International Journal of Cardiovascular Sciences. 2016;29(6):492-499 492 ARTIGO DE REVISÃO Treinamento de Força Moderado Atenua o Aumento da Pressão Arterial e Diminui o Número de Núcleos em Cardiomiócitos de Ratos Hipertensos Moderate Resistance Training Attenuates the Increase in Blood Pressure and Decreases the Cardiomyocyte Nuclei Number in Hypertensive Rats Rodrigo Vanerson Passos Neves,1,3* Thiago Santos Rosa,1,3* Michel Kendy Souza,1 Clévia Santos Passos,2 Adriana Aparecida Ferraz Carbonel,3 Cristiane Paula Teixeira,3 Francisco Navarro,4 Ricardo Santos Simões,5 Brande Ranter Alves Soares,1 Maria Carmo Pinho Franco,3,5 Milton Rocha Moraes1,3* Universidade Católica de Brasília,1 Brasília - DF; Instituto do Coração (InCor)2 – HCFMUSP; Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP),3 SP; Universidade Federal do Maranhão (UFMA),4 São Luís, MA; Universidade de São Paulo (USP),5 São Paulo, SP - Brasil * Estes autores contribuíram igualmente para este estudo. Resumo Fundamentos: O treinamento de força (TF) é uma estratégia que diminui a pressão arterial (PA) em pacientes com hipertensão arterial (HA) estágio 1 e atenua a progressão da PA em ratos hipertensos (estágio 3). A influência do TF na remodelação cardíaca na HA não controlada ainda não está estabelecida. Objetivo: O objetivo deste estudo foi avaliar os efeitos a longo prazo do TF em intensidade moderada na remodelação cardíaca em ratos espontaneamente hipertensos (SHRs) sem tratamento. Métodos: Dez SHRs machos com HA estágio 3 (PA sistólica ≥ 180 mmHg) e cinco ratos Wistar-Kyoto (WKY) normotensos (PA sistólica < 120 mmHg) foram divididos em três grupos: sedentários normotensos (SED-WKY), sedentários hipertensos (SED-SHR) e hipertensos TF (TF-SHR). O TF foi realizado em uma escada vertical (3 dias / semana por 12 semanas, em dias não consecutivos) com 70% da carga máxima. A PA e a frequência cardíaca foram registradas. Ao final do protocolo, os animais foram sacrificados e tiveram o ventrículo esquerdo seccionado para análise histológica (hematoxilina e eosina e picrosirius red). Resultados: O TF não atenuou o ganho de peso absoluto e relativo do coração e do ventrículo esquerdo no grupo TF-SHR em comparação ao grupo SED-SHR. Não houve nenhuma diferença no volume nuclear nos cardiomiócitos e conteúdo de colágeno entre os grupos. No entanto, o TF diminuiu o número de núcleos nos cardiomiócitos e atenuou o aumento da PA sistólica no grupo TF-SHR em relação ao grupo SED-SHR. O Δ do duplo produto foi menor no grupo TF-SHR em comparação aos grupos SED-WKY e SED-SHR. Conclusões: Os dados obtidos demonstram que o TF não atenuou a hipertrofia cardíaca, mas reduziu a proliferação nuclear nos cardiomiócitos e a progressão da PA em SHR com HA severa. (Int J Cardiovasc Sci. 2016;29(6):492-499) Palavras-chave: Hipertensão, Ratos, Hipertrofia Ventricular Esquerda, Miócitos Cardíacos. Abstract Background: Resistance training (RT) is a strategy that decreases blood pressure (BP) in patients with stage 1 hypertension and attenuates BP progression in hypertensive rats (stage 3). The influence of RT in cardiac remodeling in uncontrolled hypertension is not yet established. Objective: The aim of this study was to evaluate the long-term effects of RT in moderate intensity in cardiac remodeling in spontaneously hypertensive rats (SHRs) without treatment. Methods: Ten male SHRs with stage 3 hypertension (systolic BP ≥ 180 mmHg) and five normotensive Wistar-Kyoto (WKY) rats (systolic BP < 120 mmHg) were divided into three groups: sedentary normotensive (SED-WKY), sedentary hypertensive (SED-SHR), and RT hypertensive (RT-SHR). The RT was conducted in a vertical ladder (3 days/week for 12 weeks, on nonconsecutive days) at 70% of the maximum load. BP and heart rate were recorded. At the end of the protocol, the animals were euthanized and had their left ventricles sectioned for histological analysis (hematoxylin and eosin and picrosirius red). Correspondência: Milton Rocha Moraes Programa de Pós-Graduação Stricto Sensu, Universidade Católica de Brasília – Campus I - QS 07 – Lote 01 – EPCT. CEP: 71966-700, Bloco G Sala G 119, Águas Claras, Taguatinga, Distrito Federal, DF - Brasil E-mail: [email protected]; [email protected] DOI: 10.5935/2359-4802.20170008 Artigo recebido em 15/06/16; revisado em 08/07/16; aceito em 10/10/16. Neves et al. 493 Int J Cardiovasc Sci. 2016;29(6):492-499 Artigo Original Exercício e Núcleos de Cardiomiócitos em Ratos SHR Results: RT did not attenuate the absolute and relative weight gains of the heart and left ventricle in the RT-SHR group compared with the sedentary group (SED-SHR). There was no difference in nuclear cardiomyocyte volume and collagen content between groups. However, RT decreased the number of nuclei in the cardiomyocytes and attenuated the increase in systolic BP in the RT-SHR when compared with the SED-SHR group. The Δ of the rate-pressure product was lower in the RT-SHR group compared with the groups SED-WKY and SED-SHR. Conclusions: The data obtained demonstrate that RT did not attenuate the cardiac hypertrophy, but reduced the nuclear proliferation in cardiomyocytes and the BP progression in SHRs with severe hypertension. (Int J Cardiovasc Sci. 2016;29(6):492-499) Keywords: Hypertension; Rats; Hypertrophy, Left Ventricular; Myocytes, Cardiac Full texts in English - http://www.onlineijcs.org Introdução O ventrículo esquerdo (VE) é órgão-alvo da hipertensão e responde com hipertrofia à sobrecarga constante de pressão no miocárdio. 1 Embora a hipertensão arterial (HA) seja considerada um forte determinante da hipertrofia do VE (HVE), a pressão arterial (PA) explica apenas variações interindividuais limitadas na massa do VE.1 Outras alterações estruturais importantes no miocárdio, como a hipertrofia de cardiomiócitos e aumento no conteúdo de fibroblastos e elementos intersticiais, estão diretamente ligados à HVE em ratos espontaneamente hipertensos (spontaneously hypertensive rats, SHRs).2-4 Em roedores, a HVE é caracterizada por alterações no volume e número de núcleos nos cardiomiócitos e deposição de colágeno.5-8 Estas alterações induzem fibrose cardíaca e rigidez, levando à redução da contratilidade cardíaca, com progressão para insuficiência cardíaca.2,9 O treinamento aeróbio (TA) é uma intervenção eficaz na proteção contra doenças cardiovasculares, diminuindo a ocorrência de fatores de risco e dano ao miocárdio e melhorando a função cardíaca em ratos hipertensos.10 Pacientes com HA severa submetidos ao TA mostraram um declínio na HVE e nos níveis de PA. 11 Os mecanismos sugeridos entre o TA e a HVE é uma redução na deposição de colágeno intersticial, que impede a remodelação cardíaca em humanos 11 e roedores. 12,13 Por outro lado, o treinamento de força (TF) também tem sido relatado como uma intervenção eficaz na redução de fatores de risco cardíacos e PA em hipertensos,14 impedindo a progressão da PA em SHRs com HA estágio 3 15 (níveis de PA ≥ 180 mmHg).16 Porém, pouco se sabe ainda sobre os efeitos do TF sobre a HVE em pacientes hipertensos. Apesar de estudos terem mostrado um efeito hipotensor do TF em normotensos 17 e pacientes hipertensos,14 bem como em roedores hipertensos,15 não há estudos investigando a associação do TF com a diminuição ou controle da PA e a HVE na HA sistólica. Além disso, não há um consenso sobre as adaptações morfológicas cardíacas promovidas pelo TF e seus possíveis efeitos sobre os fatores de risco em pacientes hipertensos.18,19 Desta maneira, o objetivo do presente estudo foi analisar as adaptações morfológicas cardíacas em um modelo experimental de HA submetido ao TF moderado. Nossa hipótese foi de que o TF atenuaria o desenvolvimento de HVE patológica induzida pela HA em SHRs não tratados. Métodos Animais O estudo incluiu cinco ratos Wistar-Kyoto (WKY) machos e 10 SHRs machos. Os animais apresentavam 17 semanas de idade e uma média de peso corporal de 268,4 ± 32,1 g (WKY) e 327,0 ± 17,5 g (SHR). A média dos níveis de PA sistólica dos animais foi de 119,4 ± 3,6 mmHg e 205,8 ± 10,9 mmHg, respectivamente. Os animais foram obtidos a partir da Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). O estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da inst it uição [n.922985/2014 omit ido pela revisão]. Os animais foram mantidos em gaiolas plásticas com cinco ratos em cada gaiola a uma temperatura de 22 ± 2 °C e umidade relativa de 55 ± 10%, com ração padrão para roedores (Nuvital ® CR1, São Paulo, Brasil) e água ad libitum. Os ratos foram divididos em três grupos de cinco animais em cada grupo: WKY sedentários (SED-WKY), SHR sedentários (SED‑SHR) e SHR submetidos ao TF (TF-SHR). O número de roedores utilizados no presente estudo foi pequeno e foi atingida uma boa reprodutibilidade Int J Cardiovasc Sci. 2016;29(6):492-499 Neves et al. Artigo Original dos dados da PA, com coeficientes de variação de 2 ± 1% (SED‑WKY), 1 ± 1% (SED‑SHR) e 2 ± 1% (TF‑SHR), demonstrando que a amostra tinha boa homogeneidade e confiabilidade. Condicionamento ao treinamento de força Antes do TF, todos os animais foram condicionados ao aparelho de TF (escada vertical), conforme descrito anteriormente por Neves et al.15 Os animais foram submetidos a três sessões de TF por semana em dias não consecutivos por 2 semanas sem qualquer carga, conforme descrito anteriormente.15 Todas as sessões de treinamento ocorreram entre as 18:00 e 20:00 horas. Os animais nos grupos sedentários foram mantidos em uma caixa com mesmo tamanho da caixa do grupo TF. Este procedimento foi realizado a fim de gerar as mesmas condições de estresse em todos os animais. Peso máximo transportado Dois dias após o procedimento de condicionamento, o peso máximo transportado (PMT) pelos animais do grupo de treinamento foi determinado. Na subida inicial, os animais transportavam 75% de seus pesos corporais. Em seguida, adicionava-se 30 g de carga até que a carga máxima tivesse sido atingida quando o rato não conseguia mais subir toda a extensão da escada em 4 – 9 tentativas. Foi definida como falha quando o animal era incapaz de subir a escada após três ciclos consecutivos de estímulos na cauda (com uso de pinça), com um período de repouso de 60 s entre cada subida. A carga mais pesada que o animal conseguia carregar com sucesso ao longo de toda a extensão da escada foi considerado como sendo o PMT para aquela sessão de teste. Em seguida, a próxima sessão de teste consistiu em subida na escada com 50%, 75%, 90% e 100% do PMT prévio do animal, com um intervalo de descanso de 60 s entre cada subida. Para as subidas subsequentes na escada, uma carga de 30 g foi adicionada até que um novo PMT foi determinado; o período de recuperação entre cada subida foi de 120 s.20 Este procedimento foi aplicado na primeira semana e repetido a cada 15 dias durante as 12 semanas para ajustar a intensidade do treinamento.15 Protocolo do treinamento de força Após o PMT, os animais foram submetidos ao protocolo do TF, no qual completaram 36 sessões Exercício e Núcleos de Cardiomiócitos em Ratos SHR divididas em três sessões por semana em dias não consecutivos, entre as 18:00 e 20:00 horas por 12 semanas, com cada uma das sessões consistindo de 6 – 8 séries de escaladas com 10 – 12 repetições, 1 min de pausa entre cada série e uma duração média de cada sessão de treinamento de ~10 – 12 min. A carga de treinamento foi progressivamente ajustada (30 a 70% do PMT), conforme descrito por Hornberger & Farrar,20 com utilização de tubos cônicos de 50 mL com pesos no interior, fixos à parte proximal da cauda do animal com uma trave de pressão com encaixe giratório e fita Scotch de borracha (Scotch 3M, São Paulo, Brasil), conforme descrito por Neves et al.15 Medida da pressão arterial A PA sistólica (PAS) foi medida com o método do manguito de cauda com PowerLab System (ADInstruments Inc., Sydney, Austrália) com os ratos conscientes. Para calcular a mudança na PA, a PAS foi medida em todos os animais antes do início do período de treinamento (T0) e ao final das 12 semanas de TF, 48h após a última sessão de exercício no mesmo horário a cada dia (entre 18:00 – 20:00) para permitir que os animais se adaptassem ao procedimento. O duplo produto (DP) foi calculado como o produto da frequência cardíaca e da PAS. A PAS, a frequência cardíaca e o peso corporal foram avaliados semanalmente por um mesmo examinador.15 Coleta de tecido Os ratos foram sacrificados por decapitação 48 horas após a última sessão de treinamento. Os corações foram removidos e pesados imediatamente. O VE foi isolado e pesado e depois seccionado transversalmente no maior eixo e imerso em formaldeído a 10% (10 mM de tampão PBS, pH 7,4) para posterior inclusão em parafina. Durante o processamento histológico, cortes com espessura de 5 µm foram obtidos e corados com hematoxilina e eosina (H.E.) para a identificação do volume e o número de núcleos por área, e corados com picrosirius red para quantificação de colágeno.7 Análise morfológica e morfométrica Fotomicrografias foram obtidas com utilização de um microscópio de luz (Leica DM 1000, Wetzlar, Alemanha, objetiva de 40X e ocular de 10X). Para análise do volume nuclear dos cardiomiócitos, oito imagens foram obtidas 494 Neves et al. 495 Int J Cardiovasc Sci. 2016;29(6):492-499 Artigo Original Exercício e Núcleos de Cardiomiócitos em Ratos SHR a partir de cada VE, totalizando 40 imagens por grupo. Foi medido o diâmetro maior e menor de 12 núcleos por imagem e avaliamos a atividade celular. Os valores obtidos foram aplicados à fórmula: V = (A2 x B) / 1,91, na qual o A é o menor diâmetro e B é o maior diâmetro do núcleo e 1,91 é uma constante.7 O número de núcleos foi avaliado nas mesmas fotomicrografias. Os núcleos foram inicialmente delimitados em cada área da fotomicrografia e o número de núcleos foi posteriormente calculado em uma área de 0,016 mm2, como descrito por Cabanelas et al.7 Para analisar o volume e o número de núcleos por área, utilizamos o programa AxioVision Rel, 4,8 (Carl Zeiss, IL, EUA). Para quantificar a quantidade de colágeno no VE, obtivemos oito imagens de cada animal, totalizando 40 imagens por grupo. Estas fotomicrografias foram analisadas com o programa Image J® e a quantificação de colágeno foi expressa em porcentagem por área.7 Análise estatística Todos os dados estão expressos como mediana (intervalo interquartil). Os testes de Shapiro-Wilk e Levene foram utilizados para avaliar a normalidade e homocedasticidade dos dados. Posteriormente, foi utilizado o teste não paramétrico de Kruskal-Wallis para comparar os dados morfológicos, morfométricos e hemodinâmicos, enquanto o pós-teste de Dunn foi utilizado para avaliar diferença entre os grupos. Valores de p < 0,05 foram considerados significantes. As análises estatísticas foram realizadas com o programa GraphPad Prism, 6.0 (GraphPad Software, OH, EUA). Resultados Os grupos SED-SHR e TF-SHR apresentaram aumento absoluto e relativo no peso do coração quando comparados com o grupo SED-WKY. Um padrão de resultado semelhante ocorreu em relação ao peso absoluto e relativo do VE. Nenhuma diferença no volume nuclear foi observada entre os grupos. O número de núcleos por área se mostrou reduzido no grupo TF-SHR quando comparado com o SED-SHR, mas nenhuma diferença foi observada entre os grupos SED-WKY e TF-SHR em relação a este parâmetro. Da mesma forma, não foi observada diferença no volume de colágeno entre os grupos. O ganho de peso corporal se mostrou reduzido no grupo TF-SHR em comparação com o grupo SED-WKY, mas nenhuma diferença significativa nesta variável foi observada entre os grupos hipertensos (SED-SHR e TF-SHR). Todos os resultados estão apresentados na Tabela 1. O ΔPAS foi maior no grupo SED-SHR em comparação com o grupo TF-SHR, mas nenhuma diferença foi observada entre os grupos SED-WKY e TF-SHR. Nenhuma alteração na frequência cardíaca foi observada entre os grupos. O ΔDP no grupo TF-SHR se mostrou reduzido quando comparado com o dos grupos SED‑WKY e SED-SHR, conforme mostra a Tabela 2. A PAS foi maior nos grupos hipertensos quando comparados com o grupo normotenso tanto antes do treinamento (SED-WKY: 122 mmHg [116 – 122 mmHg], SED-SHR: 202 mmHg [198 – 2016 mmHg] e TF‑SHR: 208 mmHg [193 – 218 mmHg]) quanto após o treinamento (SED-WKY: 127 mmHg [126 – 137 mmHg], SED-SHR 222 mmHg [219 – 232 mmHg] e TF-SHR 202 mmHg [191 – 205 mmHg]). Como mostra a Figura 1, a progressão da PAS após o treinamento foi atenuada no grupo TF-SHR quando comparado com o grupo SED-SHR. A Figura 2 mostra fotomicrografias representativas de cortes do VE corados com H.E. e picrosirius red em todos os grupos. Discussão O presente estudo analisou as adaptações morfológicas do miocárdio de SHRs com HA severa submetidos a 12 semanas de TF. Nossa hipótese era de que o TF poderia atenuar a HVE, diminuindo a progressão de alterações morfológicas cardíacas induzidas pela sobrecarga de pressão da HA. No entanto, nossos resultados demonstraram que o TF foi incapaz de reverter a HVE neste modelo experimental de HA severa. Os níveis elevados de PA (≥ 180 mmHg) dos animais e a ausência de tratamento farmacológico podem ter influenciado estes resultados. Sabemos que para alcançar as maiores reduções da PA, é necessária uma combinação de exercício, dieta e medicamentos anti-hipertensivos para diminuir a pós-carga e alterar mecanismos bioquímicos, incluindo redução da atividade do sistema renina-angiotensina, levando a uma regressão da HVE na HA severa.21-23 Por outro lado, um resultado relevante do nosso estudo foi o achado da análise histomorfométrica de redução no número de núcleos nos cardiomiócitos (NNC) dos SHRs submetidos ao TF (grupo TF-SHR) quando comparados com os SHRs sedentários (grupo SED‑SHR). Esta diminuição da proliferação de núcleos nos cardiomiócitos poderia indicar um possível efeito benéfico do TF sobre a HA. Curiosamente, ainda não existem estudos na literatura analisando o NNC em roedores submetidos ao exercício. Int J Cardiovasc Sci. 2016;29(6):492-499 Neves et al. Artigo Original Exercício e Núcleos de Cardiomiócitos em Ratos SHR Tabela 1 – Análise morfológica do coração dos animais após 12 semanas de treinamento de força SED-WKY SED-SHR TF-SHR Valor de P 54 (35 - 68) 25 (22 - 28) 23 (17 - 25) a 0,0031 Peso do Coração (g) 1,24 (1,14 - 1,29) 1,65 (1,54 - 1,83) a 1,83 (1,67 - 2,05) a 0,0019 PVE (g) 0,84 (0,79 - 0,85) 1,09 (1,06 - 1,18) a 1,13 (1,03 - 1,21) a 0,0089 PCar/PCor (mg/g) 3,80 (3,63 - 3,99) 4,70 (4,29 - 5,19) a 5,20 (5,04 - 5,77) a 0,0036 PVE/PCor (mg/g) 2,62 (2,47 - 2,67) 3,04 (2,95 - 3,39) a 3,24 (2,99 - 3,54) a 0,0018 34 (29 - 46) 46 (31 - 50) 41 (31 - 61) 0,6200 NN / 0,016 mm2 9,0 (7,1 - 10,8) 12,1 (11,2 - 14,3) 6,3 (5,6 – 8,9) b 0,0205 Volume de Colágeno (%) 8,0 (7,1 - 9,1) 8,7 (8,2 - 11,1) 10,6 (8,3 - 11,5) 0,1330 Δ Variáveis Peso Corporal (g) VN (µm3) Os dados estão expressos como mediana (intervalo interquartil [percentis 25o - 75o]).Δ, Delta, pós-treinamento - pré-treinamento (12asemana - 1ª semana); PCor, peso corporal; PCar, peso cardíaco; PVE, peso do ventrículo esquerdo; PCar/PCor, razão do peso cardíaco sobre o peso corporal; PVE/PCor, razão do peso do ventrículo esquerdo sobre o peso corporal; VN, volume nuclear; NN / 0,016mm2, número de núcleos em uma área limitada de 0,016 mm2. a Diferença versus SED-WKY; b diferença versus SED-SHR. Tabela 2 – Parâmetros hemodinâmicos após 12 semanas de treinamento de força SED-WKY SED-SHR TF-SHR Valor de P PA sistólica (mmHg) 9 (5 - 18) 20 (15 - 22) -13 (-22 - 11) b 0,0115 Frequência Cardíaca (bpm) 23 (5 - 68) 14 (-37 - 55) -25 (-92 - 11) 0,0534 86 (61 - 175) 135 (-16 - 207) -145 (-187 - -27) a,b 0,0111 ΔVariáveis DP (mmHg•bpm)/100 Os dados estão expressos como mediana (intervalo interquartil [percentis 25o - 75o]). Δ, delta pós-treinamento - pré-treinamento (12a semana - 1ª semana); PA, pressão arterial; DP, duplo produto. a Diferença versus SED-WKY; b diferença versus SED-SHR. Ressaltamos que ainda há poucas evidências científicas sobre a proliferação nuclear nos cardiomiócitos como um índice de dano cardíaco.5,7 Dois estudos demonstraram que um aumento no NNC é um possível marcador de piora da cardiomiopatia em modelos experimentais, como ratas ooforectomizadas7 e camundongos obesos,5 demonstrando que doenças crônicas distintas poderiam alterar o NNC e influenciar a apoptose celular e a fibrose.7 No entanto, nosso 496 Neves et al. Int J Cardiovasc Sci. 2016;29(6):492-499 Artigo Original Exercício e Núcleos de Cardiomiócitos em Ratos SHR 275 Pressão Arterial Sistólica (mmHg) 497 a,b 250 b 225 b b,c SED-WKY SED-SHR 200 TF-SHR 175 150 125 100 0 Após o treinamento Antes do treinamento Figura 1 – Monitorização da pressão arterial sistólica antes e após treinamento. Os dados estão expressos como mediana (intervalo interquartil [percentis 25º – 75º]). Os valores foram comparados dentro de cada grupo e entre os grupos. a Diferença versus pré-treinamento; b diferença versus SED-WKY; c diferença versus SED-SHR. SED-WKY SED-SHR TF-SHR B A 200 µm C 200 µm E D 200 µm 200 µm F 200 µm 200 µm Figura 2 – Fotomicrografias representativas de cortes do ventrículo esquerdo corados com hematoxilina e eosina (A, B e C) e picrosirius red (D, E e F). As setas em A, B e C indicam os núcleos dos cardiomiócitos. As marcas vermelhas em D, E e F indicam colágeno. Amplificação de 400X. grupo é o primeiro a ter estudado o NNC em SHRs com HA severa submetidos ao TF. de Pagan et al.,12 que submeteram SHRs ao TA em esteira Quanto à ocorrência de fibrose, nossos resultados não demonstraram alterações significativas no volume de colágeno total nos animais SED-SHR e TF-SHR quando comparados aos SED-WKY. Esses dados corroboram os não observaram diminuição no volume total de colágeno (12 m/min, 30 min/dia, 5 dias/semana) por 4 semanas e I. Verificamos em nosso estudo que o TF não atenuou a hipertrofia cardíaca avaliada pelo ganho em valor absoluto e relativo do peso do coração em SHRs. No entanto, o TF Int J Cardiovasc Sci. 2016;29(6):492-499 Neves et al. Artigo Original aplicado neste estudo pode ter atenuado a progressão da PAS no TF-SHR (Δ = -7 mmHg) ao final das 12 semanas. Por outro lado, os animais sedentários apresentaram um aumento na PAS: SED-SHR (Δ = +19 mmHg) e SED-WKY (Δ = +11 mmHg). Embora alguns estudos apontem para uma diminuição significativa nos níveis da PA em associação ao TF em pacientes com HA estágio 1,14,19,24 bem como em animais,15,25 é possível que na HA severa (≥ 180 mmHg), uma redução mais expressiva da PA seja necessária para evitar a progressão da HVE.1 Além disso, o tratamento farmacológico com medicação anti-hipertensiva deve ser iniciado logo após o diagnóstico da HA. 16 Seguindo esta linha, um estudo recente em ratos com HA induzida por nitro‑L-arginina metil éster (L-NAME) demonstrou que o tratamento com betabloqueador (ex., nebivolol) associado ao TA por 4 semanas foi mais eficaz em reduzir o percentual de colágeno cardíaco do que cada intervenção isolada.26 O presente estudo foi limitado pelo pequeno tamanho da amostra em cada grupo (n = 5), o que pode ter restringido a nossa capacidade de obter resultados estatisticamente significantes. Além disso, poderíamos ter utilizado ratos Wistar em vez de ratos WKY, porque ao contrário do que ocorre em ratos Wistar, a ocorrência de HVE em ratos WKY é independente dos níveis pressóricos dos animais.27 Em estudos futuros, será relevante investigar também a função cardíaca e os parâmetros bioquímicos e moleculares, a fim de elucidar o papel do TF no remodelamento ventricular em SHRs tratados. Além disso, o TF em intensidade moderada foi eficaz na redução do DP em SHRs com HA estágio 3. Este resultado tem um significado clínico importante, uma vez que reflete uma diminuição do trabalho cardíaco. O DP é considerado um bom marcador para avaliar o consumo de oxigênio do miocárdio durante o repouso ou esforço e é eficaz em estimar o trabalho do miocárdio em resposta ao TF.28 Além disso, não observamos alterações na frequência cardíaca; portanto, a diminuição do DP pode ser atribuída à significativa redução da PA observada.28 Conclusão O TF moderado foi incapaz de reduzir a HVE em um modelo experimental de HA severa sem tratamento farmacológico, mas foi eficaz em atenuar o aumento nos Exercício e Núcleos de Cardiomiócitos em Ratos SHR níveis da PA na HA e reduzir a proliferação nuclear em cardiomiócitos de SHRs. Ainda assim, acreditamos que a diminuição da PA é um fator importante para a HVE. No futuro, será interessante analisar os efeitos do TF com exercícios de leve a moderada intensidade como um apoio ao tratamento farmacológico em seres humanos e roedores com HA severa. Agradecimentos Agradecemos a Mauro Cardoso Pereira, da Divisão de Nefrologia da Universidade Federal de São Paulo, pela assistência com os animais durante o projeto. Este trabalho foi apoiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP), o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) e a Coordenação de Aperfeiçoamento de Nível Superior (CAPES). Agradecimentos também vão para o Dr Niels Olsen, chefe do Laboratório de Imunologia Clínica e Experimental-UNIFESP, por seu apoio entusiasmado às nossas ideias. Contribuição dos autores Concepção e desenho da pesquisa e Redação do manuscrito: Neves RVP, Rosa TS, Souza MK, Passos CS, Carbonel AAF, Teixeira CP, Navarro F, Simões RS, Moraes MR; Obtenção de dados, Análise e interpretação dos dados e Revisão crítica do manuscrito quanto ao conteúdo intelectual importante: Neves RVP, Rosa TS, Souza MK, Passos CS, Carbonel AAF, Teixeira CP, Navarro F, Simões RS, Câmara NOS, Moraes MR; Análise estatística e Obtenção de financiamento: Neves RVP, Rosa TS, Moraes MR. Potencial conflito de interesse Declaro não haver conflito de interesses pertinentes. Fontes de financiamento O presente estudo foi financiado pela FAPESP, CNPq e CAPES. Vinculação acadêmica Este artigo é parte de Dissertação de Mestrado de Rodrigo Vanderson Passos Neves pela Universidade Federal de São Paulo - UNIFESP. 498 Neves et al. 499 Exercício e Núcleos de Cardiomiócitos em Ratos SHR Int J Cardiovasc Sci. 2016;29(6):492-499 Artigo Original Referências 1. Cramariuc D, Gerdts E. 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