ponto de vista ACEDRIANA VICENTE SANDI Diretora Pedagógica da Editora Positivo [email protected] Imaginem a seguinte cena: uma ponte entre dois penhascos, muito desgastada pelo tempo, cuja altura impossibilita a visibilidade do chão. Soma-se a esse cenário um vento fortíssimo e muita chuva. Tudo isso para assegurar que a travessia configure um risco. O que mobilizaria uma pessoa a empreender a travessia? Uma quantidade monetária? Para alguns pode ser o suficiente. Mas, pergunto: quantos pais hesitariam em iniciar a travessia se o seu filho estivesse no outro extremo precisando da sua ajuda? Essa descrição denuncia o que vem a ser um “lugar de valor” para uma determinada pessoa, ou ainda, em nome de que/quem ela estaria disposta a investir as suas energias para preservar, para cultivar, para promover. Partindo do conceito de “lugar de valor”, como sendo o destinatário da energia investida nas relações humanas, e buscando estabelecer a possível correspondência com a relação entre professores e alunos, no interior da escola, questiona-se: o professor se constitui em um “lugar de valor” para os seus alunos? Os alunos são considerados um “lugar de valor” para os seus professores? Ambos produzem sentido de valor um para o outro? A relação valor versus energia é tão antiga 30 julho 2009 . quanto a história da humanidade: explicite em que/quem você investe as tuas energias que eu te direi o que você considera um “lugar de valor”. Energia, aqui, entendida como tempo, vitalidade, dedicação, enfim o pulsar de cada vida – o nosso melhor! Há pessoas que discursam sobre o que consideram “lugar de valor” e, na prática, as suas prioridades denunciam falta de coerência. Quem de nós já não viu um pai discursar sobre a importância de seu filho na sua vida e, de fato, o que sobra para esse filho são somente as migalhas do seu valoroso tempo. A letra do “Epitáfio”, música do Titãs, nos remete a essa realidade: “Devia ter...”. Na verdade, quando o precioso tempo das nossas vidas parece se esgotar é que nos dedicamos a pensar sobre quantidade de tempo e, portanto, de energia dispersada ao longo de uma vida. Uma ideia-constituinte, delineada a partir das considerações citadas, é a de que para se constituir um “lugar de valor”, faz-se necessário ser alvo do investimento das energias pulsantes da vida de alguém. Caso contrário, não passa de retórica vazia. Não são raras às vezes em que caímos na armadilha de procurar soluções certas para os problemas errados, afinal, as respostas são bem menos im- portantes para a dinâmica vida real do que as boas e genuínas perguntas. Na escola, investimos um tempo considerável na busca de respostas para problemas antigos que, muitas vezes, se apresentam como sintoma e não como causa das principais indagações institucionais. Falta tempo para pensar... Isso faz com que as nossas ações aconteçam à revelia de nós mesmos, ou seja, não somos capazes de compreender – pensar e exprimir – o que somos capazes de fazer... O que impede o avanço na direção da compreensão da prática educativa que assumimos não é a possibilidade de aprender com o sucesso de algumas iniciativas na área educacional, fazendo adaptações responsáveis e respeitosas a cada realidade, mas, sim, a atitude biocida de alguns gestores escolares que desconsideram a inteligência coletiva dos seus profissionais, conferindo a outrem a competência para determinar o compasso dos processos pedagógicos, bem como a identidade da instituição. Alheios à dinâmica interna, terceiros são contratados para fazer reuniões com as famílias, com os professores, comunicar a comunidade sobre as ações escolares, construir o planejamento estratégico, o regimento escolar, entre outras. Por tudo isso, a crítica sobre o “transplante” de modelos e eventuais “rejeições” do próprio “organismo” escolar se faz presente e necessária na discussão do tema proposto: A Construção do “Lugar de Valor” no Interior da Escola. Portanto, a construção do “lugar de valor” de professores e alunos no espaço escolar está intimamente relacionada ao cultivo e a qualidade das relações interpessoais, capazes de oxigenar, vitalizando o movimento criador, por meio do qual se extrai a identidade da obra, ou melhor, a assinatura da autoria. Esse movimento confere, de modo singular, o sentido de valor ao processo de ensino e de aprendizagem, considerando a realidade a partir da identidade coletiva, sem a qual qualquer projeto humano se esvazia. Muitas vezes o mais difícil e, ao mesmo tempo, o mais necessário é aprender a desaprender, para que possamos inovar respeitando o espírito de comunidade, capaz de revelar as impressões do agora, que se encontra em plena atualização. É isso que viabiliza o necessário e nos afugenta da armadilha do possível, conferindo responsabilidades pelo “lugar de valor” que construímos e com o qual identificamos a nossa obra. © ilustração: A Construção do “Lugar de Valor” no Interior da Escola