MODELAGEM E SIMULAÇÃO DO PROCESSO DE PRODUÇÃO DO BIODIESEL C. B. SILVA1, J. J. N. ALVES2 e B.V de SOUSA3 1 Universidade Federal de Campina Grande, Centro de Ciência e Tecnologia, Unidade Acadêmica de Engenharia Química 2 Universidade Federal de Campina Grande, Centro de Ciência e Tecnologia, Unidade Acadêmica de Engenharia Química 3 Universidade Federal de Campina Grande, Centro de Ciência e Tecnologia, Unidade Acadêmica de Engenharia Química E-mail para contato: [email protected] RESUMO – O biodiesel tem se tornado uma alternativa ecologicamente viável na substituição de combustíveis fósseis. Ele pode ser obtido a partir de reações entre triglicerídeos (resíduos de óleos vegetais, óleos vegetais virgens ou gorduras animais) com um álcool na presença de um catalisador. As pesquisas atuais focam na melhoria da produção desse combustível, nesse sentido, diversos fatores de influência da reação devem ser analisados, como exemplo, temperatura de operação, razões molares álcool/óleo e catalisador/óleo, constantes de equilíbrio, entre outros. Sabendo da importância desses fatores, foi realizada uma simulação de uma modelagem cinética da reação de produção do biodiesel, para isso, fez-se uso do software MATLAB. Os resultados obtidos permitiram avaliar a influência de alguns dos fatores mencionados anteriormente na extensão das concentrações finais dos ésteres (biodiesel) e de alguns produtos indesejáveis formados ao longo da reação, como exemplo, o sabão. 1. INTRODUÇÃO Nos últimos anos, a demanda por combustíveis tem aumentado consideravelmente, esse fato acompanha-se do crescimento de grandes populações, como Índia e China, que necessitam de um alto valor energético e combustível para que supram suas economias e continuem se desenvolvendo a longo prazo (Campbell, 1997). Dentre as diversas fontes utilizadas para a produção de combustíveis, as mais comuns são as fósseis, como óleo, gás e carvão. A queima desses combustíveis tem gerado um impacto negativo ao meio ambiente, decorrente das grandes emissões de poluentes como monóxido de carbono, dióxido de carbono, materiais particulados e óxidos de enxofre (Domingos, 2010). Sendo assim, tornou-se de extrema necessidade buscar alternativas que minimizassem os efeitos de tais poluentes. Nesse contexto, surgem os biocombustíveis como solução para boa parte dos problemas, pois são considerados fontes rentáveis e de poucas contribuições negativas para o meio ambiente (Turner, 2005). O biodiesel tem se tornado uma ótima alternativa ao diesel de petróleo. Segundo a Resolução n° 7 de 19 de março de 2008, da Agência Nacional do Petróleo (ANP), o biodiesel (B100) é definido como um combustível composto de alquil ésteres de ácidos graxos de cadeia longa, derivados de óleos vegetais ou de gorduras animais conforme a especificação contida no Regulamento Técnico. Existem várias formas de obtenção do biodiesel. Comumente emprega-se a transesterificação dos triglicerídeos (TG), onde um tri-éster converte-se em 3 ésteres individuais, e a esterificação dos ácidos graxos livres, onde um éster (E) é formado. O biodiesel formado corresponde as moléculas de E. As transesterificações podem ser catalisadas por base, ácido ou podem ser enzimáticas (Turner, 2005). A catálise da reação pode ser do tipo homogênea ou heterogênea. Na primeira, o catalisador encontra-se na mesma fase dos reagentes, na última, ele se encontra em uma fase diferente. Tanto a transesterificação como a esterificação para produção do biodiesel pode ocorrer via catálise homogênea. A catálise heterogênea surge como uma forma de melhorar problemas encontrados na catálise homogênea, diminuindo o número de etapas no processo, melhorando a reutilização dos catalisadores (o ideal é que ele não seja consumido, ou desativado), diminuindo significativamente os custos do processo, visto que normalmente esses catalisadores são caros (Galante, 2012). O estudo da modelagem cinética para a reação do biodiesel é uma ferramenta importante. Depois de realizadas as definições matemáticas pertinentes, pode ser útil para verificar diversos fatores influentes da reação. Toda a cinética pode ser descrita através de equações diferenciais, formando um sistema capaz de descrever o comportamento de reagentes e produtos no curso reacional. Através de simplificações matemáticas posteriores, podem ser resolvidas mais facilmente com o auxílio de diversos softwares. Sendo assim, este trabalho tem como objetivo a implementação de uma modelagem cinética da reação de produção do biodiesel utilizando o software MATLAB. A avaliação de como as concentrações dos reagentes e produtos se comportam ao decorrer do tempo reacional, e a verificação do quanto as razões molares álcool/óleo e catalisador/óleo e a formação de subprodutos indesejáveis influenciam na conversão final do biodiesel. 2. METODOLOGIA A cinética reacional utilizada foi baseada no trabalho de Komers et al. (2002), que propõe um modelo cinético para a reação do óleo de colza com metanol, catalisada por hidróxido de potássio (KOH), a qual ocorre em duas etapas: a primeira é a metanólise do óleo em metil ésteres (biodiesel) e a segunda é uma reação concorrente, a saponificação (formação de sabão (A)). A cinética obtida é descrita na forma de equações diferenciais, que foram posteriormente simplificadas para serem resolvidas por métodos computacionais. Komers et al. (2002) usou as seguintes considerações para obtenção de seu modelo cinético: 1. A concentração de ácidos graxos livres é desprezível; 2. Em todo o processo, as reações principais são a metanólise e a saponificação; 3. Todos os isômeros de TG reagem na metanólise e saponificação com a mesma taxa e mecanismos; 4. A metanólise pode ser catalisada por íons OH- ou RO-, entretanto, as concentrações desses íons são muito pequenas quando comparadas a concentração de TG e metanol. As equações diferenciais (1) a (6) descrevem o comportamento dos 8 componentes envolvidos na reação: TG, diglicerídeos (DG), monoglicerídeos (MG), glicerol (G), A (correspondente ao ácido graxo em questão), OH, álcool (ROH) e E. dTG b.OH .(k 2' ..TG.OH k 2' r .DG.E ) a.OH .k 9 .TG dt dDG b.OH .(k 2' ..TG.ROH k 2' r .DG.E ) k 4' .DG.ROH k 4' r .MG.E ) a.OH .(k 9 .TG dt k10 .DG) dMG b.OH .(k 4' .DG.ROH k 4' r .MG.E k 6' .MG.ROH k 6' r .G.E ) a.OH .(k10 .DG dt k11.MG) dG b.OH .(k 6' .MG.ROH k 6' r .G.E ) a.OH .k11.MG dt dROH dE b.OH .(k 2' .TG.ROH k 2' r .DG.E k 4' .DG.ROH k 4' r .MG.E k 6' MG.ROH dt dt k 6' r .G.E k 8 .E ) dOH dA b.OH.k 6' .E a.OH.(k 9 .TG k10 .DG k11.MG) dt dt (1) (2) (3) (4) (5) (6) Eliminando pequenos termos e substituindo as relações de equilíbrio pela equação da taxa para cada espécie, Komers et al. (2002) normaliza as espécies restantes pelas concentrações iniciais de triglicerídeos e de álcool. Para solucionar o sistema de equações diferenciais, neste trabalho utilizou-se as constantes cinéticas obtidas por Komers et al. (2002) por três diferentes métodos e a rotina computacional “ODE 45” contida no software MATLAB. 3. RESULTADOS As Figuras 1, 2 e 3, são referentes aos dados obtidos na simulação para cada conjunto de constantes cinéticas calculadas por Komers et al. (2002), para valores de n = 2,0223 (razão molar álcool/óleo) e p = 0,1225 (razão molar catalisador/óleo). Os eixos y de cada gráfico representam os resultados das concentrações normalizadas. Figura 1 – Concentração normalizada dos reagentes e produtos versus tempo de reação para a transesterificação do óleo de colza com metanol, catalisada com KOH a 295,85 K (Método 1). Figura 2 – Concentração normalizada dos reagentes e produtos versus tempo de reação para a transesterificação do óleo de colza com metanol, catalisada com KOH a 295,85 K (Método 2). Figura 3 – Concentração normalizada dos reagentes e produtos versus tempo de reação para a transesterificação do óleo de colza com metanol, catalisada com KOH a 295,85 K (Método 3). A Figura 4 apresenta os resultados de Komers et al. (2002) para as mesmas condições da simulação realizada utilizando as constantes obtidas pelo método 1. Figura 4 – Resultados de Komers, para n = 2,0233 e p = 0,1225. Comparação entre valores experimentais (pontos) e simulação pelo método 1-Runge-Kutta com otimização (curvas). Comparando as Figuras 1 e 4, pode-se observar que os resultados da simulação no MATLAB apresentam uma boa aproximação para o modelo proposto por Komers et al. (2002), visto que, na Figura 1 no tempo de aproximadamente 300 segundos a concentração normalizada de biodiesel começa a se estabilizar, chegando ao seu máximo de aproximadamente 0,7. O que pode ser validado pela figura 4, que no tempo de 5 minutos (300 segundos) a concentração também se aproxima desse valor. Os valores de concentração obtidos para o sabão também podem ser comparados. Observa-se pela Figura 1 que a concentração máxima para o sabão é de aproximadamente 0,1. Já na Figura 4, verifica-se que essa concentração se aproxima de 0,13. Observando os as Figuras 1, 2 e 3 é possível observar que a simulação foi coerente com a literatura, visto que, à medida que o tempo de reação aumenta as concentrações de TG, ROH e OH diminuem, pois são reagentes e estão sendo consumidos, à medida que as concentrações de ésteres (biodiesel) e sabão aumentam. Também é possível observar que a concentração de DG aumenta, até que em um determinado tempo de reação sua concentração começa a diminuir. Este fato está coerente, visto que a medida que TG e ROH são consumidos, DG são formados, e em seguida, são consumidos para formar MG, até que os MG sejam consumidos para formarem G. Comparando os resultados simulados para os três métodos, verifica-se que, as concentrações de biodiesel ao final do processo foram de 0,789, 0,582, e 0,604 para os métodos 1, 2 e 3, respectivamente. Já para o sabão, as concentrações foram de 0,113, 0,122 e 0,121. Por esses resultados, é possível inferir que a forma como foi calculada as constantes possui maior influência nos resultados para os ésteres, visto que, a sua variação foi mais acentuada do que para o sabão. Para verificar a influência dos parâmetros n e p na reação, realizou-se duas simulações, a primeira com n = 3,33 e p = 0,1225 e a segunda com n = 2,0223 e p = 0,5, ambas foram simuladas com os valores das constantes calculadas pelo Método 1. As Figuras 5 e 6 apresentam o comportamento das concentrações normalizadas versus tempo para cada simulação. Figura 5 – Concentração normalizada dos reagentes e produtos versus tempo de reação para a transesterificação do óleo de colza com metanol, catalisada com KOH a 295,85 K, com n = 3,33 e p = 0,1225 (Método 1). Figura 6 – Concentração normalizada dos reagentes e produtos versus tempo de reação para a transesterificação do óleo de colza com metanol, catalisada com KOH a 295,85 K, n = 2,0223 e p = 0,5 (Método 1). Comparando a Figura 1 com a Figura 5, observa-se que o aumento da razão molar álcool/óleo reduz a concentração de Ésteres formados ao longo da reação. Fazendo o mesmo comparativo com a Figura 6, nota-se que o aumento na razão molar catalisador/óleo tem como consequência a elevação da concentração de Ésteres, entretanto, a concentração de sabão ao longo da reação tem um crescimento significante, fato que pode ser explicado pelo caráter básico do catalisador, que influencia a reação de saponificação. Dessa forma, é preciso analisar até que ponto se deseja aumentar a concentração de biodiesel formado, pois esse aumento poderá vir acompanhado do crescimento de subprodutos indesejados, como exemplo, o sabão. O custo envolvido na obtenção de maiores concentrações de Ésteres quando acompanhados de um aumento nos subprodutos gerados, muitas vezes se tornam maiores do que quando se obtém menores quantidades do produto desejado e subprodutos, pois de fato a separação do produto final é um fator de grande influência no preço final do processo. 5. CONCLUSÕES É notória a relevância dos estudos em relação a melhorias e aperfeiçoamentos na produção do biodiesel, visto que, a demanda por combustíveis tem crescido significativamente. Simular como que alguns fatores influenciam na cinética reacional é um passo importante para a melhoria do processo, isto é, de que forma maximizar o produto de interesse comercial tendo em vista melhores condições operacionais e menor formação de produtos indesejáveis. Sendo assim, com os resultados obtidos, foi possível analisar alguns desses fatores e mostrar como eles afetam o rendimento da reação. 6. REFERÊNCIAS AGÊNCIA NATURAL DO PETRÓLEO, GÁS NATURAL E BIOCOMBUSTÍVEIS. Resolução n. 7, de 19 de março de 2008. DOU 20.3.2008. CAMPBELL, C.J. The Coming Oil Crisis. Essex, England: Multi-Science Publishing Company and Petroconsultants, S.A, 1997. DOMINGOS, A. K. Produção de biodiesel via catálise heterogênea. Tese submetida ao corpo docente do Programa de Pós-graduação em Tecnologia de Processos Químicos e Bioquímicos da Escola de Química da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, Rio de Janeiro, 2010. GALANTE, R. M. Modelagem e simulação de um reator tubular contínuo para a produção de biodiesel. Tese (doutorado) - Universidade Federal de Santa Catarina, Centro Tecnológico. Programa de Pós - Graduação em Engenharia Química. Florianópolis, SC, 2012. KOMERS, K.; SKOPAL, F.; STLOUKAL, R.; MACHEK, J. Kinetics and mechanism of the KOH – catalyzed methanolysis of rapeseed oil for biodiesel production Eur. J. Lipid Sci. Technol. 104 (2002) 728–737. TURNER, T. L. Modeling and Simulation of Reaction Kinetics for Biodiesel Production. A thesis submitted to the Graduate Faculty of North Carolina State University, Raleigh, NC, 2005.