Password Rússia Mudança de paradigma e processo de resolução Para evitar possíveis repercussões inflacionárias a Europa já está a moldar a sua postura, deixando Putin perante uma oportunidade de alterar o curso dos acontecimentos sem ter necessariamente que voltar atrás na palavra ou assumir uma atitude de desistência. Estratégica ou não, a mensagem de fim de ano de Vladimir Putin, muito criticada pelo seu carácter optimista - quando disse que a crise estaria resolvida em apenas dois anos acabou por criar um efeito de viragem na situação. “É difícil de prever uma reviravolta na crise. O preço do petróleo é praticamente impossível de prever. Mas Putin está a fazer o seu papel, de optimista, já assumindo que 2015 vai ser um ano difícil”, disse à PNN Paulo Wrobel, investigador do BRICS Policy Center. .Ao ver a conjuntura agravar-se e medidas accionadas que não lhe correspondem, a comunidade internacional começa a pôr de lado a intenção mostrada até agora, de isolar o país. A almejada solução política para o leste Vladimir Putin Russia Presidential Press and Information Office A posição internacional perante os conflitos no leste da Ucrânia está a conhecer novos parâmetros neste início de 2015. Depois de consecutivas penalizações a Moscovo devido ao apoio disfarçado aos rebeldes pró-Rússia, o cenário económico alterou-se. No final de 2014 chegou a falar-se numa crise semelhante a 1998, com a acentuada queda do rublo e a descida a pique do preço do petróleo. Se primeiro houve quem pensasse que este enfraquecimento russo poderia ser a solução para a paz entre Moscovo e Kiev, o que se verifica agora é um certo receio de alastramento da crise entre os países europeus. Várias foram as tentativas de cessar-fogo violadas no leste da Ucrânia, originando uma consequente onda de sanções contra a Rússia por parte da Europa e dos EUA. Se Moscovo pensava ter formas de responder e contornar as repercussões que surgiriam das suas acções no leste europeu, não foi bem isso que se verificou. Apesar das ameaças de retaliação várias vezes proferidas por Vladimir Putin, nomeadamente dirigidas aos EUA, o que acabou por ficar provado foi uma grande incapacidade de resposta. Todavia, perante uma crise com contornos bem definidos e um Presidente que se mostra optimista e a não dar sinais de recuo - apesar da recessão prevista para 2015 ter chegado aos 4% - um cenário de graves consequências internacionais começa a comandar a situação. Russia Presidential Press and Information Office Rússia e o novo paradigma de acção europeu europeu parece estar a desenhar-se, prevendose finalmente um avanço significativo já para o encontro entre Vladimir Putin e Petro Poroshenko, marcado para 15 de Janeiro em Astana, Cazaquistão, no qual vão participar o Presidente francês, François Hollande, e a Chanceler alemã, Angela Merkel. Ao que se pode prever através das mais recentes considerações, será novamente a Europa a ceder. Mais de um ano de sanções impostas à Rússia pelas principais potências mundiais contribuíram fortemente para a desvalorização do rublo em quase 40% face ao dólar, durante 2014. Este difícil contexto em que se encontra Moscovo estará na origem da nova posição ocupada por França, que Password - Janeiro 2015 - Pág. 10 Password Rússia defende o “levantamento gradual” das penalizações financeiras. Também o líder dos socialistas alemães e segunda figura do Governo de coligação de Merkel, Sigmar Gabriel, deixou claro que a degradação da economia russa representa um perigo iminente para a economia mundial, reforçando a mensagem de uma posição mais condescendente por parte da Europa. “Não há muito que a Rússia possa fazer. Este tipo de afirmações tem um lado de retórica. Já houve, por exemplo, a proibição da importação de carne bovina, dos EUA e América em geral, o que afectou em parte o Brasil, mas trata-se de um produto de baixo valor agregado. Talvez possa proibir impotações de um ou outro produto, mas não pode fazer muito mais. Cumulativamente, a médio-prazo, as medidas poderiam até ter algum impacto”, explicou Paulo Wrobel. Apesar desta fraca capacidade da Rússia em responder e retaliar as sanções internacionais, a capacidade de resistência do seu Presidente parece conseguir gerar os resultados pretendidos. Não há muito que a Rússia possa fazer, mas já está a colher frutos por nada fazer quanto à crise. Encontro em formato de Normandia Há vários meses que é defendida uma “solução política” para o conflito do leste ucraniano. Apesar de nunca se ter efectivamente chegado a acordo e de continuarem as sucessivas violações de cessar-fogo, todas as partes envolvidas apontam a concertação política como a solução desejada. No entanto, os vários encontros já realizados entre Putin e Poroshenko, com os mais variados órgãos de mediação, nunca surtiram efeitos no respeito aos acordos de Minsk. “Chegar a acordo quanto à Ucrânia não é impossível mas é preciso haver vontade dos dois lados. Os combates continuam. O acordo é possível mas não vejo nenhum dos lados empenhado. A Rússia diz-se neutra mas está claramente a apoiar o leste”, referiu Paulo Wrobel. Esta situação difícil e imprevista acabou por depositar uma esperança renovada no próximo encontro em formato de Normandia, no qual países como a França e a Alemanha acabam por se tornar inesperadamente actores centrais para a concertação política entre Kiev e Moscovo. Na opinião do investigador do BRICS, “a crise financeira russa muda um pouco o quadro. Em primeiro lugar pode afectar a popularidade que Putin tem junto da população. Por outro lado, se o preço do petróleo se mantiver, é difícil que haja condições para Russia Presidential Press and Information Office Rússia e o novo paradigma de acção europeu Chanceler alemã, presidente ucraniano e Vladimir Putin evitar a recessão. Um poder autoritário tem que se legitimar de alguma forma. No caso da Rússia tem sido através do poder económico”. Estando Moscovo a atravessar um momento difícil na sua economia, seria expectável que esse enfraquecimento gerasse um recuo no leste da Ucrânia. Contudo, para resolver a crise económica, Putin terá apenas que dar provas de boa vontade sobre os conflitos no leste. Para François Hollande, o Presidente russo já disse aquilo que a Europa queria ouvir, quando, em conversa telefónica, afirmou que não tem a intensão de anexar a Ucrânia Oriental, mas “apenas” não quer o país na NATO. Risco de alastramento O leste europeu e os países emergentes são aqueles em que recai directamente o maior medo de repercussão da crise, aliado a efeitos secundários noutras economias, que poderão derivar dessa contaminação. Apesar da me- lhoria das perspectivas mundiais para este ano, sistemas económicos mais frágeis estão a representar um risco de asfixia para a expansão do Produto Interno Bruto (PIB) Golobal. Sendo membro do BRICS, o Brasil deverá sentir os efeitos desta crise em primeira instância mas, na opinião de Paulo Wrobel, o país enfrenta outro tipo de questões: “Em relação ao Brasil não me parece que estejamos perante uma crise como a de 1998, ao ponto de contaminar directamente a economia brasileira. Trata-se de uma crise muito específica da Rússia. O Brasil está a sofrer com a queda do real, está num período económico difícil, com escândalos de corrupção nunca antes vistos envolvendo a maior empresa brasileira. Este é que é o motivo. O Brasil pode, ou já está, a entrar num ciclo vicioso de inflação”. A situação de conflito na Ucrânia já não é o assunto mais mediático do leste europeu. Em vez disso, a crise cambial da Rússia e a descida inesperada do preço do petróleo passaram para o primeiro plano, definindo os parâmetros em que será resolvido o braço-de-ferro entre Kiev e Moscovo. Putin não quer a Ucrânia na NATO e a Europa não quer mais riscos económicos. Uma vez mais, a Ucrânia vê-se impotente na escolha do seu caminho. Todos os países envolvidos neste quesito são, pelo menos oficialmente, classificados como Repúblicas Democráticas, mas voltam a questionam-se os valores desta ideologia. Para Paulo Wrobel “a grande maioria dos conflitos foi baseada no território. A tomada da Crimeia mostra que os fundamentos da soberania são uma realidade que ainda aspiramos alcançar”. Password - Janeiro 2015 - Pág. 11