Emmanuel Vitor Cleto Duarte - Sapientia

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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SÃO PAULO
PROGRAMA DE ESTUDOS DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS SOCIAIS
EMMANUEL VITOR CLETO DUARTE
PRODUÇÃO MUSICAL EM CONEXTOS "RESIDUAL/EMERGENTE" DE REDES:
MÓVEIS COLONIAIS DE ACAJU
Mestrado em Ciências Sociais
São Paulo
2014
EMMANUEL VITOR CLETO DUARTE
PRODUÇÃO MUSICAL EM CONTEXTO "RESIDUAL/EMERGENTE" DE REDES:
MÓVEIS COLONIAIS DE ACAJU
Dissertação apresentada à banca examinadora
como exigência parcial para obtenção do título
de MESTRE em Ciências Sociais pela
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,
sob a orientação da Prof. Dra. Silvia Helena
Simões Borelli.
São Paulo
2014
Banca Examinadora
_______________________________
________________________________
________________________________
AGRADECIMENTOS
Eu acredito que nenhum trabalho, nem mesmo obras de arte que dependem apenas
do trabalho solitário do artista, se constrói apenas com uma única pessoa. Essa dissertação não
seria uma exceção. Apesar de incansáveis horas no escritório, biblioteca ou cafés, esse é o
fruto direto ou indireto de várias pessoas que conviveram comigo ao longo desses últimos
anos.
Primeiramente agradeço a Professora Silvia Borelli, pela acolhida, toda a paciência e
dedicação no desenvolvimento desse trabalho e pelos cafés nos grupos de pesquisa que
participei, fundamentais para que eu chegasse até aqui. Aos professores Micael Herschmann e
Rosemary Segurado, presentes na banca de qualificação e que contribuiram imensamente com
a dissertação, muito obrigado pelo apoio.
Aos amigos da PUC-SP e outros acadêmicos que encontrei ao longo dos congressos
com quem pude tomar um café, cerveja ou vinho, obrigado pela convivência e existência
principalmente nos momentos de agonia. Aos outros amigos da vida offline e não acadêmica,
meu obrigado pelo apoio nesses últimos anos e principalmente pelos momentos de
descontração, longe da tela do Word.
À minha família, obrigado pelo apoio incondicional de sempre. Não fosse o apoio e
entendimento do meu pai e da minha madrasta não teria trilhado novos caminhos. A
compreensão e carinho foram absolutamente fundamentais. Não poderia ter pedido nada além
disso.
O último espaço da página é dedicado à pessoa que me tornou um sujeito melhor.
Ligia, agradecimentos nunca serão suficientes para quem me fez enxergar que era possível
uma vida melhor e mais saudável e é a minha parceira principalmente nos momentos onde a
lama chega até o nariz. Palavras descrevem de maneira parca o que você trouxe para a minha
vida. Mais do que obrigado, super ultra obrigado por tudo.
“Percebi que eu só quero pesquisar o que me dê
esperança. Porque pesquisar para me tornar mais
triste, mais pessimista, não serve para ninguém.
Temos que pesquisar não só o que permite
denunciar, mas o que permite transformar, mesmo
que seja numa medida muito pequena. [...]
O sujeito da comunicação não é o meio, mas
a relação. Importante não é o que diz o meio, mas
o que fazem as pessoas com o que diz o meio, com
o que elas veem, ouvem, leem”.
(Jesús Martín-Barbero)
He could have gone for general...but he went for
himself instead.
(Captain Willard - Apocalypse Now, 1979)
RESUMO
Esta dissertação de mestrado tem por objetivo avaliar como uma banda consegue obter legimidade e
sustentabilidade no mercado de música atual sem estar vinculada a nenhuma grande empresa,
utilizando-se de "formas residuais" do tradicional modelo das gravadoras e "formas emergentes" como
a cultura digital, a produção em redes e o contato direto com os consumidores e usuários. Para essa
avaliação, a banda da cena cultural de Brasília, Móveis Coloniais de Acaju foi selecionada como
estudo de caso e exemplo desse "emergente" e das estratégias "residuais" utilizadas pelos artistas,
atualmente, numa perspectiva de produtores culturais, produção de "materialidades", em uma cultura
de redes, que se ancora nas bases teóricas de Raymond Willams, Jesús Martin-Barbero, Nestor García
Canclini e Manuel Castells. Com mais de uma década de carreira como músicos brasileiros, a banda
reúne várias características e responde por um modelo de produção, divulgação e comercialização que
opera longe das grandes gravadoras e consegue se manter com significativa independência. Assim, a
trajetória da banda e suas principais estratégias de produção musical foram analisadas para entender
quais são as possibilidades dos artistas que operam fora do circuito das grandes gravadoras.
Destacam-se ainda autores que também fundamentam teórica conceitual e metodologicamente entre
eles: Herschmann, Janotti. Jr, Freire Filho e, na avaliação sobre a produção e o mercado de música;
Jenkins, Lévy e Castells na reflexão sobre cultura das redes, interações, participação, convergência
como o foco para a produção de formas e conteúdos na Internet; Recuero, Fragoso, e Amaral
colaboram com a metodologia/pesquisa de campo e na avaliação da produção da banda na Internet e
nas redes sociais. A metodologia assume a perspectiva não excludente referente à múltiplas relações
como online e offline; "dominante, residual e emergente"; mainstream (grandes gravadoras) e bandas
independentes; produção, circulação, apropriação e uso dos produtos culturais.A pesquisa foi realizada
ao redor de entrevistas, dados do mercado musical, artigos da imprensa tradicional e coleta da
produção da banda no site, blog e redes sociais ao longo de vinte meses.
O primeiro capítulo desse trabalho faz um balanço do mercado de música e suas principais alterações e
acontecimentos para avaliar o contexto no qual a banda se insere e traça um paralelo entre a "forma
dominante" das grandes gravadoras e o que surge como "forma emergente" de bandas independentes
que se articulam em redes. A indústria de música foi uma das primeiras a ser afetada por um
importante acontecimento: a criação da Internet. Produção e consumo musicais sofrem rápidas
transformações.
Posteriormente avaliou-se a história da banda desde a sua formação, a relação com a cidade de Brasília
e a sua cena musical e cultural, as raízes na Universidade e a articulação a com a rede de músicos
independentes com o intuito de compreender o desenvolvimento dos Móveis Coloniais de Acaju e o
contexto em qual atuam.
A terceira parte deste trabalho analisa a forma como a banda produz na Internet de maneira coletiva e
interagindo com os seus os fãs para compreender as estratégias de criação, distribuição e divulgação.
Foram avaliados o site, blog e redes sociais para levantar exemplos dos mecanismos usados que são
fundamentais para avaliar a "forma emergente" utilizando os Móveis Coloniais de Acaju como
exemplo.
Palavras chave: Jovens, redes, produção cultural, Internet.
ABSTRACT
This thesis has as its main objective to evaluate how a banda can achieve sustainability and
legitimation within the music market nowadays, without a link with a major company, using "residual
forms" from the tradicional companies' model, and "emergent forms" as the digital culture, the
network production and a direct contact with their users and consumers. For this analysis, Móveis
Coloniais de Acaju, a banda from the cultural scene of Brasilia was selected for a case study and an
exemple of this "emergent form", also and and exemple of the "residual" strategies used by the artists,
within the perspective of cultural producers, production of "materialities", inside a network culture,
supported by the theory of Raymond Wlliams, Jesús Martin-Barbero, and Manuel Castells. With more
than a decade as musicians in Brazil, the band gathers many characteristics and is able to answer for a
production, comercialization and distribution model that operates away from the major record
companies and is able do sustain themselves with significant independence. This way, the trajectory of
the band and its main strategies for music production were analysed to understand which are the
possibilities for artists that operate outside of the circuit of major record companies.
Also within the authors that give theoretical and conceptual foundations we can highlight:
Herschmann, Janotti. Jr, Freire Filho, within the evaluation of production and the musical market;
Jenkins, Lévy e Castells with the reflection about internet culture, interations, participation and
convergency as the focus for production in the Internet; Recuero, Fragoso, e Amaral colaborate ith the
metodology/field research and with the evaluation of the production within social networks and blogs.
The methodology assumes non excludend perspective or multiple relations such as online and offline;
"dominant, residual and emergent"; mainstream (major record companies) and independent artists;
production, circulationo, apropriation and use of cultural products. The field research was structured
with interviews, musicam market data, traditional press articles and the collection of the band's
production from the official site, blog and social networks withing twenty months.
The first chapter of the thesis does a music market balance and its main changes to evaluate the
context where the band is inserted and makes a paralel within the "dominant form"of the major
companies and what appears as an "emergent form" of independent bands that work as networks. Te
music industry was on of the first ones heavily impacted for the Internet creation and development.
Production and consumption were rapidly impacted.
The following section evaluates the band since its formation, their relation with the city of Brasilia and
its musical and cultural scene, their roots in the University and the way they articulate with the other
musicians as a network to answer for the context they appeared and how they develop in the music
market.
For the third chapter, the way that Móveis Coloniais de Acaju produce in the Intenet in a collective
way and interacting with the fans will be evaluated to understand the strategies for creating,
distributing and promoting their musical products. Site, blog and social networks (Youtube, Facebook
and Twitter) were evaluated to gather exemples of which mechanisms of this "emergent form" are
used by the band
Keywords: Youth, networks, cultural production, Internet
LISTA DE FIGURAS
Figura 1 - Show no Rock In Rio 2011 ...................................................................................... 25
Figura 2 - Faturamento das majors em US$ ............................................................................. 28
Figura 3 - Capa do LP da trilha sonora de Dancing Days ........................................................ 30
Figura 4 - Formatos de LP 45 e 33 rotações ............................................................................. 34
Figura 5 - produtor Carlos Miranda em estúdio com os Móveis .............................................. 35
Figura 6 - Fitas cassete de diversas marcas .............................................................................. 38
Figura 7 - Compact disc tradicional ......................................................................................... 40
Figura 8 - Página Inicial do Napster com a área de chat .......................................................... 57
Figura 9 - Aba de busca do Napster .......................................................................................... 58
Figura 10 - estrutura de redes P2P versus servidor dedicado ................................................... 59
Figura 11 - Tela de instalação do Emule................................................................................... 60
Figura 12 - Tela da Itunes, loja de música digital da Apple ..................................................... 61
Figura 13 - Apresentação da banda Boyce Avenue no European Music Awards ..................... 74
Figura 14 - clip de Funk Ostentação do Mc Guimê ................................................................. 74
Figura 15 - Rede de negócios do músico autônomo ................................................................. 75
Figura 16 - de Thrift Shop no Youtube. .................................................................................... 76
Figura 17 - Página da dupla Ryan Lewis & Macklemore com a equipe de trabalho ............... 76
Figura 18 - tirinha do site theoatmeal.com ............................................................................... 77
Figura 19 - tirinha do site theoatmeal.com ............................................................................... 78
Figura 20 - tirinha do site theoatmeal.com. .............................................................................. 78
Figura 21 - tirinha do site theoatmeal.com ............................................................................... 78
Figura 22 - Post no blog da banda após a ocupação do Congresso Nacional em
Junho de 2013 ........................................................................................................ 82
Figura 23 - Capa do disco da banda The Skatalites .................................................................. 85
Figura 24 - Capa do disco da banda The Specials .................................................................... 85
Figura 25 - com a banda The Mighty Mighty Bosstones ......................................................... 85
Figura 26 - Ensaio com a banda Móveis .................................................................................. 86
Figura 27 - EP Móveis 2001 ..................................................................................................... 93
Figura 28 - Capa do CD Idem, primeiro disco de estúdio da banda......................................... 96
Figura 29 - Flyer do festival Móveis Convida Mercado Musical em 18 de
Novembro de 2012 .............................................................................................. 106
Figura 30 - Segundo festival Móveis Convida em 11 de Março de 2005 .............................. 107
Figura 31 - Flyer do terceiro Móveis Convida convida com Ludov ...................................... 107
Figura 32 - Flyer do Móveis Convida, 4 em Novembro de 2006 ........................................... 108
Figura 33 - Flyer da quinta edição do Móveis convida .......................................................... 109
Figura 34 - Flyer da sexta edição do festival Móveis Convida .............................................. 109
Figura 35 - Capa do single Sem Palavras para download no projeto Trama Virtual .............. 110
Figura 36 - Flyer do sétimo festival Móveis Convida ............................................................ 111
Figura 37 - Flyer do oitavo festival Móveis Convida ............................................................. 112
Figura 38 - Foto dos ensaios para o disco C_mpl_te postada no blog da banda .................... 113
Figura 39 - Post no blog da banda com vídeo mostrando o processo de produção do
encarte do novo disco .......................................................................................... 113
Figura 40 - Bastidores das gravações do disco C_mpl_te com o produtor Carlos Miranda .. 113
Figura 41 - Flyer da Nona Edição do Móveis Convida .......................................................... 114
Figura 42 - Página do Álbum Virtual da Trama ..................................................................... 115
Figura 43 - Disco C_mpl_te em formato CD ......................................................................... 115
Figura 44 - Flyer do décimo festival Móveis Convida ........................................................... 117
Figura 45 - Homenagem ao cantor Raul Seixas no programa Som Livre da Rede Globo ..... 118
Figura 46 - Gravação do clipe Cheia de Manha, primeiro do álbum C_mpl_te..................... 120
Figura 47 - Capa da revista Gol especial sobre Brasília com a banda como representante da
cena musical Brasiliense ...................................................................................... 120
Figura 48 - EP Móveis em formato Compact Disc Slim ........................................................ 123
Figura 49 - Capa do EP Vai Thomaz no Acaju, parceria com Gabriel Thomaz, lançado
também em Vinil.................................................................................................. 123
Figura 50 - Post da pré-venda do DVD no blog ..................................................................... 124
Figura 51 - Os shows de 22 e 23 de Janeiro de 2010 marcaram a gravação do DVD ........... 124
Figura 52 - Gravação do clipe de seria o rolex postado no Youtube ...................................... 125
Figura 53 - Diário de viagem da banda para o show em São Paulo ....................................... 125
Figura 54 - Logo dos posts com diários de viagem da banda em vídeo no Youtube.............. 127
Figura 55 - Flyer do festival Pukkelpop 2008 com participação da banda ............................ 127
Figura 56 - EP Móveis e Bocato a venda na loja virtual da banda ......................................... 128
Figura 57 - Formatos do CD C_mpl_te disponíveis para venda na loja virtual da banda ...... 129
Figura 58 - foto de divulgação do álbum C_MPL_TE ........................................................... 129
Figura 59 - Premiação Multishow .......................................................................................... 130
Figura 60 - Música em parceiria com Leoni, ex Kid Abelha. Junho 2011 ............................. 130
Figura 61 - Flyer da atividade Móveis Ocupa ........................................................................ 132
Figura 62 - Logo do projeto Rotas Musicais 2013 ................................................................. 133
Figura 63 - Debate sobre Mercado Musical com a banda em São Paulo14/11/11 ................. 133
Figura 64 - Bate papo Fnac Brasília 22/05/2006 .................................................................... 133
Figura 65 - Site antigo da banda. Imagem de arquivo pessoal ............................................... 138
Figura 66 - Home page atual da banda ................................................................................... 139
Figura 67 - Post de Feliz Ano Novo, classificado como amor/geral no site da banda ........... 141
Figura 68 - Post classificado como imagem/geral. Foto do recém-nascido filho do
guitarrista ............................................................................................................. 142
Figura 69 - Exemplo de post de receitas do saxofonista Esdras ............................................. 142
Figura 70 - Gratite do grupo SNC, 16/10/2013 ...................................................................... 144
Figura 71 - Portal do clip colaborativo com os fãs ................................................................. 148
Figura 72 - Comunicação de uma das etapas para os fãs ....................................................... 149
Figura 73 - Comunicação de uma das etapas para os fãs ....................................................... 149
Figura 74 - Portal do concurso com os fãs junto com a Sadia Hot Pocket ............................. 150
Figura 75 - Vídeo da música com as serenatas para os premiados no Youtube ..................... 150
Figura 76 - Atividade de Crowdfunding para o festival Móveis Convida 10/05/2011 .......... 151
Figura 77 - Seção “Música” do site, com toda a discografia da banda .................................. 155
Figura 78 - Disco da banda disponível para streaming e download ....................................... 155
Figura 79 - Site da loja virtual da banda ................................................................................. 156
Figura 80: Postagem de Fan art .............................................................................................. 157
Figura 81 - Gráfico do % de postagens da banda no site ....................................................... 158
Figura 82 - Clipe da música “Dois Sorrisos”. ........................................................................ 159
Figura 83 - Clipe da música “Tempo” .................................................................................... 160
Figura 84 - Paulo imitando um meme em vídeo no Youtube ................................................. 160
Figura 85 - Clipe da música “Adeus” ..................................................................................... 161
Figura 86 - Clipe da música “Adeus” ..................................................................................... 161
Figura 87 - Agenda de eventos da banda no Facebook .......................................................... 163
Figura 88 - Post da banda utilizando a agenda de eventos do Facebook................................ 163
Figura 89 - Clip da música “Adeus” feito pela fã Maya Quirino ........................................... 164
Figura 90 - Compartilhamento de post de fã com piada sobre o vocalista e resposta ao
fã no mesmo post ................................................................................................. 165
Figura 91 - Piada com Coaracy e Borém ................................................................................ 165
Figura 92 - Twitcam do lançamento do clip “Livraria Cultura” ............................................. 167
Figura 93 - RT fã-clube .......................................................................................................... 167
Figura 94 - Respostas a fã sobre dúvidas de produtos vendidos na loja virtual e loja nos
shows ................................................................................................................... 167
Figura 95 - Café com o diretor do clipe no Twitter ................................................................ 168
Figura 96 - Foto de filho de integrante durante o ensaio no Twitter ...................................... 168
Figura 97 - Rede de negócios dos Móveis.............................................................................. 170
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 1 - Vendas de formatos no Brasil em unidades ........................................................... 37
Gráfico 2 - venda dos formatos no Brasil em unidades ............................................................ 40
Gráfico 3 - venda dos formatos no Brasil em unidades ............................................................ 41
Gráfico 4 - número de usuários da Internet no mundo em milhões ......................................... 48
Gráfico 5 - percentual de usuários da Internet no mundo em relação ao total da população ... 49
Gráfico 6 - percentual de usuários para cada 100 habitantes ................................................... 50
Gráfico 7 - Bilhões de dólares em Investimento de Infraestrutura pelas empresas de
telecomunicação .................................................................................................... 50
Gráfico 8 - percentual de usuários da Internet no mundo em relação ao total da população ... 52
Gráfico 9 - Percentual de usuários de banda larga por 100 habitantes ..................................... 53
Gráfico 10 - % do total de assinaturas de bandas larga em Março de 2013 ............................. 53
Gráfico 11 - Evolução do Facebook em relação ao Orkut no Brasil ........................................ 64
Gráfico 12 - mundial com shows ao vivo, em bilhões de dólares ............................................ 70
Gráfico 13 - Gráfico do % de postagens da banda no Youtube .............................................. 162
Gráfico 14 - Gráfico do % de postagens da banda no Facebook ............................................ 163
Gráfico 15 - Gráfico do % de postagens da banda no Twitter ................................................ 166
LISTA DE QUADROS
Quadro 1 - Evolução global das vendas dos formatos em unidades ........................................ 36
Quadro 2 - Velocidade mínima anunciada para banda larga - % de países .............................. 51
Quadro 3 - % de aumento no acesso da Internet via celular por faixa de renda....................... 54
Quadro 4 - Raning dos vídeos musicais mais visualizados no Youtube em 2013 .................... 56
Quadro 5 - tendências do processo atual em relação so Século XX......................................... 69
Quadro 6 - classificação das postagens no blog da banda. Elaboração própria. .................... 139
Quadro 7 - ranking dos vídeos mais vistos entre Out/10 e Maio/12 ...................................... 159
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ...................................................................................................................... 14
CAPÍTULO 1 - A FORMA "DOMINANTE" DAS GRAVADORAS E O
"EMERGENTE" DIGITAL .................................................................................................. 25
1.1 A consolidação das grandes gravadoras e a formação de um modelo "dominante" na
Indústria da música ............................................................................................................ 25
1.2 As crises da indústria de música durante as alterações das "materialidades", do LP até a
Internet ............................................................................................................................... 33
1.3 Redes, cibercultura e culturas digitais: a chegada da Internet, e novas possibilidades
para as "formas emergentes" .............................................................................................. 42
1.4 A "forma emergente" e as estratégias das majors. ............................................................. 66
CAPÍTULO 2 - MÓVEIS COLONIAIS DE ACAJU: BUSCA PELA AUTONOMIA E
INDEPENDÊNCIA MAS TAMBÉM POR TRADIÇÃO ................................................... 82
2.1 "Somos brasilienses". O início dos Móveis na cena brasiliense e a identificação com a
tradição musical da cidade ................................................................................................. 82
2.2 "Somos independentes". A formação dos Móveis nas bordas do mainstream. .................. 99
2.3 "Somos digitais", mas ainda lançamos Vinil, CD, DVD e somos reconhecidos pelas
nossas performances ao vivo. .......................................................................................... 121
2.4 "Somos protagonistas". Os Móveis pró-artistas independentes, cultura livre na
Internet e a atuação política da banda. ............................................................................. 131
CAPÍTULO 3 - WEBMASTERS, BLOGUEIROS, E PRODUTORES. ...............................
A ATUAÇÃO DA BANDA NA INTERNET ...................................................................... 138
3.1 Site, blog e loja dos Móveis ........................................................................................... 138
3.2 A atuação da banda nas redes sociais: um estudo das plataformas Youtube,
Facebook e Twitter ........................................................................................................... 156
CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................... 171
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................... 175
REFERÊNCIAS WEBGRÁFICAS .................................................................................... 178
14
INTRODUÇÃO
“O jazz é produto de seus músicos e cantores. O
executante é o centro desse mundo. É preciso,
portanto descobrir quem é esse homem [...]”.
Hobsbawm (1990)
A minha trajetória explica o meu ponto de partida neste trabalho. Estudei música
desde os cinco anos de idade e lembro, até hoje, da aula de iniciação musical tocando
triângulo ou coquinho, dos exercícios no piano e das aulas de canto no coral da escola. A
música sempre esteve presente na minha vida desde as mais precoces lembranças, mas, em
algum momento, o espaço ocupado pela música deu lugar à carreira no mundo corporativo
logo após o ingresso na graduação como Economista. Sendo assim, cada vez com menos
tempo para dedicar às atividades paralelas, o espaço da música na minha vida resumiu-se ao
de consumidor.
Consumindo música, foi assim que encontrei os Móveis Coloniais de Acaju1, que
tiram seu nome de um evento fictício que é contado no blog da banda.2. Já na época em que
uma das minhas poucas exigências para a vida era uma banda larga de boa qualidade para os
padrões brasileiros, recebi um e-mail de um amigo que tinha recebido de outro amigo um link
do Youtube com um videoclipe da banda. O comentário no corpo do e-mail dizia: “olha esses
caras, música boa, nove malucos no palco, tá tudo errado! E tem 10 anos de carreira, já
duraram muito no nosso mercado. Ouve que é bom.”
A necessidade de pesquisar veio com uma pergunta feita por um professor de bateria
da escola de música na qual ingressei alguns anos atrás: “mas se você é da área de Marketing
e toca, por que é que você não desenvolve um modelo pra gente que é artista independente?”.
Eu lembrei dos Móveis, perguntei se ele tinha um canal no Youtube e se disponibilizava a
música na Internet. Ele me olhou com uma grande interrogação no olhar e eu sabia que tinha
o tema de que teria que tratar.
O problema de investigação proposto nesta dissertação está assim formulado: 1)
baseado no pressuposto de que produção, distribuição, comercialização, apropriação e usos da
cultura em contextos digitais passam por profundas transformações; 2) considerando que a
banda Móveis Coloniais de Acaju produz música nesse contexto, algumas perguntas foram
formuladas em busca de respostas que constituem o percurso desse trabalho. Como se
1
2
Para efeito desta dissertação, será usado Móveis na denominação da banda
A banda descreve a Revolta do Acaju e a escolha do nome nos posts
http://moveiscoloniaisdeacaju.com.br/2006/02/o-que-foi-a-revolta-do-acaju/
http://moveiscoloniaisdeacaju.com.br/2009/04/release-da-banda-moveis-coloniais-de-acaju/
no
blog.
15
relacionam nesse contexto de transição e conflito as grandes gravadoras e produções
independentes? São excludentes entre si? É possível encontrar, em diferentes formas
culturais/produções musicais, elementos que permanecem como "dominantes"? Outros que
persistem como "resíduos" das formas tradicionais? Ou ainda, "formas emergentes" que
propõem alterações nestes processos de produção, distribuição, comercialização, apropriação
e usos da cultura? Que estratégias são adotadas pela banda para garantir legitimidade e
sustentabilidade, via redes sociais, sem recorrer aos mecanismos constitutivos do mainstream?
Ou seja, como manter a condição de "independentes"?
O objetivo geral deste trabalho é abordar as possibilidade de produção3 de artistas
independentes e inseridos num contexto de cultura digital atualmente no Brasil e utiliza o
Móveis como exemplo, num momento em que a "forma dominante" (Williams, 1979) das
grandes gravadoras segue em transformação, saindo do foco das vendas em fonogramas e
buscando novas estratégias. O conceito de independente no mercado musical é bastante amplo
e neste trabalho será usado para os artistas que não são contratados de uma das grandes
gravadoras, ou para as outras gravadoras que não as majors que serão detalhadas logo no
primeiro capítulo, da mesma maneira que Herschmann (2010) adota a demonicação de indies
para as gravadoras fora do circuito das majors. Brandini (2003) reforça que os termos
alternativo, underground e rock independente remetem para a música produzida sem recursos
provenientes de grandes companhias fonográficas ou de corporações transnacionais de
entretenimento. Como contraponto, o termo mainstream quando empregado será para a
música produzida por artistas contratados pelas grandes corporações. Embora esse trabalho
use o conceito de independente, não há a intenção de debate entre os conceitos de alternativo,
indie ou underground. No entanto, reconhece-se uma importância desta avaliação feita por
autores como Jeder Janotti, Micael Herschmann e João Freire Filho, entre outros. Esta
disertação em também como proposta avaliar quais elementos da "forma dominante" ainda
permanecer ativos, quais são "resíduos" e o como se caracterizam as "formas emergentes" seja
online ou offline e suas características de de produção, distribuição, comercialização,
apropriação e usos da cultura das redes.
A hipótese inicial é que, utilizando-se de características que podem ser lidas como da
cultura da Internet, propostas por Castells (2003 e 2010), da Cibercultura, de Lévy (1999), e
3
Ainda que, do ponto de vista teórico e de base epistemológica compreende-se os circuitos culturais
e comunicacionais como um conjuto articulado e conflituoso de relações entre produção,
divulgação, circulação, consumo, apropriação e usos, este trabalho foca na análise da perspectiva
da produção, divulgação e comercialização dos produtos musicais dos Móveis, inseridos em
contextos de redes sociais.
16
da cultura da convergência, de Jenkins (2008), além de mesclar características da "foma
dominante" "emergente" e "residual", conforme Williams (1979), a banda consegue se
consolidar no mercado de música nacional num modelo que apesar de . A pergunta de
pesquisa a que se pretende responder é: como e usando quais ferramentas a banda consegue
ter uma carreira estável no mercado nacional? A intenção deste trabalho é, também, deixar
recomendações aos artistas independentes para a viabilização de suas carreiras no mercado
brasileiro, que, hoje, oferece possibilidades como as leis de incentivo públicas e outras
iniciativas privadas.4
O quadro de referências teóricas propõe em primeira instânca o diálogo com
Raymond Wiliams toamando por base categorias analíticas adequadas para a análise da
produção e das "materialidades", relação entre "dominante", "emergente" e "residual",
inserido num contexto histórico.
Um outro tipo familiar de história é a história social de "audiências" e públicos:
novamente contendo detalhes indispensáveis, mas usualmente tomados dentro de
uma perspectiva do "consumo" que é incapaz de desenvolver as relações sempre
significativas e por vezes decisivas, entre os modos de consumo, que também são,
em geral, formas de uma organização social mais ampla, e os modos específicos de
produção, que são o mesmo tempo tecnológicos e sociais. (Wiliams, 2012:74.)
Deveria ser também possível levantar as questões principais sobre as relações desses
modos produtivos mais gerais, com tipos diferentes de ordens sociais (que em nosso
período são cruciais entre as questões básicas das habilidades, da capitalização e do
controle (Williams, 2012:75)
Castells (2003, 2010) é fundamental para avaliar a Internet no formato em que
conhecemos hoje, como world wide web. A Internet tem, aproximadamente, vinte anos de
existência e, nesse tempo, aliada à popularização dos microcomputadores através do globo,
está é parte das aterações da maneira de viver em sociedade, os modos de produção, a cultura;
e as transformações estão apenas no começo, conforme avaliado também por Jenkins (2008).
A rede mundial de computadores reinventa, diariamente, as relações entre usuários,
oferecendo novas plataformas sociais, conforme o conceito de cibercultura de Lévy (1999).
Plataformas como o Youtube, Facebook, Twitter e Instagram dão espaço para a
interação entre milhões de pessoas no mundo todo e começam a alterar a produção cultural e
sua relação com os meios midiáticos. Anteriormente, a relação do consumidor com os meios
de comunicação de massa era quase unilateral e feita de “um” para “muitos”, como o que
acontece com a televisão, rádio e revistas. As novas plataformas possibilitam a comunicação
4
A importância das políticas públicas para os produtos culturais tem sido objeto de estudo do grupo de
pesquisa “Jovens Urbanos” (Departamento de Antropologia – Programa de Estudos Pós-graduados em
Ciências Sociais / Faculdade de Ciências Sociais - PUCSP) desde 2002. Mais informações em
http://www.pucsp.br/projetojovensurbanos/quemsomos/index.html
17
de muitos para muitos e começam a alterar a relação entre meios de produção e consumidores,
e, nesse contexto, encontra-se a relação entre músico e usuário. Os meios passam a coexistir e
convergir (Jenkins, 2008), embora grandes conglomerados hegemônicos, como a TV Globo,
passem a ser afetados pela popularização das redes sociais (Borelli, 2011). Há um formato
que emerge (Williams, 1979) das brechas possibilitadas pela Cibercultura.
O músico, que antes tinha alta dependência das gravadoras para alcançar seu público,
hoje, pode gravar, produzir e comercializar seu produto em contato direto com o consumidor.
As gravadoras começam a ver a necessidade de se adaptar a essa nova realidade, enquanto o
consumidor deixa de visitar o varejo tradicional, consome o MP3 e encontra-se com seus
artistas diretamente no Youtube.Adota-se, numa perspectiva epistemológica deste trabalho,
um espaço de constituição de uma "forma emergente" (Williams, 1979) que utiliza elementos
novos, porém, não nega algumas características da "forma dominante", havendo um espaço
para a mescla de estratégias e tendências dos produtos culturais, sem necessidade de
substituição de um modelo pelo outro.
Para avaliação das mudanças no mercado será utilizado nesse trabalho o conceito de
forma de Williams e serão descritas como formas "emergentes", "residuais" ou "dominantes"
[...] o conceito de forma contém uma ambigüidade signifi cativa [...] uma confi
guração visível ou exterior e um impulso configurativo inerente [...] a forma é uma
relação [...] depende de sua percepção tanto quanto de sua criação [...] é sempre um
processo social que se converte em produto social. As formas são propriedade
comum, com diferenças de grau, de escritores e audiências ou leitores antes que se
possa ter qualquer tipo de composição comunicativa [...] Em suas formas acessíveis
são criadas e recriadas dentro de tradições culturais específicas que certamente
podem ser difundidas e tomadas de empréstimo. (Wlliams, 1997:213-215)
Este modelo emergente é permeado por uma mudança na "estrutura de sentimentos"
(Williams, 1979) que abre espaço para uma produção em rede, coletiva, fora das grandes
empresas produtoras de bens culturais e com suporte em várias plataformas da Internet e fora
dela.
Segundo Castells, há uma série de transformações impulsionadas por essa "estrutura
de sentimentos" (Wiliams, 1979) que tem se alterado e contribui com a formação da Internet:
[...] a estrutura ocupacional das nossas sociedades foi realmente transformada pelas
novas tecnologias. Porém os processos e formas dessa transformação foram o
resultado da interação entre mudança tecnológica, ambiente institucional e evolução
das relações entre capital e trabalho em cada contexto social específico. (Castells,
2010:85)
18
Neste contexto, o mercado de música é um dos grandes exemplos, pois vem sofrendo
transformações em cada alteração das materialidades5 e, posteriormente, com o aumento da
pirataria e o aparecimento do compartilhamento de arquivos na rede mundial de
computadores. Herschmann (2010) faz uma leitura da razão pela qual a música traz um bom
recorte para avaliação dessas transformações nas indústrias culturais
Há alguns anos assiste-se a um processo de transição da indústria da música
em quase todo o globo. Presenciam-se mudanças significativas na estrutura
da sua cadeia produtiva: dentre as muitas alterações, constatamos, com
grande perplexidade, por exemplo, a “resistência” dos consumidores em
pagar pelos fonogramas; a redução do cast de artistas e do quadro de
funcionários das grandes empresas; a crise da noção de álbum, que vai deixando de
ser o objetivo central dessa indústria ou a mercadoria mais valorizada de produção e
consumo; o desaparecimento de antigas funções no setor e, ao mesmo tempo, o
surgimento de novas profissões que empregam, especialmente as novas tecnologias.
Em virtude de certo ineditismo e relevância dessas mudanças, poder-se-ia dizer que
a indústria da música, no início do século XXI, constitui-se – de uma certa maneira
– em uma espécie de “laboratório “ para observar as transformações que já começam
a afetar os diferentes setores das indústrias culturais. (Herschmann, 2010:11)
Para Jesús Martin-Barbero (2009) 6 , estudar comunicação é estudar os meios e as
mediações e não somente a transmissão de mensagens; os produtos culturais carregam em si
muito do contexto no qual estão inseridos e no qual serão inseridos. O mesmo MartinBarbero traz o conceito de “tecnicidade”, também fundamental para a avaliação proposta ao
relacionar tecnologia, cultura e comunicação e suas articulações entre produção, narrativas e
recepção:
Tecnicidade não é algo que se possa conceber a partir da redutora noção de
instrumento: trata-se de reorganizações perceptivas e competências de linguagem.
Para além da noção de aparatos (maquinais ou ideológicos) de domínio da
natureza/sociedade, a tecnicidade remete-se, hoje, à comunicação do mundo como
imagem. A discursividade constitutiva da visibilidade permite a emergência de uma
nova “figura de razão”: mediação cognitiva de uma nova mescla cérebro/informação
e de um novo cenário da “batalha das imagens”. Se já não se escreve ou se lê como
antes é porque tampouco se pode ver ou representar como antes (Martin-Barbero,
20007).
Fragoso, Recuero e Amaral (2011) lembram, que avaliar as capacidades de
comunicacão ativa presentes na Internet é uma categoria fundamental para análise. As autoras
também trazem uma perspectiva adotada nesse trabalho, a da Internet como "artefato cultural"
e retomam a perspectiva de Raymond Wiliams sobre o contexto histórico.
5
6
7
As alterações das materialidades como LPs, K7s, CDs e os arquivos digitais como MP3 e seusmpactos na
indústria musical serão tema do primeiro capítulo
Jesus Martin-Barbero, em Aula Magna, 17 de agosto de 2009, na instalação do Fórum Permanente dos
programas de pós-graduação em comunicação do Estado de São Paulo. Publicada no site da FAPESP.
Curso realizado na PUC-SP de 9 à 11 de Junho de 2000
19
A perspactiva da Internet como arfetato cultural observa a inserção da tecnologia na
vida cotidiana. Assim favorece a percepção da rede como um elemento da cultura e
não como um elemento da cultura e não como uma entidade à parte[...] (2011:42.)
Os estudos cujas abordagens enfatizam o aspecto de artefato cultural tendem a
observar questoes acerca dos discursos sobre a Internet, como, por exemplo, os
discursos libertários acerca da natureza anárquica e da atitude contracultural dos
hackers e cyberpunks do início da rede, como em Lemos (2002), Amaral (2006) ou
Turner (2006) e os processos de produção de produção e consumo na construção dos
seus usos sociais. A noção de Internet como arfetao cultural oportuniza o
entendimento do objeto como um local intersticial no qual as fronteiras entre online
e offline são fluidas e ambos interatual.
As práticas de produção econsumo de conteúdo dos usuários acabam oportunizando
um amplo recorte de análise. [...] sob a noção antevista por Raymond Williams
(1974), de que as tecnologias são sempre produzidas por um processo histórico e em
um sistema social, como uma "articulação ou aparato" (2011: 42- 43).
A metodologia asume a perspectiva não excludente referente à múltiplas relações
como online e offline; "dominante, residual e emergente"; mainstream (grandes gravadoras) e
bandas independentes; produção, circulação, apropriação e uso dos produtos culturais. A
metodologia de pesquisa utilizada nessa avaliação apresenta-se em dois eixos. Um deles
acompanha as atividades da banda offline (fora da Internet), e visa entender como os Móveis
se articulam no mercado, o processo de produção das "materialidades", como se
desenvolveram através dos anos e se relacionam com as instituições e demais artistas. Para
essa avaliação da trajetória dos Móveis fora da rede, foi feita uma entrevista com a banda em
14/12/2011, exclusivamente para este trabalho, na qual os músicos contaram a sua história,
como se formaram, o papel das ferramentas como a Internet e as redes socais para a banda e
as estratégias para seguirem independentes e sustentáveis dentro do mercado brasileiro. Além
da entrevista,o blog dos Móveis também foi usado para buscar depoimentos dos músicos
sobre o mercado, eventos como shows ao vivo e momentos das gravações dos discos, além
de notícias e depoimentos na Imprensa tradicional. O blog foi visitado constantemente nos
anos de 2010, 2011, 2012, 2013 e 2014.
O segundo eixo da metodologia analisa a produção da banda na Internet (online) e
para tal foi desenvolvido um planejamento para captar todo o conteúdo publicado pela banda
em seu site (www.moveiscoloniaisdeacaju.com.br) e nas canais oficais das redes sociais
Youtube, Facebook e Twitter. Vale reiterar como já citado anteriormente, que o objetivo de
estudo dessa pesquisa é a produção da banda nas redes sociais e não a recepção de seus fãs.
Não há a intenção nesta avaliação de se entender a produção ou interação do fã com a banda,
portanto não serão avaliadas as manifestações ou recepção nas "comunidades virtuais"
(Lévy,1999) ou as interações destes com os Móveis. Os exemplos de atividades são utilizados
apenas para ilustrar as possibilidades abertas pela banda na sua produção na Intenet e redes
20
sociais. A perspectiva da recepção dos fãs, pode ser encontrada nas análises do grupo de
pesquisa do Obitel Brasil8.
A principal preocupação nesta avaliação da produção online foi a montagem de uma
amostra quantitativa consistente pois, ao se trabalhar com o Twitter, o número de posts
costuma ser muito maior do que no Facebook ou no Youtube, sendo necessário fazer a coleta
dos dados de uma forma automatizada. A partir daí, com a base desta primeira rede social
definida, a amostra das outras plataformas foi feita com o mesmo período da amostra do
Twitter para uma base comparável em termos de período de produção nas redes e no site.
Assim, foram testadas diversas plataformas de automatização e arquivamento de postagens
nas redes sociais9 e a ferramenta escolhida foi o Snapbird10 por ser fácil de operar e gratuita.
A plataforma permite a busca na timeline11de um usuário até um limite de 3000 tweets12.
Como o campo foi feito no dia 31 de maio de 2012, os tweets cobriram todas as postagens da
banda desde Outubro de 2010, num total de 20 meses.
Para o Facebook e Youtube, a base do que foi produzido pela banda no período de
Outubro de 2010 até o Maio de 2012 foi construída através da plataforma Scup13. A escolha
pela ferramenta foi baseada pelas indicações de alguns profissionais que trabalham com o
monitoramento de redes sociais, pelo fato da plataforma oferecer um treinamento online
gratuito e pelo pagamento que pode ser feito conforme o uso por mês, sem haver necessidade
de contratação anual. Na época o Scup também oferecia dois meses gratuitos para estudantes
universitários ou de pós graduação,possibilidade que já não existe mais. Atualmente há um
período de teste gratuito de 7 dias ou pode se assinar pelo plano básico mensal ao custo de
R$ 380,00.
A ferramenta monitora o usuário escolhido e recolhe numa base tudo o que é
produzido num período determinado. Sendo assim, todas as postagens feitas pela banda no
Youtube e no Facebook foram coletadas para o período escolhido.
8
9
10
11
12
13
OBSERVATÓRIO
IBERO-AMERICANO
DE
FICÇÃO
TELEVISIVA.
Disponível
em:
<http://obitelbrasil.blogspot.com.br>.
Para maiores informações sobre diferentes plataformas e funcionalidades consultar a dissertação de Silva
(2012). Disponível em:
<https://repositorio.ufba.br/ri/bitstream/ri/6044/1/Tarc%C3%ADzioRobertodaSilva.pdf>. Acesso em: 24 fev.
2014.
SNAP BIRD. Disponível em: <http://snapbird.org>.
Termo em inglês para linha do tempo, que é o local onde ficam as postagens das redes sociais Twitter e
Facebook, organizados em uma linha temporal descendente, começando da postagem mais recente e indo
para as mais antigas
Termo em inglês para a postagem na rede social Twitter
SCUP. Disponível em: <www.scup.com.br>.
21
Para o site da banda usou-se o programa HTtrack Website Copier14. O programa que
é gratuito possibilita que uma página completa possa ser armazenada integralmente para
visualização offline e guarda a página completa no momento em que é feito o download. Para
o site da banda, que tem formato de blog, como veremos posteriormente nessa análise, foi
armazenada a página do dia 31 de Maio de 2012 e o programa buscou até a primeira postagem.
em 03de Fevereiro de 2003. Para montar a base com a amostra do mesmo período, exportouse o conteúdo do download para uma planilha em excel onde expurgou-se as postagens
anteriores a Outubro de 2010.
O mesmo foi feito para as bases colhidas no Snapbird e no Scup, onde todas as
postagens de Outubro de 2010 até Maio de 2012 foram exportadas para uma base em excel. A
partir daí foi feita uma classificação das postagens em categorias e a análise numérica desse
conteúdo para verificar as características da produção da bandana Intenet e Redes Sociais. O
conteúdo qualitativo para avaliar os tipos de atividades da banda foi escolhido dentre essa
base e serão citados exemplos para explicitar a análise.
Dentre os métodos apresentados por Fragoso, Recuero e Amaral (2011), o Website15
e as redes sociais da banda serão avaliados numa Etnografia, Estudo de caso e análise de
conteúdo. As autoras trazem a noção de etnogtrafia de Angrosino (2009) como "a arte e a
ciência de descrever um grupo humano - suas instituições, seus comportamentos interpessoais,
suas produções materiais e suas crenças" (Angrosino, 2009, p. 30) que vai de encontro à
proposta desse trabalho seja na parte online quanto no offiline.
Essa análise está embasada em alguns pressupostos para a pesquisa em Intenet
enumerados por Fragoso, Recuero e Amaral (2011) que são:
1) Manter a pesquisa sobre Internet contextualizada dentro das tradições de pesquisa
de mídia e tecnologia que transpasse a Internet (Baym, 2005, p. 232) [...] 2)abordar
o objeto Internet responsavelmente, através de perguntas chave que deixam a mostra
questões relativas ao poder e à condição humana; 3)"empenhar-se em observar
quadros maiores do que aqueles relevantes a nossas condições locais; [...] 4) manter
o diálogo e a troca mútua com outras disciplinas e tradições de pesquisa.
O primeiro capítulo fará um balanço histórico do mercado, passando pelo início dos
festivais, como Montreux e Woodstock, até a popularização do LP, formato que viria a
dominar o mercado de música por muitos anos até a chegada do CD. Após a consolidação do
CD como formato líder, a pirataria começou a tomar conta do mercado e assim iniciou um
período de turbulência na dominância das grandes gravadoras. Será avaliado também a
14
15
HTTRACK Website Copier. Disponível para download em: <http://www.httrack.com>.
Página na Internet. Poderão ser usados também os termos site e home page
22
construção de uma "forma dominante" das grandes gravadoras, as estratégias para a
consolidação desse modelo como a venda de fonogramas, a montagem de uma estrutura de
suporte e produção dentro das grandes empresas, com produtores, empresários e seus papéis e
como as grande gravadora se reconfiguram para enfrentar as alterações das "materialidades"
(Williams, 1979) na passagens de LPs para K7s, depois para os CDs e chegando até aos
formatos digitais como o MP3 e streaming.
É fundamental na perspectiva de Raymond Williams o estudo da alteração das
materialidades, no caso do mercado de música, a mudança de cada suporte tecnológico. Na
passagem de LPs par a p CD e atualmente nos formatos digitais há uma mudança nos modos
produtivos e na experiênca dos produtores e consumidores. Para o autor:
A materialidade inevitável das obras de arte é, então, a materialização insubstituível
de tipos de experiência, inclusive a experiência na produção de objetos, que, a partir
de nossa mais profunda sociabilidade, vão além não só da produção de mercadorias,
mas também de nossa experiência comum dos objetos. (Wiliams, 1979:12)
Ao mesmo tempo e, além disso, a produção cultural material tem a história social
específica. Grande parte da evidente crise da “literatura”, na segunda metade do século XX,
resulta das modificações de processos e relações na produção material básica. Não quero
dizer apenas as radicais modificações materiais na impressão e publicação, embora estas
tenham efeitos diretos. Quero dizer também o desenvolvimento de novas formas materiais de
dramatização e narrativa, nas tecnologias específicas do cinema, do rádio e da televisão,
envolvendo não só
novos processos materiais intrínsecos, que nas tecnologias mais
complexas trazem conseguem
novos problemas de notação e realização material, mas
também novas relações de trabalho de que dependem as tecnologias complexas.(1979 pg. 162
O declínio iniciado com a pirataria de CDs, especialmente no mercado nacional, foi
acentuado com a chegada da Internet e do MP3. Essa transição é fundamental para esta
avaliação e, assim, a Internet será analisada desde a sua criação, com a Arpanet, até a chegada
das rede sociais e seu impacto na produção e nos contato com os fãs e a cultura digital. Os
novos formatos de promoção dos artistas dentro das grandes gravadoras assim como os
independentes baseados nas apresentações ao vivo também serão foco deste primeiro capítulo.
Um modelo "emergente" de artistas que se aproveitam da cultura da Internet (Castells, 2010)
e são permeados por uma mudança na "estrutura de sentimentos" (Williams, 1979) com
artistas/empresa que se organizam em rede também será foco deste capítulo. A transição do
mercado de música e seu processo histórico, utiliza a base teórica com suporte em Edgar
Morin (1969) Keith Negus (2002), Chapple e Garofalo (1989), Renato Ortiz (1998), André
23
Midani (2008), Micael Herschmann (2010,2011), Jeder Janotti (2003), Silvia Borelli (2011),
Mariana Lima (2009), Michel Netto (2007) Leonardo De Marchi (2011) e Eduardo Vicente
(2002) , referindo-se as passagens dos diversos modelos do mercado de música enquanto
produtor de bens culturais.
O segundo capítulo irá abordar a trajetória dos Móveis Coloniais de Acaju e a
consolidação da banda no mercado musical brasileiro desde o seu início, em 1998, quando os
amigos do colégio se juntaram para fazer música. As influências da cidade de Brasília e da
universidade na banda, assim como os precursores dos Móveis abrem esse capítulo. Na
sequência, será avaliada a atuação da banda em diversos eixos, como um exemplo de banda
independente que consolida a carreira no país. Os Móveis são agentes culturais, além de
músicos, e produzem o próprio festival independente em Brasília, movimentando a cena
musical da cidade. A banda tem, ainda, sua própria loja virtual com produtos desenvolvidos
pelos próprios músicos, faz contatos diretamente com a imprensa tradicional, mesmo sendo
defensora do contato direto com o fã e tem atuação política em esfera municipal e nacional.
Sendo assim, os Móveis Coloniais de Acaju funcionam como um modelo de diversas
estratégias que podem ser empregadas por bandas independentes. Straw (1991) e Janotti Jr.
(2006) fundamentam o papel da banda na cena Brasiliense, independente e cultural.
A terceira parte desta dissertação irá tratar da produção da banda na Internet e da
forma como os Móveis Coloniais de Acaju se comunicam com os fãs e produzem junto com
os mesmos. Serão avaliados o site da banda, o blog e as redes sociais Youtube, Facebook e
Twitter para identificar quais são as interações feitas com os fãs, de que maneira e em quais
plataformas elas acontecem, principais diferenças e identificar as principais estratégias da
banda num cenário em que a Internet ganha um número cada vez maior de usuários 16 .
Recuero (2009), Fragoso, Recuero e Amaral (2011) dão suporte teórico à avaliação na
Internet e redes sociais como Twitter, Facebook e Youtube. e nesse contexto de produção de
bens culturais na rede, Anderson (2006) e Negri e Hardt (2001) são também fundamentais na
descricão dos possíveis nichos e segmentação de mercado e produção de um "comum" onde
os artistas e consumidores se encontram.
Encerrando, reforço que ainda há uma grande fatia de mercado a ser conquistado
dentro do país – pois metade da população não consome nenhum tipo de apresentação de
música ao vivo 17, um dos formatos importantes para a arrecadação de receitas para os artistas
–, o potencial para crescimento desse mercado parece longe de ter alcançado seu máximo,
16
17
Diversas pesquisas como as da Comscore e Ibope indicam até 80% dos brasileiros conectados a Internet
Pesquisa DataSenado 2011
24
independente do gênero musical. Além dos Móveis Coloniais de Acaju, outros artistas do
chamado Tecnobrega18 ou do Funk de ostentação capitaneado pelo produtor Kondzilla19 tem
conseguido carreiras estáveis longe do modelo "dominante" das grandes gravadoras.
18
19
Gênero musical que tem início do estado do Pará e é um dos modelos independentes das grandes gravadoras
que tem sucesso no país
O produtor Kondzilla tem um documentário disponível no Youtube contando o crescimento do Funk de
ostentação fora do formato das grandes gravadoras. Disponível em: <http://youtu.be/UI4U-kZ_UJg>.
25
CAPÍTULO 1
A FORMA "DOMINANTE" DAS GRAVADORAS E O "EMERGENTE" DIGITAL
E se fosse pra ter medo dessa estrada
Eu não estaria há tanto tempo nessa caminhada
Artista independente leva no peito a responsa, tiozão
E não vem dizer que não
(Lion Man – Criolo)
1.1 A consolidação das grandes gravadoras e a formação de um modelo "dominante" na
Indústria da música
O Móveis Coloniais de Acaju se apresentou na edição de 2011 do Rock In Rio, no
palco Sunset. O festival é um dos grandes acontecimentos20 da música brasileira, com sua
primeira edição em 1985, trazendo naquele ano atrações como AC/DC, Iron Maiden, Ozzy
Osbourne, Queen e os brasileiros Gilberto Gil, Paralamas do Sucesso e Barão Vermelho. O
evento é uma idealização do empresário Roberto Medina, e em 1991 teve a sua segunda
edição no Rio de Janeiro, com um público que foi recorde na época, sendo registrado no livro
Guinness Book of Records, com os noruegueses do A-HA, que tocaram para 198 mil pessoas.
O festival ainda teria uma terceira edição em 2001, com um público total de 1.235.000
pessoas em 7 dias, antes se internacionalizar, indo para Lisboa em 2004, com atrações como
Metallica, Paul McCartney, Foo Fighters, Kings of Leon e Incubus.
Figura 1 - Show no Rock In Rio 2011
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
Os festivais, como outras formas de apresentações dos artistas ao vivo, são um dos
emergentes (Williams, 1979) do mercado de música que vem enfrentando diversas alterações
20
A categoria de acontecimentos está descrita em Certeau, Michel de (1994).
26
com o passar dos anos. O festivais, antes relegados a segundo plano na estratégia das grandes
gravadoras, como veremos mais a frente, tomam novo significado e passam a ser um dos
maiores geradores de receita tanto para grandes gravadoras quanto para artistas independentes.
Por “residual” quero dizer que algumas experiências, significados e valores que não
podem ser verificados ou não podem ser expressos nos termos da cultura dominante
são, todavia, vividos e praticados como resíduos – tanto culturais como sociais – de
formações sociais anteriores. [...] Por “emergente” quero dizer, primeiramente, que
novos significados e valores, novas práticas, novos sentidos e experiências estão
sendo continuamente criados. (Williams, 2011b:56-57)
As alterações no mercado de música serão descritas neste capítulo, em âmbito
mundial e nacional, num processo de produção que tem alterado as suas materialidades 21
(Williams,1979) e, consequentemente, consumo e produção, chegando até o momento onde a
cultura digital impacta a música no mundo todo, dos discos de vinil para o formato MP3 e as
redes sociais, e durante essas etapas, toda a formação de um mercado, como os seus agentes
alterando como propões Wiliams a produção cultural destes períodos. O mercado musical
vem passando por diversas alterações desde a consolidação das majors22, como são chamadas
as maiores gravadoras do mercado musical que atuam globalmente. O processo de
estruturação dessas empresas nos anos 1980 leva o mercado a três grandes companhias que
controlam 80% da produção e distribuição de música em âmbito global: Sony/BMG,
Universal/EMI e Warner. Ortiz (1998) já relata a presença dessas companhias desde 1910 em
vários países do mundo, incluindo o Brasil. Entender a formação dessas empresas é parte da
compreensão da formação desse modelo "dominante" ao longo dos anos e dos impactos da
cultura digital como descrita por Castells (2003) num possível "emergente".
A avaliação do modelo "dominante" numa perspectiva histórica é fundamental para
Raymond Williams, que rege a base teórica deste trabalho. Há que se avaliar as relações
sociais e de produção, as práticas culturais, entre outros aspectos, possibilitando assim
identificar também as práticas "residuais" e "emergentes".
Uma característica distintiva e comparativa de qualquer ordem social dominante é
até que ponto chega a toda gama de práticas e experiências, numa tentativa de
incorporação. Pode haver áreas de experiência que se dispõe a ignorar ou dispensar;
considerar como privado, ou especializar como estático, ou generalizar como
natural. Além do mais, assim a ordem social se modifica, em termos de suas próprias
necessidades de desenvolvimento, também essas relações são variáveis. Assim, no
capitalismo avançado, devido às modificações no caráter social do trabalho, no
caráter social das comunicações, e no caráter social da tomada de decisão, a cultura
21
22
O conceito já foi explicitado na introdução deste trabalho.
Multinacionais que ocupam um lugar dominante no mercado fonográfico mundial e, hoje, são
em número de três: Sony/BMG, Universal/EMI e Warner.
27
dominante vai muito além do que ia à sociedade capitalista, chegando a áreas de
experiência, prática e significado até então “reservadas” ou “resignadas”.
A área de penetração efetiva da ordem dominante em todo o processo social e cultural
é, assim, agora significativamente maior. Isso, por sua vez, torna o problema do
aparecimento especialmente agudo, e estreita a distância entre elementos alternativos e
opostos. A alternativa, especialmente em áreas ligadas a áreas significativas do
dominante, é considerado com freqüência como uma oposição e, por pressão,
transforma-se por vezes nessa oposição. Mesmo aqui, porém, pode haver esferas de
prática e significado que, quase que por definição de seu próprio caráter limitado, ou
de sua deformação profunda, a cultura dominante é incapaz, em quaisquer termos
reais, de reconhecer. Elementos do aparecimento podem, na verdade, estar
incorporados, mas com idêntica freqüência as formas incorporadas são simplesmente
fac-símiles da prática cultural autenticamente emergente. Qualquer aparecimento
significativo, além ou contra o modo dominante, é muito difícil, nessas condições, seja
em si mesmo, ou na repetida confusão com os fac-símiles e novidades da fase
incorporada. Não obstante, em nosso próprio período como em outros, o fato da
prática cultural emergente é ainda inegável, e juntamente com o fato a prática residual,
uma complicação necessária da pretensa cultura dominante. (Williams, 1979:128-129)
Se fora do Brasil, com início nos EUA, o processo de constituição de um
"dominante" no mercado de música se dá início na década de 60, com um amplo processo de
fusões descrito abaixo, Ortiz (1988) lembra que no mercado nacional esse processo se inicia
na década de 70, com a consolidação de um mercado de bens nacionais apoiado pelo governo
diatorial daquele período.
O processo de concentração das majors pode se dar de forma horizontal ou vertical,
como descrito por Lima (2009). A horizontalização se dá quando companhias de gravação
compram outras companhias ou formam sociedades, como foi o caso da Warner-Reprise, que
comprou a Atlantic e a Elektra. As fusões verticais são as que integram diferentes partes da
indústria, comprando distribuidores ou varejistas, como a ABC-Paramount e a Capitol em
1968, que compraram complexos de distribuição e varejo de diversas companhias que
cobriam diferentes regiões nos Estados Unidos. Há também as “fusões entre conglomerados”,
as mais importantes nos anos 1960, em que grandes companhias incorporaram outras,
dedicadas a negócios que não necessariamente possuem relações mútuas, permanecendo
reunidas numa só unidade de financiamento e gestão, como é o caso da Sony. O processo de
fusões e aquisições formou as três grandes companhias que atualmente dominam o mercado.
Definir o funcionamento dessas empresas é fundamental para compreender a lógica que
domina o mercado de música no mundo, que ainda é controlado por essas companhias, pois,
embora tenhamos novas alternativas, como esse trabalho pretende mostrar, este ainda é o
modelo "dominante".
28
As três majors globais e seus respectivos faturamentos são:
Figura 2 - Faturamento das majors em US$
Faturamento de 2013 das gravadoras em Bilhões de US$
2,87
4,69
11,6
Fonte: Transnationale.
A Warner Music vem da Warner Brothers, empresa responsável pelos filmes falados,
em circulação desde o início do século XX. Em 1958, inicia a divisão de discos da Warner,
com a intenção de ser o segundo grande produto da empresa, com grande suporte no rock,
gênero que crescia nos EUA. Dando sequência ao foco da companhia na expansão do negócio
de discos, a Warner adquiriu importantes gravadoras, como a Atlantic, a Elektra e a Asylum, e
em 1973 a divisão musical do grupo já representava 43% das vendas totais e 46% dos lucros
totais da companhia. De acordo com Chapple e Garofalo (1989), a “Warner Communications
aprendeu, a fazer da cultura pop uma mercadoria”. Em 2003, a divisão musical da Warner foi
vendida para um grupo que esteve na origem da incorporação da MCA (Movie Corporation of
America) à Universal e da Polygram à Seagram – indústria de bebidas canadense.
A Sony Music Entertainment é uma divisão da Japanese Sony Corporation, fundada
originalmente como Tokyo Telecommunication Engineering, em 1946. Em 1988, adquiriu a
CBS Records, e a Columbia Tri-Star Pictures em 1989. Em 1995, o novo presidente reduziu o
grau de autonomia financeira e orçamentária das divisões de música e filmes e, pela primeira
vez, a companhia conseguia a posição de vice-liderança no mercado americano, contando
com artistas como Gloria Estefan e Michael Jackson. Em 2008, após cinco anos de fusão com
a BMG, a Sony compra esta última e passa a ocupar o segundo lugar nas vendas mundiais de
discos.
A Universal, assim como a Warner, tem início no cinema, com a abertura dos
estúdios em 1912. Em 1924, a companhia abre sua divisão de música, chamada de Universal
29
Music Group. Em 1990, a Universal foi adquirida pela companhia de eletrônicos japonesa
Masuschita, que passou a fazer ajustes financeiros, deixando de investir na gravadora. Nos
anos 1990, com a aquisição da Polygram Discos, a Universal Music se torna a maior
gravadora entre as quatro majors. A fusão com a EMI em 2012 é o mais recente movimento
da empresa, aumentando ainda mais a sua posição de liderança no mercado.
Há uma grande semelhança nas etapas no processo de formação das majors, sempre
buscando a aquisição e fusão com outras empresas, além de trabalhar para maximizar os
lucros com um número menor de artistas. A história da indústria fonográfica, como um todo,
sempre foi de uma relativa concentração desde seus primeiros anos (1890-1900). Outro ponto
importante para a maneira de trabalhar das majors é que elas geralmente não fazem
competição por preços, conforme lembra Negus (2002). Sendo assim, quando uma grande
companhia sente que há considerações de mercado ou de lucros que justifiquem um aumento
de preços, todas as seguem. Com essa estratégia clara, as empresas precisam buscar outras
alternativas, como publicidade, promoção, inovações e tecnologia. Para Netto (2008):
[...] a tecnologia, que até então servia apenas de meio para o negócio da música,
alcança outras etapas do processo deste negócio e passa a não ser apenas uma parte
subsidiária à indústria fonográfica, mas também uma alternativa e, assim, uma
concorrente a esta. (Netto, 2008:145)
Esse processo não foi diferente no Brasil. Márcia Dias Tosta (2000) reforça que a
grande fertilidade da produção musical brasileira, que articulou as esferas da cultura e da
política, nos anos 1960 e 1970, contribuiu para a consolidação da indústria da música. Nos
anos 1970, o LP também ajuda a trazer novas possibilidades para a indústria no Brasil. Assim
as gravadoras montaram casts estáveis, e, em 1976, as sete maiores gravadoras do país eram
responsáveis por 88% do mercado nacional, conforme levantado por Morelli (1991).
Com o desenvolvimento do mercado de música gravada, no Brasil, a indústria
fonográfica entra em sincronia com o mercado “internacional-popular” de bens culturais,
pronto a se intensificar com o processo de mundialização da cultura,já descrito por Ortiz
(1994). Com a consolidação do mercado, as gravadoras passam a empregar as estratégias já
utilizadas em outros mercados, realizando festivais, gerenciando a carreira dos artistas e
promovendo seus negócios. Assim como já havia acontecido no mercado americano, a
televisão se torna uma importante aliada na promoção dos artistas, com destaque para a Som
Livre, filiada à Rede Globo, que surge em 1971. A gravadora liderou o mercado nacional em
1979, chegando a 25% de participação no mercado.
30
O processo de borramernto dos campos, que na indústria da música é uma constante
desde o seu início, visto que as grandes empresas tem braços no cinema, notícias, produção de
bebidas alcoólicas, entre outros ramos como visto acima. Vilchez (2003), lembra que essas
empresas se tornam cada vez mais conglomerados de comunicação lúdica, e esse conceito fica
claro no mercado brasileiro quando avaliamos a Rede Globo que nesta época já utiliza dessa
estratégia vinculando as suas telenovelas ao seu braço na indústria de música, a som Livre.
As telenovelas tiveram forte contribuição através de suas trilhas sonoras, para a
promoção dos artistas no Brasil. Segundo pesquisa da ABPD, em julho de 1977, diversas
trilhas sonoras ocupavam as primeiras posições no ranking de LPs mais vendidos em São
Paulo e no Rio de Janeiro, como a da novela Dancin’Days, por exemplo.
Figura 3 - Capa do LP da trilha sonora de Dancing Days
Fonte: Trilha Sonora Dancin’Days Internacional (1978).
A centralização e crescente padronização das companhias leva, como já mencionado,
ao controle dos processos de criação, produção e distribuição dos artistas contratados por
essas empresas, o que aumenta a importância das funções dos agentes e empresários de
artistas. Lima (2009), em entrevista com André Matalon, relata:
As funções dos agentes e dos empresários estão um pouco combinadas, sendo difícil
estabelecer atividades próprias a um e outro. Por isso, em alguns momentos, os tratei
de forma indistinta. De um modo geral, o empresário, está envolvido com o negócio
da música como um todo, assim como com o artista e seu trabalho. Tem uma
proximidade maior com a gravadora do que o agente, que por sua vez vincula-se de
modo mais estreito ao artista e sua carreira. (Lima, 2009:45)
31
As funções adquiriram importância no negócio da música nos anos 1960, quando
seus profissionais foram fundamentais para o estabelecimento da nova música, o rock’n’roll, e
para a criação de estratégias de divulgação e comercialização dos novos produtos, conforme
avaliam Chappel e Garofalo (1989). Os agentes e empresários tinham funções muito próximas
uma da outra. Lima (2009) relata que:
Se é possível estabelecer algumas diferenças entre as atividades dos empresários e
dos agentes, pode-se dizer que, em geral, tanto um como outro podiam ter agências
de administração de carreiras, nesse caso trabalhavam com outros agentes e com
vários artistas, ou trabalhavam sozinhos, com um artista apenas. Na maioria dos
casos, o agente era responsável por estabelecer contratos para atuações, gravação de
discos ou campanhas publicitárias e organizar shows e turnês. O empresário, por sua
vez, era responsável pelo planejamento geral e gerenciamento da carreira de seus
contratados, além de servir de intermediário entre este último e a gravadora. (Lima,
2009:38)
Nos anos 1960, empresários e agentes começam a dar mais foco à rentabilidade dos
artistas, tratando-os como parte da "cadeia produtiva". Passam a dar mais atenção à música
para gravação e ao artista, no qual podiam investir tempo de formação e lucro na divulgação
de seu trabalho. Dessa maneira, o mercado de música passa a se assemelhar ao modelo de Star
System, aproximando-se da descrição que Edgar Morin (1989) faz do cinema: “máquina de
fabricar, manter e promover as estrelas sobre as quais se fixaram e se divinizaram as
virtualidades mágicas da imagem da tela”(Morin, 1989, pag. 77), processo que segue ativo até
hoje.
As atuações ao vivo eram também, desde a década de 1960, um importante
mecanismo de atuação do mercado de música. Chapple e Garofalo (1989) relatam que os
salões de shows nos Estados Unidos rapidamente passaram para um modelo de grandes
festivais geridos por empresários e gravadoras, nesse momento, já mais envolvidas com o
novo tipo de música e suas estratégias de crescimento. Nascem assim os grandes festivais,
tendo como um dos principais exemplos o festival de Monterey. O modelo desenvolvido por
Ben Shapiro, promotor de espetáculos norte-americano, impulsionaria o desenvolvimento da
indústria. O festival seria ainda um importante acordo para a rede ABC de televisão, que viria
a lucrar significativamente com o evento.
Em 1969, surgiria o Woodstock em Bethel, Nova York, um dos grandes
"acontecimentos" (Certeau, 1994) do mundo da música. Segundo Chapple e Garofalo (1989)
APUD Lima (2009), “Woodstock foi não só um festival de cultura juvenil, mas também um
exemplo de sua comercialização e domesticação”. O verdadeiro lucro do festival foi obtido
32
depois, com sua transformação em acontecimento mítico para todo o mundo ocidental, graças
aos 86 produtos que rendeu, como gravações e filmes. É importante frizar o papel da
atmosfera da época do Woodstock e de todao o "momento hippie" que vai impactar
diretamente a "estrutura de sentimentos" das gerações posteriores e apesar da apropriação do
próprio festival pelas grandes gravadoras e conglomerados, o espírito de independência do
rock que seguia como um campo de embate e resistência às grandes empresas ganha força
deste momento para frente e assim os artistas independentes seguem em paralelo às majors.
[...] as gravadoras acabam se incorporando ao que poderia ser chamado de novo
ecossistema produtivo, onde o seu papel era o de prospectar novos artistas e nichos
de consumo locais, enquanto as grande gravadoras assumiam os artistas e segmentos
que suscitassem um consumo massificado. (Vicente, 2008:3)
Negus (2002), em seu levantamento, indica que, entre 1967 e 1970, mais de
2.500.000 pessoas assistiram a quase 30 festivais de rock, tornando os shows uma parte
lucrativa do negócio da música. O autor lembra que, da mesma maneira que eu outros
oligopólios, a indústria de música raramente faz concorrência de preços e, quando uma grande
companhia sente que há considerações de mercado ou de lucros que justifiquem um aumento
de preços, todas as seguem. Sendo assim, as estratégias mais comuns para aumentar as vendas
são a publicidade, as promoções e as inovações. As fusões trouxeram para as gravadoras uma
nova maneira de pensar o negócio, cada vez mais próximo do mundo corporativo e do
conceito de cultura de massa, conforme Morin (1977). A criação perde espaço no processo
industrial, “predominando a organização racional do produto sobre a invenção” (Morin,
1977:25). O foco é total na maximização dos lucros, com um portfólio bastante reduzido, se
possível, para facilitar o gerenciamento dos negócios. Além disso, estas empresas estão
sempre em busca de fusões e aquisições para aumentar seu domínio de mercado e integrar
cada vez mais a cadeia de produção e distribuição. A produção é guiada pelo consumidor, “a
contradição invenção-padronização é a contradição da cultura de massa. É seu mecanismo de
adaptação ao público e de adaptação do público a ela” (Morin, 1977:28). A busca de maior
escala é a busca pelo "homem médio".
um homem que em todas as partes responde às imagens pela identificação ou
projeção [...], o homemcriança que se encontra em todo homem, gostando do jogo,
do divertimento, do mito do conto [...], o homem que em toda parte dispõe de um
tronco comum de razão perceptiva, de possibilidades de decifração, de inteligência.
(Morin, 1977:44-45)
Assim, as majors do mercado de música gerenciam seus casts com as mesma lógica
que qualquer outra corporação e passam a ser responsáveis pela "forma dominante" (Williams,
33
1979) de produção, influenciando todo o mercado até o momento atual e regendo a maneira
como este se comporta. Os novos modelos surgem como resposta às grandes corporações e
serão descritos nas próximas seções deste trabalho onde um mercado massificado dá espaço
para um mercado segmentado com maior abertura para a criatividade e inovação, diferente do
existente nas majors.
1.2 As crises da indústria de música durante as alterações das "materialidades", do LP
até a Internet
As crises da indústria fonográfica não são uma novidade e praticamente acontecem
desde o início do século passado, toda vez que temos uma alteração nas materialidades, como
já descrito por Williams (1979), que consequentemente alteram o processo produtivo dessa
indústria. Isso aconteceu na mudança dos padrões do fonógrafo para o gramofone, nos LPs de
33 e 45 rotações e na entrada do CD e do Minidisc, entre outros formatos.
Se levarmos em consideração o fonógrafo de Thomas Edison já em 1838 como um
"acontecimento" (Certeau, 1994) no mercado da música, essa já seria a primeira ruptura no
mercado musical, dando início à música gravada como produto e posteriormente diminuindo a
relevância das apresentações ao vivo o que vai alterar a produção da "materialidade", prática
constante no mercado musical e que será descrita nessa seção. Os processos produtivos pouco
se alteram até a chegada do MP3 assim como a relação entre os agentes e a maneira de
distribuir o resultado do processo do mercado musical.
Dez anos depois, o gramofone a disco é criado, alterando de uma vez por todas o
mercado com o disco de 78 rotações. Esse formato deu a possibilidade da reprodutibilidade
técnica (Benjamin, 1975) da música gravada, assim como de revistas e jornais, num já
estabelecido mercado editorial, perdendo a sua característica artística e entrando no mercado
de bens culturais. “Fotografar um quadro é um modo de reprodução; fotografar num estúdio
um acontecimento fictício é outro. No primeiro caso, o objeto produzido é uma obra de arte e
a reprodução não o é” (Benjamin, 1975:177).
Como já visto no histórico de formação das majors, rapidamente um processo de
industrialização começa a se instituir na música, focando na comercialização da música
gravada em LP. Assim se iniciam os oligopólios e a transnacionalização, com base nessa
materialização dos bens, conforme proposto por Williams (1979). Lima (2009) ressalta a
transformação no mercado que é dada pela entrada dos LPs: “O formato possibilita a
transformação do intérprete em artista e, em função disso, algumas gravadoras formaram casts
estáveis, investindo em intérpretes para torná-los conhecidos.”
34
As majors encontrariam posteriormente um acordo para os formatos conflitantes de
LP que se estabeleceriam como álbuns e singles. A falta de sincronia e acordo entre essas
grandes companhias não é uma constante nesse mercado, onde há, como denomina
Herschmann (2010), um “truste velado” entre as companhias, ditando preços dos seus
produtos. A sincronia das majors proposta por Herschmann é vista já na definição dos
formatos de LP vistos abaixo onde as próprias gravadoras deixaram o formato de 33 rotações
apenas para singles.
Figura 4 - Formatos de LP 45 e 33 rotações
Fonte: Hernandez Video (2014).
As grandes gravadoras montam no Brasil uma associação em 1958, a Associação
Brasileira de Produtores de Discos (ABPD), que representaria as gravadoras atuantes no país
diante da classe artística, da sociedade civil e do Poder Público. Em 1965, a entidade realizou
a primeira pesquisa de mercado no país, levantando a venda de 5,5 milhões de unidades de
discos (Vicente, 2002). O contato junto ao poder público passa a ser importante para o
desenvolvimento do mercado e das companhias.
No Brasil, assim que o mercado de música se integra ao mercado global, com a
chegada das majors nos anos 1950, os processos rapidamente se integram ao modelo das
majors, já com os primeiros discos de bossa nova produzidos pela Odeon. Midani (2008) fala
sobre as estratégias de vendas, similares às que eram usadas nos Estados Unidos. "A primeira
seria vender bossa-nova nas portas das escolas, colégios e das universidades; a segunda, abrir
uma empresa que venderia discos populares de porta em porta, ao estilo da Avon, com
repertório exclusivo, não encontrado nas lojas convencionais." (Midani, 2008: 94)
Nesse momento, as mudanças técnicas, elemento privilegiado da constrituição do
padrão industrial entram no processo, assim como as mudanças artísticas, com a contratação
profissionais mais especializados e investindo até nas capas dos discos. Midani ainda
35
trabalharia no México e relata a implementação das mesmas estratégias, e de uma estreita
parceria com a Televisa, rede de televisão local, “Estratégia que seria aperfeiçoada no Brasil
alguns anos mais tarde pela Phonogram e Som Livre” (Midani, 2008 p. 176). Assim, os
processos de produção e estratégias do mercado brasileiro estariam alinhados ao modelo
globalizado do mercado liderado por grandes corporações como já detalhado anteriormente.
O processo de produção de um disco segue algumas etapas padronizadas até chegar
ao consumidor. Lima (2009) descreve as fases de materialização do produto dentro do
formato das grandes companhias que segue desde a época dos LPs até a chegada dos CDs:
Retomando o processo de produção de um disco em si, sua primeira fase, depois de
compostas/selecionadas as músicas pelo compositor/intérprete, passa pelas etapas de
gravação: produção e produção gráfica, mixagem e masterização. Num segundo
momento teríamos a fabricação, o processo de prensagem, a edição fonográfica
propriamente dita. Em ambas as fases, há uma divisão de trabalho cada vez mais
especializada, há o cumprimento a valores padronizados [...]
Na fase de gravação, produtor musical e gravadora, organizam a produção musical, a
partir da ordenação das equipes artísticas, composta por músicos, intérpretes e
técnica, constituída por engenheiros, técnicos de som, de mixagem e masterização.
Em seguida, acerta-se as gravações em estúdio, em geral de propriedade de alguma
produtora com quem a gravadora trabalha e, a partir de um repertório já acordado
com intérprete e produtor, inicia-se a gravação do master, assegurada pelo editor
fonográfico com consentimento do produtor. Por fim, é encaminhado para
prensagem, isto é, fixação e reprodução do material gravado sobre um suporte
material.
A produção acontece em paralelo às gravações, dentro da gravadora ou em terceiros
e as decisões desse processo ficam geralmente sob a responsabilidade do diretor
artístico, diretor de marketing e gerente de produção, com a aprovação do diretor
geral. Depois disso o segue o processo de fabricação e prensagem e na sequência a
distribuição e comercialização. (Lima, 2009:194)
Figura 5 - produtor Carlos Miranda em estúdio com os Móveis
Fonte: Miranda presesnte nos últimos ensaios (2012).
Nesse momento se definem algumas funções chave dentro da construção das
"materialidades " na indústria de música, sendo uma delas a figura do produtor, que como
visto na imagem acima segue como um "residual" deste período pois mesmo bandas mais
recentes como é o caso do Móveis reconhecem um papel necessário desse profissional, e
foram buscar o experiente Carlos Miranda para a produção os discos mais recentes. Há hoje
36
uma diminuição de algumas funções ou menor especialização em relação aos papéis na
década de 70 como por exemplo o empresário que hoje deixa de existir em algumas bandas
como os Móveis ou os americanos do Boyce Avenue que tem uma função de produtor para
shows e agenda sendo integrante da banda no caso dos Móveis e terceirizado no caso dos
americanos.
A década de 1970 passa a ser o início de um período virtuoso para as majors e as
vendas de LPs passam a apresentar uma tendência global de crescimento, conforme o quadro
abaixo. O mesmo aconteceria no Brasil, que apresentaria altas taxas de crescimento até os
anos 1980. O mercado nacional chega a ser o quinto maior do mundo, conforme levantado por
Lima (2009), crescendo em média 15% ao ano.
Quadro 1 - Evolução global das vendas dos formatos em unidades
Ano
1973
1974
1975
1976
1977
1978
1979
1980
1981
1982
1983
1984
1985
1986
1987
1988
1989
1990
1991
1992
1993
1994
1995
1996
1997
1998
1999
Continua.
LP
617
655
674
743
898
942
896
878
1140
900
850
800
730
690
590
510
450
339
292
175
109
49
33
21
17
23
14
K7
185
209
236
289
374
428
470
474
510
570
660
800
950
970
1150
1390
1540
1447
1493
1476
1382
1354
1200
1188
1034
897
847
CD
6
20
61
140
260
400
600
777
998
1185
1419
1784
1983
2162
2232
2374
2411
Album digital
Singles
530
515
483
516
545
600
624
526
550
580
800
750
650
490
390
370
357
344
334
352
410
390
432
466
516
459
440
37
Quadro 1 - Evolução global das vendas dos formatos em unidades (conclusão)
Ano
2000
2001
2002
2003
2004
2005
2006
2007
2008
LP
12
10
8
6
7
4
3
6
9
K7
736
659
534
492
368
186
114
82
53
CD
2454
2310
2190
2043
2065
1938
1760
1545
1329
Album digital
6
18
39
64
113
Singles
370
318
265
233
354
582
931
1202
1494
Fonte: IPFI Digital Music report (2014).
Gráfico 1- Vendas de formatos no Brasil em unidades
Fonte: ABPD apud Ortiz 1994b. p.127
Uma alteração nos formatos traz uma das primeiras crises no Brasil, quando as fitas
cassetes passam a se popularizar, dando a possibilidade aos consumidores de gravar suas
próprias compilações nas fitas, fosse de um LP, rádio, e assim escapando do controle da linha
de produção das majors e iniciando a proliferação da pirataria, que tem sido, desde os anos
1980, uma das explicações dadas pelas empresas para a retração do mercado da música.
38
Figura 6 - Fitas cassete de diversas marcas
Fonte: O romance em K7 (2014).
As fitas seguiram como um suporte popular até a introdução de um novo formato, o
CD. Em 1993, Midani (2008) relata que há uma decisão tomada pelos executivos das majors
de se retirar da produção de fitas cassete no Brasil, como uma possibilidade de combate à
pirataria, o que não aconteceu, pois o CD rapidamente se tornou um formato facilmente
copiado e explorado pelo mercado paralelo. A fita abre a primeira possibilidade para uma
"reprodubilidade técnica" (Benjamin, 1975) "caseira" e inicia um mercado paralelo, além de
começar a alterar a "estrutura de sentimentos" (Williams, 1979) de um consumidor que se
acostuma a pagar muito menos ou absolutamente nada pela música de um artista favorito e de
um artista que é pago cada vez menos pela venda de fonogramas.
Por volta de 1993, já não se vendiam cassetes nas lojas. E a alegação oficial de
muitos executivos brasileiros era que, graças ao “boom econômico” do Plano Real, o
aumento do poder aquisitivo das classes menos favorecidas tinha aumentado de tal
maneira que o mercado havia migrado inteira e exclusivamente para os CDs. Essa
alegação nos pareceu pelo menos fantasiosa, pois se vendiam ainda muitas fitas
cassete nos chamados “países do Primeiro Mundo”. Durante uma reunião com meus
colegas em Miami, lembrei que, no Brasil, a pirataria havia iniciado suas atividades
vendendo fitas cassete principalmente em postos de gasolina nas estradas
interestaduais.
Propus verificar se essa prática continuava, à revelia da indústria brasileira.
Contratamos um profissional para fotografar as lojas de serviço nas estradas Rio-São
Paulo, São Paulo-Curitiba etc. Descobrimos, então, que os singelos estandes de fitas
do passado, que ocupavam um modesto lugar dentro dos postos de gasolina, tinham
se transformado em importantes lojas que, em muitos casos, vendiam quase que
exclusivamente cassetes piratas. Depois de investigações mais extensas, constatamos
que o estrago se estendia também às ruas do centro das principais cidades do país. A
dimensão era tal que o processo era, provavelmente, irreversível. As companhias
brasileiras, preocupadas com a maximização de sua participação dentro do mercado,
tinham simplesmente se esquecido de proteger esse setor, abandonando-o para os
piratas. Consternados, só restava imaginar o que aconteceria se e quando essa
perfeita rede de distribuição paralela se dedicasse à venda, em grandes quantidades,
de CDs piratas.
39
Mal havíamos formulado essa hipótese, aconteceu o desastre, com a chegada de
quantidades cada vez maiores de CDs piratas ao Brasil, provenientes do Paraguai.
(Midani, 2008: 140)
O crescimento da pirataria fez com que as gravadoras se organizassem e dessem
suporte para o aparecimento de alguns órgãos para combate à pirataria, como a IFPI
(International Federation of the Phonographic Industry) e a criação da APDIF (Associação
Protetora dos Direitos Intelectuais e Fonográficos), em 1994 e 1996, respectivamente. Midani
define o papel das associações como:
A IFPI é a instituição que tem por missão e finalidade representar os interesses da
indústria perante os governos e as cortes internacionais, coordenar a luta contra a
pirataria, compilar estatísticas confiáveis e, sobretudo, oferecer um terreno neutro e
amistoso para reunir companhias que competem ferozmente no seu dia-a-dia. Tem
sede em Londres e escritórios regionais pelo mundo, exceto na América Latina até
1994, quando fundamos a IFPI latino-americana, com sede em Miami, da qual fui
nomeado presidente, cercado por uma diretoria essencialmente composta por
executivos de outras gravadoras, encarregados, como eu, dos territórios latinos.
A IFPI latina teve como responsabilidade inicial instalar entidades de classe em
todos os países do continente, inclusive no mercado latino dos Estados Unidos,
dedicando-se de imediato a desenvolver um plano para combater a pirataria de fitas
cassete, cada vez mais vigorosa no México e no Brasil. Nos primeiros anos de
atividade no Brasil, tal qual ocorria no México, constatamos que tudo o que se
conversava durante as reuniões dentro dessas duas IFPIs chegava imediatamente aos
ouvidos dos piratas e, além do mais, que existiam empresas legítimas que, com ou
sem o conhecimento dos seus dirigentes, fabricavam fitas cassete piratas.
Foi então imperativo instituir a entidade APDIF (Associação Protetora dos Direitos
Intelectuais Fonográficos), totalmente fora do controle das IFPIs locais,
exclusivamente dedicada ao combate à pirataria. Para tornar a unidade realmente
profissional, contratamos especialistas em investigações — em geral já aposentados
e que tinham adquirido experiência nos serviços secretos dos governos locais ou no
FBI norte-americano — para operar no Brasil e no México. (Midani, 2008:239)
O aparecimento do CD como um novo formato "dominante" é mais um exemplo das
estratégias conjuntas das majors. Sony e Philips já desenvolviam pesquisas conjuntas desde
os anos 1970, mas globalmente o formato só inicia em 1983 e no Brasil apenas na década de
1990. Lima (2009) relata em entrevista com André Midani essa estratégia das gravadoras de
necessidade de renovação do mercado com um novo produto:
o CD foi considerado como um avanço tecnológico, sobretudo na qualidade. Aí
vem: a qualidade do LP é melhor do que a do CD? Claro. A capacidade de graves e
agudos é mais extensa no long play do que no CD. Quer dizer, a qualidade, a
primeira vez que você toca um LP é melhor o som do que um CD. Só que cada vez
que você toca o LP tem uma agulha. Então, cada vez teu long play vai baixando de
qualidade. No entanto, para o CD baixar de qualidade, leva alguns anos. Então, acho
que, particularmente, a grande vantagem da entrada do CD foi esta. Depois [...],
entram elementos de economia de escala, você colocar mais produtos dentro do
mesmo metro cúbico, isso contou também. (LIMA, 2009:43)
40
Figura 7 - Compact disc tradicional
Fonte: Rocky Music.
O CD rapidamente alcançou vendas significativas e, mesmo em face de um forte
mercado paralelo de fitas cassete, os CDs alcançaram quase 60 milhões de unidades em 1995.
A indústria contribuiu também com novas estratégias, como o relançamento dos LPs no
formato atual e a colocação em lojas de varejo não especializado, como supermercados e
magazines (Lima, 2009).
Gráfico 2 - venda dos formatos no Brasil em unidades
Fonte: ABPD apud Dias, 2000 p.106.
Essa prosperidade durou até a proliferação de mecanismos para cópia de CDs,
mudando o formato do mercado paralelo, que era anteriormente de fitas cassete, para o
próprio CD. Assim, a partir de 2003, as quedas nas vendas de CDs são evidentes, enquanto
surge um novo formato, o DVD. Este também teve o seu período de glória e consequente
declínio. Assim que o formato se tornou acessível para quem quisesse copiar, as vendas
passaram a despencar.
41
Gráfico 3 - venda dos formatos no Brasil em unidades
Fonte: ABPD Apud Lima, 2009.
Tanto CDs quando K7s deram possibilidade à uma indústria que operava em pararelo
às grandes gravadoras e esse impulso também aconteceu junto aos artistas. Mesmo com a
dominância das majors um mercado paralelo segue existindo com gravadoras independentes e
artistas que fazem juz ao lema do punk rock do it yourself e gravam suas próprias fitas ou
CDs para venda direta ao público. Artstas como Lobão e Emicida buscaram canais
alternativos para a venda de seus CDs gravados de maneira quase que artesanal. O hip hop
nacional sempre esteve às margens do modelo das gravadoras e já mantinha um circuito de
shows desde essa época, mais uma das alterações da "estrutura de sentimentos" (Williams,
1979), onde artistas tomam o lema da independência das majors como um modelo de
negócios.
As constantes crises da indústria seriam agravadas pela popularidade de um novo
formato, que surge com o aumento de penetração da Internet e o compartilhamento de
arquivos em rede. Há a necessidade de um novo arranjo das majors, porém novos modelos
"emergentes" passam a ganhar força com a outra crise da indústria fonográfica.
Yúdice (1999) lembra que as majors, a essa altura, já haviam deixado de ser apenas
indústrias de produção e distribuição de música, o que será fundamental para uma
reorganização dos negócios após a chegada da Internet.
[...] a partir dos anos de 1980, as grandes gravadoras já não se concebiam como
simples produtoras e distribuidoras de música, mas sim como conglomerados
globais de entretenimento integrado, que incluem a televisão, o cinema, as cadeias
da indústria fonográfica, as redes de concertos e mais recentemente a Internet, e a
difusão a cabo e via satélite. (Yúdice, 1999:116)
42
Neste ponto, retomo Vilchez (2003) onde as empresas passam a se tornar grandes
conglomerados de comunicação lúdica e passam a borrar as fronteiras dos campos, abraçando
música, televisão, cinema, jornalismo e fatalmente com a chegada da Intenet, iriam estender
seu alcance às fronteiras da cultura digital. As fusões e aquisições irão continuar com a
Internet como vimos recentemente com a aquisição do aplicativo Whatsapp pelo Facebook
(Facebook compra o aplicativo WhatsApp por US$ 16 bilhões ...), porém a possibilidade de
uma brecha para o artista independente é reforçada com a Intenet e as culturas digitais.
1.3 Redes, cibercultura e culturas digitais: a chegada da Internet, e novas possibilidades
para as formas "emergentes"
A popularização da Internet e seu uso em escala global vem alterando profundamente
a nossa sociedade em diversas escalas, e não foi diferente com o mercado da música. A
própria formação da rede mundial de computadores expressa uma alteração nas "estruturas de
sentimento" (Williams, 1979), o que será demonstrado a seguir.
O termo é difícil, mas “sentimento” é de “visão de mundo” ou “ideologia”. Não que
tenhamos apenas de ultrapassar crenças mantidas de maneira formal e sistemática,
embora tenhamos sempre de leva-las em conta, mas que estamos interessados em
significados e valores tal como são vividos e sentidos ativamente e as relações entre
eles e as crenças formais ou sistemáticas são, na prática, variáveis (inclusive
historicamente variáveis), em relação a vários aspectos, que vão do assentimento
formal com dissentimento privado até a interação, mas nuançada entre crenças
interpretadas e selecionadas, e experiências vividas e justificadas. Uma definição
alternativa seriam as estruturas de experiências: num certo sentido, a melhor palavra,
a mais ampla, mas com a dificuldade de que um dos seus sentidos tem o tempo
verbal do passado que é o obstáculo mais importante ao reconhecimento da área da
experiência social que está sendo definida. (Williams, 1979:134)
Essa seção se propõe a debater as condições que levaram ou possibilitaram o
desenvolvimento da Internet, e suas principais características à luz dos acontecimentos da
década de 60 em diante, onde a "estrutura de sentimentos" (Wiliams, 1979) proposta por
Williams vem a moldar a rede com os conceitos descritos por Castells, Jenkins e Lévy.
O desenvolvimento da rede e as "instituições" (Williams, 1979) - para Williams, as
instituições "tem uma influência profunda sobre o processo social ativo" e no caso da
Intenet o fato de ter nascido em meio às universidades e à comunidade científica, faz com que
a rede absorva muito desse sentimento libertário - nas quais a Internet se funda vão definir
boa parte da "Cultura da rede" (2010), como denomina Manuel Castells posteriormente. A
Internet é resultado das pesquisas da Agência de Projetos de Pesquisa Avançada (ARPA) do
departamento de defesa dos EUA, que buscava um sistema de comunicação invulnerável a
43
ataques nucleares. A saída foi uma rede de comunicação independente de centros de comando
e controle, que pudesse se comunicar diretamente com qualquer ponto da rede.
A ARPANET, que foi a primeira rede de computadores, funcionou em 1o de
setembro de 1969, com três dos seus primeiros pontos na Califórnia, nas Universidades da
Califórnia em Los Angeles, no Stanford Research Institute e na Universidade da Califórnia
em Santa Bárbara. Há que se lembrar que, nesse mesmo ano, o Woodstock acontecia nos
Estados Unidos e dava voz a toda uma atmosfera hippie pelo país e pelo mundo.
A Internet, como viria a ser denominada na década de 1980, passaria posteriormente
para a responsabilidade da National Science Foundation, que iria ainda repassar o comando a
duas instituições sem fim lucrativos. Castells (2010) reforça que, mesmo com a criação de um
órgão regulador sediado no EUA (IANA/ICANN) em 1998, “não existia nenhuma autoridade
clara e indiscutível sobre a Internet, tanto nos EUA quanto no resto do mundo – sinal das
características anarquistas do novo meio de comunicação, tanto tecnológica, quanto
culturalmente.” (Castells, 2010:83- 84).
[...] surgiu nos Estados Unidos uma contracultura de crescimento descontrolado,
quase sempre de associação com os efeitos secundários dos movimentos da década
de 1960 em sua versão mais libertária/utópica. O modem, elemento importante do
sistema, foi uma das descobertas tecnológicas que surgiu dos pioneiros dessa contra
cultura, originalmente batizada de “the hackers”, antes da conotação maligna que o
termo veio a adquirir. (Castells, 2010:86)
Características como trabalho em rede e sem uma liderança destacada, ou diluída,
compartilhamento gratuito, começam a ganhar corpo com a expansão da rede. Já nas décadas
de 1980 e 1990, os usuários começam a se reunir em redes de afinidade online e acontece a
expansão das BBS 23 , gerando as "comunidades virtuais" descritas por Howard Rheingold
(1993).
As BBS, são a primeira aparição de uma brecha para o usuário, que desde então
convivia apenas com o modelo de "um para muitos" e com as "comunidades virtuais" tem a
primeira oportunidade de um modelo "muitos para muitos" como propõe Castells (2010). A
partir das BBS, conceitos como interação, inteligência coletiva, consumidor/produtor passam
a existir num espaço virtual (Lévy, 1999) e ganham capilaridade com a rede mundial de
computadores.
23
BBS, sigla inglesa de Bulletin Boards Systems (BBS), também designados por Electronic Bulletin Boards
(EBB), foram os sistemas pioneiros na comunicação on-line entre membros de um determinado grupo. Para o
funcionamento destes sistemas, era necessário, além do computador, um modem, uma linha telefônica e um
programa BBS que permitiria um conjunto de facilidades semelhantes às de um painel, onde era possível
colocar e receber mensagens, enviar e receber arquivos, ter acesso a fóruns de discussão, etc. (Nunes, 2014).
44
A própria criação do aplicativo WWW por Tim Berners Lee, em 1990, e que viria a
revolucionar o uso da Internet, foi baseada na cultura hacker de 1970. O aplicativo seria
posteriormente distribuído de maneira gratuita entre diversos centros de pesquisa. Graças a
isso, um estudante resolveu aperfeiçoar a parte gráfica, desenvolvendo o primeiro navegador
da Internet, o Mosaic, que também seria distribuído gratuitamente e seria a base para o
Netscape, primeiro navegador popular da rede, lançado em 1994, conforme relata Castells
(2011).
As características de todo um período e das "instutuições" (Williams, 1979) de onde
"nasceu" a rede mundial de computadores dão o tom da "cultura da Internet" (Castells, 2010).
Nesse ponto, é possível dizer que a "cultura da Internet" de Castells está embebida da
"estrutura de sentimentos" de um momento libertário, numa atmostfera hippie, numa
Califórnia liberal, dos primeiros hackers, retomando Williams (1979), onde a cultura da
Internet é basicamente a proposta e sentimento dos seus criadores, como descrito por Castells.
A cultura da Internet é a cultura dos criadores da Internet. Por cultura entendo um
conjunto de valores e crenças que formam o comportamento: padrões repetitivos de
comportamento geral, costumes que são repetidos por instituições, bem como por
organizações formais. Cultura é diferente de ideologia, psicologia ou representações
individuais, ao mesmo tempo que influencia as práticas das pessoas no seu âmbito,
nesse caso os produtores/consumidores da Internet (Castells, 2001:34)
É também de extrema importância o papel das "instituições" (Wiliams, 1979) , como
já mencionado, e, no caso da Internet, o papel das Universidades na influência da cultura da
rede é marcante desde o seu início. “Assim a cultura da Internet enraíza-se na tradição
acadêmica da ciência, da reputação por excelência acadêmica, do exame dos pares e da
abertura com relação a todos os achados de pesquisa, com o devido crédito aos autores de
cada descoberta” (Castells, 2003:37).
Castells define a estrutura da cultura da Internet em quatro camadas: a cultura
tecnomeritocrática, a cultura hacker, a cultura comunitária virtual, e a cultura empresarial. A
primeira deriva do meio acadêmico, que influencia a rede como mencionado anteriormente, já
a cultura hacker deriva mais da possibilidade libertária da rede, sem barreiras para
compartilhamentos e uso. A cultura comunitária da Internet é considerada como uma
dimensão social aliada à cooperação tecnológica e à Internet, como um meio de interação
social e circulação de bens simbólicos. A cultura empreendedora traz bases da cultura hacker
e comunitária, difundindo práticas virtuais para ter retorno financeiro.
Se por um lado a cultura tecnomeritocrática e a cultura empresarial dão aberturas
para os produtores, que encontram na rede de computadores possibilidades de expor seus
45
trabalhos, criar junto com outros produtores e usuários, transformando as noções anteriores de
liderança e formando possibilidade de trabalho em rede com pares e parceiros do mesmo
mercado, a cultura hacker e comunitária virtual abrem espaço para um usuário que pode
interagir, e inclusive criar e alterar seus produtos favoritos.
Outros dois autores são fundamentais para as definições dessa cultura digital. Perre
Lévy (1999) avalia as características da cibercultura com algumas semelhanças e se baseia em
três características: a interconexão, que tece um universal pelo contato e não pela totalidade
de uma imensa quantidade de usuários que está no mesmo espaço; as comunidades virtuais,
que se constroem em ao redor de interesses mútuos, afinidades, conhecimentos e projetos, e,
por último, a inteligência coletiva, onde se considera que o ciberespaço coloca em sinergia os
saberes, imaginações e energias daqueles que estão conectados. Lévy considera que a
inteligência coletiva é a responsável por tornar a cibercultura (Lévy, 1999) uma expressão da
aspiração de construção de laços sociais não fundamentados em links territoriais, relações
institucionais ou de poder, mas sim pelo compartilhamento de saberes, pela aprendizagem
coletiva, pela cooperação e colaboração.
Henry Jenkins (2008) faz uma avaliação do que chama de "cultura da convergência"
em três partes: a) convergência dos meios de comunicação e fluxos de conteúdo através de
diversos suportes midiáticos. Na cultura da convergência, há um comportamento migratório
dos públicos em busca do entretenimento que desejam, além de um duplo papel na produção
que não depende mais exclusivamente das estratégias empresariais, mas também da
apropriação e recepção dos consumidores. Estas constantes alterações são fundamentais para
se avaliar transformações culturais, mercadológicas e sociais; b) cultura participativa, onde
produtores e usuários/consumidores são participantes que interagem, ao invés do modelo
anterior, onde eram excludentes e podem ser considerados criadores, com um empoderamento
cada vez maior; c) a inteligência coletiva é retomada de Lévy (1999), pela interação dos
usuários/consumidores com outros indivíduos, utilizando-se do espaço para armazenamento e
trocas da Internet, com intercâmbio de referências culturais, mitológicas e de fluxos
midiáticos.
Tanto a perspectiva de Jenkins (2008) quanto a de Lévy (1999) enfocam numa
possibilidade do usuário inexistente no modelo anterior citado por Castells (2010) do "um
para muitos". Para ambos, a Intenet abre possibilidades de uma coletividade antes incipiente
ou existente apenas em pequenos nichos, como as comunidades de fãs descritas por Jenkins
(2008). A rede abre a possibilidade de uma interconexão de atores envoltos na "estrutura de
sentimentos" (Williams, 1979) já descrita anteriormente onde a possibilidade de existência
46
fora do mainstream e das grandes corporações se torna um pouco mais fácil. Para o músico, a
antiga mixtape dos rappers, vendida de um a um no ônibus como relata o rap Emicida, se
torna um MP3 que é distribuído diretamente no ambiente "virtual" (Lévy, 1999) por fãs que
saem dos antigos fã clubes com centenas de membros e passam a atuar em comunidades e
fóruns virtuais que agregam milhares de membros do mundo todo, conectados a todo tempo.
Uso e consumo são processos coletivos para Jenkins, pois cada usuário conhece
fragmentos de um determinado conhecimento, assim, muitos dos envolvidos podem associar
recursos na rede. Para Lévy:
[...] o conhecimento de uma comunidade de pensamento não é mais conhecimento
compartilhado, pois hoje é impossível a um único ser humano, ou a mesmo a um
grupo de pessoas, dominar todos os conhecimentos, todas as habilidades. Trata-se
fundamentalmente de conhecimento coletivo, impossível de reunir em uma única
criatura. (1999:214-215)
Jenkins, usando esta concepção de comunidade de pensamento, afirma que “a
inteligência coletiva refere-se a essa capacidade das comunidades virtuais de alavancar a
expertise combinada de seus membros.” (2008:54)
Nessa avaliação das alterações da chamada "cultura da Internet" (2010, como
denominada por Castells, há que se firmar alguns conceitos. Há uma alteração nos chamados
cenários “culturais globalizados” (Appadurai, 2004), um empoderamento do consumidor,
como proposto por autores como Chris Anderson (2006), e dos produtores de menor escala,
através da redução de custos de distribuição; há alterações na esfera empresarial e profissional,
com equipes que trabalham em rede e sem líderes específicos, como proposto por Castells,
entre outras mudanças que ainda serão avaliadas ao longo deste trabalho, porém a perspectiva
adotada é de avaliar os embates e conflitos entre tendências e perspectivas, sem adotar uma
“razão dualista” (Barbero, 1997) de substituição ou exclusão de um padrão pelo outro. Há um
campo de conflito para a constituição de novas "hegemonias" (Gramsci, 1999), especialmente
num cenário ainda dominado por grandes empresas culturais/comunicacionais que segue em
constante reconfiguração.
Esse apoderamento do consumidor é explorado pelos produtores, sejam das grandes
corporações como relata Jenkins (2008) em sua análise das comunidades de fãs onde grandes
produtos midiáticos como Lost e Survivor se utilizam do contato com os fãs e das
comunidades, seja com os Móveis, que como veremos mais a frente nesse trabalho, agem
constantemente com as comunidades de fãs.
47
Em relação à influência da Internet, e das relações entre tecnologia, cultura e
comunicação, duas noções são importantes para a perspectiva aqui adotada. Barbero (2001)
propõe o conceito de "tecnicidade", pelo qual define:
Tecnicidade não é algo que se possa conceber a partir da redutora noção de
instrumento: trata-se de reorganizações perceptivas e competências de linguagem.
Para além da noção de aparatos (maquinais ou ideológicos) de domínio da
natureza/sociedade, a tecnicidade remete-se, hoje à “comunicação do mundo como
imagem”. A discursividade constitutiva da visibilidade permite a emergência de uma
nova “figura de razão”: mediação cognitiva de uma nova mescla cérebro/informação
e de um novo cenário de “batalha das imagens”. Se já não se escreve e nem se lê
como antes é porque tampouco se pode ver ou representar como antes. Estamos
diante de uma nova ordem visual – tanto no conhecer, quanto na estética do
significar e expressar – a qual as tradições são desviadas mas não abandonadas, e
cuja potência remete à (dez)razão de uma modernidade tardia do imaginário e das
novas relações que se entrelaçam com as memórias (Martín-Barbero, 2000)
Lévy, ao avaliar a metáfora do "impacto da Internet" (1999) como inadequada,
reforça que as tecnologias não são atores independentes da sociedade.
[...] Defendo, ao contrário, que a técnica é um ângulo de análise dos sistemas sóciotécnicos globais, um ponto de vista que enfatiza a parte material e artificial dos
fenômenos humanos, e não uma entidade real, independente do resto, que teria
efeitos distintos e vontade própria. As atividades humanas abrangem, de maneira
indissolúvel, interações entre:
- Pessoas vivas e pensantes,
- Entidades materiais, naturais e artificiais
- Idéias e representações
É impossível separar o humano de seu ambiente material, assim como dos signos e
das imagens por meio dos quais ele atribui sentido à vida e ao mundo. Da mesma
forma, não podemos separar o mundo material – e menos ainda sua parte artificial –
das idéias por meio das quais os objetos técnicos são conhecidos e utilizados, nem
dos humanos que os inventam, produzem e utilizam. Acrescentemos enfim que as
imagens, as palavras, as construções de linguagem, entranham-se nas almas
humanas, fornecem meios e razões de viver aos homens e suas instituições, são
recicladas por grupos organizados e instrumentalizados, como também por circuitos
de comunicação e memórias artificiais.
Ao utilizar os conceitos de "tecnicidade" de Barbero (2001) e a avaliação do
"impacto da Internet" proposta por Lévy (1999), este trabalho se propõe a uma perspectiva de
uma rede que como técnica é formada de uma "estrutura de sentimentos" (Williams, 1979)
presente em nossa sociedade, do início da rede mundial até agora, porém também
retroalimenta a sociedade e o usuário através das características que são predominantes à rede
ou à tecnologia predomimante. Reafirmo a importância da característica libertária e
descentralizada na criação a rede, porém não é possível nesta avaliação excluir as práticas
comuns à Intenet como possíveis retroalimentadoras do sistema como é o caso do uso de
imagens, predominante nas redes sociais atualmente. Para a música, são abertas as
possibilidades da "multimídia" como relata Castells (2010) o que é uma questão técnológica,
48
porém hoje é uma prática obrigatória do mercado de música a existência do videoclipe,
mesmo que seja apenas numa plataforma, o Youtube pois o usuário/consumidor busca esse
tipo de formato para consumo nas redes e não apenas uma faixa de áudio. É necessário unir o
áudio à imagem como relata o produtor de funk Kondzilla, que é responsável por gravar os
videoclipes dos artistas de funk ostentação24.
Sendo assim, a perspectiva da rede é de mediadora, de construção de novas
narrativas no ciberespaço, novas formas de consumo, produção e comunicação. Dentro desse
cenário global, a Internet aparece como um catalizador do processo de comunicação entre os
países, indivíduos, instituições e culturas, acelerando a dissolução das fronteiras e
comprimindo o tempo, conforme Giddens (1991) já havia proposto. Esta rede mundial que
segue em alterações frequentes desde o lançamento do protocolo WWW. Castells lembra a
rápida evolução da Internet:
em 1973, havia 25 computadores conectados à rede; ao longo dos anos 70, a Internet
funcionava com apenas 256 computadores; no início da década de 1980, após
aperfeiçoamentos significativos, ainda era restrita a cerca de 25 redes com somente
algumas centenas de computadores primários e alguns milhares de usuários.
Com relação aos usuários, duas pesquisas de agosto de 1991 e novembro de 1995
estimaram o número de usuários dos Estados Unidos em 9,5 milhões. Isso significa
que em apenas quatro anos o fator de aumento do número de usuários da Internet na
América do Norte foi de 10,7 ou 4,25. Já que as conexões em rede tendem a elevar o
índice de crescimento com a expansão da rede, a idéia de um bilhão de servidores
conectados via Internet e bem mais que dois bilhões antes de 2010 não parece
exagerada. (Castells, 2010: 418)
Gráfico 4 - número de usuários da Internet no mundo em milhões
Fonte: Committed to Connecting the World – ITU.
24
Documentário sobre Funk Ostentação. Disponível em: <http://vimeo.com/53295440>.
49
O gráfico acima mostra a evolução do número de usuários no mundo, chegando
acima da previsão feita por Castells em 2010 e já alcançando números próximos de 3 bilhões
de usuários da rede mundial de computadores em 2013. A diferença está no percentual de
usuários em relação ao total da população nos países desenvolvidos e em desenvolvimento.
Embora exista uma rápida ascensão da penetração da Internet nesses países, ainda há uma
enorme desigualdade no acesso.
Gráfico 5 - percentual de usuários da Internet no mundo em relação ao total da população
Fonte: Committed to Connecting the World – ITU.
Mesmo com o rápido avanço, os países em desenvolvimento ainda estão longe dos
mais ricos. Países como os Estados Unidos e o Reino Unido já apresentam 81% e 87% da sua
população conectada à rede, enquanto na América Latina, apenas como base de comparação,
temos Argentina com 56%, Bolívia, 35%, e Uruguai com 55%, sendo o melhor exemplo o do
Chile, que já chega a 61% da população conectada.
Se levarmos em comparação o uso de banda larga, fundamental para os novos
conteúdos da WEB 2.0 e de "multimídia" (Castells, 2010), a diferença é ainda maior. Como
mostra o gráfico abaixo, o percentual de usuários que usam a Internet banda larga nos países
desenvolvidos é bem maior que nos países em desenvolvimento e, neste caso, a diferença vem
aumentando ao longo dos anos, embora existam avanços na conexão banda larga dos países
em desenvolvimento. Estados Unidos e Reino Unido têm respectivamente 28 e 34 habitantes
em cada 100 com conexão via banda larga. Na América Latina, os números de banda larga em
100 habitantes são de 11 na Argentina, 1 na Bolívia, 12 no Chile, 8 na Colômbia, e o Uruguai
com 16, tendo o melhor desempenho entre os nossos vizinhos.
50
Gráfico 6 - percentual de usuários para cada 100 habitantes
Fonte: Committed to Connecting the World – ITU.
Essa situação pode não melhorar no curto prazo, pois o nível de investimento das
operadoras de telefonia, que são as responsáveis pela implementação de banda larga na
grande maioria dos países, como é o caso do Brasil, onde empresas como Oi, Vivo, Claro e
Tim são as concessionárias do governo, não tem aumentado nos últimos anos.
Gráfico 7 - Bilhões de dólares em Investimento de Infraestrutura pelas empresas de telecomunicação
Fonte: Committed to Connecting the World – ITU.
O formato MP3, hoje comum para áudio digital, começou a tomar forma em 1988,
com a criação do Moving Pictures Experts Group (Grupo de Especialistas em Imagens e
Movimento), ou MPEG. O grupo, iniciado numa conferência no Canadá e composto por
51
experts do mundo todo, iria lançar em 1992 diversas normas para codificação de áudio e
vídeo. Conforme Teixeira Jr., 2002:
Entre as normas técnicas do padrão MPEG-1 estava um certo Layer III. Responsável
pela codificação de sons... Em 14 de julho de 1995, Brandenburg criou a extensão
.MP3 para designar os arquivos codificados de acordo com as normas MPEG-1
Layer III
A chegada do MP3 tem impacto profundo no campo 25 fonográfico. O produto
anterior (vinil, K7 e CDs) que era físico, passa a ser virtual 26, alterando a relação de
produção e de consumo. Para a Galeria do Rock, que era um centro de consumo de
CDs e Vinis, a relação consumidor e mercadoria estava profundamente afetada. O
consumo de música, principalmente pelos fãs, antes estava baseado na compra de
CDs e LPs, começa a diminuir uma vez que a possibilidade de adquirir um arquivo
em MP3 passava a existir (Teixeira Jr. 2002: 27)
Essa ameaça é potencializada a partir do momento em que se tem a ideia de distribuir
os arquivos MP3 na rede mundial de computadores. Algumas iniciativas, como a do estudante
de Stanford, David Weekly, colocando num site da universidade 120 arquivos MP3, ganham
popularidade mas são rapidamente rechaçadas pelas gravadoras e pela RIAA (Recording
Industry Association of America), que fazia ameaças aos donos dos sites e rapidamente os
tirava do ar. Outras iniciativas, como a colocação das músicas em MP3 em sites FTP (File
Transfer Protocol), ajudavam a espalhar as músicas pela rede, porém não eram simples de
acessar para o usuário comum de computadores.
O ITU27 considera uma conexão de no mínimo 256 kbps como banda larga, embora
esta velocidade já não seja mais ofertada em vários países. O mesmo instituto constata que a
oferta dessa velocidade é cada vez menos frequente no mundo, embora essa migração esteja
acontecendo primeiramente em países desenvolvidos, como o próprio ITU cita em seu
relatório de 2013.
Quadro 2 - Velocidade mínima anunciada para banda larga - % de países
Velocidade anunciada (Mbit/s)
0,256
> 0,256 - 0,512
> 0,512 - 1,024
> 1,024 - 2,048
> 2,048 - 10
> 10-50
25
26
27
2008
2012
45,1
18,8
17,4
7,6
9
n/a
20,8
16
18,1
13,9
20,1
6,9
O conceito de campo está descrito em Bourdieu (2008).
O conceito de virtual está descrito em Lévy (1997).
Sigla em inglês para União Internacional do Setor de Comunicação, a organização é parceira da ONU na
implementação e padronização das comunicações globais. Mais informações em http://www.itu.int/en/ITUD/Pages/About.aspx
52
Velocidade não especificada
2,1
4,2
Nota: baseado em 144 economias com preços de banda larga fixa disponívels em 2008, 2009, 2010, 2011 e 2012.
Fonte: Committed to Connecting the World – ITU.
A realidade no Brasil não é muito diferente dos nossos vizinhos de América Latina.
E em 2012, segundo o ITU, o país já tinha 50% da população com acesso à Internet, taxas
muito próximas dos outros países da América Latina. O mesmo quadro é encontrado quando
comparamos o número de usuários de banda larga por 100 habitantes, onde a única
disparidade é o Uruguai, que já apresenta 16 usuários, enquanto o Brasil tem 9 usuários.
Gráfico 8 - percentual de usuários da Internet no mundo em relação ao total da população
Fonte: Committed to Connecting the World – ITU.
53
Gráfico 9 - Percentual de usuários de banda larga por 100 habitantes
Fonte: Committed to Connecting the World – ITU.
As diferenças seguem quando observamos o âmbito regional do país, onde a
penetração de banda larga varia muito de região para região. De acordo com os dados da
Anatel (Brasil. Ministério das Comunicações, 2014), a região Sudeste ainda concentra 61%
das assinaturas de banda larga.
Gráfico 10 - % do total de assinaturas de bandas larga em Março de 2013
Fonte: Anatel.
A necessária evolução da conexão via Internet no país não é um acaso. Um dos
pontos fundamentais para democratizar o acesso no país é a implementação de políticas
públicas que aumentem o acesso, especialmente nas regiões mais distantes e nas camadas
54
sociais de menor poder aquisitivo. Nesse sentido, o Governo Brasileiro tem sido atuante e, em
2010, o Plano Nacional de Banda Larga foi implementado, tendo como principal objetivo
ampliar e melhorar o acesso no país através do aumento da cobertura, melhorias na velocidade
e redução de preços (Brasil. Ministério das Comunicações, 2014). Já há bons resultados no
aumento do acesso, embora o maior avanço seja na conexão via celular, que apresenta
expressivos crescimentos, mesmo entre as camadas de menor renda. A banda larga, no
entanto, atingiu um crescimento de 54% desde o lançamento do PNBL, e já existe serviço de
banda larga de no mínimo 1 Mbps em 2.850 cidades. Um dos termos de compromisso do
PNBL é a disponibilização do acesso de 1 Mbps em todas as cidades do país até o final de
2014.
Quadro 3 - % de aumento no acesso da Internet via celular por faixa de renda
Classe
2005
2011
Variação
Até ¼ SM
3,8%
21,4%
463,1%
Até ½ SM
7,8%
30%
284,6%
Até 1 SM
15,8%
39,5%
150%
Fonte: Anatel.
Levando em consideração um cenário onde produtores e consumidores se encontram
no ciberespaço, uma democratização das ferramentas de produção e distribuição, a
possibilidade do rompimento do modelo “um para muitos” e entrada de um modelo “muitos
para muitos”, com maior participação do usuário e uma possibilidade cada vez maior de
segmentação do mercado, não havendo acesso igualitário para todas as regiões, pode
significar perda de competitividade para o produtor de conteúdo cultural.
As desigualdades no desenvolvimento da Internet atingem classes sociais, raças,
sexos, faixas etárias e separação espacial. Essas desigualdades no acesso aceleram o processo
de distanciamento dos produtores de cultura local, principalmente nos países em
desenvolvimento, pois, conforme Castells (2010),
ao contrário da televisão, os consumidores da Internet também são produtores, pois
fornecem conteúdo e dão forma à teia. Assim o momento de chegada tão desigual
das sociedades à constelação da Internet terá consequências duradouras no futuro
padrão da comunicação e da cultura mundiais. (Castells, 2010 pg: 463)
A possibilidade de acesso à multimídia é fundamental para a expressão cultural na
atualidade. Na leitura de Castells (2010), a característica mais importante da multimídia é
55
captar a maioria das expressões culturais em sua diversidade: “Seu advento é equivalente ao
fim da separação e até da distinção entre mídia audiovisual e mídia impressa, cultura popular
e cultura erudita, entretenimento e informação, educação e persuasão”. A rede constrói um
novo ambiente simbólico, mesclando real e virtual.
Num cenário em que o usuário tem possibilidade de ser produtor, o Brasil corre o
risco de ser mais um “subúrbio de Chicago”, utilizando um termo de Canclini (1997) em seu
livro Consumidores e Cidadãos.
Nesse cenário, a Internet apresenta-se como uma plataforma fundamental para
distribuição, união e criação das identidades locais, assim como o rádio, na leitura de Barbero
(2004), e a televisão no Brasil e México, na avaliação de Canclini (1997). Para que o
potencial da Internet possa ser ativado/explorado, duas questões devem ser colocadas e
tratadas: o acesso e a educação para a Internet/mídias digitais. O acesso diz respeito à
disponibilidade da tecnologia, tanto em relação a equipamentos e computadores, quanto à
Internet. A educação para as mídias digitais ou para a Internet refere-se não só ao
entendimento da ferramenta, mas também à mudança para uma postura mais ativa, produtora
nesse universo da comunicação, o qual, até então, com a TV, não requeria nenhuma atuação.
O ajustamento dessas questões deve contribuir para que os mercados em desenvolvimento não
sejam tão reféns da produção dos países desenvolvidos e para que o local explore essa
plataforma com a mesma naturalidade dos grandes centros, já que a produção na Internet é
necessária para a expansão da cultura local.
Segundo Canclini (1997), “a promoção das culturas tradicionais só adquire sentido e
eficácia na medida em que vincula essas tradições às novas condições de internacionalização”
(1997: 115), o que reforça o papel da rede mundial de computadores e da possibilidade da
expressão da cultura local nessa plataforma. Ainda na avaliação de Canclini (1997), há a
possibilidade de se construir um imaginário urbano comum entre os bairros e grupos com o
desenvolvimento cultural, proporcionado pelos meios de comunicação em massa.
A conexão de alta velocidade na Internet tanto para produtores quanto para
consumidores entrega aos artistas americanos por exemplo uma possibilidade de expor seus
trabalhos de maneira diferente dos artistas de outros países. Na tabela abaixo é possível ver
essas discrepâncias onde o primeiro artista mais visualizado mundialmente é o coreano PSY,
seguido do rapper americano Macklemore que é artista independente assim como os
americanos do Boyce Avenue que também foram a banda mais visualizada na plataforma.
56
Quadro 4 - Raning dos vídeos musicais mais visualizados no Youtube em 2013
Fonte: Analytics & Insights for the Music Industry (2014).
Um dos exemplos práticos para essa diferença do acesso à Internet são as "cenas"
(Straw, 1991) do Tecnobrega em Belém e do Forró em Manaus. De acordo com Castro e
Bandeira (2011), que realizou entrevistas com os artistas locais,
[...] com a maior disseminação da Internet no estado do Pará, os artistas utilizam
cada vez mais a rede para disponibilizar suas músicas ao público, através,
principalmente da plataforma 4shared e da rede social Orkut, e para estabelecer
parcerias e enviar suas músicas para os DJs, através da ferramenta de mensagens
instantâneas MSN. (Castro e Bandeira, 2011: 193)
No caso de Manaus, os autores encontraram um caso bastante diferente.
Podemos encontrar algumas faixas, DVDs e CDs inteiros de forró de Manaus
disponíveis na Internet, em sites das empresas produtoras (como no
www.djevandrojr.com.br), plataformas de música ou em redes sociais; no entanto,
nenhum dos entrevistados acha que esse meio tem papel importante na divulgação
da música hoje. Não é difícil supor os motivos: a Internet de Manaus é de baixa
velocidade e uma das mais caras do país. Para se ter uma idéia, enquanto a banda
máxima oferecida em Manaus é de 5MB, em São Paulo, a mesma empresa oferece
100, e, para a mesma velocidade, o preço cobrado em Manaus chega a ser 50%
superior ao de São Paulo. No entanto, quando falamos do trabalho do compositor, a
Internet passa a ter maior importância, pois ela ajuda a estabelecer a ponte entre
estes e bandas de outros locais do Brasil, como veremos adiante.
57
Os intermediários tradicionais – a indústria fonográfica e os meios de comunicação
de massa – não são mais fundamentais para cenas como o forró de Manaus, mas não
podemos falar em desintermediação da cadeia. (Castro e Bandeira, 2011: 202)
Nesse ponto, artistas como o Móveis e o Teatro Mágico, que são de centros que tem
disponibilidade de uma conexão de banda larga em alta velocidade como é o caso de Brasília
e São Paulo respectivamente tem uma vantagem competitiva em relação às cenas de Belém e
Manaus, onde o upload de um vídeo no Youtube pode demorar horas.
A rede mundial de computadores tem hoje papel fundamental na distribuição de
música, e foi apenas com a chegada do Napster, em junho de 1999, que esse papel tomou
proporções gigantescas. A criação de Shawn Fanning, que posteriormente viria também a se
envolver com o Facebook, permitia aos usuários compartilhar os arquivos entre seus próprios
computadores, sem necessidade de um servidor fixo, o que ficou conhecido como P2P (Peer
to Peer, ou ponto a ponto). Além disso, a interface do programa era bastante simples. Após
fazer o download e instalação do programa, passava-se por uma configuração básica,
definindo o nome de usuário, senha, localização dos arquivos e onde se queria que os
downloads fossem colocados. Passadas essas etapas, o usuário estava pronto para
compartilhar e baixar arquivos. A tela inicial ainda dava a possibilidade de entrar num chat
com os usuários do programa, ter informações sobre o número de músicas que eles
compartilhavam e a conexão que usavam.
Figura 8 - Página Inicial do Napster com a área de chat
Fonte: Evolt.
A possibilidade de pesquisar os títulos que o usuário desejava baixar também era
muito simples no Napster. Bastava clicar na aba de busca, colocar o artista e a música
58
desejada, sendo possível filtrar pela velocidade da conexão dos usuários, qualidade do arquivo
MP3, entre outros filtros, o que facilitava muito o encontro das músicas na rede. Após achar a
música, era só clicar e o software conectava diretamente com o usuário que disponibilizava o
arquivo, colocando, assim que finalizado, na pasta escolhida nas configurações iniciais.
Figura 9 - Aba de busca do Napster
Fonte:Evolt.
Estima-se que o Napster tenha alcançado a marca de 50 milhões de usuários por
volta de um ano e meio após o seu lançamento. O número de downloads por mês chegava a
quase 3 bilhões. Em dezembro de 1999, Shawn Fanning, criador da ferramenta, foi levado à
corte americana, acusado de violação de direitos autorais em massa. Mesmo com a
condenação do criador do software em 2001, a semente já estava plantada e a alteração nos
costumes já havia acontecido. Após o Napster, veio o Gnutella, que era um software escrito
com licença aberta GPL (General Public License), podendo ser alterado por qualquer usuário,
já que tinha o código fonte disponível. Assim o programa não tinha dono, e podia ser
disponibilizado e melhorado por qualquer um. Após o Gnutella, uma nova geração de
programas P2P invadiu a Internet, e assim apareceram Limewire, Edonkey, emule, entre
outros. As redes P2P se definem como:
Uma rede peer-to-peer (P2P) é formada por vários nós, e a comunicação e troca de
dados na rede é feita diretamente entre os nós, ao invés de arbitrada por um nó
intermediário. Cada nó em uma rede P2P pode agir simultaneamente como cliente e
servidor.
Em sistemas P2P, cada participante da rede (“par”) torna disponível uma parte de
seus recursos ao mesmo tempo em que usa recursos disponibilizados por outros
pares. Isto estabelece um contraste com o modelo mais usual de comunicação em
redes de comutação de pacotes (tais como a Internet), que é o modelo cliente-
59
servidor: nesse modelo, apenas os servidores fornecem recursos, e os clientes apenas
consomem recursos.
A estrutura de aplicação P2P foi popularizada por aplicativos de compartilhamento
de arquivos, como o Napster. Hoje, com o aumento da capacidade dos computadores
e dos links de acesso à Internet domésticos, outros usos de redes P2P existem, por
exemplo para projetos de computação distribuída, para distribuição de fluxos de
mídia em tempo real (streaming), telecomunicações (telefonia, videoconferência,
etc.), entre outros. (André Carvalho, 2010) (GTA. UFRJ)
Figura 10 - estrutura de redes P2P versus servidor dedicado
Fonte: Conceito de rede P2P. GTA. UFRJ.
As redes P2P apenas refletem cada vez mais a cultura da Internet como proposta por
Castells e uma Estrutura de Sentimentos (Williams, 1979) que segue influenciando a cultura
contemporânea. Vários desses programas já tinham tradução para português, ou tiveram
contribuições de usuários brasileiros para a tradução, o que facilitou para o usuário nacional
fazer downloads e, assim, a cultura libertária da Internet, como proposta por Castells,
rapidamente se espalhou pelo mercado da música, configurando um dos principais embates
entre grandes corporações e usuários da história da Internet. Associações como a RIAA e a
IFPI rapidamente acionaram os tribunais do mundo todo para pressionar os usuários através
de processos na justiça, porém não têm sido eficazes para conter a distribuição de música pela
Internet.
60
Figura 11 - Tela de instalação do Emule
Fonte: Ziggi UOL.
Segundo relatório da ABPD (Associação Brasileira de Produtores de Discos), mais
de 1,8 bilhões de músicas foram copiadas da Internet no Brasil durante o ano de 2007, e já
havia uma redução de 80 mil postos de trabalho no varejo de música no Brasil. Os dados
atuais já mostram uma recuperação no setor fonográfico nas vendas físicas, após muitos anos
de quedas, mas o crescimento maior continua sendo no consumo online de música, agora
difundido por plataformas como o Itunes, loja da música da Apple, onde é possível comprar
suas músicas favoritas, desmembradas dos antigos discos completos por US$ 0,99. A entrada
da Apple é um importante marco da reconfiguração do modelo de consumo e de novas
estratégias das grandes empresas. Novas alterações viriam com a popularização das redes
sociais na Internet, primeiramente com o My Space em âmbito global e com o Orkut em
alguns países, mais especialmente o Brasil.
61
Figura 12 - Tela da Itunes, loja de música digital da Apple
Fonte: Itunes. Preview.
Com a popularização do MP3 e das redes P2P, diversos artistas adotaram novas
estratégias de promoção e optaram por vender e distribuir suas músicas diretamente na
Internet, casos do Radiohead que lançou o disco In Rainbows diretamente na Internet, onde o
fã determinava quanto pagaria por cada faixa (Negromonte, 2007) ou do Nine Inch Nails que
também em 2008 disponibiliza todo o seu disco gratuitamente (Ghost I-IV. Wikipédia).
A criação do Youtube é um importante "acontecimento" (Certeau, 1994) no meio
fonográfico e também na Internet, e marca a multiplicação de vídeos expostos na rede, através
de uma plataforma fácil de utilizar e que se tornou rapidamente muito popular. O site, que foi
criado em 2005 por Chad Hurley, Steve Chen e Jawed Karim, ex-funcionários do site de
comércio on-line PayPal, em uma garagem, atingiu já no seu primeiro dia de acesso mais de 8
milhões de visualizações. A intenção do site, segundo os seus criadores, era ter uma
plataforma simples para compartilhamento de vídeos, que era um problema vivido por eles
mesmos. O site foi lançado oficialmente em junho de 2005. O Youtube não estabeleceu
limites para o número de vídeos que cada usuário poderia colocar on-line via upload,
oferecendo funções básicas de comunidade, como a possibilidade de se conectar a outros
usuários, e gerava URLS e códigos HTML que permitiam que os vídeos pudessem ser
facilmente incorporados em outros sites, um diferencial que se aproveitava da recente
introdução de tecnologias de blogging acessíveis ao grande público (Burgess, 2009). Os
números atuais chegam a mais de 4 bilhões de visualizações por dia e mais de 24 horas de
vídeos são colocadas no site por minuto. No Brasil, o site já tem 8 milhões de acessos por mês
e 490 milhões de visualizações por dia. Em 2006, o site foi comprado pelo Google e
incorporado às plataformas de busca do líder mundial dos site de procura na Internet.
62
O Youtube coloca em escala mundial o acesso ao vídeo na Internet. Bilhões de
usuários podem postar seus vídeos e deixar o conteúdo disponível para avaliação e
compartilhamento da comunidade online. A multimídia é uma das categorias chaves para
Castells. Para Levy (1999), a multimídia é: “aquilo que emprega diversos suportes ou
diversos veículos de comunicação.” (Lévy, 1999:63) O autor considera que o termo correto
para a integração de vídeo e som no formato de videoclipe seja mensagem multimodal, já que
coloca em jogo diversas modalidades sensoriais, no caso a audição e a visão.
A popularidade do Youtube insere uma tensão na indústria das telecomunicações e
da música, ao inserir um novo meio de entrega de imagens e sons, onde os indivíduos não são
mais passivos a uma grade de programação definida pelos produtores de conteúdo e têm a
opção de acessar o conteúdo no momento que for conveniente, desde que haja conexão à
Internet. Além da possibilidade de acessar vídeos, qualquer usuário pode fazer upload de seus
conteúdos em vídeo. “Isso transformou o Youtube no maior meio de comunicação de massa
do mundo” (Castells, 2010: 450). O portal é um tipo de “mídia híbrida”; de acordo com
Jenkins (2007), “o portal é um espaço onde conteúdos comerciais, amadores, gratuitos,
governamentais, educacionais e ativistas coexistem e interagem em maneiras muito
complexas. Dessa maneira, o site representa um espaço de conflito e renegociação entre
diferentes formas de poder”. Fica claro, assim, um espaço de conflito. O efeito do Youtube,
tanto no campo das telecomunicações quanto no fonográfico, é o de entregar ao consumidor
uma nova possibilidade de escolha de consumo dos seus artistas favoritos. O espaço
dominado pela televisão, rádios e CDs tem sua hegemonia abalada com a entrada da Internet e,
atualmente, com o aparecimento do Youtube. Para um artista ou banda, exibir seu conteúdo
em vídeo antes do Youtube significava ter acesso a uma emissora de TV como a MTV, que
controla a exibição ao público, que deve sintonizar no canal para poder ser impactado e poder
assistir a um vídeo. Da mesma forma, as rádios também recebem as músicas de determinados
artistas e, de acordo com seus interesses, montam as suas grades de programação.
A chegada do Youtube propicia a qualquer artista de qualquer nicho ou gênero
musical disponibilizar seus videoclipes diretamente ao público interessado, sem necessidade
de uma emissora de TV ou rádio, podendo ser visto quantas vezes quiser e em qualquer
momento pelos usuários, não só em seus computadores mas também agora em seus celulares,
uma vez que o Youtube já disponibiliza uma plataforma específica para esses aparelhos.
Segundo um dos fundadores do site, Jawed Karim – o terceiro cofundador que deixou o
negócio para voltar à faculdade em novembro de 2005 –, o sucesso do site se deve à
implementação de quatro recursos essenciais: recomendações de vídeos por meio da lista de
63
“Vídeos Relacionados”, um link de e-mail que permite o compartilhamento de vídeos,
comentários (e outras funcionalidades inerentes a redes sociais) e um reprodutor de vídeo que
pode ser incorporado em outras páginas da Internet (Burgess, 2009).
O slogan do site já dizia muito sobre as intenções da plataforma: “Broadcast
Yourself”. Fica claro que qualquer indivíduo poderia ter a sua chance de exposição em
formato multimídia, e bandas como os Móveis, Mombojó e Teatro Mágico tiraram proveito
desde o início do Youtube, que deixa claro o fato de ambas as bandas serem “early adopters”,
como descrito por Jenkins (2006), já que ambas as bandas utilizam novas tecnologias mais
cedo que os demais usuários. O Móveis já está inclusive no Pinterest, que é uma rede social
de imagens nascida em 2011. O sucesso do Youtube está ligado também à sua imensa
capacidade de compartilhar os vídeos postados pelos usuários – seja via a exibição de vídeos
mais vistos por categorias como música, entretenimento, esportes, videogame, ou de gêneros
vinculados a suas preferências ou via compartilhamento com uma rede de contatos, tanto no
próprio site quanto em outros sites das chamadas mídias sociais, como Facebook, Twitter e
Orkut.
Assim como o Youtube, as chamadas redes sociais ou mídias sociais têm alterado a
configuração da vida online. Bandas independentes, como os americanos do Boyce Avenue,
que são uma das bandas mais popupares do Youtube, e os próprios Móveis, passando pela
cantora de Tecnobrega Gaby Amarantos, estão presentes nos sites de redes sociais. O Boyce
Avenue iniciou no Facebook em março de 2009 e já tem mais de 1 milhão de fãs na páginas.
No Twitter, a banda iniciou em abril de 2009 e já possui mais de 200 mil seguidores. A banda
brasileira iniciou no Twitter em novembro de 2008 e já tem 35 mil seguidores. No Facebook,
a banda iniciou em dezembro de 2008 e já tem mais de 23 mil fãs.
O Facebook é um dos últimos grandes acontecimentos da rede mundial de
computadores, possivelmente o maior dos últimos anos. A história do site já foi contada
inclusive numa produção do cinema americano, A Rede Social, lançada em 2010. O site
criado por Mark Zuckerberg em 2004, inicialmente chamado theFacebook.com, mudou para
Facebook.com em 2005 com a compra do domínio. Desde então, a rede expandiu seus
domínios, tornando-se o site de mídia social mais acessado do mundo, com mais de 842
milhões de usuários. No Brasil, o site se tornou o líder em mídias sociais em dezembro de
2011, com mais de 35 milhões de visitantes.
64
Gráfico 11 - Evolução do Facebook em relação ao Orkut no Brasil
Visitantes (000) do
Facebook e Orkut no
Brasil
Dez
Dez
201
201
O rápido crescimento do Facebook fez com que ele ultrapassasse outros diversos
0
1
Fonte: Comscore. Apresentações e documentos.
sites de mídias sociais, como o My Space, que surgiu em agosto de 2003 e chegou a mais de
100 milhões de usuários, liderando os sites de mídia social até setembro de 2009. O Facebook
agrega muitas funcionalidades num único local para o usuário, uma vez que ele pode estar em
contato com sua rede de amigos, falar instantaneamente através do comunicador do Facebook,
acompanhar toda a atividade dos seus contatos num jornal atualizado constantemente, postar
fotos, compartilhar sua localização atual, compartilhar vídeos, tudo no seu newsfeed ou
timeline. Essa miríade de opções fez com que o tempo gasto no Facebook fosse igualado aos
grandes portais da Internet. O Facebook já é o 2º site mais acessado tanto no Brasil quanto
nos EUA, atrás apenas do Google.
No Brasil, o Facebook vem tomar o lugar do Orkut, que foi líder no país até 2011. A
rede social iniciada em 2004 foi criada por Orkut Buyukokkten, que era engenheiro do
Google, ao qual a rede social sempre esteve filiada.
Outro site de mídias sociais significativo é o Twitter. Criado em março de 2006 por
Jack Dorsey, Evan Williams e Biz Stone, o site surgiu como um microblog, onde o foco são
mensagens curtas de texto com no máximo 140 caracteres, que são lidas pelos seguidores de
cada usuário. Podem também ser compartilhadas imagens e vídeos, entre as mensagens
postadas. Uma das características do Twitter é a criação de hashtags28 que são utilizadas pelos
usuários para postar mensagens com um conteúdo específico. A premissa básica do Twitter é
responder à pergunta feita pelo site: “o que você está fazendo?”, através de mensagens curtas,
28
As hashtags são hiperlinks (Lévy 1999) para classificação de assuntos, utilizadas em diversas redes sociais
como Twitter, Instagram e Faceook
65
dando uma dinâmica mais imediata e veloz para a conversação mediada por computador. O
Twitter já é o 8º site mais acessado nos EUA e o 11º no Brasil. O grande precursor dos atuais
sites de mídia social são as BBS, que, segundo Castells (2010), são “sistemas de quadros de
avisos (bulletin board sytems)... os fóruns eletrônicos de todos os tipos e comunidades virtuais,
criando o que Howard Rheingold chamada de comunidades virtuais”.
Ainda na sua leitura de Wellman, ele reforça que: “a rede social do indivíduo de
laços informais, que vão desde meia dúzia de amigos íntimos a centenas de laços mais fracos...
tanto as comunidades de grupo quanto as comunidades pessoais funcionam tanto on-line
quanto off-line” (Castells, 2010:444) . E segue mostrando que as comunidades virtuais são
redes sociais capazes de gerar apoio, companheirismo, aconchego e reciprocidade.
Jenkins (2008) propõe, na sua avaliação do Youtube, que já havia uma condição
propícia para a explosão do site. Segundo o autor, já havia uma cultura de “faça você mesmo”,
florescendo nas últimas décadas, mote que já vem dos tempos do Punk Rock, onde várias
bandas abraçaram o conceito de “Do it yourself”. O Youtube vem alterar, assim como os
outros sites de mídia social, a maneira de distribuir e circular os conteúdos e mensagens,
assim como o consumo.
A Internet ofereceu uma capacidade sem precedentes para a explosão desse
fenômeno comum à sociedade humana, que é a capacidade de tecer redes sociais. Recuero
(2009) descreve a rede social:
Uma rede social é definida como um conjunto de dois elementos: atores (pessoas,
instituições ou grupos; os nós da rede) e suas conexões (interações ou laços sociais)
(Wasserman e Faust, 1994; Degenne e Forse, 1999). Uma rede, assim, é uma
metáfora para observar os padrões de conexão de um grupo social, a partir das
conexões estabelecidas entre os diversos atores. A abordagem da rede tem, assim
seus foco na estrutura social, onde não é possível isolar os atores sociais e nem suas
conexões. (Recuero, 2009: 24)
A diferença entre as redes sociais offline (fora da Internet) e online (conectadas na
Internet) são o fato de a comunicação ser mediada pelo computador nas redes online. Castells
(2010), citando Wellmann, lembra que:
as comunidades virtuais não precisam opor-se às “comunidades físicas”: são formas
diferentes de comunidade, com leis e dinâmicas específicas, que interagem com
outras formas de comunidade. [...] tanto as comunidades de grupo quanto as
comunidades pessoais funcionam tanto on-line quanto off-line. (Castells, 2010:445)
Essa possibilidade da articulação em rede online que transpassa as fronteiras virtuais
e chega ao offline fica muito evidente num dos acontecimentos de 2014, que neste momento
ainda está em embulição, os rolezinhos (Ribeiro et al. 2014). Os encontros, que começam nas
66
redes sociais, extrapolaram as plataformas como o Facebook e foram para locais como
shopping centers e até o Parque do Ibirapuera, em São Paulo, onde em janeiro se reuniram
milhares de participantes.
A articulação em redes é fundamental para o aparecimento da "forma emergente"
(Wlliams, 1979) que utiliza essa prática para sobreviver, aproveitando-se da Internet para
ganhar velocidade e prosperar fora da lógica das grandes corporações, que têm se articulado
para voltar a prosperar num mercado em transição.
1.4 A "forma emergente" e as estratégias das majors.
Se por um lado a Internet deu a possibilidade de redução de custos de distribuição e
produção aos produtores "independentes"29, o mesmo pode se dizer das majors da indústria da
música. De uma lógica que necessitava da produção de um produto físico, passamos para um
novo momento, em que os arquivos são digitais e o conteúdo que o usuário pode armazenar é
cada vez maior. Saem os tocadores de LP, K7, CD, DVD e entram os tocadores de MP3 e
posteriormente o Smartphone ou as plataformas de Streaming30. Sem a necessidade de espaço
físico para armazenamento da produção, a proposta de atingir um número cada vez maior de
segmentos é cada mais viável através dessa redução de custos, como propõe Anderson (2006).
De Marchi (2011) faz uma comparação entre as estruturas de custo de produção entre
o fonograma físico (LPs ou CDs, por exemplo) e uma faixa digital.
No preço de uma unidade de disco estão contidos: (a) os custos de produção da
matriz; (b) os royalties antecipados aos artistas; (c) direitos autorais e conexos; (d)
custos de armazenamento e distribuição; (e) custos de divulgação; (f) impostos. Para
que todo este investimento valha à pena, deve-se produzir um número expressivo de
cópias de uma obra, o que exige uma grandiosa estrutura para levar os discos aos
consumidores primários (lojas) e finais (indivíduos). O fonograma digital também
tem um custo de produção, é claro, mas este não pode ser mitigado através da
produção de múltiplas unidades de uma mesma matriz porque, uma vez inserido
numa rede digital, tal produto está imediatamente disponível para todos os usuários
a baixo custo. Seu valor depende do interesse que ele gera como informação para tal
coletividade. A cada acesso, ele não se desgasta, tampouco é retirado de circulação.
Pelo contrário, quanto mais ele é acessado, mais valoriza a rede na qual circula,
29
30
O Conceito de Independente é bastante amplo e muito debatido em qual o nível de autonomia dos artistas ou
eventos que podem ser enquadrados dessa maneira. Herschmann (2010) ressalta a classificação da Abrafin
para a classificação dos festivais independentes, que são os que não têm sistematicamente apoio da iniciativa
privada, ou eventos que selecionam pelo menos 75% das bandas e artistas que não são associados às
gravadoras internacionais e não são geridos direta ou indiretamente por órgãos do governo (ainda que possam
ser financiados por iniciativas ou leis de incentivo. De Marchi (2011) reforça a imprecisão do termo, porém
adota que “independente” é toda gravadora que não seja considerada uma grande gravadora. Neste trabalho,
serão considerados também os artistas que não são contratados por nenhuma das grandes gravadoras.
A palavra streaming, dentro do contexto da informática, designa a tecnologia para transferência de dados de
uma maneira que eles possam ser recebidos e processados em um curso constante. Grosso modo, é a
possibilidade de assistir a um vídeo enquanto ele é carregado em um servidor que não envolve outros
usuários (Amoroso, 2009).
67
agregando mais usuários (externalidades em rede). Finalmente, quando a rede de
usuários atinge uma massa crítica, pode-se restituir parte dos custos de produção
através da internalização das externalidades em rede, através da venda de outros
produtos e/ou serviços. Portanto, um disco físico e outro digital não são um mesmo
produto em suportes diferentes, mas dois produtos distintos: enquanto aquele deve
ser levado em grandes quantidades para a venda no mercado, este deve atrair uma
multidão de usuários. O que importa no mercado digital não é, portanto, a
capacidade que uma empresa possui de produzir bens físicos em maior ou menor
escala, mas a de (a) formar redes de usuários e (b) monetizar suas externalidades em
rede. (De Marchi, 2011:190-191)
Nesse cenário, a Apple se aproveitou das antigas estratégias da Indústria de música
ao incorporar partes diferentes da cadeia de produção e distribuição, hardware e software. Do
Itunes ao Ipod e ao Iphone, a cadeia de distribuição da Apple é muito bem estabelecida,
adaptando-se rapidamente a um esquema de distribuição das faixas digitais aos consumidores,
ao invés dos álbuns em fonogramas físicos. A Apple lidera o mercado de downloads digitais,
com aproximadamente 63% dos downloads em 2012 (Barr, 2013), mas já sofre concorrência
da Amazon, que se utiliza de estratégia parecida, com uma loja virtual e venda de hardwares
como o tablet e o leitor de livros digitais Kindle.
Os serviços de radiodifusão ou streaming, onde não se faz o download das faixas
digitais, e apenas se escuta, também vem apresentando grande crescimento na Internet. De
Marchi (2011) define esses serviços como:
De fato, são empresas distintas entre si, mas que por motivos tanto publicitários
quanto legais são consideradas “rádios pela Internet”. O que reúne essas empresas
sob uma mesma categoria são (a) a de exigir um cadastramento prévio dos usuários
para sua utilização e (b) apresentar gratuitamente as canções na lógica de fluxo,
como na radiodifusão, ainda que não se restrinjam a essa modalidade de acesso aos
conteúdos. Uma breve análise de suas características denuncia que podem ser
consideradas como especializações da categoria anterior. Isto é, misturando a
coleção de dados pessoais dos usuários com a lógica de fluxo dos fonogramas, essas
empresas se especializam em gerar informações as mais precisas possíveis sobre os
gostos dos usuários a fim de oferecer-lhes produtos específicos e ampliar suas redes
de pares. No caso de empresas como a Last.FM, as músicas apresentadas são
oferecidas de acordo com as informações que cada usuário provê sobre seu gosto
musical (tagging) (AMARAL, 2009). O mesmo ocorre em Spotify, onde os usuários
podem buscar e escutar as músicas que desejam de forma gratuita e, caso lhes
interessem, comprar as canções por peça ou álbum, além de se subscreverem para
serviço Premium, baixando os arquivos para equipamentos móveis (celulares,
reprodutores de MP3). Assim, fica evidente que o acesso gratuito ao fluxo de
fonogramas é apenas uma tática utilizadas por tais empresas para atrair usuários,
objetivando aplicar distintas estratégias de internalização das externalidades em
rede: venda de espaço publicitário, subscrição para serviços especializados, venda de
fonogramas digitais, entre outras possibilidades. (De Marchi, 2011:193)
Já tendo passado por outras crises e tendo em sua estratégia a aquisição, fusão e
parceria com outras empresas de entretenimento, as majors rapidamente se engajaram na
cultura da Internet e estão em processo constante de aquisições e parcerias, visando à
68
manutenção da hegemonia (Gramsci, 1999). Netto (2008) faz um levantamento de como as
majors vêm se aproximando de diversas empresas que têm seus negócios baseados na Internet.
No que diz respeito à indústria fonográfica, a EMI, uma das quatro empresas
chamadas majors (ao lado de Universal, Sony-BMG e Warner), detentora de 10% do
mercado fonográfico mundial em 2007, anunciou em abril daquele ano que passaria
a vender suas músicas no iTunes sem qualquer tecnologia de proteção contra cópias.
Na prática, isso significa que a EMI abriu mão do DRM, permitindo que, uma vez a
música comprada, ela possa ser compartilhada pelo consumidor quantas vezes este
desejar. Já a Sony-BMG, que em 2007 detinha 26% do mercado mundial, divulgou,
em outubro de 2006, acordo com o site YouTube, no qual disponibiliza seu catálogo
de vídeo e áudio para ser acessado por consumidores gratuitamente. Em
contrapartida, a Sony-BMG compartilha com o YouTube as rendas advindas de
propagandas e anúncios que sejam feitos nesse site. A Sony-BMG ainda anunciou
que havia entrado em pleno acordo com o site Qtrax, aqui já citado, para a
distribuição gratuita de música em troca de receitas advindas de anúncios e
propaganda. O elogio feito por David Renzer, CEO da Universal Music Publishing
Group (a editora ligada à Universal, gravadora que em 2007 controlava 31% do
mercado mundial), aponta para a mesma direção. Diz Renzer: “Nós acreditamos que
o Qtrax e o ambiente legal de P2P [peer-to-peer] são um excitante novo modelo de
negócio com um grande potencial de crescimento e nós nos felicitamos por termos
concluído este novo acordo com eles”. Elogio parecido é feito ao Qtrax por George
White, vice-presidente Senior da Warner Music Group (que em 2007 dominava 15%
do mercado mundial): “representa um modo de negócio inovador, que oferece a
nossos artistas um outro modo de alcançar os fãs [...] enquanto são justamente
compensados por seu trabalho”. Mais para frente entraremos em detalhes sobre o
funcionamento do Qtrax e de outros serviços similares. Agora o que nos importa é
que, ao menos em discurso, a indústria fonográfica, representada pelas grandes
gravadoras, parece mais de acordo do que em conflito com a indústria de tecnologia.
(Netto, 2008:146-147)
Até a própria pirataria já não é vista mais como uma barreira para a indústria de
música, que já libera os direitos em algumas plataformas, uma vez que atualmente se
preocupa mais em vender anúncios em suas plataformas digitais, ou outros produtos ou até
mesmo os shows ao vivo, que cada vez mais são uma receita importante dentro do
faturamento dos artistas e das empresas.
Herschmann (2010) faz um resumo das principais alterações da indústria de música
do século XX para o momento atual de transição.
69
Quadro 5 - tendências do processo atual em relação so Século XX
Tópico
Indústria da música do Século
XX
a) Empresas
Conglomerados organizados em
unidades produtivas: estrutura
organizacional hierarquizada e
departamentalizada; terceirização de
selos/indies, gravadoras independentes
pouco competitivas e isoladas
b) Mercado
Massivo: nacional e transnacional
c) Relacionamento com os
consumidores
d) Comercialização/
Distribuição
Unilateral pelos mercados e mídias:
processo pontual e difusão. Lojas e
mídias tradicionais (rádio e TV)
Através de lojas, megastores e
supermercados
Tendências no processo atual
de reestruturação da
indústria da música
Pequenas e grandes empresas
organizadas em rede: associativismo
e parcerias (competem e cooperam);
artistas e indies mais competitivas e
organizadas
em
coletivos,
associações e arranjos produtivos.
Segmentação (pulverização de
nichos de mercado): Local e glocal
Interativo pelas redes (sociais e
Internet): processos constantes e
interativos
Através da Internet, de pontos de
venda alternativos e de vendas em
shows
Diferencial competitivo: estudos
quantitativos e qualitativos de
comportamento e tendências dos
inúmeros nichos de mercado
local/glocal
e) Conhecimento
Mais um recurso entre outros: dados
quantitativos de vendas da indústria
nos mercados nacionais/internacionais
f) Estratégias de venda
Mecanismos de difusão/sedução entre
os consumidores: publicidade, listas
top 40; star system dos artistas,
esquemas para blocknusters, lobby
com os formadores de opinião,
catálogo dos gêneros musicais,
megashows ou grandes festivais
Mecanismos de interação e
coprodução com os consumidores
(na web); liberação de conteúdos
(socialização, free) ferramentas de
marketing e design; emprego de
repertórios simbólicos em sintonia
com a cultura local/glocal
g) Contratos e dinâmicas de
trabalho
Contratos: fixos, grande cast de
artistas, staff de publicidade e de Arte
& repertório. Trabalhador: empregado
da empresa (em geral em
departamentos)
Contratos temporários e downsizing.
Trabalhador: colaborador e/ou
parceiro da empresa (em rede)
h) Inovação
Sazonal: desenvolvimento de
tecnologia e know-how;
renovação/criação de novos gêneros.
Realizada por artistas e gestores da
indústria
i) Resultados
Produtos, mercadorias (suportes,
físicos) e serviços: Discos de vinil,
DVDs, CDs e outros suportes físicos.
Papel periférico dos concertos.
Constante: desenvolvimento a partir
também de conhecimentos tácitos
e/ou da cultura local; resultados
obtidos através de apropriações e
colagens (como, por exemplo,
através do ato de samplear) de
repertórios simbólicos, ritmos e sons.
Realizada por artistas e gestores da
indústria.
Bens imateriais e serviços:
Videogames, ringtones, podcastings,
concertos ao vivo (mais central),
serviços de bancos de música on-line
à la carte ou por assinatura.
Fonte: Herschmann, 2010:73
É possível verificar diversas estratégias utilizadas pela indústria de música como
"formas residuais" (Williams, 1979), como é dos discos de vinil e CDs, que, de um papel
70
maior no Século XX e tiveram seu papel resignificado para o consumidor e para as empresas.
Assim, é importante não adotar uma postura fatalista ou extremamente otimista neste
momento de reconfigurações da indústria, e principalmente levando em consideração que este
é um mercado onde grandes corporações ainda estão presentes.
Herschmann (2010) lembra que os modelos de administração de grandes artistas
ainda continuam sendo extremamente exitosos e que outros formatos que outrora pareciam
extintos retornaram num "residual" (Williams, 1979) , como é o caso do vinil, que vem
apresentando grande crescimento nos últimos anos. O vinil cresceu 33% de 2012 para 2013
no mercado americano (Petersen, 2014), vendendo um total de 6,1 milhões de unidades nesse
mercado.
O novo papel dos concertos ao vivo vem ao encontro de um momento em que as
experiências sociais parecem assumir um papel cada vez maior na vida contemporânea.
O gráfico abaixo mostra essa forte tendência de crescimento da venda de ingressos
para shows ao vivo no últimos anos, e essa receita passou de 14% para 18% do total do
faturamento da indústria de música nesses mesmos anos, reforçando o papel dos shows.
Some-se a esta receita o faturamento com transmissões via TV, patrocínios, vendas de
mercadoria, e veremos uma importância cada vez maior dos shows.
Gráfico 12 - mundial com shows ao vivo, em bilhões de dólares
Fonte: Grab Stats.
Essa importância cresce também entre os artistas independentes, e no caso do Brasil
os festivais independentes têm sido responsáveis por lançar diversos artistas e manter o
mercado movimentado em nichos e regiões não explorados pelos festivais organizados por
grandes produtoras. As redes sociais offline e online têm papel fundamental na organização e
71
movimentação do público e nessa emergência de um novo formato que se organiza em
paralelo às grandes empresas. Segundo Herschmann (2010),
Nesse novo perfil de circuito fomentado e realizado por jovens atores sociais, a
produção é toda feita via Internet e/ou tecnologias digitais (isto é, da divulgação,
distribuição, convite para shows até a organização dos festivais propriamente ditos).
(Herschmann, 2010:83)
Os festivais independentes e as cenas locais no Brasil têm sido fundamentais para
uma das principais estratégias do mercado de música atualmente, que são os shows ao vivo.
As "cenas", que para Straw (1991) são espaços culturais mutáveis e fluidos, caracterizados
pela construção e diferenciação de alianças e práticas musicais, são também caracterizadas
pela regionalidade e características específicas de alguns gêneros musicais, e sua importância
social e econômica para diversas regiões do país. Nesse sentido, Jannoti (2011) reforça o
conceito:
[...] as cenas musicais são vivenciadas das identidades que transitam entre
afirmações cosmopolitas (conexão com expressões musicais que circulam em
lugares distintos do planeta e através da Internet) e a forma como as mesmas
expressões musicais se afirmam em diferentes espaços urbanos. As identidades
culturais ligadas ao mundo da música se confirmam nas negociações efetivadas
entre afirmações cosmopolitas (conexão com gêneros musicais consumidos em
distintos lugares do planeta e socializados através da Internet) e a forma como essas
mesmas expressões musicais (mesmo em versões locais ou gêneros regionalizados)
se afirmam através de apropriações culturais em diferentes espaços urbanos. Da
mesma maneira que a música faz parte do processo de afirmações identitárias
individualizadas, ela reflete diretamente sobre o local onde é produzida (ou
consumida) gerando implicações sobre o desenvolvimento regional, bem como
sobre identidades coletivas. É conhecida a importância do Axé para o
desenvolvimento econômico e cultural de Salvador , do Frevo para Olinda, do
Tecnobrega para Belém e do Samba para o Rio de Janeiro. Por outro lado, podemos
pensar que algumas estratégias relacionadas à música pop (como o mundo das
boybands) ou alguns subgêneros da música eletrônica afirmam relações com
imaginários urbanos cosmopolitas, que não seriam tão marcados pela construção de
tradições regionalizadas. Mas, mesmo as práticas musicais desterritorializadas,
quando relacionadas aos seus locais de consumo, seja como música gravada ou ao
vivo, acabam negociando de maneira dialógica e tensiva com os tecidos urbanos em
que se materializam. Não por acaso, vivemos uma profusão de circulação de
músicos covers nos espaços urbanos. O sucesso desse tipo de empreendimento
demonstra a força afetiva e comercial da música ao vivo. Parece, que na ausência ou
impedimento do contato com o “produto original” , consome-se até o “cover
oficial”. (Janotti Jr, 2011:9-10)
Essas associações e parcerias nas redes, comportamento típico descrito por Castells
(2010) para as empresas de um mundo em rede, formam uma teia de festivais que teve como
um dos seus grandes expoentes a ABRAFIN (Associação Brasileira de Festivais), que foi
responsável por congregar dentro de uma organização alguns dos mais importantes festivais
do país, como o Abril pro Rock, Goiânia Noise, Calango, MADA e muitos outros. Esses
72
festivais são responsáveis por manter diversas cenas locais em atividade e promover o
intercâmbio de diversos novos artistas das cenas locais para o resto do país, como é o caso do
Moveis Coloniais de Acaju, Mombojó, Macaco Bong, Vanguart, Gaby Amarantos, Teatro
Mágico, entre outros artistas já consolidados.
Herschmann (2010), em entrevista com o DJ e blogueiro Israel do Vale, reflete sobre
a importância dos festivais independentes no país nessa construção de redes e parcerias entre
as cenas:
[...] esta talvez seja a grande virtude dos festivais independentes afirmar-se
localmente como a apoteose da cena local e estabelecer um diálogo construtivo e
criativo com outras cenas, abrindo canais para a circulação e o intercâmbio artísticos
que, na falta de políticas públicas mais incisivas, abrem caminho para a
sustentabilidade. Ou pelo menos ajudam a ampliar as igrejinhas de cada um.
(Herschmann, 2010:132)
Os festivais têm sido também um importante espaço para a troca de boas práticas
entre as bandas participantes, e palestras sobre o mercado de música, produção e atividades
relacionadas têm sido uma constante nos eventos.
Para os artistas independentes, uma série de pressupostos que estavam ancorados nas
estratégias de uma forma "dominante" das majors simplesmente deixaram de existir, como a
necessidade da venda de fonogramas como principal receita. Diversas bandas compartilham
suas músicas diretamente em seus sites para download, em mecanismos P2P torrents e até
mesmo abraçam a pirataria, como é o caso da cena tecnobrega de Belém.
A principal renda dos artistas do tecnobrega advém de apresentações ao vivo e da
venda direta ao público de CDs e DVDs, produzidos em estúdios caseiros, nas festas
e nos shows. As apresentações ao vivo acontecem principalmente em casas de
shows, mas também nas chamadas festas de aparelhagens que reúnem centenas (por
vezes até milhares) de pessoas ao redor das cabines dos DJs: equipamentos de som
com um impressionante efeito de luz, feito sob medida para cada uma das
aparelhagens e as bandas de música realizam, respectivamente, cerca de 3200 festas
e 850 shows por mês na região metropolitana de Belém.
Mais do que um mercado estruturado na festa, chama atenção no tecnobrega a forma
de divulgação das bandas. Para serem convidadas a tocar nas casas de shows, os
grupos musicais precisam primeiro “estourar” nem que seja com só uma música. Os
artistas possuem estratégias para que isso aconteça, mas a mais importante delas é a
“pirataria”. O artista precisa ter seus sucessos gravados nas coletâneas produzidas
pelos DJs de estúdio, que são vendidas no mercado informal, em geral com apoio
das bandas, que abriram mão do ganho com direitos autorais, visando à circulação
das obras. Em vez de lançar um CD para depois buscar o sucesso de uma ou outra
faixa, no universo bregueiro ocorre o inverso do que se vê na indústria fonográfica
formal: o artistas primeiro lançam músicas e, posteriormente, caso um número
considerável delas faça sucesso, produzem os discos com as músicas “estouradas” e
novas composições. É cada vez mais comum existirem artistas famosos sem discos
gravados. (Castro e Bandeira, 2011: 191-193)
73
A "cena" (Straw, 1999) de Belém leva em consideração novas tendências, como o
consumo de faixas únicas, o single ao invés do modelo anterior de álbuns, e a ascensão e uma
nova tendência dos shows ao vivo. Outra tendência rapidamente captada pelos artistas
independentes e colocada em prática inicialmente em um modo do it yourself resgatado do
Punk Rock é a "multimídia" (Castells, 2010). Após a explosão do Youtube e das redes sociais
na Internet, muitos artistas se aproveitaram da possibilidade de gravar seus próprios vídeos e
expor seus trabalhos diretamente para a audiência interessada. Uma das bandas de maior êxito
no Youtube em âmbito global, o Boyce Avenue, iniciou sua carreira fazendo vídeos caseiros
de covers31 e posteriormente postando suas próprias músicas na plataforma.
Desde o início no Youtube, a banda cresceu dentro do site e hoje já é a segunda
banda em número de visualizações dos vídeos postados, com mais de 1 bilhão de
visualizações e 4 milhões e 900 mil inscritos em seu canal dentro do site. Dentre os vídeos
postados, dezenas deles já têm mais de 10 milhões de visualizações e, graças à projeção no
Youtube, a banda alcançou o reconhecimento das gravadoras, chegando a ser contratada por
uma das grandes do mercado fonográfico e sendo inclusive convidada para tocar no European
Music Awards, premiação promovida pela MTV Europa em novembro de 2011. Mesmo
contratada pela EMI, a banda voltou à independência, pois julga que o formato das gravadoras
é muito restrito e poderia ter ganhos muito próximos, uma vez que já tinha alcançado uma
base de fãs consistente32 e tem turnês consolidadas pelos Estados Unidos, Europa, Ásia e mais
recentemente na América Latina. A banda se aproveita de todas as redes sociais e também já
tem suas músicas no Itunes. Na turnê europeia, a banda excursionou com outros músicos que
utilizam a mesma estratégia no Youtube e redes sociais, como o cantor Alex Goot e a cantora
Hannah Trigwell, com quem a banda faz alguns vídeos em parceria.
31
32
Músicas de um artista tocadas por um terceiro.
Entrevista realizada com a banda em Liverpool em 15 jun. 2012.
74
Figura 13 - Apresentação da banda Boyce Avenue no European Music Awards
Fonte: You Tube. Boyceavenue.
A produção de videoclipes, seja de maneira caseira ou através da contratação de
profissionais especializados, como já feito anteriormente pelas majors, tem feito diversos
artistas conseguirem notoriedade no mercado, como o segmento de Funk Ostentação, que tem
a maioria de seus artistas independentes e gerenciados pela produtora Máximo, independente
das grandes gravadoras.
Figura 14 - clip de Funk Ostentação do Mc Guimê
Fonte: MC Guime Original.
De Marchi (2011) faz um gráfico resumindo algumas das mediações usadas pelos
artistas independentes para chegar ao consumidor final. Bandas como o Teatro Mágico e
Móveis usam todas as mediações citadas no gráfico abaixo, ambas inclusive tendo feito
parcerias com a Trama Digital para a distribuição das suas músicas gratuitamente em MP3.
75
Figura 15 - Rede de negócios do músico autônomo
Concerto ao vivo
Página oficial na
Internet
Artista
Autônomo
Consumidor
final
Intemediários
do entorno
digital (Trama
Virtual, Palco
MP3, etc).
Fonte: De Marchi, 2011
Aqui é possível assinalar uma alteração na produção das "materialidades" (Williams,
1979) do mercado de música. O processo linear das grandes gravadoras, da contratação do
artista até a definição das capas para os LPs e CDs sofre mudanças. Muitas práticas seguem
inalteradas se mantém como "residuais" (Williams, 1979), como a contratação de produtores,
diretores de vídeo ou mesmo a venda de CDs e LPs. Os fonogramas físicos perdem a
importância e diversos artistas já não se preocupam e ter um disco completo como relata MC
Guimê em no filme sobre o funk ostentação. É fundamental na leitura desse trabalho a
disponibilização de um videoclipe, do arquivo digital, seja em MP3 ou em streaming e a
receita dos shows, método que é seguido por diversos artistas do mercado brasileiro. O
vocalista da banda de rock Cachorro Grande afirma: “Só Roberto Carlos deve fazer dinheiro
com venda de discos no Brasil. A gente ganha pra viver fazendo show. É isso que dá tesão.
Queremos que escutem, cantem, não importa a forma como nosso produto é adquirido”
(Machado, 2012). O rapper Emicida saiu da mixtape caseira (Duran, 2009) para o canal no
Youtube, a Fan Page no Facebook, o perfil do Twitter, um público fiel nos shows e o disco
disponível para download gratuito (Emicida disponibiliza seu novo álbum para download
gratuito. Rap Nacional, 2013).
Essas "mediações" (Barbero, 2006) têm possibilitado aos artistas independentes uma
carreira bastante estável, pela possibilidade de ter contato direto com os consumidores, sem
ter a necessidade de uma gravadora como intermediário e detentor dos meios de produção.
Assim, as receitas vão direto aos músicos, sem necessidade de intermediários. Ainda é cedo
para análises definitivas, uma vez que os artistas de maior sucesso ainda são os representados
76
pelas grandes gravadoras e, mesmo no pop internacional, tivemos apenas recentemente um
exemplo de artista independente a entrar no Top 40 da Billboard americana e liderar a lista
Hot 100 desde 1994, com a dupla de Rap e R&B Ryan Lewis & Macklemore. A dupla, que
fez sucesso com o videoclipe de Thrift Shop, tem sua página na Internet, onde mostra
inclusive a equipe responsável pela turnê e pelos videoclipes.
Figura 16 - de Thrift Shop no Youtube.
Fonte: You Tube. Macklemore & Ryan Lewis –
Thrift shop feat. Wanz.
Figura 17 - Página da dupla Ryan Lewis & Macklemore com a equipe de trabalho
Fonte: Macklemore.
No Brasil, um dos exemplos mais recentes é a funkeira Valeska Popozuda, que já
fazia parte de uma consolidada cena independente nacional, a do funk carioca. Valeska acaba
de lançar seu videoclipe em carreira solo de maneira independente e tem uma extensa agenda
77
de shows pelo país. A música “Beijinho no Ombro” já é considerada o “hit” do verão
nacional33.
O site TheOatmeal.com faz uma tirinha com uma crítica sobre o mercado de música
e uma possibilidade otimista, porém com um bom resumo de por onde o mercado já passou, o
momento atual e aonde podemos chegar.
Figura 18 - tirinha do site theoatmeal.com
Fonte: Alcântara, 2014.
33
ALCÂNTARA, Fabiana. Valesca Popozuda, do hti ‘Beijinho no Ombro’, faz três shows no mesmo dia; veja
fotos. UOL Música, 26 jan. 2014. Disponível em: <http://virgula.uol.com.br/musica/pop/valesca-popozudado-hit-beijinho-no-ombro-faz-tres-shows-no-mesmo-dia>.
78
Figura 19 - tirinha do site theoatmeal.com
Fonte: The State of the music industry. Oatmeal. (Tradução livre).
Figura 20 - tirinha do site theoatmeal.com.
Fonte: The State of the music industry. Oatmeal. (Tradução livre).
79
Figura 21 - tirinha do site theoatmeal.com
Fonte: The State of the music industry. Oatmeal. (Tradução livre).
Esta "forma emergente" (Williams, 1979) onde o artista entra em contato diretamente
com seu consumidor, como mostram as tirinhas do site Oatmeal logo acima, entrega algumas
possibilidades aos artistas e, no caso brasileiro, esses têm explorado diversas alternativas
abertas por toda uma "estrutura de sentimentos", como proposto por Raymond Williams, que
permeia as alterações nas maneiras de produzir e consumir música. No Brasil, as diferentes
"cenas" (Straw, 1999) têm se unido para movimentar o mercado, expandir a rede e ganhar
novos consumidores. Há uma identificação com o “ser independente”, como nos tempos do
Punk Rock, mas há também uma evolução como descrita por Herschmann (2010), em
entrevista com Fabrício Nobre, presidente da Abrafin: “[...] se num primeiro momento o ideal
para a música independente (especialmente para o punk rock) foi o do it yourself, hoje o
universo indie só é possível num outro modelo: o qual se baseia no do it together”.
(Herschmann, 2010:149)
Há que se ter cuidado ao adotar uma postura absolutamente otimista com as
possibilidades oferecidas pela Internet e suas correspondentes plataformas como o Facebook,
por exemplo. É sempre necessário lembrar que estamos lidando com grandes corporações,
transnacionais que como já visto nesse capítulo irão se reorganizar para manter suas posições
de controle no mercado. Além disso, empresas como o Facebook e Google, importantes hoje
na rede global de computadores são também grandes corporações e buscam estabelecer
80
dominância e lucrar com o uso das suas ferramentas, vide o caso da crescente monetização
das postagens no Facebook que passou a cobrar pelo alcance dos posts para o total da base de
fãs das páginas, ou de amigos do usuário. O resultado disso é um aumento de posts
patrocinados na rede social (Study: Pages that showed organic reac growth in December also
used advertising. Inside Facebook, 2014). Este tipo de iniciativa começa a dificultar o acesso
a pequenos produtores uma vez que os custos para alcançar toda a base de fãs ficam cada vez
mais altos. O mesmo funciona para o Youtube, que possibilita diversos tipos de anúncio
(Google. Suport).
[...] hoje estamos presenciando uma competição entre entre as corporações
transnacionais para estabelecer e consolidar quase-monopólios na nova infraestrutura de informação As diversas corporações de telecomunicações, e de
fabricantes de hardware e software, e corporações de informação entretenimento
estão se fundindo e ampliando as suas operações, esforçando-se para dividir e
controlar os novos continentes de redes produtivas. haverá, é claro, pedaços e
aspectos dessa rede consolidada que resistirão ao controle, graças à estrutura
interativa e descentralizada da rede: mas já está em marcha uma maciça
centralização de controle por meio da unificação (de facto ou de jure) dos elementos
principais da estrutura de poder da informação da comunicação: Hollywood,
Microsoft, IBM, AT&T e assim por diante. As novas tecnologias de comunicação,
que oferecem a promessa de uma nova democracia e de uma nova igualdade social
de fato criaram novas linhas de desigualdade e exclusão,dentro dos países
dominantes e especialmente, fora deles. (Hardt e Negri, 2001: 321).
De qualquer maneira, ao que vimos, há novas possibilidades sendo exploradas no
mercado musical. Nesse cenário, o Móveis se apresenta como um exemplo de como um
artista independente pode ter uma carreira sustentável e como essa carreira se desenvolve com
todas as características descritas neste primeiro capítulo. A banda é formada numa
universidade, constrói a carreira ao redor da Internet, é participante dos festivais
independentes, além de fomentar seu próprio festival, como uma maneira de intercâmbio
entre as cenas e dar oportunidade a novas bandas de Brasília. A trajetória da banda e suas
iniciativas serão exploradas no próximo capítulo, também como uma maneira de deixar pistas
para outras bandas e outras cenas de como se manter no mercado musical contemporâneo.
81
82
CAPÍTULO 2
MÓVEIS COLONIAIS DE ACAJU: BUSCA PELA AUTONOMIA E
INDEPENDÊNCIA MAS TAMBÉM POR TRADIÇÃO
2.1 "Somos brasilienses". O início dos Móveis na cena brasiliense e a identificação com a
tradição musical da cidade
[...] e depois não paramos mais também. Mas
sempre nos preocupando com Brasília, em manter
uma rotina de shows aqui. (Fábio Pedroza, baixista
dos Móveis34)
Figura 22 - Post no blog da banda após a ocupação do Congresso Nacional em Junho de 2013
Fonte: Moveis coloniais de acaju.
Acredito na mudança. Nada é permanente. O fim e o começo dançam
constantemente sobre nossas vidas. Em todo passo, existe um término e um começo.
Um ponto de partida e outro de chegada.
Nessa caminhada, redescobrimos amores, verdades, vontades, vocações, relações.
Ontem, redescobri o sentido de Democracia. Ocupamos as ruas para nos apoderar de
nossas próprias vidas. Do nosso lar, da nossa cidade, de nosso país.
Vamos assumir a responsabilidade pelo que é nosso. Nos assegurarmos de que
nossos valores não serão deturpados pela necessidade de poder de quem quer nos
governar. Eles não nos representam. Nossas causas devem ser defendidas por nós
mesmos. Vamos nos despir do medo e da desilusão, para sermos o eixo da nossa
própria revolução! Revolução de si para o todo. Do indivíduo para a sociedade.
Revolução na diversidade.
34
Post no blog da banda Disponível em: http://www.moveiscoloniaisdeacaju.com.br Acesso em 30
jul. 2013.
83
Somos muitos. De vontades, desejos e deveres diversos. Somos diferentes, mas
dependemos uns dos outros. Há aquele que me alimenta. Há aquele que me ensina.
Há aquele que me conduz. Há aquele que me diverte. Há aquele que me questiona.
O Brasil precisa mudar e possibilitar que cada um cumpra com sua função na
35
sociedade. Qual é o seu lugar nesse país? Ocupe-o.[sic]
O post do vocalista André Gonzales, um dia após a manifestação que ocupou o
Congresso Nacional, evidencia algumas características sobre os Móveis. Ativistas pró-cultura
e pró-Internet, universitários, jovens, artistas, agentes culturais, empresários e, antes de tudo,
brasilienses. O legado candango tem grande importância na formação da banda do cerrado
brasileiro.
Capital da nação, a cidade de Brasília é o berço de algumas das mais notórias bandas
desde a década de 80. O legado do cerrado brasileiro inclui bandas de grande expressão no
mercado, como Legião Urbana, Paralamas do Sucesso e Capital Inicial, além das mais
recentes, como Maskavo, Natiroots e Raimundos, já posteriores aos anos 90. As bandas
brasilienses não ficaram restritas ao Rock dos anos 80, do qual tanto a Legião Urbana quanto
Capital Inicial são representantes, mas passaram também por Reggae e rap, com o Câmbio
Negro, que chegou até a ter videoclipe na programação da MTV na época. Há, na cidade, uma
tradição na produção de bandas locais e de continuidade de uma cena que já dura mais de 30
anos. Há um sentido de "continuidade predisposta", como descrito por Williams (1979). A
cidade foi, por muito tempo, um celeiro de bandas que seriam contratadas pelas gravadoras,
detentoras do "forma dominante" do mercado musical no Brasil e no mundo, como já descrito
no capítulo anterior. Os Móveis são representantes de uma "forma emergente" (Williams,
1979), baseado em uma produção, distribuição e promoção utilizando as plataformas digitais
e as redes sociais na Internet, além de ser independente, sem contrato com gravadoras, e
promove essa maneira de trabalho como uma possibilidade no mercado musical, o que será
discutido ainda neste capítulo.
Nesta cidade de tradição musical, cenário fértil e uma cena consolidada, os Móveis
iniciaram a banda em 1998, com a proposta de tocar um gênero apreciado pelos integrantes e
pouco trabalhado no mercado, o Ska, que iniciou na Jamaica, na década de 60, como uma
junção do pop, R&B americano e alguns dos ritmos locais. O Ska jamaicano ganhou projeção
internacional com duas bandas inglesas. Em 1976, na cidade inglesa de Camdem, surgiu a
banda Madness, que emplacou, logo em 1979, a canção The Prince na lista das 20 mais
britânicas. O auge da banda ocorreu ainda na década de 80 com a gravação do disco The Rise
35
Post do vocalista André Gonzales disponível em: http://www.moveiscoloniaisdeacaju.com.br Acesso em 30
jul. 2013.
84
and Fall e foi contratada pela Geffen nos Estados Unidos, ganhando exposição na MTV e
tendo uma coletânea dos sucessos anteriores lançada pela nova gravadora como forma de
capitalizar o sucesso.
Outro grande expoente do Ska, na Inglaterra e no mundo, foi a banda The Specials,
que teve início em 1977 como The Automatics, em Coventry na Inglaterra. A banda ganhou
repercussão com a canção A message to you Rudy, do álbum que leva o mesmo nome da
banda, The Specials. O disco de estreia alcançou o sétimo lugar na parada britânica de álbuns
mais vendidos.
Tanto Madness quanto The Specials foram inspirados pela banda jamaicana The
Skatalites, que remonta à origem do Ska da ex-colônia Inglesa no Caribe. Os Skatalites são
uma boa amostra da formação de uma banda de Ska, com vários músicos e presença de
instrumentos de sopro como saxofone, trombones, trompetes, flautas, entre outros. Segundo o
site oficial da banda, The Skatalites era liderada por Thomas ‘Tommy’ McCook, no tenor e
flauta. A seção de metais incluía Don Drummond no trombone, Rolando Alphonso no tenor,
Lester ‘Ska’ Sterling no Saxofone alto, e Johnny ‘Dizzy’ Moore no trompete. A seção rítmica
era liderada por Lloyd Knibb na bateria e incluía Lloyd Brevett no baixo, Jerome ‘Jah Jerry’
Haines na guitarra e Donat Roy ‘Jackie’ Mittoo no piano e órgão. Esses nove músicos eram
os The Skatalites originais. Skatalites teve passagem em show na capital brasileira em abril
de 2009 e contou com a participação do projeto The F. Ska All Stars, que tem membros dos
Móveis.
O Ska ainda teve outros importantes representantes na década de 90, como o Mighty
Mighty Bosstones, banda estadunidense de Cambridge, Massachussets, que, em 1997,
emplacou seu single The impression that I get como número um na lista da Billboard de Rock
moderno, além de ter o álbum Let’s face it como disco de platina naquele ano. Além da banda
de Cambrige, o Save Ferris, oriundo de Orange County, na Califórnia, e também dos Estados
Unidos teve alguma expressão naquela década, chegando a figurar na parada da Billboard.
85
Figura 23 - Capa do disco da banda The Skatalites
Fonte:
SKA-Talites.
Figura 24 - Capa do disco da banda The Specials
Fonte:
The Specials.
Figura 25 - com a banda The Mighty Mighty Bosstones
Fonte: The Mighty Mighty Boostones.
É válido frisar que todos os precursores do Móveis, surgidos da década de 70 em
diante, sejam bandas do Ska como o Skatalites ou Specials e os precursores da cena de
86
Brasília como Legião Urbana ou até mesmo os mais recentes como Maskavo e Raimundos
estavam
na forma "dominante" (Williams, 1979)
das majors. Todas as bandas eram
contratadas de uma das grandes gravadoras. O surgimento dos Móveis, coincide com um
momento onde uma seqüência de "acontecimentos" (Certeau, 1994) como o surgimento do
Napster e a popularização dos formatos digitais como o MP3, já descritos no primeiro
capítulo desse trabalho, abala o mercado musical. Em pararelo, no Brasil a Internet começava
também a se popularizar quando os grandes portais aparecem em 1996. Os Móveis surgem em
meio a um cenário digital que florescia no país.
Figura 26 - Ensaio com a banda Móveis
Fonte:
Moveis Coloniais de Acaju.
A banda Móveis é o resultado da reunião de dez integrantes oriundos da
Universidade de Brasília, a UnB. A banda é formada por André Gonzáles, no vocal; Fernando
Jatobá, na guitarra; Beto Mejía, na flauta transversal; Eduardo Borém, na gaita cromática e
nos teclados; Esdras Nogueira, no sax barítono; Fábio Pedroza, no baixo; Fabrício Ofuji, na
produção; Gabriel Coaracy, na bateria; Paulo Rogério, no sax tenor; e Alexandre Bursztyn, no
trombone. Todos os membros da banda têm formação na Universidade de Brasília, como o
vocalista André Gonzales, que é formado em design, e o saxofonista Alexandre Bursztyn, que
é formado em música. Outros membros passaram pela banda ao longo dos anos, caso do
baterista Renato Rojas, do guitarrista Leonardo Bursztyn e, na mais recente troca, o guitarrista
BC.
A influência da Universidade de Brasília é clara na formação do grupo. A instituição
de ensino brasiliense é, além de ponto de encontro e vivência dos integrantes da banda, um
local de fomento para a arte e a música na cidade de Brasília. Para Williams (1979), é
fundamental avaliar os grupos culturais, as formações e as instituições que os grupos integram.
As instituições formais, como é o caso da UnB, têm papel fundamental na socialização para o
autor e seus valores são incorporados pelos indivíduos. Assim, a universidade, que promove
87
festivais de bandas numa cidade que tem uma forte cena musical, tornou-se forte influência
para a banda, assim como é para a cena brasiliense. O primeiro festival que a banda venceu e
que deu maior exposição ao grupo foi o l Finca, que promove e valoriza a produção musical
autoral da UnB, deixando clara a valorização dos artistas da universidade. Para Williams
(1979):
Instituições formais têm evidentemente uma profunda influência no processo social
ativo. O que na sociologia ortodoxa é abstraído como socialização é na prática, em
qualquer sociedade, um tipo específico de incorporação. Sua descrição como
socialização, o processo social e abstrato do qual pode se dizer que dependem todos
os seres humanos é um meio de evitar ou esconder esse conteúdo ou intenção
específica. Qualquer processo de socialização inclui coisas que todo ser humano
deve aprender, mas qualquer processo específico amarra este aprendizado necessário
num conjunto de significados, valores e práticas necessárias que na proximidade em
que manifesta sua aproximação com a aprendizagem necessária, constitui os
verdadeiros fundamentos do hegemônico. (Wlilliams, 1979: 120)
É importante também avaliar os Móveis como uma formação identificada com o
parecer de Williams: “[...] aqueles movimentos e tendências efetivas na vida artística e
intelectual que têm algumas vezes influência decisiva no desenvolvimento ativo de uma
cultura” (Wlilliams, 1979: 120). Avaliando a formação da banda, observa-se, como já citado
acima, uma coleção de diferentes profissões entre seus componentes, como designers,
músicos, publicitários e economistas. O processo de composição do grupo mostra, também, a
descentralização da banda e a ausência de uma liderança clara o que temos visto em outros
grupos ou formações com predominância de jovens como foi o caso do Movimento Passe
Livre, um dos grandes protagonistas dos protestos de 2013 ou dos jovens que compõem os
Rolezinhos, como já citado no primeiro capítulo desse trabalho.
O músico Leoni, ex-integrante do Kid Abelha e parceiro da banda na composição de
Dois Sorrisos, single lançado em 2011, esclarece as características de trabalho da banda em
post de 16 de Junho daquele ano no blog dos Móveis.
Foi aí que eu entrei em contato com o efervescente e caótico processo criativo dos
10 Móveis. Eu nunca vi nada parecido. Em geral, músicos preferem cuidar das
melodias e harmonias e os cantores das letras. Em quase todas as bandas há um
núcleo criativo para as composições. Nesse caso não há núcleo, não há responsável,
nem líder. Todos opinam sobre tudo e mandam igualmente. Cada ideia que eu tinha
era comentada independentemente por uns 5 deles, mas as mensagens eram enviadas
para mim sem que tivessem se falado sobre elas. Uma mesma palavra podia ser
adorada por dois e detestada por 3. Eu não sabia como lidar com essa enxurrada de
palpites e achei que nossa parceria nunca chegaria ao fim. Um dia fizemos uma
sessão de composição via Skype, mas nem todos puderam comparecer. Deu para
adiantar um pouco e eles criaram um Google Doc para trabalharmos virtualmente
nas partes da letra que haviam ficado indefinidas. Eu viajei e as coisas ficaram
bastante paradas porque eles andavam ocupadíssimos.
88
Um dia apareceu a oportunidade de nos encontrarmos porque eu estava indo a
Brasília para uma audiência com a Ministra da Cultura junto com Frejat e Dado
Villa-Lobos como representantes do GAP – Grupo de Ação Parlamentar Pró-Música.
O Beto me pegou na frente do Ministério e fomos almoçar num restaurante colado
no estúdio/escritório deles.
É impressionante o que trabalham esses caras. O escritório é simultaneamente um
galpão de material para camisetas, brindes, CDs Slim etc. Cada um tem uma função,
ou várias, além de compor e tocar. Toda a carreira é imaginada, gerenciada e tocada
por eles. Fui conhecendo todo mundo e entendendo o que tocavam. O André não
pode ir porque estava cuidando do filho recém-nascido.
Negociei com eles as coisas que eu mais gostava na letra em troca de tirar o que eles
menos gostavam e, nessa parte, tudo andou muito mais rápido do que eu esperava. A
confusão aconteceu mesmo na hora de imaginar o arranjo. Aqui vai uma observação:
nunca uma parceria minha chegou nesse estágio. Normalmente quem vai gravar
decide como arranjar a canção, mas essa não é a ideia que eles tem de colaboração.
A coisa é integral! Mas é ótimo. Foram horas de idas e voltas em estilos e levadas
sem que nada parecesse vingar. Mas eles estavam satisfeitos então eu confiei. Tive
que ir embora e nada estava decidido.
Continuamos a mandar ideias de arranjo via e-mail uns pros outros até que recebi a
demo para colocar a minha voz e, de repente, todo o processo fez sentido. No meio
desse processo ainda tive a chance de tentar me encontrar com eles em Brasília mais
uma vez quando fui à Audiência Pública da Câmara dos Deputados sobre o ECAD,
mas demorou tanto – e ainda rolou problema com a passagem – que acabamos
apenas nos falando por telefone. Só encontrei o Fábio para entregar umas
encomendas dele que estavam no Rio.
Foi aí que eu soube da promoção de Dia dos Namorados, mas confesso que só
entendi tudo no domingo. Fui filmado na minha casa para poder participar das
serenatas para os namorados escolhidos. No dia fiquei muito emocionado com a
última em que houve até pedido de casamento.
Minha voz foi gravada em casa. Foram 4 tracks, dois com interpretações um pouco
diferentes da música e dois com vocais que foram enviados por YouSendit e inserido
na mixagem por eles. Achei que tinha feito bastante! Foi só quando vi o clipe pronto
é que deu para perceber o tamanho da produção e da disponibilidade da galera. O
que são as fantasias? Mas nenhuma supera a odalisca do Gabriel! Há uma cena perto
do fim que concorre mas, na minha opinião, não tem como vencer nos quesitos
“cara-de-pau” e “coragem”. É o clipe mais divertido e amoroso dos últimos
tempos.36
Essa é mais uma das alterações da formação das "materialidades" (Wiliams, 1979) de
uma forma "emergente" (Williams, 1979), onde ao invés de gravar absolutamente todo um
disco ou todas as faixas num estúdio, dois artistas colaboram via Intenet, cada um em um
ponto do país, em tempos diferentes, em oposto ao que se faz geralmente como processo de
produção, gravando um disco todo num estúdio com diversos artistas.
A banda não define um estilo ou gênero único para as suas músicas e já utilizou o
termo feijoada búlgara para descrever a mescla de estilos, ritmos e gêneros das suas
composições. Em entrevista para o jornal O Diário do Aço, de Ipatinga – MG, o vocalista
André Gonzales explicita as influências do grupo e a identidade brasiliense.
Brasília é uma cidade muito dinâmica, múltipla. A década de 80 foi um grande
marco representativo para cidade. Brasília foi desenvolvendo muitas posturas em
36
Post do do cantor e compositor Leoni disponível em: http://www.moveiscoloniaisdeacaju.com.br Acesso em
30 jul. 2013.
89
torno do rock. Na década de 90 nasceu outro estilo que nega o anterior, com letras
mais esculachadas. Nós começamos a frequentar essa cena no final da década de 90.
O Hard Core e Ska foram nosso ponto de partida. A banda é muito grande e todos os
integrantes têm voz. Assim dinamizamos a nossa estética. Misturamos Ska, o som
37
do Leste europeu e muita coisa brasileira. A nossa essência é Brasília.
A influência do Ska e a formação com músicos tocando instrumentos de sopro, como
já citado no início desse capítulo, ficam claras na disposição do grupo. São nove indivíduos
que tocam - uma vez que o produtor Fabrício Ofuji é considerado parte da banda, mas não
toca nenhum instrumento - e 5 deles são músicos do naipe de metais, fundamental para uma
banda de ska, que é uma das principais influências da banda.
As composições da banda tratam de temas variados em suas letras, como cotidiano,
consumo, relações amorosas e a transição para a vida adulta, que remetem a uma das mais
importantes bandas de Brasília, a Legião Urbana; são temas possíveis de identificar na canção
Perca Peso, dos Móveis.
Móveis Coloniais de Acaju - Perca Peso
38
Você tem alergia, micose, passa mal
Toma sempre um melhoral
A crescente agonia do seu ser denuncia
O seu cheque especial
Três por cento sobre a taxa do seguro total
Lhe parece ser banal
Acrescente Elyseé Belt à lista de Natal
E dá mais de três mil pau
No cheque especial
São tantas coisas pra lembrar
Tantos filhos pra criar
Dá-lhe shampoo anticaspas
Dois comprimidos pra jantar
Não esqueça o perfume da mulher que tu tem
Nem procure desculpas pra dizer à sua filha que o Noel não vem
Papai Noel não vem
Deixe de lado o jogo de faca dos seus sonhos
E vá buscar seu cachorro no cabeleireiro
Não esqueça o dia de casamento
Não esqueça a data de vencimento
Não esqueça o presente de sua cunhada (ai ai)
E perca peso agora
Perca peso agora
Se hoje seu café amanhecer gelado
37
38
Post do vocalista André Gonzales disponível em: <http://www.moveiscoloniaisdeacaju.com.br>. Acesso em:
30 jul. 2013.
YOU
TUBE.
Móveis
Coloniais
de
Acaju.
Perca
Peso.
Disponível
em:
<http://www.youtube.com/watch?v=IqTpNpibiHM>.
90
Se hoje sua mulher dormir do lado errado
Podia estar mal, mas está pior
E a tendência é se agravar
Não é melhor se engravatar?
Eis que faltou
Aquele motivo pra pirar
Mas não há por que se preocupar
A sua hora vai chegar
E você vai se encontrar
Bebe água, dorme, não troca a cueca
Acorda, defeca e Amém
Olha, gosta, compra
Perde, vende, troca ou aluga
Sua calvície nasce prematura
Como você se atura?
Bêbado se dorme, cueca não se troca
Decora e afeta sua mente
Ira, tira, tora a tara, atura
Não esqueça a mulher do perfume, tenta o quê?
Nem procure sua filha pra dizer que Noel, desculpa, não vem
Eu disse, ele não vem
Deixe seus sonhos de lado
Use as facas para o jogo
E vá morar com o cabeleireiro, seu cachorro
Não esqueça o vencimento da data
Não esqueça o casamento da chata
Não esqueça a cunhada do seu tormento (ai ai)
E perca peso agora
Perca peso agora
Perca peso agora
Perca peso agora
Perca peso agora
Perca peso agora
Perca peso agora
Legião Urbana - O mundo anda tão complicado
39
Gosto de ver você dormir
Que nem criança com a boca aberta
O telefone chega sexta-feira
Aperto o passo por causa da garoa
Me empresta um par de meias
A gente chega na sessão das dez
Hoje eu acordo ao meio-dia
Amanhã é a sua vez
Vem cá, meu bem, que é bom lhe ver
O mundo anda tão complicado
Que hoje eu quero fazer tudo por você.
Temos que consertar o despertador
39
Musica do disco V da banda Legião Urbana. WIKIPÉDIA. Legião Urbana. Álbum V. Disponível em:
<http://pt.wikipedia.org/wiki/V_(%C3%A1lbum_de_Legi%C3%A3o_Urbana>.
91
E separar todas as ferramentas
Que a mudança grande chegou
Com o fogão e a geladeira e a televisão
Não precisamos dormir no chão
Até que é bom, mas a cama chegou na terça
E na quinta chegou o som
Sempre faço mil coisas ao mesmo tempo
E até que é fácil acostumar-se com meu jeito
Agora que temos nossa casa
é a chave que sempre esqueço
Vamos chamar nossos amigos
A gente faz uma feijoada
Esquece um pouco do trabalho
E fica de bate-papo
Temos a semana inteira pela frente
Você me conta como foi seu dia
E a gente diz um pro outro:
- Estou com sono, vamos dormir!
Vem cá, meu bem, que é bom lhe ver
O mundo anda tão complicado
Que hoje eu quero fazer tudo por você
Quero ouvir uma canção de amor
Que fale da minha situação
De quem deixou a segurança de seu mundo
Por amor
É possível verificar na leitura das letras das duas bandas a noção de "cultura como
vida cotidiana" de Raymond Williams (2012). O vínculo com a outra grande banda brasiliense,
a Legião Urbana, levou o vocalista André Gonzales para duas apresentações em 2008 e 2013,
em tributo ao falecido vocalista da banda precursora dos Móveis, Renato Russo, tocando
junto com os antigos membros da Legião, Paulo Bonfá e Dado Villa Lobos.
O começo de carreira dos Móveis - essa é a forma como a banda se autointitula,
utilizando o plural e o gênero masculino - teve foco na composição, consolidação e realização
de shows na cidade natal do grupo, Brasília. Em entrevista com os músicos, o flautista Beto
Mejía conta que a maior intenção era começar a montar uma base de fãs.
O começo é importante para ter os primeiros fãs e ficar conhecido. A gente chamava
todo mundo para os shows em Brasília e pedir pra chamar mais gente, ia mãe,
amigos e assim fomos construindo em shows pequenos uma base de fãs que nos
40
acompanhava. [sic]
Essa fase inicial, de consolidação, assim nomeada pela banda, fica clara também
vendo a atividade dos Móveis na Internet. A página oficial do grupo, com o domínio
40
Entrevista presencial com a banda feita pelo autor, especialmente para este trabalho no dia 14 nov. 2011.
92
<www.móveiscoloniaisdeacaju.com.br, surgiu apenas em Novembro de 2003. Em procura no
site de buscas Google, encontram-se poucas menções à banda até o aparecimento do site. O
site teve, conforme declaração do tecladista e gaitista Eduardo Borém, um importante papel
para a banda.
A gente estabeleceu um contato com o público que não tínhamos. É barato, fácil e
eficiente. Desde o início de 2003, as músicas Jezebel, Swing 1 e Eu.nasci.com.fama
que estão disponibilizadas em formato MP3 foram baixadas 624 vezes. Além disso,
cerca de 15 cópias do CD-EP do Móveis foram vendidas.41
Retomo aqui o momento histórico da crescente popuralização da Intenet no Brasil e
no mundo e o surgimento de plataformas digitais como é o caso do Itunes, que vem a surgir
em 2001 como discutido no primeiro capítulo. Para as bandas que surgem nessa forma
"emergente"(Williams, 1979) num cenário digital, o site é uma ferramenta fundamental de
promoção.
O EP42 mencionado pelo gaitista é o primeiro da banda, lançado em 2001, e tem
como título o nome do grupo. Com 6 faixas e gravado na cidade de Taguatinga, é o primeiro
registro da banda em formato CD, com produção e edição local. Apesar de um "emergente"
(Williams, 1979) digital, em que a banda disponibiliza todo o seu conteúdo em formato MP3
na Internet, o formato de CD tradicional segue sendo usado pela banda, como "residual",
conforme já levantado no primeiro capítulo deste trabalho, no qual os formatos de CD e MP3
tomam um novo significado cult.
41
42
Post do gaitista e tecaldista Eduardo Borém
André Gonzales disponível em:
http://www.moveiscoloniaisdeacaju.com.br Acesso em 30 jul. 2013.
EP A sigla EP vem do inglês "extended play", usada para um disco longo demais para ser um single,
geralmente com duas faixas, e curto demais para ser um LP, ou "long play", de cerca de doze músicas.
93
Figura 27 - EP Móveis 2001
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
Em 2002, com a música Copacabana, a banda ganhou o festival Finca da UnB,
Festival Universitário de Música Candanga da Universidade de Brasília, que acontece desde
1999 e que tem como função, de acordo com o site do evento, a valorização, promoção e
divulgação da produção musical autoral da instituição de ensino de Brasília. O evento já
revelou diversos artistas como Ellén Oléria, Móveis, Banda Rupestre, entre outros.
A participação em shows e festivais foi mais frequente nos anos seguintes. Em
Fevereiro de 2003, a banda esteve presente no festival Louco Verão junto de outras bandas
independentes de Brasília e outros estados. Ainda pouco conhecidos na cena musical
brasiliense, os músicos abriram o show para a banda Sentupé, na casa de shows Zeppelin,
também em Brasília, onde executaram músicas que não estavam presentes no primeiro EP da
banda, como Copacabana e Seria o Rolex?. Seguiram apresentações no projeto Goiania Rock
City, em Goiás; nos Sesc Brasília; Agace Fest, também em Goiás; Musicalango, em Brasília;
Bananada, em Goiânia, que contou com artistas consagrados no cenário brasileiro, como
Garotos Podres, Benegão, e cobertura da MTV , na casa de shows Bedrock, no Campus
Sonoro da UnB, Camping Show e Jogo de Cena. No Brasília Music Festival, em Novembro
de 2003, a banda foi a única atração local num evento que reunia bandas como Ultraje a Rigor,
Tihuana, Charlie Brown Jr. e até a atração internacional Live. Neste último festival, a banda já
disponibilizou um vídeo no site com a apresentação ao vivo.
Apresentações como essa deram projeção aos Móveis na imprensa local e nacional,
como é o caso do Jornal de Brasília, que em 29 de Maio de 2003 relatou do evento:
Vestidos de macacão de operário, com óculos 3D e movimentos frenéticos, os dez
integrantes da banda brasiliense Móveis tocaram entre os grandes no último dia do
BMF e brilharam. O grupo abriu a noite de sábado no palco principal, onde trocaram
94
Tihuana, Charlie Brown Jr., Live e Ultraje a Rigor. Eles não passavam de anônimos
da cena roqueira candanga. “Móveis da onde?”, perguntou Cristina Morena, de 28
anos, ao ouvir o grupo ser anunciado. Um pequeno grupo de tietes, entre as quase
três mil pessoas presentes no início do show, aplaudiu a primeira canção. De música
para música, o público foi se soltando ao ritmo contagiante do Móveis e as palmas
cresceram. “Esses caras são muito legais”, aprovou Cristina lá pela metade do show,
quando tocaram Ska, dos Paralamas do Sucesso. No momento em que o bemcompassado naipe de metais (sax tenor, sax barítono e trombone) corria de um lado
para o outro do palco, o vocalista André Gonzáles (foto) vestiu uma casaca de
maestro e, erguido por uma corda de rappel, voando pelo palco, regeu um inusitado
(e também frenético) solo de violino executado pelo instrumentista Billy Geier, da
Orquestra Sinfônica do Teatro Nacional. A banda-revelação surpreendeu o público
que retribuiu com entusiasmo a despedida dos dez músicos. Os Móveis Coloniais
foram selecionados por unanimidade do júri no concurso Saidera, realizado em
frente ao CNB (Moveis Coloniais de Acaju).
A relação com a imprensa é considerada pela banda como uma parte fundamental do
processo. O site oficial dos Móveis Coloniais tem uma seção dedicada a matérias de jornais e
blogs, e os próprios integrantes, em entrevista realizada com a banda, afirmam:
A gente sempre busca exposição junto à imprensa, seja em grandes veículos ou
blogs menores, não importa. Quanto mais gente conhecendo o nosso trabalho,
melhor. À partir daí sempre repassamos no site ou nas redes sociais as matérias, tipo
a que a gente fez no Jornal da Tarde na Globo.43
A leitura feita a partir dessas características dos Móveis onde não se nega um contato
necessário com as mídias tradicionais, e ao mesmo tempo se usa blog, site, entre outras
plataformas digitais é a proposta de Jenkins (2008) de um modelo onde as mídias convergem
porém não há uma razão fatalista onde o surgimento de um meio ou plataforma não obriga o
desaparecimento das mais antigas. A banda converge no contato com TVs, rádios, jornais,
revistas, blogueiros e acredita nessa convergência como parte da estratégia necessária para se
manter no mercado musical nacional.
O blog Alucináticos, em matéria sobre a banda, reforça os resultados da interação
com a imprensa: “Apresentações como a do Brasília Music Festival (onde tocaram no palco
principal) e aparições em diversos programas de televisão (como Jornal Nacional, DF TV,
Bom Dia DF e outros) com certeza colaboraram bastante para isso.” Essa interação com a
imprensa tradicional mostra outro "residual" em relação ao "emergente" (Williams, 1979)
digital em que os meios de comunicação tradicionais, como TVs, jornais e revistas, seguem
importantes em uma estratégia de divulgação.
Outro festival, o Rolla Pedra, que daria às bandas escolhidas por júri e público a
oportunidade de integrarem um CD, que seria gravado pelo selo brasiliense GRV discos,
esteve na agenda da banda em 2003. Em entrevista ao Jornal de Brasília, o vocalista André
43
Entrevista com a banda em 14 nov. 2011.
95
Gonzales já destacava a importância dos shows ao vivo para a banda. “Toda oportunidade de
divulgar nosso trabalho é valida, e a gente sempre aprende com os diferentes públicos nos
festivais” (Moveis Coloniais de Acaju).
Em depoimento para o blog Alucináticos, o vocalista André Gonzales classificou o
ano de 2003 como “grande ano do Móveis, pois além de terem feito diversos shows, nos mais
diversos lugares,o grupo conseguiu expandir seu público para além das cercanias do
underground”. O blog considera os Móveis como uma das bandas que mais realizaram shows
em Brasília.
O ano de 2004 marcou o início das gravações do primeiro disco da banda, que
contou com apoio do Fundo da Arte e da Cultura (FAC) da Secretaria de Cultura/DF,
reforçando não apenas a ligação da banda com a cidade de origem, mas também a necessidade
de apoio das políticas públicas para a arte e cultura, como já discutido nos trabalhos do grupo
de pesquisa Jovens Urbanos ligado à PUC-SP (Jovens/Juventudes, Inquietações e Trajetórias,
2014) . O fundo é uma iniciativa para os artistas do Distrito Federal e seus objetivos estão
assim expressos:
Art. 2° O Fundo de Apoio à Cultura tem os seguintes objetivos:
I – proporcionar a todos os cidadãos do Distrito Federal os meios para o livre acesso
às fontes de arte e cultura e o pleno exercício dos direitos artísticos e culturais;
II – preservar, apoiar, valorizar e difundir o conjunto das manifestações culturais do
Distrito Federal e seus respectivos criadores;
III – preservar os bens materiais e imateriais do patrimônio artístico, cultural e
histórico do Distrito Federal;
IV – priorizar o produto artístico e cultural do Distrito Federal (BRASIL. Decreto nº
31.414, de 11 de março de 2010).
O flautista Beto Mejía e o tecladista Eduardo Borém, em entrevista ao site
Urbanaque, ressaltam a importância do apoio da verba pública para o grupo.
Geralmente, os projetos aprovados são de grupos ou músicos que já estão
trabalhando há bastante tempo. Exigem que tenha um currículo e experiência
comprovada, no caso da área de música, por panfletos e aparições em mídia. A verba
do FAC é um mecanismo importantíssimo para ajudar na concretização de qualquer
tipo de projeto. No entanto, a verba total pedida nunca é alcançada. Ou seja, é
necessário buscar outras formas de investimento para efetivar o projeto, no nosso
caso, a gravação do CD. É uma alternativa muito interessante e importantíssima para
o desenvolvimento da cultura como um todo no Distrito Federal (Beto Mejía).
Destaco, como já foi sugerido acima, que o FAC é, por princípio, um fundo de
apoio, ou seja, ele visa apoiar uma produção e nunca patrociná-la por completo;
necessariamente deve-se complementar o recurso disponibilizado pelo FAC com
algum outro investidor. Acreditamos que, sim, vale a pena se produzir um disco com
dinheiro público, desde que o trabalho do artista tenha sua integridade respeitada.
Ter o apoio do FAC não quer dizer que votamos nesse ou naquele candidato, quer
dizer que o Estado está cumprindo uma de suas funções, que a cultura nacional está
sendo estimulada e valorizada (Borém). (Móveis Coloniais de Acaju).
96
A banda entrou, no mês de outubro de 2004, em estúdio com o produtor Rafael
Ramos, que já havia trabalhado com bandas como Los Hermanos, Pitty, Raimundos e Ultraje
a Rigor e foi guitarrista da banda Baba Cósmica. Em maio de 2005, o álbum de 12 faixas
ficou pronto, alcançando boas críticas por parte de blogs e pela imprensa em veículos como o
blog Senhor F e o Correio Brasiliense. O disco alcançou a marca de duas mil cópias vendidas
em apenas duas semanas, do total de três mil da primeira prensagem. O produtor ainda é um
forma "residual" (Williams, 1979) das majors sendo importante para o processo de formação
das "materialidades" (Williams, 1979) ainda hoje e como visto no primeiro capítulo é um
profissional contratado de maneira terceirizada, embora a banda siga como independente. A
busca por um produtor renomado e que já trabalhou com bandas de sucesso no mercado dá
pistas de uma banda que pretende obter sucesso comercial, ainda que sem estar no cast de
uma major.
Figura 28 - Capa do CD Idem, primeiro disco de estúdio da banda
Fonte: Móveis Coloniais de Acaju.
Os shows feitos pela banda nesse período abriram espaço para o reconhecimento pela
imprensa e também legitimidade com a cena musical. As apresentações ao vivo são uma das
marcas da banda e sua fonte de receitas. Os shows, que tinham menor espaço num momento
do mercado em que a venda de CDs era o principal fator de arrecadação das bandas, agora são
uma importante forma de arrecadação para os artistas, sendo um "residual" do modelo que
iniciou nos anos 60 com os grandes festivais, como já mencionado no capítulo anterior. A
forma "dominante" (Wiliams, 1979) , com as majors, vem se reformulando com a intenção de
permanecer hegemônico, incluindo shows e apropriando-se da promoção nos meios digitais
como o Youtube, entre outros, como já proposto por Williams (1979). O reconhecimento da
banda deu possibilidade para a escolha de produtores para o primeiro disco dos Móveis. Uma
das escolhas da banda, na época, para trabalhar como produtor foi o músico André Abujamra,
97
que escreveu o release da banda, postado no blog Música Indie Br, recomendando o disco e
comentando o estilo da banda.
Um dia de sol recebi um telefonema estranho:
- Por favor, aqui é do Moveis Coloniais de Acaju
- Desculpa, eu já tenho móveis, eu respondi.
- Não! Aqui é uma banda de Brasília…
- Sério? Então já gostei do som; com esse nome o som deve ser bom.
Pronto!
Conheci os caras. Quero produzir. […] Até que a vida me levou para o México fazer
trilha de cinema […]. Que pena.
Pena nada! Os caras fizeram um puta CD…
Daí sobrou de eu escrever.
Vamos lá:
Essa banda é uma mistura de Kusturica com Hermeto, um pouco de Cuba com
macarrão. Um pouco de Paulista sendo de Brasília, um pouco de Brasília sendo do
Brasil, um pouco do mundo sendo da Terra e, por que não, um pouco de Karnak com
Los Hermanos. Um pouco de Pato Fu com amendoim. Um pouco de móveis com
cabelo, um pouco de sorte com pensamento, um pouco de dor com amor, um pouco
de Solidão com quarto e sala com fiador. Gorbachev com Copacabana. Samba de
russo, pagode de cego com Tom Waits. Se fosse Teatro seria Tadeus Kantor, se fosse
Foto seria do Rodchenko, se fosse esquilo não sambaria.
O melhor é que eles não são nada disso.
Eles apenas são uma grande banda com um grande som!
44
Vida longa.
A verba pública foi suficiente para pagar a gravação e o trabalho do produtor além do
estúdio. A banda acabou pagando com verba própria a masterização e finalização do CD além
da necessária divulgação, que viria a ser paga posteriormente com outras fontes de
arrecadação.
Há que se reforçar a escolha de um produtor, como mais uma forma "residual"
(Wiliams, 1979) das grandes gravadoras. O papel desse profissional ainda é muito
reconhecido no mercado e importante para a formação de um disco, como já descrito no
primeiro capítulo desse trabalho. A escolha de Rafael Ramos que já havia trabalhado com
Los Hermanos e Raimundos e posteriormente de Carlos Miranda, produtor de Skank e O
Rappa deixa claro a intenção da banda que embora independente, busca a experiência de
profissionais que já trabalharam com artistas de grande sucesso no mercado brasileiro.
Retomando Williams o "residual", por definição, foi efetivamente formado no passado, mas
ainda está ativo no processo cultural, não só como um elemento do passado, mas como um
elemento efetivo do presente." (1979:125). No caso dos produtores, mesmo as bandas
independentes vão buscar os profissionais renomados, numa característica das "empresas em
44
MÓVEIS Coloniais de Acaju – Idem (2005). Musica Indie BR. Disponível
<http://musicaindiebr.blogspot.com.br/2007/08/mveis-coloniais-de-acaju-idem-2005.html>.
em:
98
rede" propostas por Castells (2010) onde a terceirização, flexibilização e redes de
profissionais são constantes.
O trabalho coletivo e a divisão das tarefas já estavam presentes no CD Idem, cuja
capa, por exemplo, possui design assinado pelo também vocalista André Gonzales e pelo
tecladista Eduardo Borém. Retomando a discussão do primeiro capítulo, as "estruturas de
sentimento" (Williams, 1979) da "cultura da Internet" descrita por Castells (2010) estão
presentes na banda. Avaliando a banda como uma empresa em rede, o modelo de trabalho dos
Móveis se enquadra em várias características de empresas horizontalizadas descritas por
Castells (2010:221) como a organização em torno do processo e não da tarefa, hierarquia
horizontal, gerenciamento em equipe, maximização do contato com os fornecedores e clientes
e informação.
Inicialmente o CD Idem estava à venda apenas em Brasília. A banda deu sequência
aos shows com apresentações na UnB, Fnac, no festival Porão do Rock, novamente com
nomes já consagrados do cenário brasileiro, como Supla, Los Hermanos, Barão Vermelho e
Pato Fu e 65 mil pessoas como público final. Apresentou-se também no Curitiba Rock
Festival, marcando a passagem da banda por outras cidades do país. Nessa época, o primeiro
guitarrista do grupo, Leonardo, deixou a banda para se dedicar ao Doutorado.
Em 2005, além do CD Idem, a banda também deu início ao festival Móveis Convida
em sua primeira edição no mês de Dezembro. Após a festa promovida pela banda, nesse
mesmo ano, na Universidade de Brasília, os músicos resolveram fazer um evento nos mesmos
moldes, porém com duas bandas convidadas: a dos brasilienses do Super Stereo Surf e o
Coquetel Acapulco, do Rio de Janeiro, ambas independentes e em começo de carreira. A
proposta, já naquele ano, era realizar o evento de maneira semestral, conforme afirma o
produtor Fabricio Ofuji. O festival foi coberto pela filial local da TV Record e a equipe do
Fantástico esteve presente para gravar uma matéria que foi ao ar em março do ano seguinte,
conforme o blog www.sobremusica.com.br. O festival tinha como mote sempre apresentar
uma banda do Distrito Federal para incentivar a cena local, conforme o conceito de Janotti Jr.
(2003). Segundo o autor Jr., as cenas musicais, enquanto rede de consumo, atuam na
formação de uma identidade em comum partilhada pelos participantes.
Ao mesmo tempo em que pretendem atingir um público cada vez maior, os produtos
midiáticos têm que se render à tendência crescente de segmentação de mercado.
Esse último reúne, como membros de uma mesma comunidade de consumidores,
indivíduos de diferentes partes do planeta, consumidores esses que, às vezes, têm
muito mais em comum com os valores de seus pares da rede de consumo do que
com sujeitos com os quais partilham um mesmo país, cultura ou etnia (Janotti Jr.,
2003:09).
99
A consolidação da banda na cena de Brasília e a gravação do primeiro álbum abriu as
portas para o resto do país e, a partir de 2005, os Móveis iniciaram uma sequência de shows
pelo resto do país o que veio a abrir o mercado para a banda e aumentar o reconhecimento.
É importante lembrar que mesmo estando ligados à tradição musical de Brasília a
banda consegue se firmar no cenário nacional e até mesmo fora do país. Janotti Jr. lembra
que
Se é possível pensar em uma cena indie rock em Maceió, com suas bandas,
público, crítica especializada, circuito de apresentações ao vivo, também é
possível pensar em outras cenas usando uma visão macro, como uma cena
brasileira indie rock e uma cena mundial indie interconectadas, pois, as
fronteiras da cena são reconfiguradas constantemente devido ao desenvolvimento
das tecnologias de comunicação e aos fluxos contínuos de inf ormação. (Janotti
Jr., 2011:15).
A Internet e a articulação em redes dão novas possibilidades às cenas que embora
tenham status local como a cena grunge de Seattle, ou a cena Heavy Metal de Belo Horizonte,
ganham novos contornos, alcançando mercados maiores que os da cidade que representam.
2.2 "Somos independentes". A formação dos Móveis nas bordas do mainstream.
Permanecer com uma carreira sólida ao longo dos anos e com liberdade para criar e
apresentar-se da maneira como quiser, sem estar sob o controle de uma grande corporação,
parece ser o anseio de uma boa parte dos artistas nos tempos atuais. No blog da banda, um
post do baixista dos Móveis, Fábio Pedroza, refere-se a essas diferenças entre o mainstream e
o underground:
[...] pensando na quebra do mercado tradicional da música, ou melhor, do modelo de
marcado fonográfico estabelecido nos últimos 40-50 anos, no crescimento das redes
de produção e circulação como o fora do eixo, abrafin, etc, na abertura de alguns
veículos de comunicação de massa (mesmo que os "periféricos" do mainstream)
para bandas que não são das grandes gravadoras, de modelos de distribuição da
música como o álbum virtual ou o trama virtual, do sucesso (e esse termo precisa de
um tópico a parte) e o reconhecimento de bandas como teatro mágico, móveis,
macaco bong, etc., com grandes artistas saindo de gravadoras e auto-proclamando
"independentes", tudo isso me faz pensar na possibilidade de contágio do
mainstream com características vistas antes apenas no underground (Moveis
Coloniais de Acaju).
Os Móveis, já na carreira desde 1998, foram buscar uma gravadora indepentente
brasileira, a Trama para gravar o segundo álbum da banda. A parceria era para produção do disco
nos estúdios da gravadora em São Paulo, e junto com os Móveis seria feita a escolha do produtor
dentre um rol de possibilidades oferecidos pela Trama. O formato de distribuição e promoção
100
ficaria sob escolha e responsabilidade dos Móveis que trabalhariam a distribuição na sua loja
virtual, que será avaliada no próximo capítulo, além do site da banda e venda em lojas
especializadas. A banda prega um formato, independente,
sem contrato com as grandes
gravadoras desde a sua formação e nessa fase já começa a mesclar emelentos "residuais" da forma
"dominante" (Williams, 1979) das majors como por exemplo a presença de Carlos Miranda como
produtor e forma "emergente" como a distribuição digital e o empreendedorismo (Castells, 2010).
Esse empreendedorismo Catells (2010) pode ser avaliado também na condução da
carreira dos Móveis. A banda é responsável por gerenciar sua própria carreira e pela
característica de sua formação; cada membro tem papéis diferentes no gerenciamento da
banda. A divisão de tarefas é tema de um dos posts da banda, que conta como os músicos
fazem o design das camisetas vendidas na loja virtual e nos shows e aponta multiplicidade de
profissões distribuídas entre os integrantes. Os membros assumem para si uma divisão de
trabalho, numa caracerística de do it yourself que já vimos em outros artistas que estão numa
forma "emergente" (Williams, 1979) já levantados no primeiro capítulo.
No Móveis, todos possuem, ao menos, o Ensino Superior completo. André e Borém
têm formação em Desenho Industrial, o Fernando Jatobá é Engenheiro Mecânico,
Beto e Xande são das Ciências Biológicas... Paulo e Esdras são bachareis em
música, Coaracy é da Comunicação Social, fabio das Ciências Sociais e Ofuji é
mestre em Comunicação (Moveis Coloniais de Acaju).
A banda tem sua própria empresa, que é responsável por gerenciar a carreira e fazer
o trabalho burocrático. Atualmente, também cuida da parte gráfica, do site da banda, da
agenda de shows, da loja virtual e até da contratação de funcionários terceirizados, que
auxiliam durante os shows e turnês dos Móveis. O post abaixo, retirado do blog da banda,
explica o papel da empresa, a Móveis LTDA.
Banda de rock?! Empresa?! Empresa de música?! Isso mesmo! Para administrar a
carreira de nossa banda, fundamos a Móveis Produções Artísticas. E, neste
empreendimento, temos o quadro societário formado pelos dez integrantes da banda.
A empresa foi constituída e formalizada em 2008. No primeiro momento, veio para
suprir algumas demandas da banda, sobretudo para organizar as contratações e
pagamentos dos shows. Hoje, além de representar a banda, a empresa é responsável
por uma infinidade maior de serviços na área de música e produção cultural. Por
exemplo, é a produtora audiovisual do clipe da música “O tempo”.
Hoje, além da gestão da banda, a empresa busca apoiadores e projetos a fim de
contribuir também com a cultura musical no Distrito Federal, bem como ampliar
essa vontade para outras regiões.
O festival Móveis Convida traz uma amostra dessa vontade da banda – além de
reunir shows, abre espaço para negócios entre artistas e empresas culturais, para a
capacitação dos agentes da rede produtiva da música e formação crescente de
público.
| PROJETOS
Móveis Convida
Rotas Musicais
Marcenaria Sonora
101
DVD Mobília em Casa
Moveis Ocupa
Pesquisa em ações de mídia e redes sociais
45
Pesquisa em inovações em gestão de grupos musicais
A falta de liderança clara, como já descrito no início deste capítulo, na passagem em
que o músico Leoni descreve como funcionou o processo de criação da banda, é outra das
características dos Móveis. A divisão de tarefas no dia a dia da banda é necessária, e cada um
dos músicos tem um papel específico, muitas vezes relacionado com as profissões escolhidas.
Outra característica dos Móveis é a escolha de seguir como uma banda independente. As
escolham da banda deixam possível uma análise da alteração na "estrutura de sentimentos"
(Williams, 1979) desse período onde optam por uma forma "emergente" (Williams, 1979) ,
em que artistas independentes, impulsionados pela cultura da Internet e das redes sociais, tem
num tipo de diferente de organização.Estes artistas, avaliam uma forma "dominante"
(Williams, 1979) das majors, que convive com redução dos casts das gravadoras e têm
menos espaço dentro de um formato do star system e optam por atuar nas brechas, em
segmentos menores como avalia Anderson (2006) e ainda assim sustentáveis.
Vale ressaltar que os Móveis, como uma banda empresa, em rede, empreendedoras,
podem ser avaliados como representantes da "cultura da Internet" de Castells (2010) ,
dispostos a agir em conjunto no mercado, num modelo que é paralelo ao das majors e ainda
assim utiliza de várias estratégias ou"resíduos" (Wlliams, 1979) do modelo que ainda domina
o mercado.
Os músicos falam de uma maneira positiva e mostram a banda como um exemplo de
possibilidade de seguir no mercado de música sem manter contrato com uma grande
gravadora. O baixista Fábio Pedroza descreve a carreira como independente desde o início da
banda, até o ponto onde os Móveis conseguem atingir o patamar onde a banda toda pode se
sustentar apenas com as atividades musicais:
[...] Pois bem, o primeiro show do móveis foi organizado pela própria banda no
esquema mais tosco que você possa imaginar. eu estava lá como público, conhecia a
galera. só fui entrar na banda em meados de 1999.
Até 2000, fazíamos alguns poucos shows, talvez uns 5-6 por ano, todos em bsb.
vários produzidos pela banda (em festa em escola de inglês, shows em parceria com
o grêmio da escola que estudávamos) ou de outros produtores.
A procura por shows era bem simples, o esquema era o seguinte: ensaio sábado na
hora do almoço, saíamos de lá e falávamos "vamos no conic tentar uns shows?" e
assim corríamos por todas as lojas do complexo do conic (muitas de skate,
quadrinhos, etc). tocamos em shows de hc, ska, reggae, hip-hop numetal (muito
comum aqui em bsb na época), não importava o estilo, era show, estávamos lá.
45
MOVEIS COLONIAIS DE ACAJU. Disponível em: <http://www.moveiscoloniaisdeacaju.com.br> Acesso
em: 5 jun. 2012.
102
Ainda em 2000 fomos chamados para abrir o palco principal do porão do rock.
primeiro grande show, com boa estrutura. foi o primeiro show que lembro escutar
bem o baixo e todos os instrumentos! foi surreal! [...]46
Esta primeira etapa avaliada pelo Fábio esclarece a importância do das apresentações
ao vivo para a banda, que segundo os mesmos e de acordo com o crescimento do mercado
mostrado no primeiro capítulo trazem receita para os artistas. A busca da banda por shows,
culmina na presença em um Festival, o Porão do Rock, que abre as portas da rede de músicos
brasileira que acaba por levar os Móveis para outras áreas do país, não sem antes garantir um
espaço na "cena" (Straw, 1999) brasiliense, o que vemos a seguir.
[...] Dando um salto, até 2002 fizemos apenas uns 2 shows fora de bsb, em goiânia.
mas tocamos muito aqui em bsb. continuamos com esse esquema de correr e tentar
fechar shows (tocamos em todos os buracos e tipos de eventos), fizemos mais
algumas produções. o lançamento do ep no final de 2000 foi um marco pra cena. em
parceria com o lançamento de outra banda, fizemos dois shows no mesmo dia no
mesmo lugar. um sem bebida alcoólica para pegar o público menor e outra a noite.
maior lotação da casa (500 pessoas por sessão) e vendemos 200 eps!
Em 2003, já com muita bagagem e um certo público (umas 400-500 pessoas por
show), já dentro do circuito universitário (ganhamos o finca pelo júri popular em
2001 e pelo júri oficial em 2002), fizemos 27 shows, sendo apenas 2 fora, mais uma
vez todos em goiânia.
No mesmo ano, quando participamos do Brasília Music Festival, como única banda
da cidade a tocar no palco principal, tivemos de montar uma estrutura própria.
chamamos um produtor que trabalha na área de teatro, acertamos um valor para
aquele show e montamos uma equipe com técnico de pa, iluminador e roadie.
acertamos um cachê com cada um, bem menos do que o mercado oferecia e eles
mereciam (mas hoje são grandes parceiros e alguns ainda trabalham com gente), mas
conforme o que podíamos pagar.
Nessa época já não gastávamos dinheiro com a banda. tudo o que entrava ia para um
caixa único e era gasto com o aluguel de um estúdio (dividíamos com outras duas
bandas uma sala própria), material novo, correios, etc. mas não tirávamos para os
músicos (só para repor o que por ventura tínhamos de adiantar).
Depois do BMF, chamamos o fabrício ofuji que era amigo de longas datas, já tinha
tido uma banda com o beto e conhecia muito bem o cenário dos anos 90 e início dos
anos 2000, para trabalhar a assessoria de imprensa (ele trabalhou no festival e
conseguiu muitos contatos e entrevistas para a gente!). e aí tudo mudou. tivemos de
aprender a trabalhar com uma pessoa que não era músico e que aos poucos foi
ganhando a confiança e cada vez mais espaço, passando a ser empresário, produtor,
roadie, etc, etc. isso foi muito importante para que ele entendesse como a gente
trabalhava, o que queríamos, onde queríamos chegar e, por fim, virar o membro tão
47
importante da banda que é hoje em dia. [sic]
A presença no festival Porão do Rock leva a banda para outros festivais da Abrafin
(Associação Brasileira de Festivais Independentes) e coloca a banda dentro da rede, e desta
forma"emergente" (Williams, 1979) de músicos independentes nacionais que se apoiam e
46
47
MOVEIS COLONIAIS DE ACAJU. Disponível em: <http://www.moveiscoloniaisdeacaju.com.br> Acesso
em: 5 jun. 2012.
MOVEIS COLONIAIS DE ACAJU. Disponível em: <http://www.moveiscoloniaisdeacaju.com.br> Acesso
em: 5 jun. 2012.
103
acabam por movimentlar as cenais locais, regionais e consequentemente nacionais. O baixista
segue relatando outras características desse "emergente" como por exemplo o site, o contato
com outros profissionais que podem ser contratados como terceiros, a rede de afetos, os
downloads na plataforma digital, e se assemelham muito ao esquema de distribuição proposta
por De Marchi (2011) descrita no primeiro capítulo desse trabalho.
Falamos geralmente que esse foi o ano do início da profissionalização do móveis:
site no ar com todas as músicas de graça para download, estruturação de uma equipe
mínima fixa e contato com outras pessoas para trabalhos maiores, auto-suficiência
da banda (mas ainda não remunerando seus músicos), estúdio próprio e por aí vai.
Em 2004 foram apenas 12 shows (10 em bsb e 2 em gyn), pois ficamos 4 meses sem
o andré o móveis e passamos a maior parte de estúdio ensaiando, compondo e
gravando o primeiro disco, o idem.
Em maio 2005 fizemos o lançamento do idem, numa festa-show organizada em 3
semanas em que tivemos mais de 3500 pessoas e 2007 cds vendidos em 9 dias!! ali
foi a base para aprendermos a produzir e dar gás para novos projetos, como o
convida (que começou no final do mesmo ano).
Foram 36 show no ano! 2 gyn, 1 são paulo, 2 curitiba e 3 no rio de janeiro. os outros
28 shows foram em bsb e depois não paramos mais também. mas sempre nos
preocupando com brasília, em manter uma rotina de shows aqui (claro que hoje não
podemos fazer mais do que 5-6 shows na cidade, mas em cada momento esse
número limite foi um), diversificar e renovar o público, garantir um caixa para
investimentos fora da cidade.
Além disso, tentamos trabalhar nas outras cidades da mesma maneira que fizemos
aqui: passos de formiga, contato com o público, fidelização, contato com mídias e
produtores locais estabelecendo parcerias e investimentos mútuos.
Tivemos de recusar muitos shows fora de bsb? poderíamos ter circulado mais e
mais? provavelmente. mas só para dar um exemplo, em 2006, um ano depois do
lançamento, fizemos 38 shows, sendo 21 fora, 3 em outras cidades do df e "apenas"
14 em bsb. uma baita inversão.
Com essa prática, conseguimos criar um sistema sustentável tanto para a banda
(desde de 2003 temos um crescimento bruto de arrecadação que varia entre 9095%!) como para os músicos (hoje vivo apenas do meu trabalho com o móveis!). já
vendemos mais de 7mil cópias do idem, 4mil do c_mpl_te, mais de meio milhão de
músicas do c_mpl_te baixadas no álbum virtual, uma média de arrecadação de mil
reais por show em vendas de produtos (com a entrada dos cds "slims" a R$ 5,00,
conseguimos aumentar a venda de cds de uma média de 10 por show para quase
100!!!).
Isso pra falar apenas em termos econômicos, porque se for falar dos aspectos
afetivos, simbólicos e subjetivos aí não tem espaço em blog ou lugar que for para
48
colocar tudo que já conquistamos. mais ainda falta muito!!!![sic]
A imprensa também reconhece nos Móveis um modelo de carreira como banda
independente. Diversos meios de comunicação citam a atuação da banda como independente
assim como seus métodos para atingir uma carreira sólida - como já mencionado no post
acima, agenda de shows constantes, presença em festivais, site, downloads em plataformas da
Internet, reconhecimento da imprensa tradicional e digital - . Um exemplo é encontrado no
blog Overmundo.
48
MOVEIS COLONIAIS DE ACAJU. Disponível em: <http://www.moveiscoloniaisdeacaju.com.br> Acesso
em: 5 jun. 2012.
104
De xodó do público universitário da capital federal, a banda Móveis vai se firmando
como atração de alcance nacional. Os degraus vão ficando para trás: participação em
festivais de destaque, apresentações em premiações televisivas de peso, capa de
revista,
faixas
em
trilhas
sonoras,
shows
fora
do
país.
O que tem conquistado os ouvidos é a mistura sonora – autodenominada “feijoada
búlgara” – de rock, ska e outras vertentes do pop com ritmos brasileiros e do Leste
Europeu, somada a uma quente performance de palco, que, aliás, sempre vai além do
palco e catalisa manifestações ensandecidas do público. O que nem todos podem ver
na ponta é que um modelo de negócios e arranjos singulares de organização
alavancam [sic] esse sucesso crescente. Trata-se de uma combinação de autogestão,
profissionalização, estreita ligação com os fãs, uso intensivo de redes sociais,
processo coletivo de criação, envolvimento direto dos músicos com as tarefas
logísticas e administrativas e adesão a formas não-convencionais de distribuição e
remuneração (Biondi, 2011).
A forma "dominante"(Williams, 1979) das majors, no qual os artistas buscavam seu
espaço no mercado através de exposição para as gravadoras e um posterior contrato via
festivais, com fitas demo entre outras possibilidades, tem como contraponto uma forma
"emergente" e que apresenta possibilidades de carreiras para as bandas. Cada vez mais
surgem, nas bordas do sistema das majors, novas possibilidades de exposição e fomento para
novas bandas e bandas independentes, como a Associação Brasileira de Festivais
Independentes, o coletivo Fora do Eixo e o próprio Móveis, que desenvolveu um modelo de
festival visando dar espaço para bandas de Brasília, bandas iniciantes, além de uma
apresentação ao vivo adicional no calendário da própria banda, o Móveis Convida.
O Móveis Convida teve início em Dezembro de 2005 com a proposta de apresentar
novas bandas do cenário de Brasília, de todo o Brasil e possivelmente bandas internacionais.
Apesar de ter tido, em diversas edições, artistas legitimados e de carreiras consolidadas, como
Los Hermanos e Pato Fu, o mote do festival é o mercado independente, como mostra o post
da banda após a primeira edição do evento: “Um pouco sobre o projeto Móveis Convida...
estamos sempre abertos a receber novos materiais... basta entrar em contato conosco!”.
A última edição do Móveis Convida mostrou a preocupação dos Móveis com a
consolidação de um mercado independente. O evento não teve apresentações ao vivo com
bandas nessa etapa, mas sim um formato de três dias em que, no primeiro dia, o produtor
Carlos Miranda deu seu depoimento sobre o fortalecimento da cena musical; no segundo dia,
Tom Serralvo, o técnico de som da banda, falou sobre sonorização; e, no terceiro dia, a
própria banda falou sobre o fortalecimento do meio musical em Brasília com outras bandas
independentes.
É claro no discurso da banda e na sua atuação a preocupação com a movimentação
da cena local, e da cena independente, evidente na criação do festival Moveis Convida.
Retomando Janotti Jr.
105
Ao mesmo tempo em que pretendem atingir um público cada vez maior , os
produtos midiáticos têm que se render à tendência crescente de segmentação
de mercado. Esse último reúne, como membros de uma mesma comunidade de
consumidores, indivíduos de diferentes partes do planeta, consumidores esses que,
às vezes, têm muito mais em comum com os valores de seus pares da rede de
consumo do que com sujeitos com os quais partilham um mesmo país, cultura
ou etnia. (Janotti Jr., 2003. 09)
Reforçar a cena local é reforçar a identidade local, a identidade como representante
legítimo de uma forma independente "emergente" (Wiliams, 1979), isso acontece no entanto
sem estabelecer uma fixação para as bandas que apenas de ter identificação com as suas raízes,
conseguem ultrapassar as fronteiras de suas cidades. A cena mais forte, significa em último
caso um mercado de música mais robusto, maior circulação de bandas, mercadorias, maior
consumo, conexão entre as bandas e profissionais.
A formação de uma cena, local em que também é possível o reconhecer a
participação atores sociais envolvidos na cadeia produtiva da música, desde a sua
composição e gravação até o seu consumo final, subentende uma série de
implicações. A principal delas é o desenvolvimento social e econômico do
espaço urbano, através da formação de um grupo que se “identifica” com a cena e
atua na disseminação da informação e conhecimento dentro da cena, forjando redes
sociais, afetivas e mercadológicas ao redor de certas práticas musicais. (Jannoti Jr. ,
2011: 12)
A existência de uma cena Brasiliense e a identificação da banda com a cena local não
é no entanto um delimitador para a banda, ou nenhum outro artista representante das suas
respectivas cenas, como são Vanguart e Macaco Bong para a cena de Cuiabá, Mombojó para
Recife, entre vários outros exemplos.
A delimitação dos contornos das cenas, todavia, não se correlaciona,
necessariamente, às fronteiras de seu referente geográfico [...] Ainda assim, a
reorganização da cultura do rock alternativo teve como uma de suas
conseqüências o status paradoxal do “localismo” . Os valores estéticos locais,
entretanto, são os mesmos de um cosmopolitismo que mantém pontos de
referência relativamente estáveis, de uma comunidade para outra, possibilitando a
reprodução do localismo do rock alternativo em níveis internacionais e até
mesmo globais. (Freire Filho e Fernandes, 2006: 31)
A banda, como já proposto no primeiro capítulo, se articula com outros artistas e não
só reforça a cena local como acaba por alcançar outros mercados nacionais e internacionais.
Nesse sentido é importante relembrar o papel da Associação Brasileira de Festivais
Independentes no desenvolvimento de uma "rede de produtores", conforme define Castells
(2010).
Abrangem todos os acordos de co-produção que oferecem possibilidades a
produtores concorrentes de juntar suas capacidades de produção e recursos
106
financeiros/humanos com a finalidade de ampliar seus portfólios de produtos, bem
como sua cobertura geográfica. (Castells, 2010:251)
Figura 29 - Flyer do festival Móveis Convida Mercado Musical em 18 de Novembro de 2012
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
Hardt e Negri (2001) usam a "cooperação abstrata" para definir essa rede de
produtores ou empresas que cooperam de maneira territorializada ou desterritorializadamente.
[...]os operários que cooperam podem ou não estar presentes num lugar, e podem
até ser relativamente desconhecidos entre si, ou ser conhecidos apenas pela troca de
informações produtivas. O circuito de cooperação é consolidado na rede e na
mercadoria num nível abstrato.Lugares de produção podem, pois, ser
desterritorializados, e tendem à existência virtual, como coordenadas na rede de
comunicação. Em oposição ao velho modelo vertical industrial e social, a produção
agora tende a ser organizada em redes horizontais de empresas. (Hardt e Negri,
2001:317)
O festival da banda brasiliense mostra uma trajetória de crescimento e
desenvolvimento ao longo dos anos. Após a primeira edição com as bandas Coquetel
Acapulco, do Rio de Janeiro, e a brasiliense Super Stereo Surf, o evento prossegue até hoje
sendo organizado pela banda. O segundo festival Móveis Convida promovido pela banda foi
realizado em Março de 2005 com presença de outras três bandas, além dos próprios Móveis
Coloniais: a Rádio de Outono, de Pernambuco; Ímpar, de Minas Gerais; e Lafusa, de Brasília.
107
Figura 30 - Segundo festival Móveis Convida em 11 de Março de 2005
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
Em Abril de 2006, a banda estava presente na FNAC de Brasília num bate papo
promovido pela loja com o intuito de compartilhar suas experiências e práticas do processo de
gravação e promoção do álbum Idem. Esse tipo de iniciativa passou a ser uma das práticas da
banda, que passou a, constantemente, participar de eventos sobre o mercado independente de
música e as possibilidades de se estabelecer uma carreira fora das grandes gravadoras.
A terceira edição do festival organizada pela banda teve como convidados Lucy and
the Popsonics, Colina e Ludov. A banda paulistana Ludov já havia sido consagrada com o
prêmio de Melhor Clipe Independente no VMB da MTV em 2004 e foi indicada ao prêmio de
Melhor Artista Independente naquele mesmo evento.
É possível avaliar aqui o desenvolvimento da banda como agente da cena brasiliense
e como agente da rede de festivais independentes que se formou ao redor do país e tem
movimentado o mercado.
Figura 31 - Flyer do terceiro Móveis Convida convida com Ludov
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
108
A quarta edição do festival Móveis Convida, em 25 de Novembro, teve uma
novidade: uma seletiva feita pela banda para a apresentação de novos artistas no evento.
Foram enviados 30 trabalhos para os Móveis e os selecionados apresentaram-se duas semanas
antes do festival para escolha, dos selecionados pelo público presente,. A escolhida foi a
Gilbertos Come Bacon. Além da nova banda, o festival contou com a presença da banda
Lafusa, de Brasília; do Moptop, do Rio de Janeiro; e com a banda Los Hermanos,
nacionalmente conhecida.
Figura 32 - Flyer do Móveis Convida, 4 em Novembro de 2006
49
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
A quinta edição do festival Móveis Convida aconteceu em Março de 2007 com as
bandas ADI, de Brasília, e Rock Rockets, de São Paulo, e levou mais uma novidade que se
estendeu para a sexta edição, em 29 de Setembro, com as bandas Teatro Mágico, de São Paulo,
Velhos e Usados, do Distrito Federal, e Canastra, do Rio de Janeiro. Essa novidade marcou a
interação com os fãs na Internet e uma maneira de se promover na rede. A banda lançou em
seu site e blog um concurso para sortear ingressos junto aos fãs. Os participantes deveriam
publicar o flyer do show em sua página pessoal, blog, flog ou qualquer outro site, ajudando,
assim, na divulgação e concorrendo a um convite ao evento. As seguintes regras foram
publicadas no post:
1. Publique o flyer em sua página (blog, flog, site, etc) e anunciem [sic] as
informações do show;
49
Dessa vez com seletiva para bandas. Trinta trabalhos foram
http://www.moveiscoloniaisdeacaju.com.br. Acesso em: 5 jun. 2012.
enviados.
Disponível
em:
109
2. Após publicar o flyer, comente em qualquer um dos textos deste blog (qualquer
um mesmo), indicando seu respectivo endereço na Internet.
3. Depois, é só esperar. Os resultados serão divulgados na sexta-feira (28) e os
vencedores comunicados por e-mail. Fique atento.
4. No dia do evento, basta se apresentar na entrada para convidados e identificarse. Depois, tenha bons shows (Moveis Coloniais de Acaju).
Figura 33 - Flyer da quinta edição do Móveis convida
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
Figura 34 - Flyer da sexta edição do festival Móveis Convida
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
110
Este tipo de atividade da banda, interagindo com os fãs nas suas plataformas digitais
e estimulando promoções e outras atividades é uma das principais características da banda
como forma "emergente" (Williams, 1979) que se aproveita da cultura digital e será avaliada
no próximo capítulo.
O festival Móveis Convida, em sua sétima edição, no dia oito de Dezembro de 2007,
apresentou o lançamento do single Sem Palavras feito em uma parceria com a gravadora
Trama no projeto Trama Virtual. A proposta do projeto era liberar a música de graça na
Internet no site da gravadora Trama e, para cada download realizado, o artista receberia um
valor pago pelos patrocinadores do projeto em uma clara contraposição ao modelo das majors
e grandes distribuidores do mercado musical digital como a Apple que cobra por downloads
feitos em suas plataformas. Empresas, como a Wolkswagen, entraram como parceiras no
projeto. O Trama Vrtual iniciado em 2002 teve seu fim em Fevereiro de 2013 com os
downloads em MP3, e a trama atualmente libera todo o seu conteúdo em vídeo no Uol e
Youtube.
Figura 35 - Capa do single Sem Palavras para download no projeto Trama Virtual
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
111
Figura 36 - Flyer do sétimo festival Móveis Convida
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
Mais um reconhecimento da banda, por meio da imprensa, veio na lista das 25
Melhores Canções Nacionais de 2007 da Revista Rolling Stones Brasil com o single de Sem
Palavras figurando na 25ª posição, reforçando a posição dos Móveis de um modelo onde as
plataformas convergem e não negam a necessidade de veículos tradicionais para o mercado da
música, como a Rolling Stones.
O ano de 2008 trouxe a primeira edição do festival Móveis Convida, em 28 de março,
com mais uma banda já consagrada no cenário musical, os mineiros do Pato Fu. Além deles,
também estiveram presentes Bois de Gerião, de Brasília, em uma novidade que foi a parceria
com o site especializado em música independente, o www.senhorf.com.br, e com a rádio
Cultura FM de Brasília, que foram os responsáveis por conduzir uma seletiva com diversas
bandas e escolher uma para se apresentar ao vivo no evento. A vencedora foi a Cravo
Carbono do Pará. A seletiva teve 112 bandas inscritas de todo o Brasil, o que mostra um
significativo crescimento no interesse pelo evento por parte dos músicos, considerando que a
primeira seletiva contou com inscrição de 30 bandas. A oitava edição do Móveis Convida
contou com cobertura da Trama Virtual em parceria com o canal Multishow.
112
Figura 37 - Flyer do oitavo festival Móveis Convida
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
O ano no qual a banda completou dez anos de existência foi também marcado pelo
início das gravações do segundo disco dos Móveis, batizado de C_mpl_te, que, segundo o
guitarrista BC, é relacionado com o processo de composição da banda, na qual não há uma
figura líder responsável e todos os membros completam o processo. O produtor escolhido pela
banda, em parceria com a Trama, foi Carlos Eduardo Miranda, já responsável pela produção
de bandas, como Raimundos, Skank, O Rappa e Cansei de ser Sexy, e jurado do programa
ídolos do SBT, retomando aqui o "residual" (Wiliams, 1979) na figura do produtor. As
gravações tiveram início em outubro no estúdio da Trama em São Paulo e foram captadas
pelo blog da banda em várias postagens dos momentos de gravação, ensaios, composição,
comentários sobre as músicas e até mesmo a relação das canções e arranjos através de relatos,
fotos e vídeos. Os diários de bastidores mostram, inclusive, a produção do encarte do disco,
realizada pelo vocalista André Gonzales e pelo tecladista Eduardo Borém, ambos formados
em design. Esse é um dos exemplos de como uma banda independente pode reduzir os custos
de produção de um CD, pois, em vez de utilizar o processo tradicional de uma gravadora,
contratando um serviço terceirizado ou tendo profissionais especializados dentro de seu cast, a
banda utiliza seus próprios membros nas etapas de produção do disco.
113
Figura 38 - Foto dos ensaios para o disco C_mpl_te postada no blog da banda
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
Figura 39 - Post no blog da banda com vídeo mostrando o processo de produção do encarte do novo disco
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
Figura 40 - Bastidores das gravações do disco C_mpl_te com o produtor Carlos Miranda
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
114
Figura 41 - Flyer da Nona Edição do Móveis Convida
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
As gravações do novo disco seguiram e a nona edição do Móveis Convida serviu
como teste para a reação do público às novas músicas, conforme o blog da banda informa.
“No show da gente o set vem cheio de novidades, vamos aproveitar que estamos preparando o
disco novo e testar algumas músicas, depois me digam o que acharam.” (Moveis Coloniais de
Acaju). Essa edição trouxe um formato maior e com mais bandas, dividida em três dias e com
atrações internacionais, como Mutandina ( Arg) e Coiffeur( Arg), além das nacionais
Deuses da Kaaba (DF), Watson (DF) – The Pro(DF), Pata de Elefante ( RS), César de Paula
(DF), Leo Yolobem (DF) e Diego de Moraes (GO).
Assim, os Móveis seguiram com o lançamento do novo álbum, em 8 de maio, em
uma parceria com a Trama Virtual e com disponibilização para download no site da gravadora,
assim como no formato de CD com as doze faixas que viriam a compor o álbum. Já em março,
bem antes do lançamento do disco para download no site da Trama, a banda liberou o
primeiro single para audição com a canção O Tempo. A banda preparou, como estratégia de
promoção e divulgação, um hotsite que seria hospedado em um domínio da banda
www.moveiscoloniaisdeacaju.com.br/complete
115
Figura 42 - Página do Álbum Virtual da Trama
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
Figura 43 - Disco C_mpl_te em formato CD
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
O lançamento oficial aconteceu na décima edição do Festival Móveis Convida, que,
dessa vez, contou com as bandas Black Drawing Chalks e Macaco Bong, já muito comentadas
no mercado independente de música nacional, além da Galinha Preta. O festival ficava cada
vez mais reconhecido no meio musical e a cobertura da mídia tradicional já incluía grandes
veículos como o Globo, que reportou o clima independente e informal da banda.
Na semana passada, fui escalada para cobrir o festival "Móveis Convida". A banda,
que já tem dez anos de estrada, estava promovendo a décima edição e lançando o
segundo disco, "C_mpl_te", cujas faixas já estão disponíveis desde o mês passado
no site deles. Já tinha ouvido o som da banda, mas nunca tinha visto o tão falado
show ao vivo.
O legal de um festival independente é que, longe do glamour que o público costuma
achar que existe, o clima é de muita informalidade. Eu e os demais jornalistas
convidados, por exemplo, chegamos ao Centro Comunitário da UnB na mesma
van do Black Drawing Chalks, a primeira atração da noite. E jantamos com o
pessoal do Macaco Bong e com parte do Móveis. Caía uma chuva como eu nunca
116
imaginei ver no árido Planalto Central: das quatro da tarde às quatro da manhã foi
um aguaceiro ininterrupto. Mais um estereótipo que cai...
Mais afeita ao cavaquinho e violas do que às guitarras (confesso), fui surpreendida
pelos shows que vi: os goianos do Black Drawing Chalks cantaram como veteranos
e já fizeram o público vibrar desde o começo; o Galinha Preta e sua apresentação
caótica arrancaram alguns risos incrédulos e a simpatia do público; e o Macaco
Bong, com suas sinfonias roqueiras, receberam aplausos longos e calorosos. Tomei
um susto ao achar que via um princípio de confusão no show, tão pacífico. Que
nada, eram apenas umas rodas de pogo - aprendi o nome lá - daquela galera que
gosta de se esbarrar quando está ouvindo um som pesado (!).
A essa altura do campeonato, eu já estava lutando contra a dor nas pernas - e às
voltas com a bateria do celular com câmera que eu levei para gravar os shows ganhei uma nova dose de energia com a entrada do Móveis. Das músicas já
conhecidas, como "Copacabana" até "O tempo", do novo CD, o público cantou
praticamente todas as letras - prova do sucesso certo que o disco vai fazer. Bonito de
se ver! (Soares, 2009)
A revista Trip fez uma cobertura sobre a décima edição do festival e reforçou a
maneira como a banda se estrutura e a sua interação com a plateia.
Enquanto as 5 mil pessoas se divertiam no lotado Centro Comunitário da UnB
(Universidade de Brasília), o Móveis trabalhava duro para que a 10ª. Edição do
Festival Móveis Convida, que aconteceu no dia 3 de abril, continuasse animada e
organizada até a hora em que subiriam ao palco.
“Cara, isso aqui está uma loucura. Está sendo a edição em que mais pessoas da
banda estão envolvidas na produção”, diz Fabrício Ofuji, integrante do Móveis. O
grupo é formado por André Gonzáles (voz), BC (guitarra), Beto Mejía (flauta
transversal), Eduardo Borém (gaita cromática, escaleta e teclados), Esdras Nogueira
(sax barítono), Fabio Pedroza (baixo), Paulo Rogério (sax tenor), Gabriel Coaracy
(bateria) e Xande Bursztyn (trombone). Qual dos oito instrumentos musicais do
grupo Ofuji toca? Nenhum. Ele organiza, coordena, planeja e administra a
empresa/banda Móveis Coloniais. Depois das poucas palavras, o samurai candango
corre para o backstage. Enquanto isso, o Black Drawing Shalks (GO), um dos
convidados da noite, se acabava no palco sob os olhares atentos do vocalista do
Móveis, André Gonzáles, que acompanhava tudo da mesa de som.
Tradicionalmente, o Móveis Convida é formado, em sua maioria, por estudantes do
ensino médio e universitário, que neste dia enfrentaram a chuva torrencial da capital
federal para trocarem 1 quilo de alimento por diversão garantida. “É o terceiro ano
que eu venho”, diz a estudante do curso de Letras da UnB, Gabriela, 19, que até
demonstrava um certo interesse pelos convidados da banda, mas estava ali “para ver
o Móveis mesmo” (DIAS, 2009).
117
Figura 44 - Flyer do décimo festival Móveis Convida
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
O lançamento do novo álbum, somado às apresentações ao vivo, contribuíram para
que a banda obtivesse excelentes avaliações do novo disco na imprensa. Os Móveis, que têm
como uma das principais características a independência e o contato com os fãs utilizando as
redes sociais, o que será avaliado no terceiro capítulo deste trabalho, faz uso também do
contato com a imprensa tradicional assim como se utiliza de estratégias do modelo das majors,
como a contratação de um produtor, e segue com as performances ao vivo como uma das
principais fontes de receita da banda. Há "resíduos" da forma "dominante" (Williams, 1979)
que seguem ativos . A relação com a imprensa tradicicional é um exemplo.
As performances ao vivo renderam para a banda duas indicações para a premiação do
Video Music Awards Brasil, da MTV, no ano de 2009, nas categorias de Melhor Show e
Banda de Rock Alternativo e o grupo ainda esteve ao vivo na premiação. Essa é uma
característica "residual" (Wlliams, 1979) do modelo das majors que é rapidamente integrada
às estratégias da banda que não pretende ter como maior fonte de receita a venda de
fonogramas e sim os shows.
Os Móveis aproveitaram o evento para seguir capitalizando com a polêmica sobre a
crítica da Revista Época em relação a ficção criada pela banda para justificar a Revolta do
Acaju e gravaram diversos vídeos postados no Youtube com outros artistas manifestando-se
em relação à existência da Revolta, entre eles, Didi Wagner, apresentadora do canal
Multishow; Marcelo Adnet, humorista da MTV; Marcos Mion e Felipe Solari, da MTV;
118
Marco Luque, Rafael Cortez e Marcelo Tas, do CQC, da TV Bandeirantes; Pitty, Lobão,
Rafael Ramos e Supla.
A relação da banda com a mídia tradicional permanece, como já citado anteriormente
e recebeu até um espaço no blog dos Móveis, onde há uma coletânea do que é noticiado nos
principais veículos de imprensa do país desde o início do blog. O site trazia a matéria
publicada pela revista Rolling Stone na sua versão brasileira, classificando o disco
C_MPL_TE na 5ª posição entre os 10 melhores de 2009.
5 Móveis Colonias de Acaju- C_mpl_teTrama
Se uma banda deu um salto qualitativo em 2009, foi o Móveis. Eles estiveram mais
visíveis, presentes em todos os festivais e eventos. Mesmo com todos os cacoetes
característicos de banda indie, o Móveis buscou a popularidade e C_mpl_te, cheio
de canções de refrão fácil de lembrar, cumpriu o seu papel (Rolling Stones Brasil,
2009).
As aparições da banda em redes de TV também eram frequentes. Durante o ano de
2007 foram frequentes as aparições em programas como o Som Livre, da Rede Globo, no qual
a banda participou de um tributo ao falecido Raul Seixas tocando as músicas Eu também vou
reclamar, Eu nasci há dez mil anos atrás, Carimbador Maluco e Como vovó dizia. O grupo
participou também de uma apresentação na TV Câmara, em 25 de maio, e convocou os fãs,
em post no blog, para participar da plateia.
Figura 45 - Homenagem ao cantor Raul Seixas no programa Som Livre da Rede Globo
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
O primeiro videoclipe do álbum C_mpl_te foi lançado no programa Acesso MTV.
Depois a banda passou, no mesmo ano, pelos programas Edgard no Ar, no canal Multishow,
Acesso MTV, Programa Atitude, da TV Brasil, e pela Rádio Metodista. A banda ainda viria
participar do programa Altas Horas após pedidos dos fãs. O reconhecimento rendeu uma
119
música na trilha da novela Araguaia, da Rede Globo, e a capa da Revista Gol, entre outras
publicações. Em release no site da banda, o produtor Fabrício Ofuji fala sobre a relação com
as mídias tradicionais. “A avaliação é que estar na mídia tradicional é tão importante quanto
participar do [movimento] Música Para Baixar ou visitar uma rádio comunitária” (Moveis
Coloniais de Acaju).
Eliminando a lógica fatalista de que um meio substitui o outro e utilizando a o
conceito de "convergência" (Jenkins, 2008), sabemos que
O conteúdo de um meio pode mudar (como ocorreu quando a televisão substituiu o
rádio como meio de contar histórias, deixando o rádio livre para se tornar a principal
vitrine do rock and roll), seu público pode mudar (como ocorre quando as histórias
em quadrinho saem de voga, nos anos 1950, para entrar num nicho, hoje) e seu
status social pode subir ou cair (com acontece quando o teatro de desloca de um
formato popular para um formato de elite), mas uma vez que um meio se estabelece,
ao satisfazer alguma demanda humana essencial, ele continua a funcionar dentro de
um sistema maior de opções de comunicação. Desde que o som gravado se tornou
uma possibilidade, continuamos a desenvolver novos e aprimorados meios de
gravação reprodução do som.. Palavras impressas não eliminaram as palavras
faladas. O cinema não eliminou o teatro. A televisão não eliminou o rádio. Cada
meio antigo foi forçado a conviver com os meios emergentes. É por isso que a
convergência parece mais plausível como uma forma de entender os últimos dez
anos de transformações dos meios de comunicação do que o velho paradigma da
revolução digital. Os velhos meios de comunicação não estão sendo
substituídos.Mais propriamente, sua função e status estão sendo transformados pela
introdução de novas tecnologias. (Jenkins,2008:186)
Os Móveis vão buscar uma estratégia já mencionada por Midani (2008) no primeiro
capítulo desse trabalho e trabalham sua promoção junto à TV Globo, na participação de
programas ao vivo e dentro da trilha sonora de uma novela. Dentro dessa perspectiva, é
possível um melhor entendimento da "ressurreição" do vinil e forte crescimento em vários
mercados (embora ele nunca tenha falecido e tenha seguido com um público fiel) e a
manutenção do CD, como já vimos no primeiro capítulo deste trabalho. Ambos os suportes,
embora tenham deixado de ser as grandes fontes de renda de gravadoras e artistas seguem
com um público de nicho, que ainda enxerga valor no encarte, e diferenças na qualidade
sonora, além de uma experiência diferenciada em relação às faixas digitais. LPs e CDs se
tornam "residuais" (Williams, 1979), ainda ativos como produtos de nicho e a banda se utiliza
disso como veremos posteriormente e como já mencionado no primeiro capítulo esses
formatos retomam o crescimento. Dessa mesma maneira, os meios tradicionais de
comunicação como TV e rádio também seguem ativos e são utilizados pela banda. A
participação na trilha de Araguaia remete à estratégia mencionada no primeiro capítulo de
promoção junto às TVs muito usada nos anos 60.
120
Figura 46 - Gravação do clipe Cheia de Manha, primeiro do álbum C_mpl_te
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
O vídeoclipe da música O Tempo estreou numa ação na MTV, em parceria com o
grupo de arte urbana Kollor Kings. Esse foi o clipe de O Tempo, resultado da ação em tempo
real, #TempoRealMoveisMTV, parceria dos Móveis com a MTV e o grupo Kollors Kingz,
em homenagem ao Dia do Grafitti e ao aniversário de Ceilândia (cidade do Distrito Federal).
A banda recebeu a premiação do canal Multishow na categoria Experimente além do prêmio
Orilaxé e Música Digital no mesmo ano.
Figura 47 - Capa da revista Gol especial sobre Brasília com a banda como
representante da cena musical Brasiliense
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
O lançamento do álbum C_mpl_ete, com um produtor renomado contratado pela
banda, somado aos esforços de contato com a mídia tradicional e à extensa agenda de shows
consolidou a banda no cenário nacional, ainda que os Móveis seguissem como uma banda
independente, sendo reconhecido pela imprensa especializada como um dos melhores
121
exemplos desse segmento no país. A formação da banda, num cenário de cultura faça você
mesmo, propicia a manutenção da independência da banda, uma vez que todos os seus
membros se envolvem nas tarefas da banda, desde a composição até a realização dos festivais
Móveis Convida, os quais ajudam a dar maior exposição a outras bandas independentes de
Brasília, do Brasil e, agora, internacionais.
2.3 "Somos digitais", mas ainda lançamos Vinil, CD, DVD e somos reconhecidos pelas
nossas performances ao vivo.
Quando a gente começou já tinha Internet, a gente
cresceu usando a Internet, era normal que o nosso
trabalho fosse direto pra rede (Fábio Pedroza).
No início dos Móveis, em 1998, a Internet já também começava a dar seus primeiros
passos no país. A banda, formada por universitários que se consideravam, em maioria, geeks
ou nerds50, era adepta da rede mundial de computadores desde o seu início no Brasil. Um post
do produtor Fabrício Ofuji ilustra a relação entre a banda e a Internet, desde o seu início no
Brasil e a sua transição para a vida cotidiana.
Bom, sendo ilustrativo e simplório, podemos dizer que tudo começou décadas atrás,
num pensamento, majoritariamente acadêmico… produziu-se tecnologias,
linguagens, protocolos e interfaces que resultaram nesse arranjo que temos hoje
chamado Internet!
Durante um bom tempo isso ficou restrito ao meio científico… mas, logo, atingiu
outros lugares que não necessariamente a Academia. Outras pessoas, não
necessariamente cientistas ou pesquisadores, mas interessadas em tecnologia
também começaram a utilizar essas novidades. Seria, mais ou menos, como darmos
a alcunha de nerds e geeks…
Então, durante um determinado período de tempo, esses recursos da computação e
comunicação ficaram restritos a pesquisadores, cientistas e alguns poucos curiosos.
Mas isso não durou tanto assim. Imagine que as pessoas logo percebem todo o
potencial desse arranjo. E a rede digital começa a sair dessa limitação e passa a
auxiliar várias e crescentes comunidades virtuais.
Naturalmente, as empresas comerciais também compreendem o potencial dessas
redes digitais. E, nos anos 90, a chamada Internet torna-se acessível a tod_s. Aqui no
Brasil, por volta de 1996 temos o surgimento de vários provedores de acesso…
Até aí, tudo bem… mas, onde se insere a discussão promovida, principalmente, pelo
Paulo? Vale lembrar que, majoritariamente, o comportamento daquelas pessoas
envolvidas nos primórdios desse arranjo, estava de acordo com uma cultura livre,
colaborativa e baseada no conhecimento. Logo, dentro desse comportamento,
compartilhar conhecimento e informações sempre foi uma premissa.
E, mesmo comercial, essa lógica ainda permanece(u) dentro das redes digitais…
basta a gente pensar no Napster. E aí podemos dizer que o coreto bagunçou…
Depois termino essa historinha […] (Moveis Coloniais de Acaju).
50
Termos em inglês para usuários assíduos de computadores, videogames e outras tecnologias
122
A Internet é parte das atividades da banda desde o seu início, porém o lançamento do
site oficial dos Móveis, com o domínio www.moveiscoloniaisdeacaju.com.br, é de novembro
de 2002. O site já foi lançado com as músicas disponibilizadas em formato Mp3 para que os
interessados pudessem fazer o download diretamente. Segundo a banda, na época já tinham
sido baixadas mais de 600 faixas digitais do grupo, e 15 CDs do primeiro EP da banda, com 6
músicas no formato tradicional em Compact Disc no ano de 2000.
O "emergente" (Williams, 1979) digital está presente numa banda que adota a
Internet e a cultura digital logo no seu início, buscando um novo formato de promoção que
caminha em paralelo com o formato "dominante" das majors, no Star System. Isso acontece,
entretanto, em consonância com o "residual" (Williams, 1979) e a banda segue utilizando os
formatos tradicionais como o CD e até mesmo o LP. Esta avaliação sobre a produção da
banda na Internet será foco do terceiro capítulo.
Os álbuns da banda foram lançados sempre no formato CD além do Mp3 e sempre
estiveram disponíveis para download na página da banda. Um novo trabalho da banda - em
parceria com Gabriel Thomaz, guitarrista dos Autoramas, banda carioca e ex-integrante do
Little Quail, de Brasília - que havia sido gravado em dezembro de 2006 foi lançado no
formato de LP em vinil contendo três faixas. O LP foi gravado por Diego Marx no estúdio
Quintal no dia 20 de dezembro de 2006, e foram feitas gravações adicionais no estúdio
Inferninho, em Brasília, por Diego Marx, e no estúdio Hanoi, no Rio de Janeiro, por Perazzo.
Foi mixado e masterizado por Diego Marx no estúdio Inferninho no período de janeiro a
março de 2007. A produção ficou sob a responsabilidade dos músicos envolvidos na parceria.
O lançamento foi feito no show dos Móveis em 28 de agosto. O trabalho foi relançado
posteriormente em CD.
O saxofonista da banda Esdras Nogueira fez um post sobre a importância do formato
em vinil nos dias de hoje, ressaltando a necessidade e o espaço que o LP ainda tem para o
mercado atual, mesmo que seja em menor escala.
Sou fã dos bolachões, acho muito elegante, mas o fator principal não é só o do som,
na verdade é principalmente o preço ..
Então, tava vendo que as gravadoras estão começando a relançar os discos em vinil,
mesmo que seja em menor escala e exclusivo a poucos artistas, basicamente os que
atingem um filão no exterior, é uma ótima iniciativa, além de que para eles isso é
ótimo contra a pirataria.
E não só por esse motivo, o vinil ainda hoje tem muitos fãs que afirmam sem medo
que o som do LP é outro, que tem uma profundidade maior, as frequências graves e
agudas não ficam comprimidas, isso não é facilmente perceptível mas existe.
Sou fã dos bolachões, acho muito elegante, mas o fator principal não é só o do som,
é principalmente o preço.. Nos Sebos compro muita coisa boa, que são relançadas
hoje em Cd por um valor bem alto, por três reais, quatro, cinquenta centavos, para
mim vale muito a pena, além do encarte muito chique, e não que eu seja contra
123
baixar músicas, muito pelo contrário, mas o material original tem outro valor.
(Moveis Coloniais de Acaju).
Figura 48 - EP Móveis em formato Compact Disc Slim
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
Figura 49 - Capa do EP Vai Thomaz no Acaju, parceria com Gabriel Thomaz, lançado também em Vinil
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
A mesma avaliação aplica-se ao formato de DVD. Em 2010, a banda gravou os
shows no Auditório Ibirapuera, em São Paulo, nos dias 22 e 23 de janeiro, e, desses shows,
surgiu o DVD da banda, como um produto adicional, independente do fato de o show, na
íntegra, ser disponibilizado no canal do Youtube da banda, além de ser colocado em formato
torrent pelos próprios membros em sites como o The Pirate Bay.
124
Figura 50 - Post da pré-venda do DVD no blog
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
Figura 51 - Os shows de 22 e 23 de Janeiro de 2010 marcaram a gravação do DVD
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
A presença "multimídia" (Castells, 2010) da banda já havia iniciado em 2006 com a
gravação do seu primeiro videoclipe da música Seria o Rolex, faixa do álbum Idem. O clipe
seria postado naquele ano na Rede Social Youtube. As várias atividades da banda deram
reconhecimento, ainda em 2006, pela atuação na cena independente de Brasília com o Prêmio
Dynamite, dado pelo site www.dynamite.com.br.
125
Figura 52 - Gravação do clipe de seria o rolex postado no Youtube
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
Figura 53 - Diário de viagem da banda para o show em São Paulo
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
A modo informal e próximo com que a banda interage com os fãs assim como a
ligação com a Internet aparecem em alguns exemplos nesse período. Em 12/11/07, a banda
publicou, no seu blog, um convite para uma partida de futebol numa terça feira, dia 20/11,
chamando os fãs e propondo um aluguel de quadra. O convite teve resposta de vários fãs no
próprio blog. O grupo começou a publicar na Internet os diários de viagem da banda em
forma de vídeo nessa mesma época.
Os Móveis reforçam o papel da Internet para as bandas independentes, construindo a
sua carreira ao longo da evolução e desenvolvimento da rede mundial de computadores, e
abraçando novas plataformas, como o Youtube, assim que estas apareceram na rede. Esse
comportamento de Early Adopter (Jenkins, 2007) seguiu com as redes sociais Instagram e
Pinterest. Os Móveis estão no Youtbe desde 2006, no Facebook e Twitter desde 2008. A
maneira como a banda se promove usando esses sites será avaliada no próximo capítulo. O
126
gaitista e tecladista Eduardo Borém afirma sobre a importância da Internet para a banda: “A
gente estabeleceu um contato com o público que não tínhamos. É barato, fácil e eficiente”
(Moveis Coloniais de Acaju).
A Internet contribui para a independência da banda também através da loja virtual,
que iniciou suas primeiras vendas no lançamento do DVD. A banda mantém também a venda
de produtos numa loja física durante os shows, além das vendas realizadas diretamente no
escritório em Brasília, onde é possível avaliar a "convergência" (Jenkins, 2008) dos formatos
pois a existência da loja na Internet não exclui a venda física nos shows. A atuação da banda
na Internet rende muitas premiações e reconhecimento para os Móveis na imprensa
especializada, porém as performances ao vivo têm extrema importância na carreira dos
músicos. Como visto no início deste capítulo, a banda lançou-se nos festivais da UnB e,
posteriormente, no Brasília Music Festival, quando foi a única banda da cidade a se apresentar
no palco principal. Em entrevista ao Jornal de Brasília, o vocalista André Gonzales já
destacava a importância dos shows ao vivo para a banda. “Toda oportunidade de divulgar
nosso trabalho é válida, e a gente sempre aprende com os diferentes públicos nos festivais”.
Em depoimento para o blog Alucináticos, o vocalista André Gonzales classificou o ano de
2003 como “grande ano do Móveis, pois além de terem feito diversos shows, nos mais
diversos lugares ‘,o grupo conseguiu expandir seu público para além das cercanias do
underground’”. O blog considera os Móveis como uma das bandas que mais realizaram shows
em Brasília, reforçando a cena e a identidade com a cidade. A agenda de shows de 2006 levou
a banda para apresentações fora de Brasília, com shows em Natal, Recife, São Paulo, Rio de
Janeiro, entre outras praças.
O ano de 2008 seguiu com a confirmação da presença da banda em seu primeiro
festival internacional, o Pukkelpop, na Bélgica, ao lado de importantes bandas internacionais,
como Metallica, The Killers, Bloc Party, The Flaming Lips, Stereophonics, além de vários
outros artistas em início de carreira e independentes. A participação do festival rendeu, para a
banda, o agendamento de uma turnê na Europa, com shows nas cidades alemãs de Jena,
Stelzen e Frankfurt, em Basel, na Suíça, e Chomutov, na República Tcheca, além de várias
menções na imprensa brasileira. O convite para a participação no Pukkelpop partiu do
produtor do festival após ter assistido ao show dos Móveis no festival Goiânia Noise. A
viagem pela Europa está registrada em vários posts no blog e em vídeos postados como um
diário no Youtube.
127
Figura 54 - Logo dos posts com diários de viagem da banda em vídeo no Youtube
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
A agenda de shows seguiu, no retorno ao Brasil, com presença no festival Porão do
Rock, em um formato menor, realizado em Brasília com a banda Sueca The Hives em
25/09/08. Antes disso, havia sido realizada a nona edição do Móveis Convida, com a presença
das bandas Deuses da Kabaal e Watson, do Distrito Federal, e a primeira atração internacional,
a banda Mutandina, da Argentina. O festival, nessa edição que foi realizada no Espaço Brasil
Telecom, disponibilizou inclusive um ônibus gratuito para deslocamento do público aos
shows. O evento contou com 10 bandas no total com duração de três dias, 8, 9 e 10 de agosto
daquele ano. O festival teve cobertura da TV Cultura de São Paulo, que fez uma reportagem
para o programa Radiola.
Figura 55 - Flyer do festival Pukkelpop 2008 com participação da banda
Fonte:
Pukkelp, 2008.
A finalização das gravações do novo disco aconteceu em 05 de março de 2009, e,
logo na sequência, a banda fez um show no Itaú Cultural, com participação do trombonista
128
Bocato, de longa carreira na música brasileira, tendo tocado com artistas como Roberto Carlos,
Elis Regina, Ney Matogrosso e Rita Lee. A apresentação ao vivo rendeu mais um EP para a
banda, lançado em formato Slim, como já haviam feito nos trabalhos anteriores, sem o encarte
tradicional dos CDs e também num custo mais baixo, atualmente vendido a R$ 6,00 na loja
virtual da banda.
Figura 56 - EP Móveis e Bocato a venda na loja virtual da banda
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
O novo álbum foi lançado e, assim, a banda seguiu com a divulgação do novo disco
em uma turnê pelo Estado de São Paulo com direito a passagens pela virada cultural no
interior, nas cidades de Indaiatuba e Caraguatatuba. O novo trabalho foi muito bem recebido
pela crítica especializada e pela imprensa em geral. A banda promoveu o disco nos programas
Edgard no Ar, do canal Multishow, Acesso MTV e Programa Atitude, da TV Brasil. O disco
foi lançado no formato digital em parceira com a gravadora Trama, porém a banda lançou
outros três formatos: o slim, com preço de R$ 6,00; o CD em acrílico tradicional, custando
R$ 18,00; e o formato digipack, com o custo de R$ 23,00. Após o lançamento do novo álbum,
a banda consolidou uma agenda de shows pelo país todo.
129
Figura 57 - Formatos do CD C_mpl_te disponíveis para venda na loja virtual da banda
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
Figura 58 - foto de divulgação do álbum C_MPL_TE
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
Após o C_mpl_te, os Móveis receberam reconhecimento no cenário musical
brasileiro, sendo a banda vencedora da categoria Experimente no prêmio Multishow de 2010
e tendo sido uma das atrações do Rock in Rio em 2011. Nesse ano ainda foi lançado o EP
Dois Sorrisos, em parceria com o músico Leoni e que foi lançado, novamente, em formato
Slim e também com um vídeo no Youtube.
130
Figura 59 - Premiação Multishow
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
Figura 60 - Música em parceiria com Leoni, ex Kid Abelha. Junho 2011
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
Os Móveis, apesar da inclusão na rede mundial de computadores e de seu formato
independente reconhecido pelo mercado como um dos mais eficientes, seguiu utilizando
estratégias da forma "dominante" (WIlliams, 1979) das majors para se promover e gerar
exposição e receita para a banda. Os membros da banda afirmam que, atualmente, a maior
fonte de receita da banda são as apresentações ao vivo, costumeiramente em casas lotadas
devido ao público fiel conquistado pelo grupo. A banda, que lança as músicas pela Internet,
publica seus próprios vídeos no Youtube e segue, também, com os formatos residuais, como
os CDs, DVDs e com a loja física, agora de uma maneira "residual", focada em um público
que ainda busca uma interação além do virtual. A junção de uma forma "emergente" com o
"residual" (WIlliams, 1979) faz dos Móveis uma das bandas independentes de maior
relevância no cenário brasileiro atualmente.
131
2.4 "Somos protagonistas". Os Móveis pró-artistas independentes, cultura livre na
Internet e a atuação política da banda.
O post do vocalista André Gonzales sobre as manifestações ocorridas no país durante
o mês de Julho de 2013 surge como a possibilidade de uma reflexão sobre uma das
carecterísticas dos Móveis, que é a atuação política e cultural em tópicos que são de interesse
dos membros. Embora esse trabalho não se proponha a debater categorias como ativismo ou
protagonismo juvenil, há uma brecha para a avaliação deste tipo de atuação da banda. Feixa
(1999) considera que à partir do século XX há o surgimento de um jovem mais atuante, ou
como define o autor: “a irrupção da juventude já não como sujeito passivo mas sim como ator
protagonista na cena pública” (Feixa, 1999: 41).
Nesse cenário, os Móveis podem ser avaliados como esse tipo de jovem, que buscar
ser protagonista e atuar sobre as causas que lhe dizem respeito. No caso da banda brasiliense,
pautas como o políticas culturais e apoio à Internet como uma plataforma de qualidade e livre
no país vão diretamente de encontro com os interesses de uma banda que se utilizou de verba
pública para gravar seu primeiro disco e que se promove via Internet. Essa postura da banda
vai de encontro à leitura de Rocha (2012) na qual essa atuação por vezes questiona o poder
público e o enfrenta, e em outros momentos busca aporte nessas mesma instituições.
A entonação das narrativas que estudo fala de ativismo e engajamento, embora, em
muitos casos, isto signifique o questionamento frontal a algumas institucionalidades
políticas e, em outros, desenhe-se como potente convocação à atuação de instâncias
políticas tradicionais, o Estado na linha de frente. (Rocha, 2012:7)
Devido ao seu reconhecimento como banda independente na cena brasiliense e no
cenário nacional, os Móveis adotaram, desde sempre, uma postura ativa em possibilitar a
replicação do modelo que faz com que a banda tenha uma carreira sólida desde 1998 e
participam de ações junto aos eixos da Internet livre e cultura, se aproximando da leitura que
Feixa (1999) faz do jovem como ator protagonista.
O Móveis Convida, que já teve, dentro do evento, espaço para palestras e debates
sobre o mercado de música, desenvolvimento da carreira além de oficinas de produção, abriu
espaço para um novo evento em Janeiro de 2013, o Móveis Ocupa, no qual foram realizadas
oficinas de produção e de Sound Design com membros da banda, além de um show do projeto
solo do flautista Beto Mejia. A atividade teve apoio do Branco do Brasil.
132
Figura 61 - Flyer da atividade Móveis Ocupa
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
Os Móveis promovem, desde o lançamento de seu primeiro disco, em 2005, palestras
e debates para discutir e compartilhar as experiências sobre a cena independente, promoção,
distribuição, produção, e outras dúvidas com fãs e outros músicos, sempre com o apoio de
empresas privadas e públicas, como foi o caso da Fnac, que abriu as portas para o lançamento
do disco e palestras, e da Petrobrás, que apoia o projeto Rotas Musicais da banda. Em cada
cidade visitada pela banda, os Móveis abrem um espaço de uma hora para o debate sobre
mercado musical. A história da banda com os editais públicos e privados vem desde a
gravação do álbum Idem, como já descrita anteriormente.
A banda segue em 2013 com o projeto Rotas Musicais, com o patrocínio da
Petrobrás e do Fundo de Apoio da Secretaria da Cultura do Distrito Federal.
O site da Agência Petrobrás traz a descrição do projeto com os Móveis:
O projeto Rotas Musicais da banda Móveis, selecionado pelo Programa Petrobras
Cultural, visitará 12 capitais brasileiras – sendo que duas delas pela primeira vez.
“Além dos shows, também discutiremos o mercado musical, realizando debates em
cada cidade” – explicam os músicos. De acordo com os integrantes do grupo, o
Rotas Musicais tem o objetivo de ampliar o público e levar a alegria, um de seus
principais valores, a novos lugares. “Partimos do pressuposto que o público é tão
importante quanto o artista”, resumem sobre a ênfase dada à interação na turnê.
133
Figura 62 - Logo do projeto Rotas Musicais 2013
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
Figura 63 - Debate sobre Mercado Musical com a banda em São Paulo14/11/11
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
Figura 64 - Bate papo Fnac Brasília 22/05/2006
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
134
O Móveis Convida de 2012 levou as seletivas para escolha das bandas do Distrito
Federal que iriam tocar no evento para as escolas da região em uma proposta de movimentar e
dar apoio à cena do Distrito Federal e às novas bandas, seguindo o mote do festival
desenvolvido pelos Móveis. As bandas apresentaram-se em diversas escolas do Distrito
Federal.
Bandas do Distrito Federal (DF) interessadas em tocar no Convida nas Escolas e
Movimentando a Cena publiquem no mural da fanpage do Móveis Convida
(http://fb.com/moveisconvida) o material de vocês com nome artístico, site
com o trabalho, contato e cidade. Iremos receber até o meio-dia da sexta-feira, dia
21 de setembro! Aproveitem e convidem a galera para dar uma força na sua
postagem curtindo e/ou comentando.
O que é:
Convida nas Escolas - shows de bandas locais em escolas públicas do Distrito
Federal.
Movimentando a Cena - os artistas se apresentam em palcos de diversas cidades do
DF (Moveis Coloniais de Acaju)
Os Móveis participam da construção das políticas culturais do Distrito Federal e do
país. A banda tem estado presente nos debates das esferas Municipais, como na 3ª
Conferência de Cultura do Distrito Federal. A banda posta no blog a necessidade de políticas
públicas que fomentem o desenvolvimento da cena local, o empreendedorismo e o embate
com a cobrança de direitos autorais promovida pelo ECAD.
#mobilizacultura
Como colocou o Paulo Rená no texto anterior, nesse final de semana passado não
tivemos show, tiramos esses dias para participar da III Conferência de Culura do DF,
estivemos por lá representando o Móveis, CBAC e a Associação Pilotis, ao longo
desses três dias muito se discutiu sobre a Cultura no DF, e a necessidade da
implementação de políticas públicas com ações contínuas que incentivem o o
emprendedorimo, a continuidade, a produção local e tudo isso foi discutido e
debatido entre os agentes culturais do DF e entorno.
O tempo para se discutir todos esses pontos que vão desde a cobrança abusiva do
ECAD com os agentes culturais, a necessidade a criação/revitalização de pontos
culturais em todas as cidades do DF e entorno que envolvam um gestão conjunta da
sociedade com o o Governo, reformulação do FAC, na prestação de contas do que é
produzido com verba pública com um real benefício para a sociedade, entre outros.
O resultado dos três dias foi o começo de toda uma organização e uma
movimentação contínua que tem ainda muita coisa pra ser feita. Esse envolvimento
da sociedade está acontecendo, precisamos agora conseguir respostas, compromisso
e envolvimento mais sério dos nossos governantes, como bem falou o Sec de
Cultura do Df Hamilton . o Estado precisa tarabalhar como indutor dos agentes
culturais e qualificador dos trabalhos.
Da nossa parte cabe cobrar e trabalhar para que isso seja feito. O próximo encontro é
daqui 45 dias, vamos ?
Abs [sic] (Moveis Coloniais de Acaju)
A banda também tem atuado junto com outros artistas contra a atuação do ECAD,
especialmente durante o mandato da ex-Ministra Ana Buarque de Holanda, que causou muita
135
polêmica durante passagem com posições que vão de encontro a de muitos ativistas culturais
e pela Internet livre, que é o caso dos Móveis. A banda também abre espaço em seu blog para
o Advogado Paulo Rená, ativista pela Internet Livre. Os Móveis participaram de um debate
sobre a lei de Creative Commons e dos Direitos Autorais e postaram a convocação, no blog,
junto com o posicionamento da banda
debate sobre direitos autorais, cc, ecad, reforma lda. 16.02 no balaio café
voltamos com um tópico que parecia superado. lembram-se dos debates que fizemos
via twitcam? de toda aquela movimentação durante o período da consulta pública
sobre a reforma da lei do direto autoral? então, parece que o caminho é bem mais
longo do que pensávamos – e certamente muito mais do que gostaríamos.
para quem não está acompanhando, existe uma crise (acho que já podemos chamar
de crise, não?) no minc que gerou uma grande insatisfação em vários setores da
cadeia produtiva da cultura desde a mudança de governo.
a troca no comando da pasta da cultura parecia ser tranquila, sem muita diferença de
princípios, objetivos. mas começou durante o próprio período eleitoral. a cultura não
foi tema central para nenhum candidatoa. vimos crescer vários movimentos em todo
país, como o pcult (partido da cultura). aqui em brasília, grupos de agentes da
cultura (desde produtores, artistas, ao próprio público) realizaram debates,
encontros, manifestos, etc.
tudo que era pra ser simples, na verdade era apenas o começo.
normal, em trocas de gestão, a atual querer tomar as rédeas, dizer quem manda.
assim, apesar do total desconforto que senti, com a retirada da licença creative
commons do site do minc, ainda não tinha perdido todas as esperanças. mas pedir o
documento já enviado ao legislativo com o texto proposto pelo antigo governo sobre
a reforma da lei do direito autoral, aí foi um pouco mais do que conseguia aguentar.
não vou entrar na discussão aqui, pois era pra ser apenas um post chamando a todoas
para o debate, quarta dia 16 de fevereiro, às 19h, no balaio café (201 norte, brasília)
e acabou virando um pequeno desabafo. tenho de guardar a energia pra lá, né? hehe
resumindo é isso: não dá para ficar calado e parado vendo o mínimo de avanço na
cultura indo pro ralo!
#ArtistasPelaReformaLDA
serviço:
Dá Licença ! QUARTA – FEIRA – 16.02.11
PROSA: DIREITOS AUTORAIS – do Creative Commons a modernização da Lei
de Direitos Autorais [sic] (Moveis Coloniais de Acaju).
A Internet livre, o Marco Civil da Internet Brasileira, Softwares Livres e os
posicionamentos políticos da banda são outros temas de posts da banda e os membros da
banda são frequentes em debates e palestras envolvendo esses temas. A banda e seus
membros acreditam no posicionamento político independente de filiação partidária, fazendo
política no cotidiano, como se vê no post do baixista Fábio Pedroza, em que a arte e a política
se cruzam.
em época de eleições, ninguém agüenta mais ouvir falar de mensalão e caixas 2,
sanguessuga e tantos outros casos que assolam o mundo político brasileiro. não
queremos mais saber. não acreditamos mais. vemos notícias como as indicadas ao
lado (meros exemplos de um todo absurdamente grande de corrupção) e, no fim,
temos de aceitar que as coisas fiquem assim. ou não?
não estou fazendo campanha para ninguém, muito menos quero me intitular
politicamente correto ou algo do gênero. apenas perco todas as esperanças de que a
136
política no brasil poderá mudar, afinal, são esses mesmos políticos que serão
reeleitos em outubro.
mas então qual o motivo para esse texto? um desabafo… pode ser? não somos uma
banda com discurso político partidário e/ou panfletário (ainda bem!!! viva o
apartidarismo!), mas creio ser uma preocupação – direta ou não, por bem ou mal -,
por meio da sátira, da ironia, do surrealismo, de como a pessoa se coloca no mundo.
o seu modo de agir, de pensar, de ser neste mundo cotidiano que – espero – nos irrita
tanto.
sobre todo o mundo pop (musical ou não), aponto algumas “campanhas” da mtv
brasileira como, no mínimo, interessantes: aquela do “desligue essa televisão, vá ler
um livro” escrita na tela durante um período da tarde; e uma agora que fala das
eleições, algo do tipo “em quem você vai votar?”, questionando esses candidatos
que são os mesmos de sempre e que nunca mudaram nada!
musicalmente conhecemos os clichês, mas escolho aqui duas bandas que tenho
escutado muito ultimamente. Desórden Publico, da venezuela, e Fela Kuti, da
nigéria.
o primeiro, uma banda já muito citada por aqui (vide último post d’ofuji), faz um
som e um show maravilhosos!! fiquei impressionado com o show deles em janeiro
em são paulo! foi lindo! eles não declaram apoio abertamente, mas se mostram
preocupados com vários temas como política, violência, racismo e intolerância de
maneira geral. indico o disco DP 18, disco duplo ao vivo em comemoração aos 18
anos da banda.
descobri Fela por volta de 98/99 e desde então sempre esteve na minha lista de top
5. falar sobre sua música e todos os aspectos que circulam sua obra é muito pouco!
tem de ouvir! cd indicado, para hoje: Coffin for Head of State, que tem ainda a
música Unknown Soldier, ambas compostas quando policiais invadiram sua casa
(república de kalakuta) e jogaram sua mãe através da janela, matando-a (Moveis
Coloniais de Acaju)
O protagonismo (Feix, 1999) da banda remete também ao reforço da cena como
proposto anteriormente. A Internet é extremamente importante para a promoção e contato
com os fãs como veremos no próximo capítulo e fundamental para um artista independente
como os Móveis. A Internet é mais uma parte de um conceito de "cena" (Jannoti Jr., 2001)
que abraça as práticas online e offline,
A ideia de que as cenas possibilitam a materialização da música nos espaços urbanos
está alicerçado na afirmação de um processo de midiatização que não
pressupõe mais uma separação entre atores sociais e meios. Na verdade
podemos supor que o que caracteriza uma cena musical são as interações
relacionais entre música, dispositivos midiáticos, atores sociais e o tecido
urbano em que a música é consumida. (Janotti Jr.,2011:20)
A importância das políticas públicas vai também de encontro à proposta de uma cena
mais forte e consequentemente com um mercado mais sustentável conforme mencionado
neste capítulo. O fomento através de agências governamentais, instituições públicas ou
privadas acaba por dar suporte ao aparecimento de novas bandas e sustentabilidade da rede de
produtores locais, regionais e nacionais, dando espaço para "diálogos
produtivos entre
mercado, criação, produção cultural, consumo global, apropriações locais e circulação
de afetos" conforme Janotti Jr (2011:.20-21). Assim, os Móveis reforçam a identidade como
137
banda independente e se garantem nessa forma "emergente"(Williams, 1979) de produção em
rede (Castells, 2010), seja nas práticas offline ou online como veremos na sequencia. Vale
reforçar, retomando a leitura de Rocha (2012) que a banda não é apenas uma contestadora das
políticas públicas mas sim um agente atuante, que assume o seu papel protagonista na cena
brasiliense e na cena indepentente, contestando o governo quando necessário e se apoiando
nas instituições públicas se preciso.
138
CAPÍTULO 3
WEBMASTERS, BLOGUEIROS, E PRODUTORES.
A ATUAÇÃO DA BANDA NA INTERNET
3.1 Site, blog e loja dos Móveis
Este capítulo irá tratar das estratégias online do Móveis, com foco nas principais
plataformas usadas pela banda para divulgar seu conteúdo na Internet e entrar em contato com
os fãs/consumidores, além de comercializar outros produtos. Retomando o gráfico proposto
por De Marchi (2011) para rede de negócios dos músicos independentes, a página na Internet
é uma das principais estratégias utilizadas pelos artistas de uma forma"emergente" (Williams,
1979) e, no caso dos Móveis, a página na reúne diversas funcionalidades.
Figura 65 - Site antigo da banda. Imagem de arquivo pessoal
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
139
Figura 66 - Home page atual da banda
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
O site sofreu algumas alterações desde a sua primeira versão lançada em 2003. É
possível visualizar nas duas imagens acima com a primeira e a última versão. As seções
“início”, “banda”, “loja” e “contato” estão presentes desde o lançamento e versão atual tem
duas adicionais, “música” e “agenda”.
A webpage da banda, que atualmente tem 658 visualizações diárias, segundo o site
Alexa 51 , traz um formato de blog com postagens bastante diversificadas que estão
classificadas nas seguintes tags52:
Quadro 6 - classificação das postagens no blog da banda. Elaboração própria.
Seção do blog
Tema dos posts
Amor
Postagens pessoais sobre sentimentos
Colaboradores
Postagens de contratados e convidados
Cupins
Postagens dos fãs da banda ou voltadas aos mesmos
Geral
Crônicas, histórias pessoais, convocações
Imagem
Fotos e ensaios fotográficos
Coninua.
51
52
www.alexa.com – o site faz medição de tráfego em páginas da Internet, entre outras análises.
Termo em inglês para classificação de posts, comum no jargão de mídias sociais. Cada tipo de post recebe
uma tag, que significa etiqueta em inglês.
140
Quadro 6 - classificação das postagens no blog da banda. Elaboração própria (conclusão).
Seção do blog
Tema dos posts
Loja
Ofertas e novos produtos na loja da banda
Mobília em casa
Notícias sobre o documentário da banda
Mobilidade Urbana
Postagens sobre transporte via bicicleta
Móveis Ocupa
Atividades culturais variadas pela cidade de Brasília
Música
Vídeos da banda e indicação de outros artistas
Perguntas Frequentes (FAQ) Dúvidas frequentes sobre a banda
Programação
Atividades culturais variadas
Receitas
Receitas de pratos
Saiu na imprensa
Informes envolvendo a imprensa e a banda
Shows
Informativos sobre os shows
Variedades
Crônicas, histórias pessoais, convocações
Vídeo
Vídeos de shows, ensaios e convites
Fonte: Desenvolvido pelo autor.
Essas divisões ou tags deixam claro que as postagens no site, são extremamente
variadas, e podem ser feitas por qualquer membro da banda, contratado ou colaborador. Os
posts podem ter mais de uma tag, de acordo com a classificação de quem elabora os mesmos.
O fato de a banda utilizar um formato de blog torna o site extremamente pessoal e informal.
Esta conotação cada vez mais pessoal e informal das plataformas de comunicação na Internet
também exprime uma alteração na "estrutura de sentimentos" (Williams, 1979) na qual
expomos cada vez mais nossas vidas cotidianas em blogs ou redes sociais, característica que
será enxergada na produção da banda avaliada daqui em diante.
Os blogs surgiram como um diário pessoal e individual, conforme Amaral, Recuero
e Montardo (2009) reforçam :
Essa expressão individual é tomada como uma qualidade da apropriação: blogs são
pessoais. Eles permitem que as pessoas expressem opiniões, construam textos
individualísticos e proporcionem um “espaço pessoal protegido” [...] blogs são
formas de publicação diferenciadas porque se tornam uma forma de apropriação do
ciberespaço como modo de expressar a identidade de seus autores.
Weblogs estão se tornando de forma cada vez maior, nas identidades on-line de seus
autores. A maioria dos weblogs não são formais, sem face, sites corporativos ou
141
fontes de notícias: eles são autorais por indivíduos (conhecidos como blogueiros), e
percebidos como vozes pessoais não-editadas. Os autores compreendem que os
blogs, mesmo aqueles que não têm como característica a expressão da opinião do
autor, são personalizados. “Até mesmo weblogs que não passam de uma coleção de
links e de comentários curtos dizem algo sobre os seus autores”. (Amaral e
Monntardo; 2009:29)
Dentro dessa perspectiva, ao observar as postagens da banda, podemos fazer algumas
avaliações. Há realmente uma característica de diário, com muitas postagens pessoais dos
diversos membros da banda, fotos do cotidiano dos músicos, seja na banda ou na vida pessoal,
postagens sobre reflexões do mercado musical, receitas de pratos, textos sobre sentimentos ou
momentos da vida dos integrantes e até mesmo textos políticos, características das atividades
offline da banda, como descritas no segundo capítulo deste trabalho, que também estão
presentes nas atividades online. É possível verificar a informalidade da bandae em três
imagens de posts abaixo onde há uma mensagem de fim de ano, uma foto do filho recém
nascido do guitarrista Fernando Rosa e uma das várias receitas postadas pelo saxofonista
Esdras Nogueira.
Figura 67 - Post de Feliz Ano Novo, classificado como amor/geral no site da banda
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
142
Figura 68 - Post classificado como imagem/geral. Foto do recém-nascido filho do guitarrista
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
Figura 69 - Exemplo de post de receitas do saxofonista Esdras
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
Uma das características da banda, já descrita no segundo capítulo deste trabalho e
que também vai de encontro dà forma "emergente"(Williams, 1979) das bandas que trabalham
em redes e estão abertas para colaborações constantes, também está no blog do Móveis. Há
uma seção específica para colaboradores que são convidados pela banda e têm um espaço
143
para escrever sobre assuntos diversos. A postagem do baixista Fábio Pedroza descreve a
intenção de fazer um espaço colaborativo e de criação coletiva, de acorco com a cultura da
Internet (Castells, 2010).
antes de começar o show, o andré noblat, vocalista do trampa me apresentou o
devana: “fabio, deixa eu te apresentar um cara que é demais. escreve textos
incríveis! o primeiro que li, ele escreveu com 14 anos! você tem de conhecê-lo!
estou tentando abrir um espaço no blog do meu pai pra ele escrever”
na hora nem pensei muito bem, mas me veio à cabeça que ele podia ser o primeiro
de uma ideia já plantada em outras reuniões do móveis por alguém: publicar textos
que não fossem do móveis e não falassem do móveis.
se o pessoal do móveis escreve sobre vários assuntos, e temos o cupins publicando
textos de outras pessoas sobre o móveis, por que não colocar também outras pessoas
escrevendo sobre esses mesmos (e outros) vários assuntos?
53
e fiz o convite! [sic]
O protagonismo (Feixa, 1999) político, conforme descrito no segundo capítulo, é
evidente nos posts do colaborador Paulo Rená. Retomando Rocha (2012), uma das
características desse protagonismo é atuar de maneira crítica ao governo por algumas vezes e
em outros momentos apoiar e requisitar ações do poder público. No post abaixo, onde é feita
uma crítica à Ministra da Cultura na época da publicação.
O Ministério da Cultura vai levando a política cultural para o buraco. Quem poderá
nos defender?
Ganhando ares de folhetim semanal, a nova composição do Ministério da Cultura
trouxe mais um capítulo nos últimos dias, recheado de emoções.
Primeiro, a troca no comando da Diretoria de Direitos Intelectuais (DDI), com a
ruidosa substituição de Marcos Souza pela advogada Márcia Regina Barbosa
Marques da Rocha, reforçou a convicção de que a Ministra Ana de Holanda irá
interromper o processo de formulação de uma nova Lei de Direito Autoral (LDA).
O conflito vem da ligação de Márcia Regina com Hildebrando Pontes Neto, expresidente do extinto Conselho Nacional de Direito Autoral e advogado defensor do
ECAD em diversos processos. E se a nova chefe da DDI tem ligação próxima ao
ECAD, a reforma da LDA fica ameaçada por um motivo simples: o DDI foi o
responsável pela promoção dos debates e o Escritório foi um de seus principais
opositores, em particular na fase realizada pela Internet.
Segundo, em entrevista, a Ministra afirmou com todas as letras:
No geral, acho que o projeto merece uma discussão maior, porque só o fato de ter
um percentual muito grande de insatisfação em relação a ele é suficiente para isso.
Ainda nem consegui ler o texto que foi mandado pela Casa Civil, nem acho que seja
o caso, porque não sou eu que vou analisar. Minha responsabilidade é de ministra.
A postura revela que a responsável pela Cultura tem apenas uma noção “geral” do
assunto, não sabe exatamente do que se trata a proposta, não está apta a discutir os
problemas e não considera que seja o caso de se informar melhor. Além disso,
curioso ela mencionar haver “insatisfação” quanto a um texto que nem sequer foi
publicizado, já que o resultado dos debates na Internet somente seria divulgado com
o envio ao Congresso Nacional da proposta de reforma.
Terceiro, confirmando as especulações sobre uma crise, o sociólogo Emir Sader
declarou que não irá assumir a anunciada presidência da Fundação Casa de Rui
Barbosa, por incompatibilidade. Num cenário de diversos elementos, o estopim teria
53
Post do baixista Fábio Pedroza.. Disponível em: <http://moveiscoloniaisdeacaju.com.br/2010/04/nova-secaocolaboradores> Acesso em: 4 fev. 2014.
144
sido a declaração dele de que a Ministra estaria “meio autista” em relação aos cortes
de gastos do governo, sem tomar uma atitude quanto às verbas necessárias para as
políticas da pasta. Assim como o cérebro e a castanha do pará, não é difícil de
comparar o autismo visto por Sader e o convicto desconhecimento da Ministra sobre
a reforma da legislação autoral.
Esse três atos vão conformando o que parece se anunciar como uma tragédia nos
rumos da política federal para a Cultura. Estou convicto de que o único herói que
pode, literalmente, salvar a pátria é a própria sociedade, mobilizada, manifestando
publicamente seu interesse na reforma da LDA; exigindo que a Ministra reassuma
um diálogo que extrapole os atores tradicionais e reconheça a legitimidade dos
diversos grupos envolvidos; e reafirmando o interesse na continuidade do trabalho
54
desenvolvido com sucesso desde a gestão de Gilberto Gil. Fica a dica. [sic]
Da mesma maneira que o protagonismo dos Móveis vai para a atuação online, segue
também para o offline com a atuação no desenvolvimento da cena cultural brasiliense. O post
abaixo mostra um exemplo de uma das atividades da banda, chamada de Móveis Ocupa, com
o foco de movimentar a cena cultural de Brasília, no caso uma ação com o grafiteiro local
Kosino. Esse tipo de atividade tem se espalhado por diversos países desde o movimento
Occupy Wall Street em 2011, motivado em ocupar o espaço público com diversas
reinvidicações, numa leitura que se aproxima da classificação de Harvey (2012) como união
dos corpos no espaço público.
Figura 70 - Gratite do grupo SNC, 16/10/2013
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
54
Post
do
colaborador
Paulo
Rena,
advogado
e
ativista
digital..
Disponível
em:
<http://moveiscoloniaisdeacaju.com.br/2011/03/estudando-a-mobilia-roteiro-de-tragedia> Acesso em: 4 fev.
2014.
145
O grafiteiro Rodrigo Koshino, do grupo de grafite SÓNACORRERIA, estará
realizando alguns trabalhos durante o Móveis Ocupa.
Para quem já viu os grafites do Kosha pela cidade, agora poderá ver o desenho ao
vivo!
Além disso, teremos outras atrações de arte, dança, música e barracas de comidas.
Lembrado que neste Móveis Ocupa, integrantes do Móveis substituirão os
instrumentos pelas pick ups junto com Dj’s e integrantes de outras bandas de
Brasília.
MÓVEIS OCUPA – CULTURA DE LÁ E DAQUI
Local: Pilotis do CCBB Brasília (SCES, Trecho 2, lote 22)
Data: Domingo, dia 20 de outubro
Hora: 15h às 21h
Entrada franca
Classificação Livre [sic]( Moveis Coloniais de Acaju).
A preocupação com a movimentação da cena e indicação de novos artistas, como é o
caso nas práticas offline do festival Móveis Convida, também está na página da banda.
Olha aí, a Mobília e mais 9 artistas indicaram outras referências da música brasileira.
Indicamos o trabalho solo do Bruno Souto, é o que diz a matéria que o blog Azoofa
fez, dá uma olhada!
http://www.azoofa.com.br/blog/entrevistas/5-artistas-indicam-5-novos-sons-pravoce-conhecer-1a-edicao [sic] (Moveis Coloniais de Acaju).
A "estrutura de sentimentos" (Wlliams, 1979) que permeia a "cultura da Internet"
(Castells, 2010) pressupõe a colaboração e as criações coletivas, como já descrito neste
trabalho. A banda abre um espaço no site para atividades dos fãs, e para criação conjunta,
utilizando habilidades e conhecimento dos mesmos. Este contexto pode ser avaliado como um
"excedente cognitivo", conceito de Shirky (2010) que considera o tempo livre dos cidadãos
escolarizados do mundo como um possível tempo para produção. O autor diz em sua análise
que:
Diariamente se acumulam provas de que, se você oferecer às pessoas a oportunidade
de produzir e compartilhar, elas às vezes lhe darão um belo retorno, mesmo que
nunca tenham se comportado antes dessa maneira e mesmo que não sejam tão boas
nisso quanto os profissionais. Isso não quer dizer que deixarão de ver televisão
negligentemente. Significa apenas que o consumo não será mais a única maneira
como usamos a mídia. E qualquer mudança, ainda que mínima, na maneira como
usamos um trilhão de horas livres por ano parece ser muita coisa.
Expandir o nosso foco para incluir produção e compartilhamento nem sempre requer
grandes alterações no comportamento individual para gerar enormes mudanças no
resultado. O excedente cognitivo do mundo é tão grande que pequenas mudanças
podem ter enormes ramificações no total. Imagine que 99% permaneça na mesma,
que as pessoas continuem a consumir 99% da televisão que costumavam consumir,
mas 1% desse tempo seja destinado a produzir e compartilhar. A população
conectada ainda assiste a televisão mais de um trilhão de horas por ano, 1% disso é
mais do que uma centena de participações úteis na Wikipedia por ano. (Shirky,
2010:15)
146
Ao incentivar a participação e fazer uso da produção dos fãs, a banda pode ser
avaliada como representante dessa cultura participativa da Internet, definida por Jenkins:
A participação é vista como uma parte normal da operação de mídia, e os debates
atuais giram em torno das condições dessa participação. Assim como o estudo da
cultura dos fãs nos ajudou a compreender as inovações que ocorrem às margens da
indústria midiática, podemos também interpretar as estruturas das comunidades de
fãs como a indicação de um novo modo de pensar sobre a cidadania e a colaboração
(Jenkins, 2008:314)
Jenkins também reforça que, dada a oportunidade, o fã irá produzir, irá criar diversas
atividades em conjunto com seu objeto preferido, nesse caso o fã, vendo a oportunidade, cria
junto com os Móveis.
Escrever novas histórias, compor músicas, criar vídeos, pintar. É essa dimensão
cultural e social que distingue o modo de recepção dos fãs em relação às outras
pessoas, que dependem do consumo regular e selecionado de mídias. A recepção de
um fã não pode – e não existe – de forma isolada, mas construída pelas idéias de
diferentes fãs. (Jenkins, 2008:208)
Três posts mostram que, uma vez aberto o espaço, os fãs, da banda os quais intitulam
“cupins”, partem para a produção de material diverso e este é amplamente aproveitado e
divulgado pelos Móveis. No primeiro post da seção “cupins”, dedicada aos fãs, um dos fãclubes pede a participação dos demais.
Agora é oficial! O cupinzeiro está sendo inaugurado.
Depois de muito rodar por esse mundo digital, ganhamos um lar. É isso mesmo! A
partir de hoje, aqui no blog dos Móveis, tem um cantinho reservado para todos os
Cupins.
Você que visita sempre o site, adora ler os posts do blog, comenta no mural de
recados, manda tweets para e sobre a banda, participa de discussões na comunidade,
agora também pode contribuir com o blog através de depoimentos, fotos e vídeos.
Você tem uma história legal com os Móveis ou sobre os Móveis? E aquela foto
incrível, que você tirou com algum deles ou do show? Tem um vídeo do show? Já se
filmou cantando ou tocando Móveis, imitando as dancinhas ou inventando outras?
Manda tudo pra gente! Você poderá estar aqui, c_mpl_tando o blog da Mobília, com
toda a sua alegria, entusiasmo, irreverência e bom humor, com o seu jeito.
Envie um e-mail para: [email protected], com seu Nome
Completo e Cidade/Estado, colocando no assunto do email o material que está sendo
enviado.
ex: Se estiver enviando um email com uma foto, coloque no assunto do email
FOTO. E não esqueça de nos dizer no corpo da mensagem o evento, o local e a data
em que a foto foi tirada. O mesmo vale pro vídeo e para os depoimentos. 55[sic]
55
Post feito pelo fã-clube #toca_móveis_aí.. Disponível em: <www.moveiscoloniaisdeacaju.com.br> Acesso
em: 4 fev. 2014.
147
Neste mesmo post do fã clube #toca_móveis_aí é possível verificar o uso do espaço
no da banda como se fosse o próprio blog do fã clube.Essa atividade vai de encontro com a
proposta de Jenkins (2008) de que uma vez que é aberto o espaço, haverá produção do fã.
A equipe do cupinzeiro selecionará as melhores histórias e postará aqui toda semana.
Então capriche no e-mail! Vale lembrar que estamos abertos a sugestões. O blog é de
vocês! Idealizado de fãs para fãs e atualizado por todos os fãs, todos nós que
acreditamos na Revolta do Acaju!
Gostaríamos muito de agradecer aos nossos Móveis queridos, que nos presentearam
com esse espaço, permitindo que sejamos porta-vozes de todos os Cupins. Isso, pra
gente, não tem preço! Vamos nos esforçar muito pra fazer com que o nosso amor
pela banda renda os melhores frutos possíveis. É isso então, “cupinzada”! Mandem
56
muitos e-mails! E para não perder o foco: #toca_moveis_ai, vai! [sic]
Outro post traz um depoimento de um fã sobre a presença de um dos shows da banda.
Eu fiquei num lugar privilegiado, na ponta direita, bem debaixo do Beto (flautista).
Quando eles entram no palco, foi mágico! Me arrepio só de lembrar! Aqueles caras
dando o suor, cantando e dançando com tanto amor! Fiquei maravilhada. Foi minha
primeira vez *-* Filmei todas as músicas e na hora de Copacabana, quando o André
desceu do palco, o Beto pegou minha máquina pra filmar pra mim… véio, chorei de
felicidade em ver como ainda existe humildade e que as pessoas são iguais… Na
hora que o André falou: “Pessoal, sigam-me!!!!”, eles se olharam com cara tipo “ele
tá doido!” hahaha Foi demais! E o pessoal foi indo…seguindo a multidão. Foi
lindo!!! A galera toda cantando, sem música, batendo palmas. Juntando com a
#galeradefora… e o show não tinha fim! Ninguém queria ir embora! Foi o único
57
show da minha virada, e valeu a pena.” (Flor Britto) 10/06/10 [sic]
Os fãs se organizaram também para montar um videoclipe coletivo, iniciativa de um
fã de São Paulo e que se efetivou com colaboradores de diversas partes do país.
Clipe coletivo organizado pelos fãs do Móveis!!! O PRAZO FOI PRORROGADO
ATÉ O DIA 19 DE SETEMBRO. PARTICIPE!
Os fãs do Móveis estão se mobilizando para a realização de um Clipe Coletivo.
Cupins de todo o Brasil e do mundo (já tem gente de Buenos Aires também *.*)
estão marcando dia e horário para deixar registrada mais uma homenagem pra nossa
banda querida.
A ideia do clipe foi da Radhika Ananda, que nos enviou texto, fotos e vídeos dos
locais que já gravaram a sua parte do clipe. E aí, vai ficar fora dessa?? Mobilize-se.
Convide os amigos que gostam de Móveis ou junte-se a pessoas com o mesmo gosto
pela Internet mesmo e participe desse clipe que ficará para a história. Por que não? ;)
Eis o texto que a cupim idealizadora enviou com todas as informações sobre o clipe:
Mas, afinal, o que é Clipe Coletivo?
É uma mobilização dos fãs da Banda Móveis que propõe a gravação de um clipe
protagonizado por fãs de todo o Brasil e mundo, aos moldes da campanha da
Starbucks “All you Need is love” e do Playng for change. A idéia é promover
encontros entre os fãs e estreitar ainda mais a relação entre o fã, a música, e a banda.
Vale lembrar que não é a primeira vez que os fãs do Móveis se mobilizam no
Youtube. Um exemplo bacana foi a mobilização espontânea do “Eu acredito”.[...]
56
57
Ibid.
Ibid.
148
[...] A interpretação é livre. Mas uma boa forma de começar o trabalho é acessando a
comunidade do clipe coletivo no orkut e procurando pessoas da sua cidade que
gostem da banda e estejam dispostas a ajudar. A idéia em primeiro lugar é unir estes
fãs e promover estes encontros…
Junte os amigos, fique de olho no fórum, Twitter e blog… Atente-se dicas de quem
58
já fez.
Outro exemplo de criação coletiva junto aos fãs é o clipe da música “Vejo em seu
olhar”. Um convite com uma série de etapas, foi disponibilizado no site no mês de maio de
2012 para os fãs. Eles deveriam produzir fotos e enviar para a banda, e assim esta imagens
fariam parte do videoclipe. Foi criado um portal exclusivo para que os fãs pudessem
acompanhar todas as etapas propostas e as fotos postadas. Além do portal, as etapas e
convocações diárias aos fãs são postadas nas redes sociais Twitter e Facebook. As imagens
abaixo são exemplos da criação junto aos fãs com o portal da atividade mostrando as diversas
fotos tiradas pelos fãs e duas etapas que deveriam ser feitas pelos fãs.
Figura 71 - Portal do clip colaborativo com os fãs
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
58
Post de convocação para organização do videoclipe coletivo dos fãs.
<http://moveiscoloniaisdeacaju.com.br/2010/09/cl_pe-c_letivo>. Acesso em: 4 fev. 2014.
Disponível
em:
149
Figura 72 - Comunicação de uma das etapas para os fãs
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
Figura 73 - Comunicação de uma das etapas para os fãs
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
São comuns também os pedidos aos fãs para participação em votações online para
que a banda ganhe alguma premiação ou tenha a música em alguma lista das mais tocadas,
como é o caso do Top 10 da MTV Brasil. A banda também faz promoções e sorteios junto aos
fãs e, em 07/06/11, o Móveis fez uma atividade convocando-os para gravar uma declaração
para seus namorados ou namoradas e enviar para a banda. Os escolhidos como melhores iriam
receber uma serenata da banda, numa apresentação ao vivo via Skype, e participar do clipe da
música Dois Sorrisos. A atividade era patrocinada por uma empresa de alimentos brasileira
que vinculou uma das suas marcas, a Sadia Hot Pocket, à atividade. O vídeo com as reações
150
dos fãs se tornou oficial da Música Dois Sorrisos e é atualmente o maior número de
visualizações da banda no Youtube.
Figura 74 - Portal do concurso com os fãs junto com a Sadia Hot Pocket
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
Figura 75 - Vídeo da música com as serenatas para os premiados no Youtube
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
Ações da banda envolvendo os fãs e criações colaborativas são frequentes, como
uma atividade na Campus Party, um dos grandes eventos de Cultura Digital do país onde o
público participante coletou sons via celular para uma faixa do novo disco. Além disso o
Festival Móveis Convida de 2011, contou com o financiamento realizado através de uma ação
via Internet, onde cada indivíduo pode contribuir com uma cota e ganhar uma recompensa
para tal, atividade já conhecida como Crowdfunding.
151
Figura 76 - Atividade de Crowdfunding para o festival Móveis Convida 10/05/2011
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
Este tipo de atuação da banda, voltada a construir uma “parceria com os fãs”, estreita
a ligação emocional com os mesmos, assim como o compartilhamento de situações do
cotidiano, que é uma atividade comum por grande parte dos usuários dos sites de redes sociais.
O Móveis compartilha o cotidiano dos seus membros e embora seus músicos
possuam perfis individuais, todos postam nos canais oficiais da banda, conforme relatado em
entrevista no dia 14/12/2011. Assim, são comuns postagens com momentos dos ensaios, fotos
de crianças, refeições, fotos de infância, backstages de shows e clipes, além de momentos
íntimos de seus integrantes.
Essas "interações" (Jenkins, 2008) são respondidas ou compartilhadas pelos fãs com
seus contatos nas redes sociais, além de receber comentários, opiniões, sugestões, abrir
conversações, gerando assim um sentimento de proximidade, que pode ser considerado um
laço forte, ou fraco, conforme descrito por Castells (2010). Essa comunicação mediada pelo
computador entrega as trocas simbólicas como, suporte e aconchego, por intermédio de uma
interação sustentada.
Os laços e o senso de pertencimento à comunidade, além do contato constante da
banda com os fãs, geram uma relação com os objetos como descrita por Jenkins (2008),
chamada de "Economia Emocional". Neste universo onde o envolvimento com a marca é
fundamental para a tomada de decisão e escolha para um consumidor, as bandas que utilizam
estas estratégias podem ter a preferência desse usuário.
Amaral (2011), em avaliação sobre as redes sociais, afirma que os fãs se sentem
importantes quando recebem um contato dos seus artistas preferidos. Essa característica é
utilizada pela banda e será descrita posteriormente na análise da produção no Youtube,
152
Facebook e Twitter. Nesses casos, não apenas a banda entra em contato diretamente com o fã,
mas também cria coletivamente com esse consumidor/produtor, como exposto por Jenkins
(2008) e Anderson (2006). A banda colabora e interage com as comunidades virtuais de fãs.
Recuero define as comunidades virtuais como:
[...] os elementos formadores da comunidade virtual seriam: as discussões públicas;
as pessoas que se encontram e reencontram, ou que ainda mantêm contato através da
Internet (para levar adiante a discussão); o tempo; e o sentimento. Esses elementos,
combinados através do ciberespaço, poderiam ser formadores de redes de relações
sociais, constituindo-se em comunidades.(Recuero, 2009:137)
Para Rheingold,
As comunidades virtuais são agregados sociais que surgem da Rede [Internet],
quando uma quantidade suficiente de gente leva adiante essas discussões públicas
durante um tempo suficiente, com suficientes sentimentos humanos, para formar
redes de relações pessoais no ciberespaço. (Rheingold, 1995:20)
André Lemos dá outra definição de comunidade virtual: “As comunidades virtuais
eletrônicas são agregações em torno de interesses comuns, independentes de fronteiras ou
demarcações territoriais fixas” (2002:93).
Recuero (2010) reforça o interesse comum e o fim da localidade espacial, o que vai
de encontro a proposta já apresentada nesse trabalho de não oposição entre online e offline.
Deste modo, a comunidade virtual é um conjunto de atores e suas relações que,
através da interação social em um determinado espaço constitui laços e capital social
em uma estrutura de cluster, através do tempo, associado a um tipo de
pertencimento.
Assim, tais comunidades são formadas pela associação de atores através da interação
social reativa (associar-se ao grupo e ser aceito pelo mesmo), que não pressupõe
interação direta entre os atores, ou mesmo interação social no sentido de
conversação. No entanto, tais vínculos podem surgir entre os atores a partir da
interação na comunidade. A comunidade preexiste à interação social mútua, sendo
esta uma decorrência daquela. Sua estrutura vem, portanto, da conexão através de
outro tipo de interação. Essa conexão, uma vez forjada, somente será extinta se os
interagentes assim desejarem. Ela gera um vínculo formal que não necessita, assim,
de interações para ser mantido e, deste modo, tem um baixo custo para os atores.
(Recuero, 2009:158)
A possibilidade da interação, da participação e de um espaço aberto em si já dá a
ideia de uma comunidade, que é a proposta dos Móveis em sua produção na Internet. Recuero
(2009) lembra que, independentemente de uma participação ativa, os laços emocionais podem
acontecer nas comunidades.
[...] o laço social não depende apenas de interação. Laços relacionais, deste modo,
são aqueles constituídos através de relações sociais, apenas podem acontecer através
da interação entre os vários atores de uma rede social. Laços de associação, por
153
outro lado, independem dessa ação, sendo necessário, unicamente, um
pertencimento a um determinado local, instituição ou grupo. (Recuero, 2009:39)
A produção em nichos pode gerar um maior contato e consequentemente uma maior
associação nos laços emocionais na avaliação de Anderson, o que pode se aplicar à avaliação
da produção da banda na Intenet:
Em vez de nos relacionarmos por laços frouxos com multidões, graças às
sobreposições da cultura de massa, temos a capacidade de nos interligarmos,
mediante laços mais fortes com igual quantidade de pessoas, se não com mais, em
consequência da afinidade comum pela cultura de nicho (2006:189)
A banda se utiliza da interatividade, das mais variadas formas possíveis propostas
pelas redes sociais e assim abre possibilidades de participação junto aos fãs. Segundo Jenkins:
A interatividade refere-se ao modo como as novas tecnologias foram planejadas
para responder ao feedback do consumidor. Pode-se imaginar diferentes graus de
interatividade, possibilitados por diferentes tecnologias de comunicação, desde a
televisão, que nos permite mudar de canal, até videogames, que podem permitir aos
usuários interferir no universo representado. Tais relações, naturalmente, não são
fixas: a introdução o TiVo pode transformar, de maneira fundamental, nossas
interações com a televisão.As restrições da interatividade são tecnológicas.Em quase
todos os casos, o que sepode fazer num ambiente interativo é determinado
previamente pelo designer.
A participação, por outro lado, é moldada pelos protocolos culturais e sociais.Assim,
por exemplo, o quanto se pode conversar num cinema é determinado mais pela
tolerância das plateias de diferentes subculturas ou contextos nacionais do que por
alguma propriedade inerente ao cinema em si.
Inicialmente, o computador ofereceu amplas oportunidades de interação com o
conteúdo das mídias e, enquanto operou nesse nível, foi relativamente fácil para as
empresas de mídia controlar o que ocorria. Cada vez mais, entretanto, a web tem se
tornado um local de participação do consumidor, que inclui muitas maneiras não
autorizadas e não previstas de relação com o conteúdo de mídia. Embora a nova
cultura participativa tenha raízes em práticas, que, no século 20, ocorriam logo
abaixo do radar da indústria das mídias, a web empurrou essa camada oculta de
atividade cultural para o primeiro plano, obrigando as indústrias a enfrentar as
implicações em seus interesses comerciais. Permitir aos consumidores interagir com
as mídias sob circunstâncias controladas é uma coisa; permitir que participem na
produção distribuição e bens culturais - seguindo as próprias regras - é totalmente
outra. (2008:359)
Nessa perspectiva, é muito clara a característica do modelo no qual opera a banda,
usando da "interatividade" (Jenkins, 2008) aberta pelas redes sociais e abrindo espaço para a
participação, diferente de empresas como a Rede Globo e outras grandes corporações, além
dos artistas que seguem no modelo das grandes gravadoras no qual a interatividade pode
existir nas redes sociais mas não há participação dos fãs na criação.
A Rede Globo por sua vez recentemente vem reduzindo a sua participação nas redes
sociais (Meio e Mensagem). Em estudo feito junto ao Obitel Brasil, Borelli (2011) explicita o
fato de não haver interatividade nas plataformas da Rede Globo como blogs e como Facebook
154
e Twitter. Esse tipo de trabalho, numa construção junto ao fã pode gerar como propõem Hardt
e Negri (2001) "trabalho afetivo" pelo contato e interação humanos.
Essa produção, troca e comunicação afetivas estão geralmente associadas ao contato
humano, mas tal contato pode ser real ou virtual, como ocorre na indústria do
entretenimento [...]
O que o trabalho afetivo produz são redes, formas comunitárias, biopoder, .Aqui
pode-se reconhecer mais uma vez que a ação instrumental da produção econômica
foi unida à ação comunicativa das relações humanas; neste caso, entretanto, a
comunicação não ficou empobrecida, mas a produção foi enriquecida até o nível de
complexidade da interação humana. (Hardt e Negri, 2001:314)
As atividades de criação coletiva da banda abrem uma possibilidade rumo à criação
de um produto comum, co-produzido entre fã e artista, uma relação diferente do modelo de
um para muitos já citado anteriormente, e rumo a um modelo descrito por Hardt e Negri (2001)
O fato é que hoje participamos de um mundo produtivo feito de redes comunicativas
e sociais, de serviços interativos e de língua comum. Nossa realidade econômica e
social é definida menos pelos objetos materiais feitos e consumidos do que pelos
serviços e relações co-produzidos. Cada vez mais, produzir significa construir
comunalidades de cooperação e comunicação (2001:323)
O site traz mais quatro grandes seções, que são nomeadas de “Banda”, onde há uma
descrição sobre a banda e seus mais recentes trabalhos, além de uma outra seção chamada
“Contato”, onde há um formulário para enviar uma comunicação direta para a banda, e a
“Agenda” de shows ao vivo. Outra seção do site é nomeada “Música”, onde está compilada
toda a discografia da banda, que pode ser ouvida no site via streaming e, no caso dos álbuns
completos da banda, pode ser feito o download dos discos completos também no próprio site,
o que deixa claro a forma "emergente" (Williams, 1979) do mercado musical, onde não se
busca faturar com a venda de fonogramas como principal negócio. Ainda que na seção
denominada “Visite nossa loja”, onde o site direciona o usuário para a loja virtual da banda,
se vendam os discos dos Móveis Coloniais em formato CD, um "residual" da forma
"dominante" (Williams, 1979) do mercado de música, pois alguns fãs ainda gostam de ter o
disco físico, com encarte e artes. É possível visualizar nas imagens abaixo o formato utilizado
pela banda no site onde todos os discos estão à disposição do usuário e é possível ouvir todas
as faixas no próprio site via streaming.
É possivel aqui enxergar mais uma alteração na produção das "materialidadades"
(Williams, 1979) na qual a banda traz parte da distribuição, antes feita por terceiros como a
Trama, para disponibilizar no seu site um serviço próprio de downloads e streaming.
155
Figura 77 - Seção “Música” do site, com toda a discografia da banda
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
Figura 78 - Disco da banda disponível para streaming e download
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
A loja virtual da banda traz, além dos discos e EPs para venda em formato de CDs,
uma diversa gama de produtos, como itens de vestuário do tipo camisetas e vestidos, passando
por bottons, sacolas, porta-copos, entre outros o que é possível verificar na imagem abaixo. A
loja é administrada por uma empresa terceirizada, mais uma característica descrita por
Castells (2010) das empresas em rede e do empreendedorismo da "cultura da Internet".
156
Figura 79 - Site da loja virtual da banda
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
A produção da banda em seu site deixa claro o modo com que o Móveis opera, assim
como outras bandas neste modelo de produção, que se alinha em paralelo às grandes
gravadoras. A “estrutura de sentimentos” (Williams, 1979) de toda uma geração que se
desenvolve com a Internet como possibilidade de mediação é evidente no site da banda e nas
atividades que a mesma propõe, seja em rede com outras bandas e artistas, seja na maneira
colaborativa e cada vez mais próxima aos fãs. Não há um descolamento das ações online ou
offline, há uma maneira de atuar num mercado que abre alternativas para uma atuação fora do
modelo das majors. Essa atuação acontece de maneira mais coletiva, em rede, com grande
suporte das ferramentas da Internet, entre elas as redes sociais, como temos visto atualmente
nos Rolezinhos, movimentos Ocupa ou nos protestos de 2013.
3.2 A atuação da banda nas redes sociais: um estudo das plataformas Youtube, Facebook
e Twitter
Para comparar a produção da banda nas redes sociais, de maneira quantitativa, no
mesmo período foi avaliada a produção do site da banda, para comparar os tipos de postagem,
se há grandes discrepâncias em relação às plataformas das redes sociais da Internet e quais são
elas, pois a banda atua com o site desde o ano de 2002 e todas as plataformas de redes são
posteriores a essa data. Como já explicado na na introdução deste trabalho, o período
escolhido para a coleta foi definido pelo Twitter, que é a plataforma com o maior número de
postagens por mês e no período todo da amostra, sendo assim, todas as redes sociais e o site
tiveram a coleta da sua produção de outubro de 2010 até maio de 2012. Após a coleta, as
157
postagens da banda no site (www.moveiscoloniaisdeacaju.com.br), no canal oficial do
Youtube (http://www.Youtube.com/user/moveiscoloniais), Facebook (https://www.Facebook.
com/moveiscoloniais) e Twitter (https://Twitter.com/moveis) foram classificadas nas
seguintes divisões:
Música/Vídeo: postagens de textos, arquivos, fotos ou vídeos sobre músicas da
banda.
Show: Informações sobre shows ao vivo e agenda de shows.
Interações com o fã (Int. Fã): Interações com os fãs. Respostas, comunicações,
produções dos fãs em fotos, vídeos ou texto.
Pessoal/Cotidiano: postagens de textos, fotos ou vídeos do dia a dia da banda,
backstage, shows, mensagens de outras bandas/artistas, política, suporte às atividades
culturais.
Cultura da Internet: atividades ligadas aos conceitos de Castells, Jenkins e Lévy.
Participação dos fãs, criação coletiva, empreendedorismo, cultura hacker, inteligência coletiva.
No período avaliado, a banda fez 194 postagens no site/blog, com uma média de 9,7
posts por mês. O blog não é a plataforma para respostas diretas aos fãs, portanto o número de
interações é pequeno em comparação ao total postado, no entanto, os 10 posts são compostos
por atividades de produção de fãs, como por exemplo a seção Cupins, já descrita
anteriormente e conforme o exemplo abaixo, um post de fan art 59 colocado na página da
banda e que traz o endereço do responsável, um ilustrador e fã. O maior número de postagens
está classificada como cotidiano, o que dá a perspectiva de um blog realmente
informal/pessoal, como já exposto no subcapítulo anterior. Essa avaliação é exposta no
gráfico abaixo que deixa claro o caráter informal das postagens.
Figura 80: Postagem de Fan art
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
59
Qualquer tipo de arte produzida por fã.
158
Figura 81 - Gráfico do % de postagens da banda no site
Fonte: Elaborado pelo autor.
O Youtube é o canal oficial de postagens de vídeo da banda.mesmo havendo o
costume de posts de faixas que são apenas de áudio na plataforma. No período analisado os
Móveis produziram em maioria postagens de vídeos, tendo apenas três comunicações via
texto para fãs. Durante o período, a banda fez 113 posts, média de 5,7 por mês, totalizando
2.084.884 visualizações dos vídeos na plataforma.
Apenas uma produção de fã foi adicionada no período, porém, ao avaliar o número
de visualizações na plataforma, o videoclipe da música “Adeus”, feito por Maya Aquino para
o seu trabalho de conclusão de curso na Universidade, é o sétimo mais visualizado, à frente de
um dos projetos colaborativos da banda, o videoclipe da música “Cão Guia”.
As postagens classificadas como Cultura da Internet contam com mais um projeto
colaborativo, o clipe da música “Vejo em Teu Olhar”, que é o quarto mais visualizado no
período. Os dois vídeos mais visualizados no período são os videoclipes oficiais da banda, a
parceria com Leoni na música “Dois Sorrisos” e a música “O Tempo”, respectivamente. O
maior percentual das postagens do período analisado é de posts Pessoais/Cotidiano, como o
exemplo abaixo, onde o saxofonista Paulo imita um meme60 em um momento de descontração
entre os ensaios da banda. Os videos estão exemplificados em imagens abaixo.
60
Recuero (2009) define os memes como: “a fidelidade é a capacidade de gerar cópias com maior semelhança
ao meme original. Ressalte-se que a propagação dos memes é cíclica e nem sempre implica a reprodução fiel
da ideia original. Ao contrário, as mudanças e transformações são frequentes e comparadas, em sua
abordagem, às mutações genéticas: essenciais para a sobrevivência do meme. Assim, as diferenças através
das quais as pessoas repetem as ideias são, por definição, parte do meme”.
159
Quadro 7 - ranking dos vídeos mais vistos entre Out/10 e Maio/12
Ranking
Título
1 "Dois Sorrisos" - Móveis Coloniais de Acaju & Leoni [clipe oficial]
2 Móveis Coloniais de Acaju, part. Kollors Kingz | Clipe O Tempo versão HD
3 A Menina Dança | Adoro Couve | Móveis Coloniais de Acaju
4 Vejo em teu olhar | #instamoveis | Móveis Coloniais de Acaju
5 Vejo em teu olhar | amor.beleza.verdade | Móveis Coloniais de Acaju
6 Móveis Coloniais de Acaju | DVD ao vivo no Auditório Ibirapuera
7 Adeus | Videoclipe | Móveis Coloniais de Acaju
8 Xirley ao vivo em Belém | Gaby Amarantos e Móveis Coloniais de Acaju #rotasmusicais
9 #moveiscpbr Clipe do @moveis na Campus Party. Assistam! ctrl+alt+moveis
10 Enter Sandman | Adoro Couve | Móveis Coloniais de Acaju
11 Cão Guia - Móveis Coloniais de Acaju
12 Making of do Clipe O Tempo | #TemporealMoveisMTV
13 Móveis Coloniais de Acaju Ao Vivo No Auditório Ibirapuera | Teaser DVD #2
14 Móveis Coloniais de Acaju Ao Vivo No Auditório Ibirapuera | Teaser DVD #1
15 Vejo em teu olhar | teaser amor.beleza.verdade
16 Participe do novo clipe do @Moveis usando o instagram! #instaMoveis
17 Pra Manter ou Mudar Móveis Coloniais de Acaju
18 Móveis Coloniais de Acaju Ao Vivo No Auditório Ibirapuera | Making of
19 Festival Móveis Convida | Projeto de Financiamento Coletivo | www.embolacha.com.br
20 Festival Móveis Convida: Ajuda nóis aê!
Fonte: Elaborado pelo autor.
Figura 82 - Clipe da música “Dois Sorrisos”.
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
Views
765.398
576.371
153.482
138.696
116.375
80.312
43.242
39.645
27.677
25.398
14.120
11.073
4.606
4.469
3.968
3.658
3.471
3.289
3.274
2.695
160
Figura 83 - Clipe da música “Tempo”
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
Figura 84 - Paulo imitando um meme em vídeo no Youtube
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
161
Figura 85 - Clipe da música “Adeus”
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
Figura 86 - Clipe da música “Adeus”
Fonte: Moveis Coloniais de Acaju.
162
Gráfico 13 - Gráfico do % de postagens da banda no Youtube
Fonte: Elaborado pelo autor.
O Facebook traz uma menor discrepância no percentual das postagens,
principalmente pela maior presença dos informes de shows e do número de pedidos para
participação em atividades coletivas, como o clipe de “Vejo em seu Olhar”, ou em votações
para listas de mais pedidos, como é o caso do Top 10 MTV. Há duas explicações para isso,
uma é o fato de que o Facebook é a mais popular das redes sociais no Brasil, levando assim a
banda a usar este canal para mais pedidos diretos à comunidade de fãs. A razão para que o
número de postagens de informes sobre os shows seja maior nessa plataforma é o fato de que
o Facebook possui uma função de agenda, onde os convites feitos pelos usuários são
colocados automaticamente no calendário e os usuários são posteriormente informados da
data dos eventos e de alterações diretamente no seu feed de notícias. Esse tipo de
característica tornou o Facebook um popular auxílio para os eventos pessoais dos usuários da
plataforma.
163
Figura 87 - Agenda de eventos da banda no Facebook
Fonte: Facebook. Moveis Coloniais de Acaju.
Figura 88 - Post da banda utilizando a agenda de eventos do Facebook
Fonte: Facebook. Moveis Coloniais de Acaju.
164
Gráfico 14 - Gráfico do % de postagens da banda no Facebook
Fonte: Elaborado pelo autor.
No período avaliado, a banda fez 364 postagens no Facebook, uma média de 18,2 por
mês, quase duas vezes mais posts que o blog. As postagens da rede social refletem em grande
parte os posts do blog, porém, devido ao maior volume postado no Facebook, vários posts são
exclusivos das redes como o Facebook e do Twitter, especialmente os da categoria
Pessoal/Cotidiano, característica das redes sociais como demonstrado abaixo em piada
postadas pela banda. Ainda há uma baixa interação junto aos fãs e a maioria dos posts
refletiam os feitos no site ou no Youtube, como é o caso do vídeo feito pela fã Maya Aquino,
que é postado também nesta plataforma.
Figura 89 - Clip da música “Adeus” feito pela fã Maya Quirino
Fonte: Facebook. Moveis Coloniais de Acaju.
165
Figura 90 - Compartilhamento de post de fã com piada sobre o vocalista e resposta ao fã no mesmo post
Fonte: Facebook. Moveis Coloniais de Acaju.
Figura 91 - Piada com Coaracy e Borém
Fonte: Facebook. Moveis Coloniais de Acaju.
O Twitter tem como grande diferença das demais plataformas, além do maior volume
de posts, um foco muito maior na interação com o fã. São muito comuns respostas diretas
(mentions) e retweets, onde a banda repassa o post de um fã para a toda a base de seguidores.
No período avaliado, a banda teve 588 interações com os fãs, totalizando 19% dos posts da
166
banda, mais do que o triplo das outras plataformas nesse quesito, o que reforça a possibilidade
de interatividade dessa ferramenta.
Gráfico 15 - Gráfico do % de postagens da banda no Twitter
Fonte: Elaborado pelo autor.
São comuns os retweets de mensagens dos fãs, respostas simples como às dúvidas de
horários de shows, compras na loja virtual e inclusive transmissões ao vivo utilizando a
ferramenta de streaming da plataforma, a Twitcam, onde é possível abrir um chat61 pelo qual
a banda e os usuários podem conversar em tempo real. Da mesma maneira que nas outras
plataformas, os posts Pessoais/ Cotidiano são em maior número.
61
Sala de bate-papo virtual.
167
Figura 92 - Twitcam do lançamento do clip “Livraria Cultura”
Fonte: Twitter. Moveis Coloniais de Acaju.
Figura 93 - RT fã-clube
Fonte: Twitter. Moveis Coloniais de Acaju.
Figura 94 - Respostas a fã sobre dúvidas de produtos vendidos na loja virtual e loja nos shows
Fonte: Twitter. Moveis Coloniais de Acaju.
168
Figura 95 - Café com o diretor do clipe no Twitter
Fonte: Twitter. Moveis Coloniais de Acaju.
Figura 96 - Foto de filho de integrante durante o ensaio no Twitter
Fonte: Twitter. Moveis Coloniais de Acaju.
Avaliando as quatro plataformas onde há possibilidade de "interação" (Jenkins, 2008)
com a banda (Blog, Youtube, Facebook e Twitter) o grande destaque é o Twitter que
apresenta um grau de interação com o usuário bem maior que nas outras redes sociais. Esse
resultado não é exclusivo dos Móveis e muitos outros artistas preferem a interação com os fãs
através do Twitter embora o Facebook seja não só a rede social mais popular do mundo como
também do Brasil.
A plataforma do Twitter porém costuma ser muito mais rápida que o Facebook,
possibilitando um contato mais ágil e fácil de ser feito inclusive em celulares. Há que se
169
relembrar aqui o fato de que o Facebook atualmente não libera os posts para toda a base de
usuários, automaticamente limitando a interação. Essa característica não aparece no Twitter
onde todos os posts alcançam todos os seguidores de um determinado usuário.
As repetições das postagens em múltiplas plataformas dá a possibilidade de que o fã
entre em contato com o conteúdo da banda e possa compartilhar nas suas próprias timelines62,
distribuindo os posts e assim viralizando ou se tornando "spreadable media"63 (Jenkins, 2008),
viajando entre diferentes plataformas midiáticas e atingindo outros possíveis consumidores
nas rede sociais. As plataformas apresentadas, assim como outras que não param de surgir,
têm diferentes características que são aproveitadas pela banda para alcançar seus
consumidores de uma maneira diferente das bandas tradicionais. O modelo apresenta brechas
para uma maior sustentabilidade do artista independente, porém ainda estamos longe de um
mercado equilibrado entre as possibilidades das majors e de qualquer banda independente,
como veremos nas considerações finais deste trabalho.
Os Móveis que se denominam "digitais" como visto no segundo capítulo deste
trabalho, se aproveitam de diversos conceitos da Internet para chegar até o usuário final. A
banda disponibiliza em seu site e redes sociais espaços e atividades de criação coletiva junto
aos fãs o que pode gerar na leitura de vários autores como Anderson (2006) um fã mais
próximo da banda se levarmos em contraponto o modelo das majors, que produz de um para
muitos e também se comunica de um para muitos.
Essa possibilidade de "interação" e "interatividade" (Jenkins, 2008) entre banda e fã,
e que é explorada pelos Móveis principalmente nas redes sociais reforça a possibilidade de
laços emocionais (Recuero, 2009), e é uma das estratégias da banda para manter uma base de
fãs constante. Levando em consideração uma das propostas dessa avaliação, que é a de não
online e offline, esse usuário que participa com a banda nas redes sociais, e colabora nas
atividades da banda é um provável consumidor de shows, hoje a maior fonte de receita não
apenas dos Móveis como de diversos artistas.
62
63
Quadro de postagens de cada usuário no Facebook e no Twiter.
Mídia espalhável.
170
Figura 97 - Rede de negócios dos Móveis
Fonte: Elaborado pelo autor.
É assim, num modelo descrito no gráfico acima, que não se preocupa em opor pólos
que podem parecer distintos como a vida na Internet e no mundo offline, digital do analógico,
mídias digitais ou tradicionais, forma "emergente" ou "residual" (Williams, 1979) que a banda
constrói a sua carreira desde 1998 na visão desta análise e é um dos fatores de sucesso para
essa banda e uma estratégia que pode e vem sendo usada por outros artistas como veremos na
próxima seção que conclui este trabalho.
171
CONSIDERAÇÕES FINAIS
O problema de investigação proposto nesta dissertação estva assim formulado: 1)
baseado no pressuposto de que produção, distribuição, comercialização, apropriação e usos da
cultura em contextos digitais passam por profundas transformações; 2) considerando que a
banda Móveis Coloniais de Acaju produz música nesse contexto, algumas perguntas foram
formuladas em busca de respostas que constituem o percurso desse trabalho. Como se
relacionam nesse contexto de transição e conflito as grandes gravadoras e produções
independentes? São excludentes entre si? É possível encontrar, em diferentes formas
culturais/produções musicais, elementos que permanecem como "dominantes"? Outros que
persistem como "resíduos" das formas tradicionais? Ou ainda, "formas emergentes" que
propõem alterações nestes processos de produção, distribuição, comercialização, apropriação
e usos da cultura? Que estratégias são adotadas pela banda para garantir legitimidade e
sustentabilidade, via redes sociais, sem recorrer aos mecanismos constitutivos do mainstream?
Ou seja, como manter a condição de "independentes"?
Ao final dessa análise é possível verificar que a banda alcança uma carreira
sustentável e com legitimidade se utilizando de uma mescla de estratégias do modelo das
majors e de um "emergente" apoioado nas culturas digitais e na articulação em rede. O
objetivo dessa dissertação era avaliar essas estratégias utilizando os Móveis como exemplo do
"emergente" e avaliando suas principais características.
Não há na avalliação desse trabalho não uma exclusão entre a "forma dominante" das
gravadoras e "forma emergente" (Williams, 1979) dos artistas independentes. A reposta para a
pergunta de pesquisa está descrita na mescla de estratégias usadas pela banda, que já é feita
também por outros artistas citados nesse trabalho. Ainda há uma "forma dominante" que são
as grandes gravadoras e suas estratégias de produção, porém ao redor desse "dominante" se
constitui toda uma rede de produtores que atuam nas brechas abertas pelas majors, em nichos
de mercado, em aráter de não exclusão.
Essa "forma emergente""que opera nas bordas das majors busca uma maior
independência, uma maior autonomia em relação ao processo de
produção de
"materialidades" dessas grandes empresas mas ainda assim, sem deixar de utilizar elementos
que são "resíduos" dessa "forma dominante. Figuras como o produtor musical e mesmo a
venda de fonogramas como os LPs permanecem sendo utilizados pelo artistas independentes,
Há espaço para uma banda independente estabelecer uma carreira sustentável no
mercado de música atual? A resposta é sim. Há mais espaço ou pelo menos mais
172
oportunidades do que na década de 80, especialmente no mercado brasileiro? Olhando para a
análise desse trabalho, é possível dizer que sim. Ao avaliar a trajetória do Móveis ficam claras
as possibilidades oferecidas por um modelo "emergente" que abraça o espírito da
independência, do indie ou de um mercado alternativo que vem desde a década de 60. Bndas
independendes como o Móveis atual numa estratégia de de nichos, ou de uma crescente
segmentação das audiências de Anderson (2006) e Jenkins (2008) que abrem espaço para
produtores, empresas, artistas e outros atores que conseguirem agradar seus consumidores e se
utilizar de elementos da "cultura da Internet" (Castells, 2010) para atingir sustentabilidade em
seus mercados locais, regionais ou até globais.
É posível identificar no Móveis características das propostas de Castells (2010) e de
Hardt e Negri (2001) de empresas ou artistas que atuam em rede, independentemente se ser
online ou offline pois a perspectiva que se adota nessa avaliação é que não são fronteiras
excludentes. Os Móveis aprenderam a minimizar custos através de um trabalho
descentralizado, sem líderes destacados, onde cada membro da banda exerce múltiplas tarefas.
São roadies, compositores, colunistas, relações públicas, analistas de redes sociais, produtores
culturais e músicos.
Avalio através de diversos conceitos e estratégias apresentadas nesse trabalho que a
banda consegue um público fiel, capaz de manter uma agenda de shows constante. O Móveis
também demonstra preocupações e atua em prol de uma cena independente nacional, seja
implementando um festival próprio, que oras é financiado pelos próprios fãs, ora por
patrocinadores privados ou por incentivos públicos, mas também participando e incentivando
uma ampla rede de festivais por todo o país que ajudam a reforçar a atuação em rede não
apenas da banda brasiliense mas também de muitos outros artistas que estão interrelacionados
com este mercado paralelo que ganhou amplitude com a Abrafin e o Fora do Eixo.
Retomo aqui, uma postagem do Fábio, baixista da banda resume muito da essência
dessa, ou dessas bandas que escolhem trilhar o caminho fora da "forma dominante" das
grandes gravadoras. É possível identificar no post do baixista características da "forma
residual" como a venda de CDs e da "forma emergente" como a articulação com produtores e
os downloads no site.
Além disso, tentamos trabalhar nas outras cidades da mesma maneira que fizemos
aqui: passos de formiga, contato com o público, fidelização, contato com mídias e
produtores locais estabelecendo parcerias e investimentos mútuos.
Tivemos de recusar muitos shows fora de bsb? poderíamos ter circulado mais e
mais? provavelmente. mas só para dar um exemplo, em 2006, um ano depois do
lançamento, fizemos 38 shows, sendo 21 fora, 3 em outras cidades do df e "apenas"
14 em bsb. uma baita inversão.
173
Com essa prática, conseguimos criar um sistema sustentável tanto para a banda
(desde de 2003 temos um crescimento bruto de arrecadação que varia entre 9095%!) como para os músicos (hoje vivo apenas do meu trabalho com o móveis!). já
vendemos mais de 7mil cópias do idem, 4mil do c_mpl_te, mais de meio milhão de
músicas do c_mpl_te baixadas no álbum virtual, uma média de arrecadação de mil
reais por show em vendas de produtos (com a entrada dos cds "slims" a R$ 5,00,
conseguimos aumentar a venda de cds de uma média de 10 por show para quase
100!!!).
Isso pra falar apenas em termos econômicos, porque se for falar dos aspectos
afetivos, simbólicos e subjetivos aí não tem espaço em blog ou lugar que for para
colocar tudo que já conquistamos. mais ainda falta muito!!!![sic]
As parcerias, a estruturação da rede de contatos, de afetos, de circulação é
fundamental para o mercado independente, o que remete à "estrutura de sentimentos"
(Wiliams, 1979) que tem em sua essência o trabalho em rede, a produção coletiva, a
proximidade com os consumidores, e várias outras características que estão nesse produtor
independente. O fortalecimento da cena, pregado por Carlos Miranda, produtor da banda, é
uma das chaves desse segmento que segue a plenos pulmões no mercado nacional. Esse
fortalecimento pode vir das parcerias entre o público e o privado, nas cenas locais e na cena
virtual (Lévy, 1999) com a participação da banda na Internet.
A Internet é um dos pontos fundamentais para os independentes. Além das possíveis
parcerias feitas virtualmente, onde no caso dos Móveis há um exemplo de colaboração e coprodução feito pela rede com o cantor Leoni, a Internet é fundamental para que os
consumidores tenham acesso ao material produzido pela banda seja em áudio ou em vídeo. A
não inclusão de algumas áreas no país impossibilita aos produtores a exposição de seus
trabalhos na Internet, como exemplificado no caso da cena de Manaus, mas também
impossibilita o consumo local, uma vez que a necessidade de se ter uma conexão de banda
larga para assistir vídeos em plataformas como o Youtube, Vevo e Vimeo. A falta de banda
larga no país é entrave mesmo para gigantes da Internet como o site Vevo, parceria de
conteúdo entre Universal, Sony e EMI (Campi, 2014). A falta de conexão ou a conexão de
baixa qualidade ainda oferecida em várias partes do país dificulta também a interatividade
proposta pelos Móveis, assim como a participação na criação da banda. Investimentos
contínuos em infraestrutura como os propostos no plano nacional de banda larga, assim como
a aprovação de um Marco Civil como proposto em sua versão original (Ventura, 2013) são
questões fundamentais para a resolução dos problemas de conexão e consequentemente uma
equalização da competição tanto para esse modelo "emergente" e relação as majors,quanto
para o nosso produtor local em relação ao produtor estrangeiro, ou para o produtor da
periferia em relação ao produtor dos bairros mais nobres das nossas metrópoles. Melhorar a
174
conexão na rede é reforçar a cena. Retomando Canclini (1997), a rede é fundamental para
sermos competitivos e não nos tornarmos um "subúrbio de Chicago"
O sucesso dos Móveis passa por essa grande "feijoada búlgara", como a banda
denomina seu estilo musical mas é também o modo de operar dessa banda/empresa, que é
digital sem deixar de ser LP, é tuiteira sem deixar de ser Rede Globo, é independente sem
deixar de contratar produtor renomado, é "emergente" e carrega todo o "residual" necessário
para se encaixar no nicho que lhe interessa. A cultura da rede está impressa na identidade da
banda.
A formação das "materialidades" dos Móveis carrega partes do modelo das majors,
da forma "emergente" (Williams, 1979) em um modelo que converge diversas práticas do
mercado. Para chegar ao usuário final, que trafega online e offline a banda faz shows ao vivo,
produz na internet seja na página oficial ou nas redes sociais, vende na loja virtual, distribui
as músicas via streaming e downloads, vende CDs da FNAC ou na Livraria Cultura.
É possível usar a Internet como um espaço de resistência, embora como vimos o
sistema capitalista há de buscar uma reconfiguração porém há vários casos de sucesso que
assim como o Móveis, consegue estabelecer um espaço mesmo num mercado dominado pelas
grandes corporações. O espaço para colaboração está posto. A vantagem que pequenos
produtores como o Móveis tem ao meu ver, levando em consideração meu passado nas
multinacionais e grandes corporações a flexibilidade e velocidade para se adaptar às rápidas
mudanças que o mercado atualmente promove, estando sempre conectados com os seus
consumidores, algo que mesmo com o advento da Internet e das redes sociais as grandes
empresas ainda tem dificuldade de lidar, quanto mais o fato de produzir em conjunto com o
seu consumidor, algo que estas "novas bandas" e o mercado de música vem fazendo a algum
tempo.
175
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