O COMPLEXO AGROINDUSTRIAL CAFEEIRO NO SUL DE MINAS E AS ALTERAÇÕES NA RELAÇÃO CAMPO-CIDADE Larissa Chiulli Guida¹, Raphael Casagrande Guida² e Flamarion Dutra Alves³ [email protected], [email protected], [email protected] ¹Graduada em Geografia pela UNIFAL-MG ²Graduando em Geografia pela UNIFAL-MG ³Doutor em Geografia e Professor Adjunto da UNIFAL-MG Palavras chaves: Complexo agroindustrial cafeeiro; relações campo-cidade; Sul de Minas Gerais. Introdução Com a modernização do campo brasileiro, as diversidades existentes no uso do espaço agrário no país se intensificaram ainda mais. A especialização no modo de produção é resultante deste processo que passou a agropecuária brasileira, por este motivo encontram-se no Brasil diversas regiões agrícolas que se especializaram em uma única produção, são regiões produtoras das commodities agrícolas, produção do setor primário voltado para exportação aliado, também, às transformações da matériaprima em um sistema agroindustrial integrando os setores da economia. Minas Gerais é o principal estado produtor da commodity café, no ano de 2010 produziu 51,8% da produção nacional, sendo a região Sul de Minas a principal região produtora (IBGE-PAM, 2010). A inserção significativa do Sul de Minas na produção do agronegócio cafeeiro, fez com que vários sistemas técnicos e normativos fossem criados para viabilizar a fluidez da produção. No que tange às competências infraestruturais, os maiores armazéns brasileiros estão localizados nas cidades de Varginha e Guaxupé. Dentre as competências institucionais destacam-se o Porto Seco do Sul de Minas (Varginha - MG), os Recintos Exportadores (REDEX) nas cidades de Guaxupé e Poços de Caldas, a Cooxupé (Cooperativa dos Produtores de Café de Guaxupé – MG), maior cooperativa brasileira de cafeicultores. As dez maiores empresas exportadoras de café do país também possuem escritórios no Sul de Minas, entre elas a Stockler Comercial e Exportadora Ltda. com escritórios nas cidades de Varginha e Muzambinho. A difusão do agronegócio globalizado no território brasileiro teve como consequência a reestruturação da relação campo-cidade, que passou a estabelecer inter-relações cada vez maiores entre si. Quanto mais moderna se torna a produção agrícola, mais urbana se torna a sua regulação. As cidades próximas ao campo se adaptam para atender as principais exigências da atividade agrícola. Segundo Milton Santos (1996, p.45) ”não é o campo que se adapta às demandas das cidades próximas, como apregoava a tradicional relação campo-cidade, mas são as cidades que se adaptam ao campo moderno”. Encontra-se na região cafeicultora do Sul de Minas diversas cidades que atendem à produção cafeeira, dessa forma, pretende-se analisar neste trabalho a relação campocidade de alguns municípios da região Sul de Minas através da infraestrutura do complexo agroindustrial cafeeiro. 1 Alfenas-MG, 3 a 6 de Setembro de 2012 Universidade Federal de Alfenas-MG As redes nos territórios agrícolas: estrutura dos complexos agroindustriais O atual período histórico que vivemos é marcado, principalmente, pela rapidez nas vias de comunicação e informação, pela fluidez nas transações (comerciais, econômicas, materiais) de pessoas e bens. Assim, a conexão é a palavra que melhor define este período de globalização. O estudo das Redes Geográficas que compõem a produção moderna do campo brasileiro, não é principiante, a partir da Revolução Verde, a interconexão dos setores produtivos, tecnológicos, logísticos, financeiros e sociais tornou-se presentes nas culturas agropecuárias ligadas ao agronegócio e a produção das commodities, assim o conceito e a existência das redes e complexos agroindustriais vem sendo bastante pesquisado. As culturas altamente especializadas nas regiões produtoras de commodities necessitam de sistemas modernos, com tecnologias avançadas, de serviços especializados, que exerçam com rapidez e fluidez os diversos setores que são precisos para realizar a produção. Consideramos esta ocorrência, uma associação de fatores produtivos, onde ocorre um uso do território com a principal finalidade de atender às exigências da produção especializada, desse modo acreditamos que o conceito de arranjos territoriais produtivos (SANTOS e SILVEIRA, 2001) é o mais indicado para compreendermos a organização espacial em redes, que se estabelecem nos territórios de produção do agronegócio. As relações campo-cidade A modernização nos modos de produção do setor agropecuário foi fundamental para evidenciar a continuidade existente entre campo-cidade, esclarecendo que a clássica separação que considera o campo como lugar atrasado e a cidade como lugar de progresso tratava de uma visão ultrapassada, não correspondente à realidade desse novo sistema de produção do campo. Desse modo, a visão de continuidade entre campo-cidade passa a estar mais evidente, onde a relação entre esses espaços é retratada como forma de complementariedade entre si. Segundo Wanderley (2001) este continuum rural-urbano não exclui as particularidades existentes em cada espaço, portanto não permite considerar que seja o fim do rural, refere-se a uma relação que aproxima e integra esses dois polos. Portanto, foi a partir da modernização do campo que ocorreu uma reestruturação na organização do espaço agrícola culminando em mudanças profundas nas relações entre o campo e a cidade. A agricultura moderna exige suportes técnicos e especializados que se fazem presentes nas cidades, estabelecendo-se desta maneira uma nova relação campocidade (ELIAS, 2007). Com intuito de atender às exigências da agricultura moderna, as cidades desenvolvem diversos sistemas técnicos e normativos, que as tornam funcionais às exigências produtivas do campo moderno. Neste sentido, procurou-se estudar as relações campo-cidade de alguns municípios do Sul de Minas através do complexo agroindustrial cafeeiro. Expansão da cafeicultura no Sul de Minas: territorialização do capital e formação do complexo agroindustrial cafeeiro 2 Alfenas-MG, 3 a 6 de Setembro de 2012 Universidade Federal de Alfenas-MG Segundo ANDRADE (1994), a expansão do café para a região sul-mineira ocorreu a partir da expansão espacial da cultura dos estados de São Paulo e Paraná para Minas Gerais, que aglomerou numerosas vantagens para se tornar, a partir dos anos de 1980 e ainda hoje, o principal estado produtor. Do ponto de vista de Minas Gerais, este estado recebeu o café com todo o apoio governamental, beneficiando-se ainda da presença do IBC nos anos setenta e oitenta, antes que esta autarquia entrasse num processo acelerado de decadência. Beneficiando-se também do apogeu da política de crédito agrícola nos anos setenta. Avançou em termos de produtividade, e deslocou-se para outras regiões do Estado. Minas Gerais representa, assim, a região onde uma nova forma de produzir o café se instala: a princípio com recursos financeiros abundantes (ANDRADE, 1994, p. 3. Grifo nosso). Como observado, importantes aspectos político-institucionais, principalmente os creditícios, favoreceram a consolidação da cafeicultura em todo estado de Minas Gerais, o Sul de Minas beneficiou-se ainda pelas suas características físicas como solo, clima, e relevo, propícios para a produção do café tipo arábica, principal espécie produzida e exportada. O Sul de Minas, apesar de ser uma região ocupada, tinha como características principais o fato de ser uma região economicamente incipiente, tendo como base o cultivo das lavouras de subsistência e a exploração da pecuária extensiva. Dessa forma, a cafeicultura encontrou aí terras acessíveis, férteis e bem localizadas geograficamente, sendo possível auferir níveis elevados de produtividade (ANDRADE, 1994, p.42). Contudo, verifica-se que a consolidação da cafeicultura na região Sul de Minas, teve vantagens significativas. Tratando-se de uma região cuja economia era incipiente o autor (idem) esclarece que o apoio governamental (concessão de créditos e políticas públicas regionais), somado a outros Programas Governamentais do momento (Programa de Renovação e Revigoramento dos Cafezais – PRRC, por exemplo), favoreceram a implantação de uma nova forma de produzir o café, sob os auspícios do modo de produção capitalista, fato este que justifica a atual organização territorial para a produção do agronegócio cafeeiro – empresas do café. As principais empresas do café estão presentes em municípios da região Sul de Minas, como se observa no quadro 1 (abaixo). Neste sentido, ocorre uma reestruturação nas relações campo-cidade, pois para atender à demanda destes serviços altamente especializados, a cidade altera suas relações com o campo. Relações campo-cidade a partir do complexo agroindustrial cafeeiro O agronegócio globalizado provocou mudanças na relação campo-cidade, as cidades passaram a atender às exigências de produção do campo moderno, atraindo grande número de agentes. Desde grandes empresas até migrantes de origens e status diferentes, atraídos pela possibilidade de empregos e melhores condições de vida. Como resultado, as cidades passam a incorporar os problemas provenientes de grandes centros urbanos, como moradia precária, sobrecarga nos serviços públicos, aumento nos índices de violência e furtos, entre outros. 3 Alfenas-MG, 3 a 6 de Setembro de 2012 Universidade Federal de Alfenas-MG A tendência do agronegócio globalizado é a de fragmentar o território agrícola, esta fragmentação e especialização crescentes na divisão territorial do trabalho proliferam também desigualdades socioeconômicas . O café por ser uma commodity depende diretamente do mercado internacional, neste sentido, nem sempre os pequenos produtores conseguem se manterem porque o valor da produção é muito alto e não compensa. Quadro 1- Serviços da estrutura do complexo agroindustrial cafeeiro no Sul de Minas. ARMAZÉNS Casa Nobre Comércio e Armazenagem de Grãos Ltda. CASEMG – Companhia de Armazéns e Silos do Estado de Minas Gerais CONAB - Companhia Nacional de Abastecimento Armazéns Gerais Leste de Minas Ltda. Grão de Ouro Armazéns Gerais Ltda. Ipanema Agrícola S/A Moinho Sul Mineiro S/A Total Alimentos S/A Corn Food Armazéns Gerais Ltda. Olam Armazéns Gerais Ltda. Armazéns Gerais Carapina Ltda. Cafeco Armazéns Gerais Ltda. COOPERATIVAS COOPFAM - Cooperativa dos Agricultores Familiares de Poço Fundo e Região COOXUPÉ – Cooperativa Regional de Cafeicultores em Guaxupé Ltda. UNICCOP – União Cooperativa Agropecuária da Sul de Minas COOPAMA – Cooperativa Agrária de Machado Ltda. CAPAL - Cooperativa Agropecuária de Alfenas Ltda. COCCAMIG – Cooperativa Central de Cafeicultores e Agropecuaristas de Minas Gerais Ltda. COMERCIALIZAÇÃO, EXPORTAÇÃO E INDÚSTRIAS Ipanema Comercial e Exportadora S/A Mitsubishi Corporation- MC Coffee do Brasil Ltda. Referências ANDRADE, R. G. R. de. A expansão da cafeicultura em Minas Gerais: da intervenção do Estado à liberalização do mercado. Dissertação (Mestrado em Economia). Centro de Desenvolvimento e Planejamento Regional, Faculdade de Ciências Econômicas. Universidade Federal de Minas Gerais, 1994. SANTOS, M. A natureza do espaço, técnica e tempo, razão e emoção. São Paulo: Hucitec, 1996. 4 Alfenas-MG, 3 a 6 de Setembro de 2012 Universidade Federal de Alfenas-MG SANTOS, M.; SILVEIRA, M. L. O Brasil, território e sociedade no início do século XXI. Rio de Janeiro& São Paulo: Ed. Record, 2001. WANDERLEY, M. N. A emergência de uma nova ruralidade nas sociedades modernas avançadas – o “rural” como espaço singular e ator coletivo. Estudos Sociedade e Agricultura, n. 15, p. 87-145, out.2000. ___________________A ruralidade no Brasil moderno. Por um pacto social pelo desenvolvimento rural. In: ¿Una nueva ruralidad en América Latina?. Buenos Aires: CLACSO, 2001 5 Alfenas-MG, 3 a 6 de Setembro de 2012 Universidade Federal de Alfenas-MG