria de Agostinho por meio da graça, também a verdade pode ser alcançada por meio da iluminação. A teoria da iluminação está na base do conhecimento. Para Agostinho a alma tem critérios, de conhecimento, necessários e imutáveis, assim à alma é capaz de conhecer a verdade. Deus na base da criação participou à alma do homem a capacidade de enxergar as verdades que se encontram Nele. 45 Revista Filosofia Capital ISSN 1982 6613 Vol. 4, Edição 9, Ano 2009. Desta forma, o princípio da liberdade está em o homem escolher o que Deus quer. Pensando assim, a liberdade se aproxima da vontade e se distancia da razão. Segundo Reale: A liberdade é própria da vontade e não da razão, no sentido em que os entediam os gregos. (...) A razão pode conhecer o bem e a vontade pode rejeitá-lo, porque embora pertencendo ao espírito humano, a vontade é uma faculdade diferente da razão, tendo uma autonomia própria em relação a razão, embora seja a ela ligada. [...]. (2003, p.98). Na liberdade encontramos o livre - arbítrio, este principio é uma das bases do pensamento ético. O Homem na concepção agostiniana jamais é autárquico em sua vida moral, ele precisa da ação divina que se dá por meio da graça. A necessidade da graça se faz por causa do pecado original que foi um pecado da soberba, portanto da razão. A vontade desviada pela razão necessita da graça divina para sua libertação, pensa Agostinho. Desta forma diz Silva: A revelação e a fé correspondem ao que lê denomina de graça, capaz de suprir o papel impossibilitado de ser cumprido simplesmente pela razão inferior e pela razão superior, a saber, trazer a mente humana verdades eternas. (2003, p. 341). Assim, Agostinho conclui que as palavras admoestam o homem a descobrir a verdade. Este despertar não se limita à razão, mas a ela supera. Esta transcendência gnosiológica permite à abertura do homem as verdades que se dão por meio do Cristo Portanto, ensinar é significar por meio dos sinais, como também de elevar a mente humana à mente divina, numa ascendência que se dá por meio dos sentidos, seguido pela inteligência e razão, culminando na fé. 46 Revista Filosofia Capital ISSN 1982 6613 Vol. 4, Edição 9, Ano 2009. REFERÊNCIAS ABBAGNANO, Nicolas. Dicionário de Filosofia. São Paulo: Meste Jou, 1970. AGOSTINHO. De Magistro. São Paulo, Pensadores: Abril Cultural, 1973. REALE, Giovane & ANTISERI, Dario. História da Filosofia. V. 2. São Paulo: Paulus, 2003. HEIDEGGER. Martin. Conferências e escritos filosóficos. O que é metafísica. São Paulo. Pensadores: Nova Cultural, 1984. SILVA, Adelmo José. A integração entre razão e fé em agostinho. IN: Revista de Filosofia Veritas. Porto Alegre. V.48. N. 3. Setembro de 2003. pp..337 -342. MERTENS, Rodolfo Saraiva Kahlmeyer. Memória e confissão como exercício prático do conhecimento da verdade de deus no pensamento de agostinho. IN: Revista de Filosofia Veritas. Porto Alegre. V.48. N. 3. Setembro de 2003. pp.343.349.