apontamentos sobre o pronatec

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 A QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL DOS JOVENS NOS MOLDES DA TEORIA DO CAPITAL HUMANO REPAGINADA: APONTAMENTOS SOBRE O PRONATEC Resumo Resultado de reflexões desenvolvidas na dissertação de mestrado, este artigo objetiva debater a presença de elementos das teorias do capital humano e social no discurso das atuais políticas públicas de qualificação e inserção profissional para a juventude de baixa renda no Brasil. No primeiro momento, abordamos as novas formas de gestão e organização do trabalho e a situação dos jovens no mercado de trabalho atual. Em seguida, procuramos mostrar de que são compostas estas teorias, a conjuntura na qual emergem, bem como a função ideológica tanto em sua gênese quanto no panorama atual. Por último, apontamos indícios da presença das teorias mencionadas, sobretudo a crescente participação de instituições privadas na execução dos programas que compõem a política de qualificação no Brasil. Palavras‐chave: Teoria do Capital Humano; Teoria do Capital Social; Qualificação Profissional; Jovens. Pâmela Regina Jung [email protected] Mariléia Maria da Silva Universidade do Estado de Santa Catarina [email protected] X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014. p.1
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A QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL DOS JOVENS NOS MOLDES DA TEORIA DO CAPITAL HUMANO REPAGINADA: APONTAMENTOS SOBRE O PRONATEC Pâmela Regina Jung ‐ Mariléia Maria da Silva INTRODUÇÃO As condições atuais do mercado de trabalho, marcadas pelo desemprego e pela precarização, são decorrentes da flexibilização das relações de trabalho e consolidaram‐
se concomitantemente a uma contínua perda dos poucos direitos trabalhistas adquiridos pela classe trabalhadora em lutas passadas. Esse panorama vem acompanhado da proposta neoliberal que responsabiliza os trabalhadores ao obterem, ou não, bons empregos por meio da qualificação de sua força de trabalho. Sabe‐se que o fim da década de 1970 compreendeu um período de baixo crescimento e acentuada desigualdade econômica, estimulando a configuração da reestruturação do modelo de acumulação, o que trouxe grandes consequências para o conjunto da economia mundial (HARVEY, 1994). As relações capital‐trabalho, pelas quais a atual geração juvenil está sujeita, guardam uma íntima ligação com esse processo, marcado por uma profunda recessão, pela queda das taxas de crescimento, por altas taxas inflacionárias e pelo fim do Estado de bem estar social em diversos países. O cenário dessa etapa do capitalismo configura‐se pela hegemonia das ideias neoliberais e por um novo padrão tecnológico de produção e organização do trabalho. De acordo com Antunes (2000), no contexto da reestruturação produtiva, as novas formas de gestão e organização comportam intensas inovações tecnológicas e seu manejo precisa ser dominado pelos trabalhadores, cuja multifuncionalidade, criatividade, flexibilidade e polivalência são propagadas como requisitos primordiais para garantia da inserção e permanência no mercado de trabalho. No entanto, dentro da perspectiva neoliberal, delega‐se aos próprios trabalhadores a responsabilidade de adquirir condições de empregabilidade por meio da aquisição de competências, como um trunfo para a inserção no mercado de trabalho. O conjunto de transformações que vem ocorrendo no mercado de trabalho constitui para Antunes (2009) uma “nova morfologia do trabalho”, ou seja, uma alteração na “forma de ser” da classe trabalhadora1. No elenco das principais tendências dessa 1
Para Antunes (2009) a classe trabalhadora “compreende a totalidade dos assalariados, homens e mulheres que vivem da venda da sua força de trabalho, a classe‐que‐vive‐do‐trabalho e que são despossuídos dos meios de produção.” (p.235, grifo do autor). X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014. p.2
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A QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL DOS JOVENS NOS MOLDES DA TEORIA DO CAPITAL HUMANO REPAGINADA: APONTAMENTOS SOBRE O PRONATEC Pâmela Regina Jung ‐ Mariléia Maria da Silva nova morfologia do trabalho está a crescente exclusão dos jovens, que atingiram a idade de ingresso no mercado de trabalho, bem como a precarização das condições de trabalho que estão por trás da melhora nos índices de emprego da população juvenil no Brasil nos últimos anos (ANTUNES e ALVES, 2004; ANTUNES, 2009). Diante dos altos índices de desemprego constatados na maioria dos países capitalistas, inclusive no Brasil, é contestável a afirmação de que uma população “competente” e “empregável” seria capaz por si só de acabar com o desemprego. Estudos realizados na primeira década do século XXI apontam que, atualmente, os jovens sofrem com taxas consideráveis de desemprego, ocupação precária, baixa remuneração e rotatividade – uma vez que as empresas estão demitindo para contratar empregados com salários mais baixos e em piores condições de trabalho. Nesse contexto, os jovens2, sobretudo os que estão em busca do primeiro emprego formal, compõem uma parcela da classe trabalhadora notavelmente prejudicada. As atuais políticas de qualificação profissional para os jovens têm priorizado cursos de formação de curta duração. O Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec) será aqui analisado como um exemplo desta tendência3. AS NOVAS FORMAS DE GESTÃO E ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO E A SITUAÇÃO DOS JOVENS NO MERCADO DE TRABALHO ATUAL Em pesquisa divulgada em 2012, a Organização Internacional do Trabalho (OIT) mostrou taxas elevadas de desemprego em escala mundial e previsões de oportunidades de emprego insuficientes para todos os trabalhadores, sobretudo para os jovens. De acordo com a Organização, a taxa de desemprego entre os jovens correspondia a 12,7%. No ano de 2011, 74 milhões de jovens entre 15 e 24 anos estavam desempregados e, em nível mundial, as chances de essa quantia aumentar eram três vezes maiores do que a taxa entre os adultos. Nos países em desenvolvimento, a faixa etária juvenil é acometida 2
De acordo com o Estatuto da Juventude, no Brasil são consideradas jovens as pessoas com idade entre 15 (quinze) e 29 (vinte e nove) anos. 3
Entendemos que, além do Pronatec, outros programas poderiam ser incluídos, dentre os quais, o Programa Nacional de Inclusão de Jovens (Projovem). Por falta de espaço, priorizaremos apenas o primeiro. X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014. p.3
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A QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL DOS JOVENS NOS MOLDES DA TEORIA DO CAPITAL HUMANO REPAGINADA: APONTAMENTOS SOBRE O PRONATEC Pâmela Regina Jung ‐ Mariléia Maria da Silva de taxas ainda piores de desemprego. O relatório afirmava ainda que os contratos temporários e em tempo parcial estavam aumentando (OIT, 2012). No ano seguinte a OIT (2013), dedica um relatório específico para as tendências mundiais do emprego juvenil, apontando a crise de emprego com a qual convive a atual geração de jovens. De acordo com o documento, o desemprego atinge cerca de 73,4 milhões de jovens em todo o mundo, representando cerca de 13% dos jovens entre 15 e 29 anos. Ainda que a taxa de desemprego entre os jovens latino‐americanos tenha caído de 17,6% em 2003 para 12,9% em 2012, a previsão é de que, a médio prazo, o desemprego entre os jovens aumente. A estimativa é de que a taxa de desemprego seguirá acima de 17% até 2015 caindo para 15,9% em 2018 (OIT, 2013). Entendemos que a resposta capitalista para a crise de acumulação do modo de produção vigente tem agido na superficialidade do padrão de acumulação, sem alterar as bases do modo de produção capitalista, ou seja, “reorganizar seu ciclo reprodutivo preservando seus fundamentos essenciais.” (ANTUNES, 2000, p.36). Essa reorganização baseou‐se na transição do antigo padrão para novas formas de acumulação mais flexíveis, gerando mudanças significativas para o contexto produtivo, notadamente em efeitos sociais como a seletividade, a precariedade e a exclusão – uma vez que a crescente dispensa de mão de obra prejudica o trabalhador na negociação pela venda de sua força de trabalho. Para Antunes (2009), a reestruturação produtiva provocou uma precarização estrutural do trabalho, por meio de novas e velhas modalidades de trabalho – o “trabalho precário” – onde se empreende esforços para recuperar as formas econômicas, políticas e ideológicas da dominação burguesa. Em suas palavras: “Proliferaram, a partir de então, as distintas formas de ‘empresas enxuta’, ‘empreendedorismo’, ‘corporativismo’, ‘trabalho voluntário’, etc., dentre os mais diversos modos alternativos de trabalho precarizado” (ANTUNES, 2009, p.233, grifo do autor). O “empreendedorismo” e a “flexibilização” estariam, para o autor, entre os exemplos mais explícitos do “processo de ocultamento das novas modalidades de exploração do trabalho” (ANTUNES, 2009, p.234). X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014. p.4
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A QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL DOS JOVENS NOS MOLDES DA TEORIA DO CAPITAL HUMANO REPAGINADA: APONTAMENTOS SOBRE O PRONATEC Pâmela Regina Jung ‐ Mariléia Maria da Silva Druck (2011) ressalta que a precarização do trabalho é um fenômeno tanto novo quanto velho. No caso brasileiro, a autora, com base em Franco e Druck (2009 apud DRUCK, 2011) especifica seis tipos de precarização do trabalho, a saber: vulnerabilidade das formas de inserção e desigualdades sociais; intensificação do trabalho e terceirização; insegurança e insalubridade no trabalho; fragilização da organização dos trabalhadores e a condenação e o descarte do Direito do Trabalho. (DRUCK, 2011). Ainda segundo a autora, embora o cenário da conjuntura brasileira tenha servido para legitimar o alarde em relação ao suposto crescimento do emprego com carteira assinada, tais declarações baseiam‐se no “fetiche dos números” e não consideram a precarização social do trabalho como o centro da dinâmica do atual modelo de acumulação flexível. (Idem.) TEORIA DO CAPITAL HUMANO E TEORIA DO CAPITAL SOCIAL A Teoria do Capital Humano (TCH) foi sistematizada e divulgada entre o final dos anos de 1950 e o início de 1960. Dentre os estudiosos que ajudaram a elaborar e difundir esta teoria, Theodore Schultz (1902‐1998) é comumente o mais lembrado por ter sido considerado o precursor, o que lhe rendeu o Prêmio Nobel de Economia em 1979. É conveniente ressaltar que, ainda que somente no final da década de 1950 a ideia de “capital humano” toma corpo de forma sistematizada, originando o que se conhece por capital humano – nome empregado analogamente à capital físico –, a TCH não é resultado de uma ideia casual de um ou alguns pesquisadores, e sim decurso das novas formas que vão assumindo as relações de produção4 e do papel do Estado no interior do capitalismo monopolista. Essa teoria compunha os estudos acerca da relação entre educação e emprego mesmo antes de sua sistematização. Inclusive, essa ideia no Brasil já estava presente antes de 1950, e ajudava a embasar a formulação de políticas educacionais e de emprego. (FRIGOTTO, 2010). De acordo com Lima Filho (2003) na perspectiva da TCH, “As atividades que influenciam a renda das pessoas – seja a educação, a formação no trabalho, o cuidado 4 Entendemos como relações de produção – relações que os homens estabelecem entre si na produção de sua existência. X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014. p.5
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A QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL DOS JOVENS NOS MOLDES DA TEORIA DO CAPITAL HUMANO REPAGINADA: APONTAMENTOS SOBRE O PRONATEC Pâmela Regina Jung ‐ Mariléia Maria da Silva médico, a emigração, etc. – são denominadas inversão em capital humano.” (p.68). No elenco das atividades que potencializam e qualificam a força de trabalho, a educação – entendida como capacitação para o trabalho – aparece no topo da lista. Nas palavras de Frigotto (2010), “A educação, então, é o principal capital humano [...]. Neste sentido é um investimento como qualquer outro” (p.51). Assim, quanto mais investe na sua qualificação – capital humano – mais o trabalhador oportuniza sua ascensão social. Para Motta (2009), a TCH está fundamentada no princípio de que o trabalho, mais do que um fator de produção, é um tipo de capital: capital humano. Esse capital é tão mais produtivo quanto maior for sua qualidade. Essa qualidade é dada pela intensidade de treinamento científico‐tecnológico e gerencial que cada trabalhador adquire ao longo de sua vida. A qualidade do capital humano não apenas melhora o desempenho individual do trabalhador – tornando‐o mais produtivo – como é um fator decisivo para gerar riqueza, crescimento econômico do país e de equalização social. (p.551). A premissa da inversão de certas atividades em capital humano justifica também, na visão dos adeptos da TCH, as diferenças salariais, uma vez que os trabalhadores que dedicaram maior tempo “qualificando” sua força de trabalho devem ganhar um salário maior. Como se vê, o trabalho qualificado passa a ser considerado um tipo de capital acumulado – capital humano incorporado – por conseguinte, sua atuação no processo produtivo é remunerada de forma equivalente àquela concedida ao capital que integra o processo produtivo por meio de máquinas, equipamentos etc. – o capital físico. O contexto político‐econômico no qual emerge a TCH tem sua base no modelo de Estado intervencionista, que passa a ocupar o lugar do Estado liberal na etapa monopolista do capitalismo financeiro, após a Segunda Guerra Mundial, assumindo o papel de proteger o conjunto de interesses do sistema capitalista. Nesse contexto, são produzidas as teses desenvolvimentistas, lideradas pelos Estados Unidos, que buscavam, acima de tudo, uma estratégia de recomposição da hegemonia imperialista ameaçada pela disputa entre dois polos antagônicos, Estados Unidos e União Soviética. A TCH é, portanto, um produto dessas teses desenvolvimentistas, (FRIGOTTO, 2010). X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014. p.6
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A QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL DOS JOVENS NOS MOLDES DA TEORIA DO CAPITAL HUMANO REPAGINADA: APONTAMENTOS SOBRE O PRONATEC Pâmela Regina Jung ‐ Mariléia Maria da Silva Tendo em vista a preocupação com o possível aumento da influência comunista nos novos países independentes, a teoria do desenvolvimento foi elaborada com base na economia dos países periféricos e disseminou‐se na América Latina5 por intermédio das políticas dos Organismos Internacionais. A tese em voga nesse contexto atribuía à modernização dos setores produtivos e sociais a melhor maneira de galgar as etapas necessárias para atingir a condição econômica do capitalismo avançado. Nesse panorama, as teses da TCH ganharam espaço pela importância atribuída ao capital humano na crença de que esse traria o desenvolvimento necessário para recompor e rearticular a hegemonia imperialista. A perspectiva desenvolvimentista sustentava‐se numa ideia de linearidade e continuidade do setor produtivo na qual a ascensão da condição de país “subdesenvolvido” para “desenvolvido” viria por meio do progresso técnico, que além de gerar emprego, exigia a qualificação, ou seja, o investimento por parte do trabalhador em sua propriedade – força de trabalho – gerando um tipo de capital, “capital humano”, garantindo‐lhe trabalho qualificado e, consequentemente, garantindo níveis de renda cada vez mais elevados. (FRIGOTTO, 2010). O fim da década de 1950 é marcado pela retomada da prosperidade econômica, condição que permite aos Estados Unidos entrar na década seguinte propondo metas de desenvolvimento e de modernização para as nações subdesenvolvidas mediante a intensificação de acordos de cooperação técnica. (Idem). O ciclo do modelo econômico pós‐guerra perdura até a crise deflagrada no início da década de 1970, quando se inicia o processo de reestruturação do capital em escala global, visando tanto à recuperação do padrão de acumulação quanto à recomposição da hegemonia enfraquecida por conta do ciclo de greves e lutas deflagradas, sobretudo, na Europa ocidental no final da década de 1960. (ANTUNES, 2009). A ideologia da 5
No Brasil, a Teoria do Capital Humano, segundo Oliveira e Motta (2010), foi incorporada ao longo dos anos 1950‐60, mas somente na década de 1970 teve sua incorporação mais efetiva, ajudando a compor a base ideológica do que ficou conhecido como nacional‐desenvolvimentismo. De acordo com Lima‐Filho, no início dos anos 1970 a TCH foi referência para muitos estudos econômicos que dirigiram reformas educacionais efetuadas pelo governo, tanto no nível universitário, quanto no ensino de 1º e 2º grau. Bem como na criação de instituições de educação técnico‐profissional (escolas técnicas industriais) e de programas de treinamento e preparação de mão‐de‐obra especializada e semi‐especializada, coordenados pelo sistema de formação profissional (Sistema “S”) e por empresas. (LIMA‐FILHO, 2003). X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014. p.7
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A QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL DOS JOVENS NOS MOLDES DA TEORIA DO CAPITAL HUMANO REPAGINADA: APONTAMENTOS SOBRE O PRONATEC Pâmela Regina Jung ‐ Mariléia Maria da Silva globalização, em voga na última parte da década de 1970, apostou na política do livre mercado como saída para a crise do Estado de bem‐estar social e de crescimento econômico. Coube a TCH ajustar‐se à nova lógica, de forma que, conforme Motta (2012), nesse período a teoria passa por um “rejuvenescimento”, agregando novos conceitos e reestabelecendo sua base teórica baseada nos conceitos de empregabilidade e de sociedade do conhecimento. Leher (1999), com base em uma fala de Thomas A. Stewart, editorialista da revista Fortune, ressalta: Nesta “nova era do capitalismo, o principal capital é o intelectual” [...] Nesta versão renovada da teoria do capital humano, o conhecimento não pertence mais ao indivíduo, tampouco é pensado a partir do mesmo: “é a empresa que deve tratar de adquirir todo o capital humano que possa aproveitar”. A empresa precisa “utilizar de maneira eficiente o cérebro de seus funcionários” que, por isso, devem ser depositários de conhecimento útil para o capital. (p.25) Ainda segundo Leher, na perspectiva das ideologias dominantes, a formação elementar e a formação profissional eram a solução para o desemprego. Ajudando a legitimar tais convicções, as diretrizes do Banco Mundial acirrou sua, já antiga, política antiuniversitária. (Idem.). Para o autor, a filosofia do Banco baseava‐se tanto no fato de que o trabalho nas nações periféricas não é baseado na elaboração de conhecimento cientifico avançado, coincidindo com sua posição na economia mundial, de subordinação, marginalizada e produtora de mercadorias de baixo valor agregado, quanto no princípio de que “um mercado global livre decide melhor quais trabalhos estão localizados em que país. Em suma, melhor do que a análise endógena dos sistemas de ensino, a tese das ‘vantagens comparativas’ explica as prioridades educacionais em curso nas periferias” (LEHER, 1999, p.27). Em fins de 1980, constata o autor, ganha relevo o caráter prioritário em um ensino fundamental “minimalista” e uma formação profissional “aligeirada”. (LEHER, 1999). No plano macroeconômico, diferentemente dos anos pós‐Segunda Guerra Mundial, nos quais se compreendia que o processo de desenvolvimento seria mais bem conduzido através do Estado, as políticas internacionais de grande parte do mundo nos X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014. p.8
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A QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL DOS JOVENS NOS MOLDES DA TEORIA DO CAPITAL HUMANO REPAGINADA: APONTAMENTOS SOBRE O PRONATEC Pâmela Regina Jung ‐ Mariléia Maria da Silva anos de 1970/90 foram definidas dentro da concepção neoliberal – uma espécie de “retorno à ortodoxia” liberal. (MOTTA, 2012). – para a qual a interferência do Estado impede o desenvolvimento. Tal concepção foi difundida na América Latina pelos economistas do Fundo Monetário Internacional (FMI) mediante conjunto de medidas econômicas prescritas no Consenso de Washington6. Assim, nos anos de 1980‐1990 no contexto de implantação das políticas neoliberais, defendeu‐se a ideia de que a inserção no mercado – livre e mundializado – dependia do aumento da competitividade. Todavia, ainda em 1990, as pesquisas revelaram que “concomitante a expansão do acesso à educação, também se intensificou os índices de desemprego e de trabalho informal, além da estagnação do IDH. Assim, a tese da empregabilidade mostrava‐se inviável na prática, ao passo que se comprovava que a globalização não trazia benefícios globais.” (MOTTA, 2010, p.554). De acordo com Motta (2012), ao passo que crescia a precarização no mundo do trabalho, a pobreza da classe trabalhadora, e a desigualdade econômica entre classes sociais e países, avançava também a ameaça de uma ruptura da ordem social estabelecida. A tensão instalada, sobretudo no final da década de 1990, devido às crises econômicas e os altos custos sociais foram o estopim de diversos movimentos sociais contra a globalização. Tal panorama de instabilidade política ajudou a instaurar a insegurança, nos setores dominantes, de que a desigualdade social e, sobretudo a pobreza, ameaçasse a governabilidade e a coesão social nos países de capitalismo dependente. Diante do enfraquecimento do ideal neoliberal, tendo em vista o quadro conjuntural exposto, tem‐se a necessidade de uma proposta que renove as bases ideológicas, mantenha o consenso e garanta a continuação da acumulação capitalista. Nesse sentido ganha destaque a proposta da Terceira Via, cujo corpo teórico foi elaborado por Anthony Giddens7. 6
Em 1989, economistas reunidos em Washington elaboraram um conjunto de propostas políticas e reformas tomadas pelo FMI e pelo Banco Mundial como condição para a renegociação da dívida externa da América Latina. (MOTTA, 2012). 7
Anthony Giddens (1938) é um sociólogo britânico. X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014. p.9
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A QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL DOS JOVENS NOS MOLDES DA TEORIA DO CAPITAL HUMANO REPAGINADA: APONTAMENTOS SOBRE O PRONATEC Pâmela Regina Jung ‐ Mariléia Maria da Silva Entre a social‐democracia do velho estilo keynesiano, que compreende o capitalismo de livre mercado, dotado de “qualidades irracionais”, porém possíveis de serem controladas pelo Estado, e o neoliberalismo que, ao contrário, defende o Estado‐mínimo e concebe um mercado com qualidades superiores, a terceira via pretende criar um projeto político modernizado para que a social‐democracia possa administrar a crise do sistema, aprofundar a democracia e promover maior igualdade de oportunidades – a chamada “redistribuição de possibilidades.” (MOTTA, 2012, p.78). Para Motta (2012), na concepção da terceira via – sustentada sob o tripé: sociedade civil, setor público e setor privado –, a função educadora do Estado é a de promover uma nova cultura cívica, reorganizando a sociedade civil com vistas à consolidação e coesão social, ao empreendedorismo social e à ação voluntária dos indivíduos. Nesse sentido, considera‐se a urgência de extinguir definitivamente qualquer resquício da “cultura de dependência criada pelo Estado de bem‐estar social e suas políticas sociais universais”, colocando em seu lugar “’políticas [sociais] gerativas’ que desenvolvam o chamado ‘capital social’ dos grupos de indivíduos para a ação, incutindo neles o espírito empreendedor, a autoconfiança, a capacidade de administrar riscos [...]” (LIMA e MARTINS, 2005, p.57, grifo nosso). Nessa perspectiva a geração de “capital social”, ou seja, o desenvolvimento de competências emocionais e morais é, sobretudo, uma alternativa para os trabalhadores que não possuem as características requeridas no trabalho globalizado, cabendo a eles empreenderem constantes iniciativas de geração e renovação econômica. Já para os trabalhadores que apresentam condições de ingressar e se manter no atual mercado de trabalho, almeja‐se o desenvolvimento das competências cognitivas. (MOTTA, 2012). RE‐REJUVENECIMENTO DA IDEOLOGIA DO CAPITAL HUMANO, TEORIA DO CAPITAL SOCIAL E O PRONATEC Paralelo à perspectiva política da Terceira Via, surge no campo ideológico a necessidade de redefinir estratégias com vistas a legitimar o consenso em torno da sociabilidade burguesa, uma vez que a inserção no mercado de trabalho, mediante X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014. p.10
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A QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL DOS JOVENS NOS MOLDES DA TEORIA DO CAPITAL HUMANO REPAGINADA: APONTAMENTOS SOBRE O PRONATEC Pâmela Regina Jung ‐ Mariléia Maria da Silva investimento em capital humano, revelou‐se ineficaz. Inicia‐se então uma nova etapa de prescrições políticas formuladas e disseminadas pelos principais organismos multilaterais. Nesse panorama mantém‐se a base ideológica da TCH, só que agora acompanhada dos princípios da Teoria do Capital Social (TCS). Nas palavras de Motta, a TCS é um novo paradigma que “visa superar a pobreza através da colaboração e da cooperação dos cidadãos no processo de alargamento do acesso dos mais pobres aos benefícios econômicos e bens socioeconômicos já disponíveis na sociedade” (2009, p.561). Motta (2012) ressalta que o termo “capital social” não é novo, mas ganha uma nova roupagem na contemporaneidade a partir da tese de Robert Putman8. De acordo com Motta, o teórico conclui que a diferença no desenvolvimento econômico e social em qualquer formação histórico‐social está no grau da ‘cultura cívica’ dos indivíduos, sendo que quanto maior o grau dessa, maior seria a solidariedade e confiança entre os indivíduos e o nível de bem‐estar social (MOTTA 2009; 2010; 2012). A propensão de uma comunidade a formar associações civis é fundamental para a eficácia e a estabilidade de um governo democrático, pois essas organizações incutem nos membros os hábitos de cooperação, solidariedade e espírito público, isto é, se traduzem em capital social. (MOTTA, 2012, p.149). Conforme Motta (2012), a partir dos anos 2000, mecanismos de ajustes políticos vêm sendo apresentados pelos organismos multilaterais, tendo sua expressão máxima nas Políticas de Desenvolvimento do Milênio9 (PDM’s), cuja principal meta, dentro dos objetivos propostos, é a extinção da pobreza até o ano de 2015. Para a autora, as PDM’s “introduzem novos mecanismos de hegemonia de função de direção intelectual e moral para abrandar os efeitos das políticas neoliberais e dar condições de reprodução do capital na virada do milênio.” (Id. Ibidem, p.85). Nas palavras de Motta (2012): 8
Robert David Putnam (1941) é um cientista político e professor norte‐americano, com atuação na Universidade Harvard. 9
Conjunto de políticas definido entre os encontros da Cúpula Mundial sobre Desenvolvimento Social (Copenhague,1995) e da Cúpula do Milênio da Organização das Nações Unidas (Nova York, 2000) (MOTTA, 2009). X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014. p.11
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A QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL DOS JOVENS NOS MOLDES DA TEORIA DO CAPITAL HUMANO REPAGINADA: APONTAMENTOS SOBRE O PRONATEC Pâmela Regina Jung ‐ Mariléia Maria da Silva Essa etapa é compreendida [...] como um segundo rejuvenescimento (um “re‐rejuvenescimento”, se nos for permitido o termo) da ideologia do capital humano. Esse remanejo ideológico se dá na incorporação das propostas de desenvolvimento do ‘capital social’, compondo as estratégias de políticas de estabilização econômica para os países de capitalismo dependente, mas ampliadas com estratégias de estabilização política e com a ideia de desenvolvimento sustentável. (p.284, grifo nosso) Embora cada organismo multilateral tenha elaborado sua concepção de capital social, o sentido geral conferido ao termo significa, em suma, “a capacidade de uma sociedade estabelecer laços de confiança interpessoal e redes de cooperação com vistas à produção de bens coletivos.” (D’ARAÚJO, 2003, p.10, apud, MOTTA, 2012, p.140). De acordo com Motta, a teoria do capital social é implantada por meio de atributos “relacionados a uma comunidade cívica, com variáveis de estrutura e atitude que levam à formação de redes de cooperação visando à produção de bens coletivos e à capacidade de estabelecer laços de confiança interpessoal.” (MOTTA, 2012, p.169). Para os adeptos da TCH, a mudança social almejada – superação da diferença de desenvolvimento econômico e social das formações histórico‐sociais – acontecerá por meio da solidariedade e da colaboração entre os membros de uma comunidade. A questão central, portanto, é o desenvolvimento da ‘cultura cívica’10. Para que se obtenha uma comunidade cívica faz‐se necessário o desenvolvimento da virtude cívica, composta por valores como a tolerância, a solidariedade e a confiança mútua. Nesse sentido, atribui‐se à educação uma nova função, qual seja: “aumentar a produtividade das camadas mais pobres da população através da ampliação do acesso aos bens sociais, isto é, gerando capital social.” (MOTTA, 2012, p.284). Como é possível observar, o equilíbrio social, a estabilidade política, a boa governança e o desenvolvimento econômico estão subordinados em maior grau ao capital social do que ao capital humano ou ao próprio capital físico. Isso porque dele 10
A cultura cívica pode ser entendida como “o civismo, a cultura política, as tradições republicanas, a capacidade da sociedade de obter maior participação política e organização social, de estabelecer uma relação menos hierarquizada, tem a função de controlar os bens socioeconômicos ou os estoques pessoais de ativos, que é exercida pela sociedade civil organizada.” (MOTTA, 2012, p. 148‐149). X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014. p.12
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A QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL DOS JOVENS NOS MOLDES DA TEORIA DO CAPITAL HUMANO REPAGINADA: APONTAMENTOS SOBRE O PRONATEC Pâmela Regina Jung ‐ Mariléia Maria da Silva [capital social] depende a coesão social, fundamental nessa perspectiva para a manutenção do consenso da ideologia burguesa e o estabelecimento do conformismo. Para a Teoria do Capital Social, a superação da pobreza está condicionada à criação de associações solidárias que objetivem resolver problemas individuais e comunitários pontuais, à criação de cooperativas comunitárias de produção e de redes solidárias visando, sobretudo, o fortalecendo da “cultura cívica”. Nessa perspectiva, cabe à educação, construir tanto a “cultura cívica”, ou seja, capital social, quanto o capital humano. A construção da cultura cívica destina‐se, sobretudo, para a camada de trabalhadores que “fora como que descartada no mercado de trabalho no processo de reestruturação produtiva neoliberal dos anos 1990, mas que ainda possui capacidade produtiva.” (MOTTA, 2012, p.21). Já o capital humano é “direcionado aos trabalhadores que já possuem qualificações profissionais competitivas e necessárias para o mercado de trabalho complexo.” (Idem.) Dessa forma, Dos trabalhadores que apresentam condições de investir em seu capital humano exigem‐se elevação do nível educacional e qualificação permanente como formas de inserção num mercado competitivo e complexo e como condições de ingresso do país no mundo globalizado. Já para os trabalhadores que amargam a falta das condições competitivas exigidas no atual mercado de trabalho formal é sugerido o desenvolvimento de suas capacidades básicas de realização produtiva a fim de que obtenham condições mínimas de sobrevivência. (MOTTA, 2012a, 21‐22) Os atuais programas de qualificação e inserção profissional compõem o elenco das políticas públicas brasileiras destinadas ao público juvenil que tomaram corpo diante dos altos índices de desemprego constatados desde meados dos anos de 1990. Considerando que tais políticas para os jovens têm priorizado cursos de formação de curta duração, consideramos o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec) exemplificador dessa tendência. Em se tratando de educação profissional no Brasil é fundamental aduzir a antiga e recorrente relação, eminentemente dual, entre esta e o ensino médio. Para tanto, concordamos com Ciavatta e Ramos (2011), que o entendimento dessa relação implica a consideração da totalidade dos aspectos históricos presentes em sua constituição. Em X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014. p.13
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A QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL DOS JOVENS NOS MOLDES DA TEORIA DO CAPITAL HUMANO REPAGINADA: APONTAMENTOS SOBRE O PRONATEC Pâmela Regina Jung ‐ Mariléia Maria da Silva síntese, o ensino médio e a educação profissional compõem uma relação dual e fragmentada que provém já da época colonial, na qual as relações desiguais entre as classes sociais manifestavam‐se na atribuição do trabalho manual para os escravos e, posteriormente, para os trabalhadores livres e o trabalho intelectual para as elites. O mesmo se repete na época da República e se organiza legalmente no primeiro governo Vargas, em meados de 1940. Posteriormente, as Leis Orgânicas do Ensino Industrial, do Ensino Secundário e a criação do SENAI, em 1942, atribuíram incompatibilidade, expressa nos currículos, entre os cursos introdutórios e os cursos técnicos. (CIAVATTA e RAMOS, 2011). Concomitante ao decurso do processo de industrialização e o consequente aumento da demanda por pessoas preparadas, acentua‐se a função profissionalizante do nível médio de ensino, mantendo‐se assim durante todo o período nacional‐
desenvolvimentista no qual vigorou o pleno emprego. Ainda que sob protesto de educadores, que nos anos 1980 haviam travado diversas lutas por uma educação emancipatória, em 1996 aprova‐se a Lei nº 9.394/96 na qual a ênfase passa da preparação para o trabalho para a preparação para a vida. “Sob esse ideário, preparar para a vida significaria desenvolver nas pessoas competências genéricas e flexíveis, de modo que elas pudessem se adaptar facilmente às incertezas do mundo contemporâneo.” (CIAVATTA e RAMOS, 2011, p.29). Nesse mesmo período, a instituição do Decreto nº 2.208/97 desvinculou o ensino médio da educação profissional e embasou as Diretrizes Curriculares Nacionais que postularam a ideologia da “empregabilidade” assim como a pedagogia das competências. Ainda para as autoras, a educação profissional, sob a perspectiva dessa reforma, foi destinada à classe trabalhadora como uma alternativa, ao nível superior. Em 2004, o Decreto nº 5.154 anula o anteriormente citado com vistas a reestabelecer a integração entre a modalidade e o nível de ensino. Todavia, para Frigotto (2011), o decreto atual conservou todas as possibilidades do decreto anterior. Nas palavras do autor: “Romper com a dualidade estrutural é equação complexa e não se resolve com reformas só no campo da educação, mas será significativo se resultar de X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014. p.14
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A QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL DOS JOVENS NOS MOLDES DA TEORIA DO CAPITAL HUMANO REPAGINADA: APONTAMENTOS SOBRE O PRONATEC Pâmela Regina Jung ‐ Mariléia Maria da Silva mudanças estruturais na ordem social, econômica e cultural da sociedade.” (FRIGOTTO, 2011, p.12). Tendo em vista o exposto até esse ponto, concordamos com Ciavatta e Ramos (2001) quando afirmam que, considerando a condição decadente da oferta de educação profissional, ela não transcende a função do ensino quando este é visto apenas como alavanca para entrada no mercado de trabalho. Pelo mesmo motivo, o Pronatec, por oferecer vagas gratuitas na educação profissional privada torna‐se convidativo, todavia pode não passar de uma espécie de indenização pela baixa qualidade do ensino médio público. (CIAVATTA e RAMOS, 2011). O Pronatec foi instituído pela Lei Nº 12.513, de 26 de 2011, sob o objetivo principal de ampliar a oferta de cursos de educação profissional e tecnológica. É composto por um conjunto de seis iniciativas, entre elas, o acordo de gratuidade com os Serviços Nacionais de Aprendizagem, que objetiva: ampliar, progressivamente, a aplicação dos recursos do SENAI, do SENAC, do SESC e do SESI, recebidos da contribuição compulsória, em cursos técnicos e de formação inicial e continuada ou de qualificação profissional, em vagas gratuitas destinadas a pessoas de baixa renda, com prioridade para estudantes e trabalhadores. (MEC,2012)11 Como também o FIES Técnico e Empresa, que tem como objetivo: financiar cursos técnicos e cursos de formação inicial e continuada ou de qualificação profissional para estudantes e trabalhadores em escolas técnicas privadas e nos serviços nacionais de aprendizagem – SENAI, SENAC, SENAT e SENAR. No FIES Empresa serão financiados cursos de formação inicial e continuada para trabalhadores, inclusive no local de trabalho. (MEC, 2012) 12 Destacamos nesse sentido o repasse de recursos públicos para instituições privadas executoras dos cursos oferecidos. Sabe‐se que atualmente a maior parte dos recursos do programa tem sido destinada a essas instituições. Consideramos que essa prática legitima‐se na ideia de que esse setor teria mais experiência e competência para 11
MEC, 2012. Idem. 12
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A QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL DOS JOVENS NOS MOLDES DA TEORIA DO CAPITAL HUMANO REPAGINADA: APONTAMENTOS SOBRE O PRONATEC Pâmela Regina Jung ‐ Mariléia Maria da Silva executar os cursos em relação ao setor estatal. Nas palavras de Grabowski (2013), em entrevista concedida a revista Valor Econômico S.A.: "O Sistema S acaba virando um braço de gestão privada do Estado. O governo do Rio Grande do Sul, por exemplo, entregou 100% das vagas estaduais do Pronatec ao Sistema S.” De acordo com reportagem de Máximo (20013), também na revista Valor Econômico S.A, “o maior ofertante das vagas do Pronatec é o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI), juntamente com outras entidades educacionais do Sistema S, como o (SENAC)13, (SENAT)14 e (SENAR)15. Das 2,5 milhões de matrículas criadas em 2011 e 2012, 1,309 milhão estão na conta das entidades empresariais, que recebem transferências por cada matrícula.” (MÁXIMO 2013). Os cursos ofertados dividem‐se em duas categorias, uma delas é a Formação Inicial e Continuada (FIC) para jovens e trabalhadores, com duração mínima de 160 horas. Atualmente são 644 opções de cursos, alocados em 13 eixos tecnológicos, de acordo com suas características científicas e tecnológicas. Os cursos são ofertados pelas escolas da Rede Federal de Educação Profissional e Tecnológica (Institutos Federais, CEFET e Escolas Técnicas vinculadas às Universidades Federais), pelas entidades dos Sistemas Nacionais de Aprendizagem (SENAI, SENAC, SENAT e SENAR) e pelas Redes Públicas Estaduais de Ensino, com o apoio do Ministério da Educação. Já os Cursos Técnicos (CNCT) são destinados a estudantes do ensino médio. A última versão do Catálogo Nacional de Cursos Técnicos, disponibilizado no site oficial do Programa, data do ano de 2012 e conta com uma relação que abrange 220 cursos, distribuídos em 13 eixos tecnológicos 16. A ênfase dada aos cursos de curta duração (Formação Inicial e Continuada) é, portanto, quase três vezes maior do que a quantidade de cursos de nível técnico. De acordo com dados da revista Valor Econômico S.A. (2013) Cerca de 70% das matrículas do Pronatec são de cursos de formação inicial e continuada (FIC), com carga horária mínima de 160 horas e baixa exigência de escolaridade. O restante das vagas é dos programas com carga horária mínima de 800 horas, sendo residuais as inscrições em 13
Sistema Nacional de Aprendizagem Comercial. Sistema Nacional de Aprendizagem do Transporte. 15
Sistema Nacional de Aprendizagem Rural. 16
MEC, 2013. 14
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A QUALIFICAÇÃO PROFISSIONAL DOS JOVENS NOS MOLDES DA TEORIA DO CAPITAL HUMANO REPAGINADA: APONTAMENTOS SOBRE O PRONATEC Pâmela Regina Jung ‐ Mariléia Maria da Silva cursos técnicos integrados ao ensino médio, cuja carga horária supera 2 mil horas – três a quatro anos de duração (VALOR ECONOMICO S.A., 2013). A quase totalidade dos cursos de curta duração suscita a duvida sobre o tipo de formação que está sendo oferecida para esse público em tão diminuta carga horária. Como é possível observar, o público alvo dos cursos de curta duração são os jovens e os trabalhadores pouco escolarizados, uma vez que para cursar o nível técnico é preciso estar cursando ou concluído o ensino médio. Depreende‐se disso que a formação oferecida para esse público aproxima‐se mais de uma estratégia de manutenção do consenso em torno da ideologia dominante do que, de fato, uma educação que vise superar as contradições de classe até aqui apontadas. Referências ANTUNES, Ricardo. Os sentidos do trabalho: ensaio sobre a afirmação e a negação do trabalho. 2ª ed. São Paulo: Boitempo, 2000. _________. Século XXI: Nova era da precarização do trabalho? In: BRAGA, R. Infoproletários: degradação real do trabalho virtual. São Paulo: Boitempo, 2009. ANTUNES, Ricardo; ALVES; Giovanni. As Mutações no mundo do Trabalho na era da mundialização do capital. Educação e Sociedade, Campinas, vol.25, n.87, p.335‐351, mai./ago.2004. BRASIL. Lei Nº 12.513, de 26 de 2011. Institui o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (Pronatec) e dá outras providências. Disponível em:http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011‐2014/2011/lei/l12513.htm. Acesso em: 15 de abril de 2014. BRASIL. MEC. (Org.). Pronatec: Objetivos e Iniciativas. 2012. Disponível em: <http://pronatec.mec.gov.br/institucional‐90037/objetivos‐e‐iniciativas>. Acesso em: 15 abr. 2014. BRASIL. MEC. (Org.). GUIA PRONATEC DE CURSOS FIC. 2013. Disponível em: <http://pronatec.mec.gov.br/fic/apresentacao>. Acesso em: 15 abr. 2014. CIAVATTA, Maria. RAMOS, Marise. Ensino Médio e Educação Profissional no Brasil: Dualidade e fragmentação. Revista Retratos da Escola, Brasília, v. 5, n. 8, p. 27‐41, jan./jun. 2011. X ANPED SUL, Florianópolis, outubro de 2014. p.17
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