A prática off label e os riscos associados à terapia

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A PRÁTICA OFF LABEL E OS RISCOS ASSOCIADOS À TERAPIA
MEDICAMENTOSA SEM ORIENTAÇÃO MÉDICA
Marcos de Souza Pereira1
Carina Rau2
RESUMO
O medicamento off label é aquele utilizado, sem a aprovação da ANVISA, para doenças que
não as indicadas em bula. Este artigo teve como objetivo orientar a prática off label e alertar
quanto aos riscos associados que esta ação, comum entre os profissionais de saúde,
apresentando o uso off label sem orientação médica como prejudicial à saúde, tendo em vista
os danos imprevisíveis àquele que é prescrito. Além de compreender a prática off label
perante o Conselho Federal de Medicina (CFM), ANVISA e o Ministério da Saúde (MS);
como são definidas as indicações na bula do medicamento e a ação da Farmacovigilância. A
metodologia utilizada foi a revisão bibliográfica contemplando pesquisas em bases de dados.
Os resultados encontrados confirmaram a prática do uso de medicamentos off label na
medicina pediátrica, por não haver indicação de posologia ajustada às fases de
desenvolvimento da criança, contribuindo para o aumento de reações adversas nesse público
alvo. Confirmou-se que há substâncias indicadas, como a heparina, de ação anticoagulante do
sangue, usada em acidentes de queimadura que provou ser eficaz nesse evento. Por fim, o
estudo mostrou que há dois tipos de uso de medicamento off label, sendo que o primeiro
revela que substâncias não específicas para determinadas doenças podem ser benéficas e
sugere-se que a ANVISA autorize o uso, e o segundo, onde práticas não indicadas podem
trazer danos à saúde do paciente, devendo haver maior controle da Vigilância Sanitária.
Palavras-chave:
Medicamentos
Off
Label,
uso
indevido
de
medicamentos,
Farmacovigilância.
OFF LABEL PRACTICE AND ASSOCIATED RISKS WITH DRUG
THERAPY WITHOUT MEDICAL ADVICE
ABSTRACT
The off label drug is that used without the approval of ANVISA for diseases other than those
indicated on label. This article aims to guide off label practice and warn about the risks
associated with this common action among health professionals, with the off-label use
without medical supervision as harmful to health, given the unpredictable damage to that
which is prescribed. In addition to understanding the practice off label before the Federal
Council of Medicine (CFM), ANVISA and the Ministry of Health (MS), are defined as the
directions in the package leaflet and action of Pharmacovigilance. The methodology used was
the literature review covering research databases. The results confirmed the practice of off1
Aluno de Especialização em Vigilância Sanitária IFAR/PUC-GO, 2013. Graduação em Farmácia, pela
Universidade Unieuro, em 2011. E-mail: [email protected].
2
Orientadora: Farmacêutica Industrial pela Universidade Federal do Paraná-UFPR. Mestre em Ciências
Farmacêuticas pela UFPR. E-mail: [email protected].
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label drug use in pediatric medicine, as there is no indication dosage adjusted to the stages of
child development, contributing to the increase in adverse reactions that target audience. It
was confirmed that no substances indicated as heparin anticoagulant for blood, used in burn
injury that has proven effective in this event. Finally, the study showed that there are two
types of off-label use of medication, the first of which shows that non-specific substances may
be beneficial certain diseases and it is suggested that ANVISA authorizes the use and the
second, where the practices not listed may bring harm to the health of the patient, should be
more control of the Sanitary.
Keywords: Off Label Drugs. Misuse of drugs. Pharmacovigilance.
1 INTRODUÇÃO
Cada medicamento registrado no Brasil possui aprovação da Agência Nacional de
Vigilância Sanitária (ANVISA), órgão regulador vinculado ao Ministério da Saúde. Dentre
suas atribuições indelegáveis estão o registro de medicamentos, visando o bem-estar físico,
mental e social da sociedade brasileira, promovendo seu bem estar e saúde. Para que sejam
aprovadas as suas indicações, são necessárias que sejam comprovadas a qualidade, eficácia e
segurança desse medicamento baseando-se em avaliações de estudos clínicos que
comprovem, mais especificamente, os dois últimos requisitos citados acima (ANVISA, 2005).
Contudo, existe uma prática paralela ao uso desse medicamento. A Organização
Mundial da Saúde (OMS) conceitua medicamentos off label como todas as indicações usuais
que não foram descriminadas em bula ou que ainda não possuam sua indicação aprovada pela
agência reguladora para o fim no qual foi destinado. Nos EUA, o uso off label é uma prática
legal. Porém, o FDA (Food and Drugs Administration) regulamenta a comercialização de
medicamentos que ainda não possuam estudos aprovados para as indicações prescritas por
profissionais de saúde (DAL PAN, 2009).
Segundo a ANVISA, a prática off label é todo medicamento administrado sob
orientação médica fora da indicação prevista em bula, seja a administração de medicamentos
por vias diferentes da recomendada ou doses elaboradas por especialidade e práticas não
usuais de posologias (ANVISA, 2005). Para o Ministério da Saúde (2012), o uso off label
apenas se justifica quando as indicações estiverem apresentadas em estudos científicos com
perfis comparativos, apresentando custo-benefício além de eficácia, efetividade e segurança
na sua indicação.
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A prática off label pode elevar os riscos de danos à saúde, portanto, não tem aprovação
da agência reguladora brasileira. Embora a prática não seja incorreta, são necessários anos de
estudos e ensaios clínicos para então se concluir uma nova indicação de um medicamento. É
comum que possam existir novas indicações para os medicamentos existentes no mercado,
mas para sua aprovação, será obrigatória a sua comprovação científica por meio dos
resultados apresentados à ANVISA que, por sua vez, terá o poder de decisão no deferimento
ou no indeferimento dessa petição (ANVISA, 2005).
Portanto, este trabalho visa orientar a prática de indicações off label, além de alertar
sobre os riscos à sociedade quanto ao seu uso sem orientação médica. A prática off label tem
sido utilizada com muita frequência por médicos, principalmente da área pediátrica. Embora o
seu uso, mesmo que consciente, pelo profissional de saúde não seja totalmente aprovado, é
uma prática comum entre eles. A indicação que difere das posologias e vias de administração
de medicamentos que ainda não estão descriminados em bulas, não possuem estudos
científicos comprovados e aprovados pelo órgão regulatório responsável pelos registros dos
produtos da indústria farmacêutica.
Este estudo propõe orientar as pessoas que desconhecem a prática off label e alertar
quanto aos riscos associados a esta prática comum entre os profissionais de saúde,
apresentando o uso off label sem orientação médica como prejudicial à saúde, tendo em vista
os danos imprevisíveis àquele que é prescrito.
Já especificamente, o objetivo deste trabalho é compreender a prática off label perante
o Conselho Federal de Medicina (CFM), ANVISA e o Ministério da Saúde (MS); como são
definidas as indicações na bula do medicamento; Farmacovigilância; e o uso da prática off
label pela medicina e os riscos associados.
2 METODOLOGIA
É um estudo qualitativo, descritivo, documental e de caráter retrospectivo, por meio de
pesquisa bibliográfica, coleta de dados em base de dados da Biblioteca Virtual de saúde
(BVS), como Bireme (Biblioteca Regional de Medicina), Lilacs (Literatura Latino-Americana
e do Caribe em Ciência da Saúde), Scielo Brasil (Scientific Electronic Library Online).
Utilizaram-se os seguintes descritores constantes no DeCS (Descritores em Ciências da
Saúde): Off label; Medicamentos Off Label; Medicamentos reações adversas, que se
relacionavam à Farmacovigilância, Farmacoterapia, uso indevido de medicamento. Nos dois
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primeiros descritores, houve incidência de artigos publicados na língua inglesa, nenhum
achado em português.
Para o termo Off Label, realizou-se a pesquisa em ambiente livre da internet em
periódicos não categorizados na BVS. A pesquisa às bases de dados ocorreu entre os meses de
junho e julho de 2013.
Segundo Ferrão (2005), “a pesquisa bibliográfica é baseada na consulta de todas as
fontes secundárias relativas ao tema que foi escolhido para a realização do trabalho”. Esse
tipo de pesquisa, de acordo com o autor, busca explicar um problema, fundamentando-se
apenas nas contribuições secundárias, como materiais de apoio de diversos autores para
fundamentar o referencial teórico permitindo-se a análise, interpretação, confronto de
informações e elaboração de novas conclusões, a fim de buscarem-se mais contribuições
acerca do tema.
3 RESULTADOS
3.1 Leis e Diretrizes
A incorporação de medicamentos para tratamento de doenças em um determinado país
se dá por meio da existência de órgãos competentes para poder exercer a vigilância e o
controle desses a sua população. E para a introdução de novos medicamentos, existem as
comissões, criando-se uma rede multidisciplinar, como, no caso do Brasil.
3.1.1 Órgãos competentes
No país, em âmbito federal, existe o Sistema Único de Saúde (SUS), vinculado ao
Ministério da Saúde (MS), que compreende a Comissão Nacional de Incorporação de
Tecnologias no SUS (CONITEC), cuja atribuição é a de incluir, alterar ou excluir novos
medicamentos, produtos e procedimentos na saúde pública, além de promover a constituição
ou alteração de protocolos clínicos ou diretrizes terapêuticas. O Decreto nº 7.646, de 21 de
dezembro de 2011, dispõe sobre a composição, competências e funcionamento da CONITEC
(BRASIL, 2011).
Compõe também a rede multidisciplinar, instituída pela Portaria nº 2.915, de 12 de
dezembro de 2011, a Rede Brasileira de Avaliação de Tecnologias em Saúde (REBRATS), a
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qual deve adotar os princípios da Política Nacional de Ciência, Tecnologia e Inovação em
Saúde (PNCTIS), além da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), que é o
órgão regulador de todo medicamento disponível no país para tratamento de doenças (SÃO
PAULO, 2013). Já em nível intersetorial, existem as Comissões de Farmácia e Terapêutica,
no âmbito hospitalar e que atendem aos Estados e Municípios (MINISTÉRIO DA SAÚDE,
2012).
3.1.2 Condutas profissionais e orientações dos conselhos na prática off label
Além de todo esse arcabouço legal, existe ainda a regulamentação por parte dos
Conselhos Federais de Medicina, Enfermagem e Farmácia, cujas atribuições dizem respeito às
condutas profissionais e éticas de cada classe dos prestadores de serviços de saúde quando da
prática e uso de medicamentos off label (SÃO PAULO, 2013).
O Código de Ética do Conselho Federal de Medicina (CFM), por meio da Resolução
CFM nº 1.931/09, capítulo XII, autoriza a prática off label desde que os médicos observem o
que determinam o parágrafo abaixo:
Parágrafo único. A utilização de terapêutica experimental é permitida quando aceita
pelos órgãos competentes e com o consentimento do paciente ou de seu
representante legal, adequadamente esclarecidos da situação e das possíveis
consequências (CFM, 2009).
Quanto aos profissionais de enfermagem, esses estão regulamentados pela Lei nº
7.498/86, a qual trata sobre as competências do enfermeiro em exercer consulta de
enfermagem e prescrição de assistência de enfermagem (art.11) livre de riscos devidos à
imprudência, negligência e imperícia, além da conduta ética contida na Resolução COFEN nº
311/2007, a qual especifica, no art. 10, a recusa de execução de atividades que não ofereçam
segurança ao profissional, à família e à coletividade em práticas proibidas em “administrar
medicamentos sem conhecer a ação da droga e sem certificar-se da possibilidade de riscos”
(art. 30) e de “executar prescrição de qualquer natureza que comprometam a segurança da
pessoa” (art. 32) (COFEN, 2007).
Quanto ao profissional farmacêutico, também encontra-se a regulamentação da prática
profissional na Resolução 417/04, do Conselho Federal de Farmácia (CFF) ao qual diz que “o
farmacêutico deverá adotar postura científica perante as práticas terapêuticas alternativas, de
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modo que o usuário fique bem informado e possa melhor decidir sobre a sua saúde e bemestar” e quanto às proibições é vedado:
Art.13
III. praticar procedimento que não seja reconhecido pelo Conselho Federal de
Farmácia;
IV. praticar ato profissional que cause dano físico, moral ou psicológico ao usuário
do serviço, que possa ser caracterizado como imperícia, negligência ou imprudência;
[...]
VIII. produzir, fornecer, dispensar, ou permitir que seja dispensado meio,
instrumento, substância e/ou conhecimento, medicamento ou fórmula magistral, ou
especialidade farmacêutica, fracionada ou não, que não contenha sua identificação
clara e precisa sobre a(s) substância(s) ativa(s) contida(s), bem como suas
respectivas quantidades, contrariando as normas legais e técnicas, excetuando-se a
dispensação hospitalar interna, em que poderá haver a codificação do medicamento
que for fracionado, sem, contudo, omitir o seu nome ou fórmula;
[...]
XV. expor, dispensar, ou permitir que seja dispensado medicamento em
contrariedade à legislação vigente (CFF, 2004).
Encontra-se na Resolução RDC nº 47, de 08 de setembro de 2009, a determinação do
documento oficial que permite a utilização e características dos fármacos: “a bula é o
documento legal sanitário que contém informações técnico-científicas orientadoras sobre os
medicamentos para o seu uso racional” (BRASIL, 2009).
Portanto, havendo dissonâncias quanto à finalidade sobre o uso de um medicamento
divergentes das que constam na bula desse registrado junto à ANVISA é considerado off
label, não tendo o aval do órgão sanitário. Nesse caso, é de inteira responsabilidade do
médico assistente que utilizou ou prescreveu o medicamento, devendo esse estar em comum
acordo com o paciente, ou seu representante para utilizá-lo de forma experimental.
3.2 O Medicamento Off Label e suas Características
Todas as comissões analisam e dão seus pareceres, favoráveis ou não, em
conformidade com os critérios adotados pela ANVISA e do registro feito por essa como
requisito para a incorporação de determinado medicamento como nova tecnologia. Contudo,
muitas vezes, existem situações em que o medicamento apresenta evidências fortes e robustas,
com efeitos colaterais mínimos e custo vantajoso, porém não possui a aprovação da ANVISA.
Quando a indicação para determinado tratamento não consta em sua bula, esse medicamento é
chamado de off label. Este fato pode ocorrer pelo fato de o medicamento ser indicado e
utilizado em outra faixa etária que a não indicada, além de outra via de administração, dose e
frequência, ou devido ainda às contraindicações (RODRIGUES; PINHO, 2013).
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Dessa forma, há a necessidade de se incorporarem estudos e pesquisas que evidenciem
a eficácia e segurança para o uso desse medicamento em determinadas doenças, sendo que o
seu uso já é padronizado e regulamentado em outras indicações, além de se buscarem
alternativas viáveis ou considerar a gravidade da doença (PAULA et al., 2011).
Outro problema que se apresenta é quando não existe determinado medicamento
autorizado no país, devendo importá-lo, pois corre-se o risco de deixar de serem tratadas
doenças tais como a Doença de Wilson, cujo tratamento não está disponível no Brasil
(MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2012).
Há também outra dificuldade para que tal situação aconteça ao não se incorporarem
determinados medicamentos por questões econômicas, haja vista que a solicitação da
autorização de registro se dá pelo interesse da empresa fabricante, tendo de comprovar
estudos randomizados e apresentar o custo-benefício, pode levar ao desinteresse comercial do
mercado ou acordarem entre empresas já incorporadas a tecnologia, reduzindo-se assim a
concorrência (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2012).
Por isso, existe um entendimento pejorativo em relação ao termo off label, pois esse
deveria ser utilizado somente ao uso irrestrito e inseguro, sem evidências, de determinados
medicamentos. Enquanto que a prática de incorporar ou prescrever determinado medicamento
já cientificamente comprovado, que não tem registro ou por razões de mercado, deveria ser
aceita, segundo o Ministério da Saúde (2012).
3.2.1 Acontecimentos adversos por medicamentos
A associação de medicamentos off label estão sempre relacionadas ao tema sobre
reações adversas. Rodrigues e Pinho (2013) alertam sobre os acontecimentos adversos por
medicamento (AAM) serem um problema de saúde pública pelos vários problemas advindos
com o seu uso ou a falta desse. Classificam os acontecimentos como não preveníveis, como as
reações adversas a medicamentos (RAMs) e os preveníveis, causados por erro de medicação
ocorrido na cadeia terapêutica medicamentosa.
Outro fator importante a ser revelado trata-se de determinados fatores de riscos
encontrados na utilização de medicamento off label quanto à faixa etária. Segundo Noblat et
al. (2011), na maioria dos casos de RAMs há o uso de prescrições que atingem crianças e
adolescentes, além de idosos, devido às “[...] alterações fisiológicas que determinam
mudanças farmacocinéticas e farmacodinâmicas nesses grupos etários”.
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Rodrigues e Pinho (2013) realizaram um estudo em um hospital de ensino,
constatando-se o uso indevido de medicamentos não aprovados ou não autorizados para uso
pediátrico, cuja utilização pode levar a AAM evitáveis, como as interações medicamentosas,
pois os pacientes hospitalizados geralmente são submetidos à polifarmacoterapia e esse fator pode
predispor à ocorrência de interação medicamentosa indesejável.
As autoras revelam que isso acontece quando há “[...] diferentes métodos de
administração, posologia, preparação, armazenamento, agentes de diluição e tempo de
estabilidade de algumas preparações”, principalmente quando há a administração intravenosa
(IV) para crianças utilizando-se fármacos destinados a adultos (RODRIGUES; PINHO, 2013).
Noblat et al. (2011) realizaram em quatro hospitais de Salvador/BA uma pesquisa sobre
internação de pacientes diagnosticados com RAMs sendo admitidos 212 pacientes, ocorrência de
316 tipos de reações e internação média de aproximadamente oito dias. A maioria dos tipos de
RAMs foi do tipo A, “[...] reações dose-dependentes de alta morbidade e baixa mortalidade,
portanto previsíveis, mas nem sempre evitáveis”, sendo uma das possíveis explicações para a
recuperação dos pacientes sendo que desses, um veio a óbito por acidente vascular cerebral
(AVC) quando do uso de warfarina (NOBLAT et al., 2011, p.43).
3.2.2 Vantagens e desvantagens da medicação off label
Paula et al. (2011) esclarecem que a medicação off label em pacientes infanto-juvenil tem
consequências, pois o médico prescreve uma medicação adulta para um paciente pediátrico,
baseando-se apenas na condição de peso, o que pode ser considerado pouco seguro quando não se
tem o suporte e informação concreta para a indicação. Isso leva à insegurança e dilema por parte
dos prescritores, haja vista que sem informações sobre a segurança e eficácia pode haver
complicações devido às RAMs, porém, deixar o paciente sem terapêutica também pode ser
prejudicial, sendo essa imprescindível em alguns casos.
Paula et al. (2011) explicam as vantagens e desvantagens do uso off label:
A liberdade de prescrição médica, bem como a opção pelo uso off label, pode
conduzir a vantagens importantes, como permitir inovação na prática clínica
(particularmente quando o tratamento aprovado não foi eficaz), fornecer aos
pacientes e médicos acesso precoce a medicamentos potencialmente valiosos e
permitir aos médicos a adoção de novas práticas baseadas em evidências emergentes
e, em alguns casos, pode ser a única opção disponível para certas condições. Ao
mesmo tempo, essa liberdade possui algumas desvantagens, como a falta de
avaliação completa sobre segurança e eficácia para determinada condição clínica e
os altos custos, além de não incentivar a realização de estudos mais rigorosos pelo
fabricante e expor o paciente aos riscos de eventos adversos.
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Pelo entendimento visto nos autores, é válido tentar um acerto haja vista os benefícios que
podem trazer, contudo, deve haver cautela e atenção redobrada para que o mal não seja maior do
que o benefício, mas não se deve ficar passível sabendo-se que, muitas vezes, o erro pode levar ao
acerto e na ciência é por meio dos experimentos que se conseguem realizar grandes feitos.
3.3 Fatores Externos que Levam ao Uso de Medicamentos Off Label
Paula et al. (2011) realizaram um estudo na Secretaria de Saúde do Estado do Paraná,
em pedidos advindos da justiça para o fornecimento de medicamentos por ordem judicial no
ano de 2008, sendo encontradas 934 solicitações. Foram analisados os pedidos em que havia
indicação prescrita diferente na faixa etária correspondente na população pediátrica, com
idade entre 0 e 18 anos, consultando-se as bases Drugex System (recomendações aprovadas
pela FDA) e a ANVISA (consulta a bulas de medicamentos registrados no Brasil).
Os autores copilaram os dados com base nessas fontes de pesquisa a fim de
identificarem se esses órgãos mantinham padronização das aprovações, e consideraram off
label as indicações divergentes das recomendadas. Foram encontrados nessas solicitações, o
percentual de 22,53% de uso off label considerado pela FDA e 26,79% considerados pela
ANVISA, havendo maior intercorrência na faixa etária de 0 a 5 anos, sendo um dado
preocupante e que também confirma a maior apreensão por saber que essa faixa é mais
vulnerável.
Como justificativa, os autores acreditam que, na maioria das vezes, este uso off label é
devido a muitos prescritores desconsiderarem as recomendações e advertências em bulas
sobre o uso indevido em crianças; além de existirem casos graves com risco de morte de
pacientes que se encontram hospitalizados sem resposta à terapia convencional ou sem opções
terapêuticas.
3.4 Usos de medicamentos Off Label
3.4.1 Toxina botulínica
Como exemplo, trata-se da análise e parecer da CONITEC sobre o uso da toxina
botulínica (TXB) em pacientes com síndrome da bexiga hiperativa. O uso da toxina botulínica
é autorizado pela ANVISA para tratamento das seguintes doenças: estrabismo e
blefarospasmo associado com distonia, incluindo blefarospasmo essencial benigno ou
distúrbios do VII par craniano em pacientes com idade acima de 12 anos; distonia cervical;
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espasmo hemifacial; espasticidade muscular; linhas faciais hipercinéticas; hiperidrose focal
palmar e axilar; incontinência urinária causada por hiperatividade neurogênica do músculo
detrusor da bexiga, não tratada adequadamente por anticolinérgicos; profilaxia em adultos de
migrânea crônica - enxaquecas crônicas e refratárias (CONITEC, 2012).
No parecer da CONITEC, o uso não foi aprovado porque a empresa fabricante do
medicamento apresentou quantitativo de estudos insuficientes para confirmação da eficácia no
tratamento da doença. As doses recomendadas na bula do medicamento de 200U de TXB
também não foram evidenciadas nos estudos, havendo divergências entre os estudos
apresentados pela empresa e da pesquisa realizada pela CONITEC, pois os resultados foram
melhores em dosagens mais baixas (100 a 150U), e nas doses de 300U, as reações causadas
foram mais relatadas, como infecção do trato urinário e dor no local da injeção, retenção
urinária, fraqueza muscular, dor pélvica e disúria. A não recomendação se deu por causa da
correlação das duas análises, onde não fica evidenciada a relação custo/benefício para o
paciente.
Nos estudos realizados houve a conclusão da eficácia da TXB em relação ao placebo,
e pacientes que receberam doses repetidas não se tornaram refratários ao medicamento,
havendo evidência de que seria efetivo o tratamento a pacientes não respondedores ou
intolerantes a tratamentos usuais, como anticolinérgicos, porém estes não estão disponíveis no
SUS. Para a aprovação da TXB em pacientes com bexiga hiperativa, há a recomendação da
comissão para que o MS investigue todas as tecnologias, inclusive a toxina botulínica.
3.4.2 Uso off label em pediatria
Paula et al. (2011), já citados acima, também relataram o uso de medicamentos não
aprovados em pediatria (23,33%). Trata-se da sildenafila que é indicada no tratamento da
disfunção erétil e hipertensão arterial pulmonar (HAP) em pacientes adultos, mas que são
utilizados em pacientes pediátricos com HAP por sua gravidade e possibilidade de
mortalidade elevada.
Tonello et al. (2013) realizaram uma pesquisa em uma unidade pediátrica hospitalar
entre 2006 e 2007, no RS, investigando 382 prontuários de crianças, com média de uso de até
quatro medicamentos por pacientes, observando-se a faixa etária entre 0 e 11 anos.
O cálculo para diluição dos medicamentos foi feito com base em prescrições acima e
abaixo das recomendadas pelas bulas e pelo cálculo do peso da criança, à exceção da
penicilina potássica que se calcula pela idade da criança, e 117 prontuários não registraram o
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peso da criança. As autoras analisaram as condições de diluição e as características físicoquímicas do fármaco, comparando-as ao que recomenda-se em manuais, observando o
volume, tipo, reconstituição e/ou diluição e estabilidade da preparação e concluíram que “[...]
o procedimento de diluição é realizado com volume fixo e um único tipo de diluente para
todos os fármacos, sendo que o volume dos pós não é considerado no ajuste do volume final
de reconstituição.” (TONELLO et al., 2013).
Nesse estudo, os achados foram contundentes e houve a preocupação dos autores em
divulgar os resultados para a direção sugerindo mudanças para a prevenção e o controle da
prescrição e diluição, haja vista cada medicamento ter características próprias e não
padronizações quando há indicação de uso profilático na clínica pediátrica. Houve a sugestão
de maior atuação do farmacêutico e treinamento para a equipe de saúde.
Entre 2005 e 2006, Rodrigues e Pinho (2013), já citadas anteriormente, realizaram
uma pesquisa em uma unidade pediátrica de um hospital de ensino, no DF, com 110
prescrições a pacientes pediátricos entre um e 12 anos de idade. As autoras também analisaram
as indicações dos medicamentos e houve maior prevalência para os do sistema nervoso
(analgésicos, antipiréticos e antipiléticos); dos anti-infecciosos para uso sistêmico; do aparelho
digestivo e metabolismo; sistema musculoesquelético; sistema cardiovascular e preparados
hormonais sistêmicos e hormônios sexuais. Foram encontrados nos estudos das 110 prescrições, o
uso de medicamentos não aprovados no total de 101 (91,8%), com maior incidência de
dipirona em 58 pacientes e ranitidina em 16, e não padronizados ou off label no total de 57
(51,8%) prescrições com maior incidência de paracetamol em 54 pacientes e nistatina em 3
desses.
Ao finalizarem o estudo, as autoras destacam o grande problema havido quando da
medicação na clínica pediátrica sobre “o sério dilema da padronização de medicamentos em
pediatria é reconhecido desde 1968 referindo-se como “órfão da terapêutica medicamentosa”
devido à utilização de medicamentos cuja informação procede de estudos realizados em adultos.”
(RODRIGUES; PINHO, 2013, p.1625).
Fato esse, segundo as autoras, que levou à indicação de maior aprofundamento por parte
dos experimentos pelas agências financiadoras e dos laboratórios para que se alcancem a
prescrição correta a partir da análise do perfil do paciente, além do envolvimento do farmacêutico
com a equipe de saúde, destacando-se a necessidade de haver, nas unidades de tratamento, o
programa de farmacovigilância e, quando houver AAM, que seja notificada aos órgãos
competentes, para que sirva como fonte de investigação a fim de buscar soluções eficazes
prevenindo riscos ou danos não intencionais.
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3.4.3 Uso off label em adultos com anuência médica
Barreto et al. (2010) apresentaram um estudo randomizado em 58 pacientes vítimas de
queimaduras e houve o tratamento convencional e o com heparina tópica. Os autores
revelaram que a prática desse tratamento é bem antiga, porém não é oficializada e pouco
divulgada, haja vista que a heparina tem efeitos e indicações para ações anticoagulantes.
Segundo os autores, provavelmente sua ação sobre queimaduras se dá por propriedades antiinflamatórias e angiogênicas além de sua ação liquidificante do sangue. Em estudo com
animais provou-se a sua eficácia no tratamento.
Sendo assim, conduziram esse estudo em três centros especializados, no Brasil, em
pacientes vítimas de “[...] queimaduras de 2º grau em 10% a 30% da superfície corpórea
causadas por fogo ou escaldo e atendidos até 48 horas após o acidente”. A análise foi feita em
um grupo de 38 pacientes que atenderam os requesitos e procedimentos especificados.
Estabeleceu-se que em um grupo de cada 4 pacientes, 2 receberiam tratamento convencional
(C) (receberam balneoterapia e curativos com sulfadiazina de prata trocados sob analgesia
com periodicidade definida por cada centro conforme autorizado pelo protocolo) e 2
receberiam tratamento com heparina tópica (HT) (ferimentos deixados abertos e
administração de 4.200 UI de heparina em spray para cada 1% de superfície corpórea afetada
três vezes ao dia, até a formação das crostas).
Os resultados apontados por Barreto et al. (2010) comprovaram a eficácia de
superioridade analgésica e cicatrização com o tratamento da heparina nos pacientes tratados e,
como benefícios, redução no custo no tratamento, além dos benefícios à saúde do paciente.
Evocam ainda, que se façam mais estudos para vir a ser aprovada definitivamente no
tratamento estudado, melhorando a qualidade de vida e oficializando a prática.
Outro estudo interessante foi visto em Carlini et al. (2009) sobre o uso de fármacos
como a fluoxetina associada a processos de emagrecimento, evidenciando-se a prática off
label perigosa para a saúde. Nesse estudo, os autores apontam que a fluoxetina é eficaz para o
tratamento dos sintomas da depressão humana e pode ocasionar diversas reações no
organismo. Essa droga tem associação com 62 reações adversas constantes em sua bula, e
muitas são graves, inclusive, em estudos comprovados, podendo levar ao suicídio.
Os autores ainda enumeram onde a droga pode agir causando algumas reações em
sistemas
do
organismo,
destacando-se
o
cardiovascular;
respiratório;
digestório;
hematológico; endócrino/metabólico; neurológico; hepático; renal/urogenital e distúrbios
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psiquiátricos. Como observado, essa substância é muito perigosa, ainda mais quando estudos
demonstram que sua associação com outras 94 substâncias, dentre elas, alprazolam,
amoxapina, acido acetilsalicílico, carbamazepina, desipramina, diazepam, diclofenaco,
dipirona, Ginkgo biloba, fenitoína, sibutramina, zolpidem podem causar danos ao organismo
e destacam que uma das reações adversas é a perda de peso, por isso, essa droga tem sido
usada no tratamento da obesidade indiscriminadamente.
Para a confirmação do uso indevido, Carlini et al. (2009) realizaram uma pesquisa de
campo entre os meses de agosto de 2005 a julho de 2006, numa cidade do interior de São
Paulo, com 73 farmácias (magistrais ou de manipulação em fórmulas criadas pelo médico)
das quais, 28 manipulavam substâncias controladas, e 135 drogarias (medicamentos
acabados) das quais, 53 dispensam medicamentos controlados, por meio das receitas aviadas
considerando as características de prescrição e dispensação da fluoxetina.
O estudo pesquisou estabelecimentos nas diversas regiões da cidade e, das 28
farmácias autorizadas, foram analisadas 13 (46%), com um total de 16.124 receitas especiais
e, das 53 drogarias, foram analisadas 27 (51%), com um total de 23.658 receitas, também
especiais, perfazendo o total de 39.782 documentos identificados.
A análise compreendeu a presença da fluoxetina, associação a outros princípios ativos
e o sexo do adquirente, extraindo-se os resultados das farmácias, e o uso da fluoxetina chegou
a 27,4%. Quanto ao perfil do paciente, Carlini et al. (2009) afirmaram que nas farmácias,
87,2% das receitas foram fornecidas por mulheres, já nas drogarias, o percentual encontrado
de prescrições por mulheres foram 79,8%, comprovando a alta incidência de uso dessa droga
para as mulheres, num total de 86% contra 14% em relação aos homens.
Quanto à associação da fluoxetina com outras substâncias, o estudo revelou que, nas
drogarias, essa não ocorreu, sendo consideradas prescrições monodrogas. Já nas farmácias,
encontrou-se entre 4 e 7 diferentes associações, inclusive, em uma prescrição encontrou-se o
absurdo de 22 substâncias e as mais psicoativas utilizadas foram benzodiazepínicos (em
62,5% das prescrições), anoréticos anfetamínicos (femproporex, amfepramona e mazindol em
45,8%), além de substâncias como extratos de plantas medicinais, hormônios, diuréticos,
laxantes, vitaminas, metais, sais minerais, entre outros.
Os autores concluíram, após estudos, que essas associações e o uso da fluoxetina estão
interligados com o objetivo de redução de peso, haja vista que para o tratamento da depressão,
essas drogas não terem efeito e nem indicação, e a proporção de mulheres com depressão não
justifica o número de prescrições. Não há, tanto na legislação brasileira, quanto pela FDA
autorização para essa interação medicamentosa denominada, por muitos, como fórmulas de
14
emagrecimento, o que pressupõe-se que, por contas das reações adversas causadas já
analisadas como ideação suicida, bruxismo, elevação das enzimas hepáticas, hiperglicemia,
alucinação, metrorragia, sintomas extrapiramidais, amenorreia, tremores, além do consumo
ser maior para mulheres, que fórmulas disfarçadas podem causar mais efeitos indesejáveis e
perigosos à saúde.
Guimarães et al. (2006) realizaram um estudo randomizado em 35 pacientes
categorizados com obesidade mórbida (associado a comorbidades como dislipidemia,
hipertensão, diabetes, osteoartrite e apneia do sono) não reagentes a outros tratamentos e que
participaram de um programa de reeducação alimentar por 6 meses, mas que não obtiveram
resultados satisfatórios. Estes pacientes tinham idade entre 18 e 51 anos, divididos em quatro
grupos, utilizando substâncias como a metformina, fluoxetina, sibutramina e placebo.
As três substâncias utilizadas
foram a sibutramina, que é uma drogra
simpaticomimética, inibe a recaptação de serotonina e norepinefrina, é indicada no tratamento
da obesidade e para o grupo indicou-se a dose de 15mg/dia. A fluoxetina, indicada para
tratamento da depressão, atua especificamente por intermédio do bloqueio na recaptação da
serotonina, que acredita-se atuar na capacidade de reduzir a ingestão de alimentos por inibir a
ação do neuropeptídeo Y, por isso sua utilização em dietas de emagrecimento, e no grupo
específico foi administrado 60mg/dia.
A metformina, cuja indicação é para o tratamento de diabetes mellitus tipo 2, age na
diminuição da produção de glicose pelo fígado e aumento da absorção periférica dessa,
elevando o número de receptores da insulina. Não se conhece o porquê da ação da metformina
na redução de peso, mas acredita-se que a redução da resistência à insulina promove algumas
mudanças no equilíbrio de energia que poderia reduzir a necessidade calórica diária do
indivíduo e, consequentemente, um menor consumo de alimentos. No grupo tratado com essa
substância administrou-se dose diária de 1700mg/dia. No quarto grupo, foi administrado
placebo com dose diária de 3 comprimidos.
Guimarães et al. (2006) monitoraram os pacientes em entrevistas durante 90 dias,
realizando avaliações antropométricas, metabólicas e dinâmicas, analisando proporções de
peso, altura, circunferência abdominal e pressão arterial. Os resultados encontrados sobre a
ação da fluoxetina comprovou maior redução no IMC (11%), peso (10%), circunferência
abdominal (11%) e tecido adiposo (13%). Houve elevação de HDL-colesterol (25,8%) e uma
redução nos níveis de triglicérides (28,3%). No caso da sibutramina, os resultados
apresentaram redução da circunferência abdominal (8%) e redução de 10% em tecido adiposo.
A metformina reduziu o IMC (4%), circunferência da cintura (7%), HOMA (23,5%) e pressão
15
arterial. Quanto ao grupo que recebeu placebo os resultados mostraram um aumento
significativo nos níveis de insulina (95%).
Quanto aos efeitos colaterais do grupo da sibutramina, foram relatados secura da boca
(79%), constipação (42%), sudorese (46%), insônia (21%) e dor de cabeça (17%). No grupo
metformina, os principais efeitos colaterais relatados foram diarréia (46%), secura da boca
(38%), sudorese (29%), vertigem (29%), náusea (25%) e alterações no paladar (21%). No
grupo de fluoxetina, as reações adversas mais relatadas foram anorexia (93%), insônia (30%),
sonolência (30%), náusea (15%) e disfunção sexual (11%), enquanto que no grupo placebo, as
reações adversas mais comumente relatadas foram anorexia (13%), sede (7%) e diarréia (7%).
O resultado final, na análise dos autores, indicou que a fluoxetina foi mais eficaz na
redução do IMC no grupo que a recebeu, mudando a classificação do IMC de moderadamente
obeso para ligeiramente obeso, houve redução no grupo da sibutramina, mas não tão
significativa, e na média geral, o índice IMC foi de 29,8% kg/m2, passando os pacientes do
estado de obesos para pacientes com excesso de peso, promovendo uma melhora geral no
quadro. As reduções nos grupos metformina e placebo foram poucas, não alterando o IMC.
Nos grupos que receberam fluoxetina e sibutramina não houve redução significativa
no peso corporal (entre 5 a 15%), mas que devem ser considerados como benefício para o
controle de desenvolvimento de outras complicações em relação à obesidade, como diabetes
tipo 2, hipertensão e dislipidemias. Em relação à pressão alta, verificou-se no grupo dos que
receberam sibutramina, um aumento não significativo da pressão arterial diastólica, mas que
necessita ser observada e controlada e, se indicada indiscriminadamente, pode comprometer e
trazer riscos à saúde.
Ao compararem-se os estudos realizados por Carlini et al. (2009) com os de
Guimarães et al. (2006) sobre as vantagens e desvantagens do uso da fluoxetina em
tratamentos para emagrecimento pode-se inferir que, desde que não haja interação
medicamentosa e mantendo-se estudos controlados e avaliação constantes dos efeitos da
fluoxetina por meio de exames e condutas; essa poderá ser uma opção benéfica no controle da
obsidade mórbida, melhorando significativamente a qualidade de vida daqueles que sofrem
dessa doença.
3.4.4 Uso recreativo ou não convencional de medicamento pela população
Mota et al. (2010) realizaram um estudo, entre julho e agosto de 2005, sobre o uso
abusivo do cloridrato de benzidamina no Brasil. Os autores informam que as indicações dessa
16
substância são para o tratamento de “[...] estados inflamatórios, tumefações edematosas de
origem cirúrgica, traumática ou inflamatória e adjuvante no tratamento de dores musculares e
articulares”, além de possíveis indicações para ações antimicrobianas. No caso de reações
adversas ou uso abusivo do medicamento podem “[...] causar agitação, ansiedade, alterações
visuais, alucinação e convulsão. Casos de falência renal, associados à superdosagem com
medicamentos anti-inflamatórios não esteroidais, [...] bem como agranulocitose, pancitopenia
e coagulopatia.”, seu uso não deve ser prolongado e deve ser controlado devido aos elevados
efeitos colaterais, não se recomenda seu uso para pacientes com problemas de epilepsia e
psiquiátricos.
Os autores relataram que em 11 farmácias pesquisadas a venda do medicamento
aparentou normalidade e, em 2, houve demanda maior. Os autores também correlacionaram
na revisão bibliográfica realizada em jornais e revistas da internet, relatos sobre o uso da
substância para efeitos alucinógenos, como uso recreativo, por jovens, dos remédios
Flogoral®, Benflogim® e Benzitrat® associados às bebidas alcoólicas. Quanto às pesquisas
realizadas nos centros de toxicologia, no período entre 2002 a 2005, houve o registro de
intoxicação por cloridrato de benzidamina em três dos sete existentes em São Paulo,
perfazendo um total de 105 casos.
Os efeitos alucinógenos causados no organismo pela utilização da benzidamina de
modo recreativo e em altas doses, segundo Guimarães et al. (2010), são:
[...] aumento da produção de dopamina no cérebro. Esse neurotransmissor acelera a
atividade do sistema límbico, que controla funções como memória e emoções. Como
consequências, as experiências armazenadas na memória afetiva vêm à tona de
maneira deformada, o que provoca a percepção alterada da realidade. O usuário
sofre alucinações visuais e fala coisas absurdas. Esgotado o estoque de dopamina, o
indivíduo deixa de sentir euforia e prazer, ficando cansado, sonolento e irritadiço.
No dia seguinte, sente tonturas, fortes dores de estômago e falta de apetite.
Os autores advertiram sobre a necessidade de maior controle sobre essa substância,
haja vista que se trata de medicação de tarja vermelha, devendo ser dispensada somente com
prescrição médica. Seus efeitos são danosos à saúde, e com associação de bebidas alcoólicas,
podem por em risco a saúde, não só física como mental dos usuários dessa interação
medicamentosa, por causar dependência química.
17
4 DISCUSSÃO
Foram observados que os problemas sérios encontrados referentes às alterações vistas
nas prescrições de medicamentos às crianças poderiam ser sanados ou minimizados por meio
da atuação de farmacêuticos a fim de disponibilizar mais informações acerca das dosagens e
diluições corretas para toda a equipe de saúde envolvida, possibilitando a cura e não a
complicação ou morte.
Quanto à atuação da equipe de saúde, cabe destacar que, na maioria dos trabalhos
analisados, ficou evidente a importância da atuação do profissional farmacêutico no
acompanhamento e controle tanto nas ações para evitar erros de medicação, como nos AAMs
preveníveis, sugerindo-se que sejam implantadas e planejadas ações para educação
continuada, boas condições de trabalho, uma assistência farmacêutica planejada e a
otimização da comunicação interdisciplinar.
Na pesquisa apresentada sobre alguns estudos, identificou-se quatro variações de uso
off label: 1) na medicina pediátrica, confirmando-se o uso inapropriado, sugerindo falta de
informação na diluição e fracionamento; 2) na utilização de substância fluoxetina em
associação com outros medicamentos para inclui-la em fórmulas de emagrecimento não
autorizadas ou contraindicadas. Em contrapartida, outro estudo identificou que essa
substância, se bem utilizada e com orientação, traz benefícios à doença da obesidade. 3)
benefícios da heparina para tratar queimaduras; 4) uso recreacional de medicamentos, cujas
autoridades e profissionais da saúde não têm conhecimento, associando substâncias
medicamentosas com álcool, trazendo não só problemas à saúde física como mental.
5 CONCLUSÃO
O estudo realizado sobre a utilização de medicamentos registrados e com usos não
autorizados (uso off label) contribui para a disseminação da informação sobre como e quando
pode-se fazer uso de sua prática a fim de minimizar os riscos que podem advir da
administração terapêutica e medicamentosa de substâncias para usos diferentes dos
comprovadamente indicados.
Mostrou-se que os órgãos controladores, vinculados ao Ministério da Saúde e ao SUS,
como a ANVISA e a CONITEC, entre outros, que compõem a Vigilância Sanitária, possuem
atribuições de farmacovigilância, como ações de fiscalização, autorização, inclusão ou
exclusão dos medicamentos após os procedimentos de certificação sobre a eficácia e
18
eficiência desses, sendo os responsáveis pela legislação que regulamenta a obrigatoriedade de
acompanhamento da bula para qualquer tipo de medicação como documento oficial sanitário.
No Brasil, a prática off label não é proibida desde que seja justificada por meio de
estudos comprovados sobre a segurança, eficácia e efetividade na indicação e com o controle
da Vigilância Sanitária, o que demanda anos de estudos até a certificação ou não, podendo
também trazer desvantagens quando não há no país medicamentos que possam substituir ou
tratar doenças raras.
Quanto aos conselhos profissionais que regulamentam as práticas de médicos,
enfermeiros e farmacêuticos, estes prevêem a prática off label, desde que haja a
responsabilização por parte do profissional, a autorização por parte do paciente, no
consentimento e ciência de fazer parte do experimento, com as possibilidades de sucesso ou
não, e quando o paciente for considerado incapaz, deve-se ter o consentimento e autorização
do responsável desse. Quanto à ética desses profissionais, as leis e resoluções definem que,
caso percebam o uso indevido ou não autorizado, são obrigados a denunciarem às autoridades
competentes.
Percebe-se a necessidade de realizar-se pesquisas científicas e estudos controlados
para o grupo específico de crianças, adolescentes e idosos, por suas características
biofisiológicas, precisando que a indústria farmacêutica conduza ensaios clínicos e submeta
informações para uso de novos medicamentos. Essa necessidade foi observada principalmente
em pacientes pediátricos, rotulados como “órfãos terapêuticos”, os quais são mais suscetíveis
à interação medicamentosa e administração de medicamentos fracionados e padronizados,
deixando-se de observar constituições individuais, como visto nas pesquisas realizadas para
esse público, percebendo-se como uma prática recorrente desenvolvida por médicos em que
não há a recomendação e nem autorização para o uso em crianças,
Cabem ainda ações por partes das instituições da saúde, bem como do governo, de
promoção a disseminação e divulgação do que é o uso off label, haja vista em alguns trabalhos
poder ter-se observado a falta de informação pelos agentes da saúde e pela população, o que
compromete seriamente a efetividade e eficácia de medicamentos que podem ser benéficos,
ou podem complicar mais ainda o quadro da doença, inclusive, levando a óbito.
19
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