BRONQUIOLOPATIAS X TOSSE COQUELUCHÓIDE Os vírus respiratórios e as más companhias das Bordetellas e de outras bactérias. A coexistência de vírus respiratórios e bactérias a priori pode causar estranheza, porém, graças às adequações de alguns dos grandes centros tecnológicos, comprovou-se, na última década, que a associação não é tão rara como antigamente se supunha. As co-infecções envolvendo dois, eventualmente mais vírus, inclusive com a parceria bacteriana, são registradas principalmente nos lactentes no primeiro semestre de vida, particularmente no segundo trimestre, faixa etária de maior incidência das Bronquiolítes virais e de maior risco para contrair a Coqueluche (“Tosse comprida”), uma vez que não se completou o calendário básico da vacinação tríplice bacteriana DPT- Difteria, Pertussis (Coqueluche), Tétanoaplicadas aos 2,4 e 6 meses, nem as duas doses de reforço com um ano e três meses e, por volta, dos quatro até seis anos de idade e cuja erradicação exige ainda doses de reforçosprevistas em campanhas nacionais- e cuidados adicionais para evitar a importação da doença pelos viajantes não imunizados. Tais ocorrências são constatadas através de exames destinados ao rastreamento (painel) de vírus respiratórios e à pesquisa de Bordetella pertussis (Coqueluche) com a da Bordetella parapertussis (Parapertussis), para a qual não existem medidas imunopreventivas. *Para maiores detalhes consulte no site Artigos e Notícias/ Artigos Especializados: 2014“Atitude antivacina leva a um aumento da Coqueluche no país”. Uma reverência às Bronquiolites, privilégio dos lactentes: Tosse, “chiado no peito” e desconforto respiratório são sintomas em comum a várias doenças, as quais recebem diagnósticos diferentes em conformidade com a sua etiologia, porém, guardam a mesma fisiopalologia: espessamento (edema) de paredes brônquicas, broncoespasmo e hipersecreção brônquica, que constituem a hiperreatividade brônquica. O resultado é um distúrbio ventilatório obstrutivo leve, moderado ou grave, na dependência do número de brônquios afetados, justificando a diversidade dos quadros clínicos e da semiologia pulmonar (expiração prolongada/ roncos, estertores creptantes e subcreptantes de finos, médios e grossos calibres, sibilância/ cianose, batimento de asas do nariz e gemência, tríade que caracteriza a toxemia e, portanto, a gravidade do quadro e a necessidade de internação, inclusive sob a ótica do leigo). Este desconforto respiratório (dispnéia) pode ser avaliado pela determinação da oximetria de pulso- o ideal é manter uma saturação de oxigênio em ar ambiente acima dos 95%- a qual pode ser complementada pela gasometria arterial. Os aspectos radiológicos são de um infiltrado linear ou micronodular, traduzindo um comprometimento intersticial, com retificação dos arcos intercostais em consequência do aprisionamento aéreo ou hiperinsuflação pulmonar, decorrente da obstrução brônquica causada pela hiperreatividade. O imbróglio da nomenclatura e a idade- antes e depois dos dois anos: “Após os dois anos de idade”, quando estes sintomas forem causados por um processo infeccioso, o diagnóstico recebe a denominação de Bronquite. Quando se identifica a alergia aos agentes inalatórios, o diagnóstico passa a ser o de Asma e os casos de causa indeterminada são referenciados como broncoespasmo, nome impróprio, uma vez que está relacionado com a fisiopatologia do processo e, nesse aspecto, a denominação mais adequada é a de hiperreatividade brônquica, entretanto, a frequência como é empregado, o consagrou como um diagnóstico factóide, independente da faixa etária. Vale ressaltar que estes termos, tanto o broncoespasmo como o de hiperreatividade brônquica, não constam como diagnósticos no CID- Código (Classificação) Internacional de Doenças. “Nos primeiros dois anos de vida (lactentes)” Estima-se que 15% a 35% dos lactentes apresentarão uma crise com estes sintomas, atribuída à infecção causada por vírus respiratórios, na qual se convencionou o diagnostico de Bronquiolite e que corresponde ao diagnóstico de Bronquite nas crianças maiores. Nos lactentes hígidos, subentende-se: os nascidos de parto a termo e sem intercorrências, amamentados ao seio e não frequentadores de berçários, a infecção costuma ser autolimitada, com cura espontânea apenas com aporte hidroeletrolítico adequado. A fase aguda, na qual os sintomas são mais pronunciados, corresponde aos primeiros três/cinco dias da doença e as expectativas são as de melhora progressiva transcorridos cinco a sete, até 10 dias, com resolução do processo em 10 a 12, no máximo, até 15 dias. Considerando-se o perfil desse grupo, quando não ocorre melhora ainda que relativa, transcorridos cinco dias, deve-se atentar para as complicações bacterianas, não necessariamente com foco pulmonar, assim como para alterações estruturais, a exemplo das atelectasias. As evoluções atípicas de Bronquiolite são assinaladas com mais frequência, da mesma forma que as recorrências, nos lactentes que não tem esse perfil, principalmente se houver antecedentes familiares de Asma, e a comorbidade- como a Fibrose Cística (Mucoviscidose) e determinadas Cardiopatias Congênitas- é outro importante fator preditivo. Nas regiões de clima tropical, verifica-se uma maior incidência no outono e no início do inverno. Na cidade de São Paulo, começa a despontar no mês de março, atinge o pico em abril/maio e só vai deixar de pontuar, de maneira chamativa, no início de setembro. Daí as oscilações da sua frequência dos 15% aos 35%. Apesar de a evolução ser favorável na maioria dos casos, a Bronquiolite constitui a principal causa de internação nos lactentes com idade entre os três e seis meses. Os índices oscilam de 0,5% a 2%, dos quais 15% necessitam de cuidados intensivos e 3% a 8% de ventilação assistida. A mortalidade é menor que 1%. O grupo mais vulnerável compreende os nascidos de parto prematuro ou com algum problema anatômico, como as broncodisplasias, e que não estão sendo amamentados e que ingressaram precocemente em berçário. O vírus sincicial respiratório (VSR) protagoniza o elenco do painel de vírus respiratórios, seguido pelo Rhinovírus. A ocorrência de uma segunda crise é estimada em 60%, ou seja, dos 35 lactentes que apresentaram Bronquiolite, 20 terão uma reinfecção e não há um estudo que aponte a prevalência do tipo viral e, embora as perspectivas sejam especulativas, a probabilidade de ocorrer uma terceira crise é dada praticamente como certa, quando então ficou estabelecido o diagnóstico de “Bebê Chiador” ou da Síndrome do Lactente com Sibilância. Embora seja vago o conceito de “Bebê Chiador”, ficou ajustado para caracterizar estes quadros: as evoluções pouco responsivas, em que os sintomas persistem por mais de 30 dias ou quando há recorrências frequentes e próximas, logo após a suspensão dos tratamentos protocolares de resgate (alívio) com corticosteroides sistêmicos (prednisolona ou metilprednisolona) e broncodilatadores beta- agonistas inalatórios de ação rápida e curta (fenoterol ou salbutamol)- convencionou-se três crises em dois meses. * Nesses casos, certamente existem outros fatores interagindo junto aos processos infecciosos. Deve-se pesquisar a alergia às proteínas do leite de vaca (APLV) isolada ou associada aos refluxos gastroesofágicos, assim como as imunodeficiências e as alterações estruturais de vias aéreas superiores (Laringotraqueomalácias e os Distúrbios da Deglutição) e inferiores (Broncodisplasias e Bronquiectasias). A abordagem diagnóstica e terapêutica é multidisciplinar e complexa, com questionamentos com relação à conduta expectante: ficar no aguardo de uma terceira crise, para dar início a essa investigação diagnóstica ou antecipar, uma vez que suas recorrências são dadas praticamente como certas, e instituir um tratamento preventivo numa fase mais precoce com maiores probabilidades de êxito, não propriamente para evitar a instalação dos quadros de “Bebê Chiador”, mas para reduzir a frequência das recidivas assim como a gravidade da sintomatologia. O entrave é a polêmica que envolve a impossibilidade de rastrear a alergia aos agentes inalatórios (poeira, ácaros, fungos...) nessa idade e firmar o diagnóstico de Asma antes dos dois anos, o que facultaria um tratamento preventivo mais direcionado com o emprego de imunobiológico específico ao invés dos imunomoduladores derivados do montelucaste de sódio e do fumarado de cetotifeno, indicados para serem administrados a partir dos seis meses de idade, o que contribuiria para espaçar, ainda mais, os intervalos entre as crises assim como amenizar a intensidade dos sintomas. *Admite-se que muitos dos bebês chiadores terão alergia aos inalantes, portanto, o “Bebê Chiador” de hoje é um forte candidato a ser o Asmático de amanhã, particularmente se houver antecedentes familiares de alergia, não necessariamente respiratória. O PAINEL DE VÍRUS RESPIRATÓRIOS inclui a pesquisa dos: Vírus Sincicial Respiratório (VSR) A e B, Influenza vírus A, A H1N/ 2009- Cepa epidêmica (Gripe suína), B e C, Parainfluenza vírus tipos 1,2,3 e 4 com subtipos A e B, Adenovírus, Bocavírus, Cononavírus, Enterovírus tipo B, Metapneumovírus A e B, Rhinovírus. O VSR, o Influenza A e B, o Parainfluenza 1, 2 e 3 e o Adenovírus são pesquisados pelo método da imunofluorescência indireta. A sensibilidade para o VSR- responsável por cerca de 80% das infecções virais- e do parainfluenza é de 90%, portanto, deve-se computar a possibilidade de resultados falso-negativos e se no protocolo de pesquisa fosse inserida a realização do método molecular para outros vírus, principalmente com relação ao Rhinovírus e ao Metapneumovírus, cuja sensibilidade, também, se aproxima dos 90%- mesmo que a prevalência não seja relevante- isso contribuiria para diminuir o número destes resultados. *Os resultados não detectáveis podem decorrer da ausência ou concentração viral inferior ao limite de detecção do teste, de forma que podem ser interpretados como falso-negativos e não, propriamente, como excludentes da etiologia viral e uma vez na dúvida quanto a etiologia infecciosa, convém dar início a uma investigação diagnóstica mais aprofundada, no sentido de apurar outras causas ou agravantes que possam estar comprometendo a evolução da Bronquiolite. Mito ou tabu literário? Os exames são solicitados frente a uma suspeita diagnóstica, daí os resultados não detectáveis serem interpretados como falso-negativos e não como excludentes. No entanto, é preciso ponderar antes de atribuir, indiscriminadamente, as causas das Bronquiolites aos vírus respiratórios, particularmente as evoluções atípicas que cursam em lactentes sem qualquer fator preditivo para tal. * Quanto à co-infecção, a associação entre dois vírus não é tão comum e acima, é excepcional. *O limite de co-participação víral detectada pelo método RT- PCR Microarray- para detectar os seguintes subtipos virais: Influenza A (H1N1) humano, H3N2 e H1N1 Cepa epidêmica (Gripe suína), Metapneumovírus A e B e Parainfluenza 4A e B- é de até 5 vírus. A COQUELUCHE A pesquisa de Bordetella pertussis (Bp) e da Bordetella parapertussis (Bpp), assim como a do painel de vírus respiratórios, é realizada em secreção de nasofaringe- swab (coleta laboratorial) ou através de aspiração (nos internados)- e obtida através da determinação do PCR –Reação em Cadeia da Polimerase- e cultura em meio específico- meio de BordetGengou. Como o PCR é mais sensível, a sua positividade não implica necessariamente em uma cultura positiva, enquanto que sua negatividade, teoricamente, dá como certa uma cultura, também, negativa. Entretanto, por problemas de coleta e de processamento da amostra, isso nem sempre ocorre e é, inclusive, o que pode justificar os resultados não detectáveis serem valorizados, nos moldes da interpretação do painel de vírus respiratórios, mais como falso-negativos do que, propriamente, como excludentes e adotar a conduta à luz dos sinais e sintomas do paciente, uma vez que o quadro clínico é soberano. Dos vírus respiratórios, a literatura aponta o VSR como o implicado em cerca de 80% dos casos de tosse coqueluchóide, seguido pelo adenovírus e parainfluenza. Nas co-infecções virais, inclusive nas associadas com a Bordetella pertussis, não se assinala uma presença marcante do VSR. Nas pesquisas realizadas com os dois métodos: imunofluorescência indireta e o molecular, apesar de ainda ser o vírus prevalente, houve mais equidade na disputa do ranking. Além da Bordetella pertussis (coqueluche) e da parapertussis (paracoqueluche), outras bactérias podem causar tosse coqueluchóide, de forma menos típica, mas com representatividade a partir da idade escolar. O Mycoplasma pneumoniae, como principal agente de Pneumonia Atípica Primária, em crianças com mais de sete anos de idade e a Chlamydophilia pneumoniae em idosos, com mais de 65 anos. Ressalvas à Chlamydia trachomatis que, também, pode causar tosse coqueluchóide com características atenuadas- tosse que lembra a da Coqueluche- em lactentes no primeiro trimestre de vida, principalmente portadores de conjuntivite e como condição sine qua non: nascidos de parto normal e, uma vez, constatada a presença de leucorréia no último trimestre de gravidez. Nos bebês prematuros, a pneumonia pode se instalar precocemente, logo nas primeiras 48 horas do nascimento, com um cortejo sintomático e imagens radiológicas indistinguíveis à da Síndrome do Desconforto Respiratório e da pneumonia causada pelo estreptococo betahemolítico do grupo B de Lancefield- Streptococcus agalactiae. Quanto ao Haemophilus influenzae do tipo B, mais que os demais, parece não corresponder ao destaque literário que lhe é imputado. Com o advento da vacina, o hemófilo perdeu a majestade e na maioria dos casos suspeitos de seu envolvimento, não se evidencia os acessos de tosse com características próximas à da coqueluche. Um adendo às Clamídias: pequenas bactérias Gram-negativas, anteriormente consideradas uma forma intermediária entre vírus e bactéria. Existem três espécies patogênicas, agrupadas em dois gêneros: Chlamydia trachomatis e Chlamidophilia pneumoniae e psittaci, as quais apresentam tosse paroxística não produtiva, com características que lembram à Coqueluche, inclusive com um exame físico praticamente normal, salvo pela presença esporádica de alguns estertores subcreptantes e sibilos esparsos, e um padrão radiológico intersticial bilateral inespecífico. - A C. pneumoniae assume papel de destaque como agente de pneumonia, sinusites e crise de bronquite, em idosos com mais de 65 anos. Conjectura-se sua relação com a aterosclerose. - A C. psittaci tem essa designação em virtude de ser transmitida por pássaros da ordem Psitaciformes (papagaios, periquitos e araras), daí a referência de psitacose e a razão da doença ser conhecida popularmente como febre dos papagaios. No entanto, como outras aves infectadas podem servir de reservatório, a denominação mais apropriada da infecção é ornitose. No quadro clínico, desperta maior atenção a tosse coqueluchóide, porém, a presença de sinais de comprometimento sistêmico como a febre, calafrios, dores musculares e de cabeça, em mais pessoas que tenham convívio com pássaros, fazem a diferença diagnóstica, particularmente se ocorrer erupção cutânea e esplenomegalia e, mais raramente: ceratoconjuntivite, icterícia (hepatite), artrite, encefalite e miocardite. É uma doença de caráter compulsório, mas devido às dificuldades diagnósticas, cuja comprovação requer um aumento de quatro vezes entre os títulos de anticorpos nas fases aguda e convalescença, pressupõe-se haver uma subnotificação e, daí, ser considerada mais rara. - A C. trachomatis representa a infecção bacteriana sexualmente transmissível, de notificação compulsória, mais comum nos EUA. Pode causar infecções urogenitais e óculogenitais em adolescentes e adultos, particularmente com menos de 25 anos de idade. No âmbito da pediatria, mais precisamente nos primeiros três meses de vida, é importante agente de pneumonia. No período neonatal, são igualmente importantes o Streptococcus agalactiae e a Listeria monocytogenes, mas, apesar do mesmo padrão radiológico, a tosse faz a diferença diagnóstica. A colonização assintomática do canal de parto pode persistir por até 18 meses, para então despontar o corrimento vaginal purulento, que pode induzir a interrupção da gravidez (aborto ou parto prematuro) e está associada ao desenvolvimento de endometriose no pós-parto ou no pós-aborto. Nos recém- nascidos de parto “normal”, após uma incubação de cinco a 21 dias, eventualmente de até dois/ três meses do contato com a secreção vaginal infectada, surge a conjuntivite. No início, se apresenta como uma secreção aquosa, que simula uma manifestação de Dacriocistite, porém, logo se torna purulenta e se associa à hiperemia e edema das conjuntivas e pálpebras. Assume aspecto semelhante ao da oftalmia gonocócica, exceto pelo surgimento mais agudo (desde logo após o nascimento até cinco dias), evolução mais fugaz e pelo fato de ter sido erradicada com um pré-natal mais acirrado e com a profilaxia, através da credeização (instilação de solução de nitrato de prata a 1%). Dessa forma, a conjuntivite é prenúncio de infecção por Clamídia e a administração precoce de azitromocina pode, senão evitar, atenuar a manifestação clínica da pneumonia que sobrevém à conjuntivite e que ocorre em 20% dos recém-nascidos de mães infectadas- 50% dos casos com conjuntivite. O trabalho realizado no HU-USP Em levantamento casuístico de 57 lactentes internados com tosse coqueluchóide, concluído em março de 2013 pelo Hospital Universitário da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, tido como referência em Coqueluche no período do estudo, constatou-se conforme artigo- J. Pediatr. (Rio J.) vol. 89 no. 6 Porto Alegre Nov./ Dez. 2013: Uma positividade de 26% para os vírus respiratórios (VR)- 15 casos. Entre os vírus, em consonância com a literatura, houve um predomínio de 80% para o VSR (12 casos), seguido pelo Parainfluenza vírus tipo 3-com dois casos e apenas um caso de associação do Adenovírus com o Influenza do tipo A. O Rhinovírus não pontuou. A PCR para pesquisa da Bp foi positiva em 44% (25 casos), com apenas 1/4 das culturas positivas, o que chancela sua maior sensibilidade. Dos 25 casos positivados para Coqueluche (Bordetella pertussis), três tiveram co-infecção viral confirmada (12%), porém, não houve especificação do tipo prevalente, nem alusão quanto à maior gravidade dos sintomas e a necessidade de cuidados intensivos. *Uma positividade na casa dos 26% para os vírus respiratórios (15 casos), associados aos quadros clínicos menos típicos, e de 44% para a Bordetella pertussis (25 casos). Portanto, com aproximadamente 30% de resultados não detectáveis, que ostentam uma representatividade contrária à da literatura. Como o método empregado para a pesquisa dos vírus respiratórios foi o da imunofluorescência indireta, apesar de abranger os principais tipos de vírus, caso a pesquisa tivesse sido complementada com o método molecular, certamente o número de resultados não detectáveis seria inferior. Da mesma forma que se na pesquisa para a Bordetella pertussis fosse incluída a pesquisa da espécie parapertussis, a positividade poderia ser maior. Contudo, nada a ponto de distorcer a significância dos dados estatísticos. Em suma: * Nas Bronquiolites há prevalência do VSR em 80% dos casos detectados, seguido pelo Rhinovírus. * Nas Bronquiolites que cursaram com tosse coqueluchóide: - 26% dos casos foram atribuídos às infecções virais, com o mesmo predomínio do VSR, porém, seguido por outros vírus- Parainfluenza tipo 3 (dois casos) e uma associação do Adenovírus com o Influenza tipo 4. - 44% dos casos foram atribuídos à Bordetella e a co-infecção viral foi confirmada em 12%. Ficou implícito a Bordetella estar associada aos quadros clínicos mais típicos, uma vez que os vírus respiratórios ficaram relacionados aos sintomas menos preditivos. Em aproximadamente 30% dos lactentes, a etiologia foi indeterminada e não houve referência quanto à intensidade dos sintomas. A CONCLUSÃO: *A infecção por vírus respiratórios, inclusive nas associações, não afasta a possibilidade de coínfecção por Bordetella pertussis e, muito menos, pela Bordetella parapertussis, para a qual não existe vacina preventiva. Os macrolídeos estão indicados nos casos de tosse coqueluchóide isolada ou como integrante do cortejo sintomático das bronquiolopatias, inclusive quando a etiologia viral é confirmada e a pesquisa para as Bordetellas for inconclusiva. No período neonatal, priorizar a azitromicina, em virtude da menor hepatotoxidade, comparada à eritromicina, particularmente com os derivados do estolato, e no que concerne à claritromicina, devido à suposição de estar relacionada com quadros de Estenose Hipertrófica de Piloro, da mesma forma obscura que ocorreu por ocasião da administração das primeiras vacinas preventivas da gastrenterite causada pelo Rotavírus. No que concerne à co-participação dos refluxos gastroesofágicos, eles devem ser considerados mais como consequência e um fator intensificador, do que exatamente a causa da tosse. Contudo, essa associação, muitas vezes, merece ser relevada em termos terapêuticos. ALGUMAS CARACTERÍSTICAS DA COQUELUCHE QUE PODEM FAZER A DIFERENÇA, FRENTE À NEGATIVIDADE DOS EXAMES: Evolução: - Fase catarral: sintomas de resfriado comum. Duração: 1/2 semanas. -“Fase paroxística”: como o nome sugere, corresponde a fase na qual a tosse assume caráter coqueluchóide e, portanto, quando é aventada a suspeita da doença e são solicitados os exames. Os casos típicos são marcados por acessos prolongados de tosse seca- daí a denominação de tosse comprida- seguidos de guincho inspiratório, tido- per si só- como um forte preditivo da Coqueluche. Por ser mais frequente e intensa à noite, é referenciada como tosse paroxística noturna. A tosse da Coqueluche não é contínua, existe um período de acalmia absoluta entre as crises. Entretanto, é extremamente sensível á qualquer estímulo. Os acessos podem ser desencadeados após qualquer esforço físico, como um simples espirro ou choro e até mesmo com engasgos ao deglutir o leite, o que impõem cuidados adicionais durante as refeições. Nas consultas, pode ser precipitado com a compressão firme da língua com a espátula ou pela leve compressão traqueal ou sobre o conduto auditivo externo. Nas crises intensas e repetidas, os acessos de tosse causam sudorese, congestão das conjuntivas, incontinência dos esfíncteres, petéquias principalmente em face e vômitos. Seu potencial emetizante e para precipitar crises de apnéia (perda de fôlego) e cianose, assim como ser apirética e pouco ou nada responsiva aos antitussígenos, são outras características que dão sustentação ao emprego de macrolídeo, independente da confirmação laboratorial. Contudo, nem toda coqueluche produz paroxismos típicos. Devem-se considerar as formas frustras (acessos atípicos), nas crianças parcialmente imunizadas, em que pesam os resultados dos exames comprobatórios, no sentido de não introduzir antimicrobianos de maneira indiscriminada. Chama atenção, tanto nas Bronquiolites clássicas como na Coqueluche, a discrepância entre os quadros clínicos com o exame físico e os achados radiológicos. A intensidade da dispneia das Bronquiolites e a magnitude e o caráter renitente da tosse e demais sintomas da Coqueluche, em contraste com uma semiologia pulmonar absolutamente normal, eventualmente com ausculta de alguns sibilos e estertores esparsos, em ambos os casos, sem ocorrer comprometimento do estado geral e com achados radiológicos que se limitam a um infiltrado intersticial ou micronodular bilateral, comum a qualquer processo gripal. Duração: 2-6 semanas, eventualmente até 10 semanas. . *A Secretaria da Saúde do Estado de São Paulo, com o objetivo de reduzir o período de transmissibilidade da doença e considerando-se a possibilidade de resultados falso-negativos, determina que pacientes que exibem tosse coqueluchóide por mais de duas semanas e os contactantes próximos, devem ser submetidos à notificação compulsória e tratados, de preferência, com azitromicina, independente da idade, de pendências no calendário vacinal e da confirmação laboratorial. -Fase de convalescença: tosse comum com reaparecimento transitório do paroxismo, não necessariamente noturno. Duração: 1/3semanas. Exames subsidiários: “leucograma”. Na fase catarral: leucocitose não muito relevante (>20 000) com linfocitose. Na fase paroxística: leucocitose > 30/40 000 com 60/80% de linfócitos- um padrão que lembra o do vírus Epstein Barr, causador da Mononucleose, exceto pela ausência de atipia linfocitária significativa. Padrão condizente com a etiologia viral, haja vista que as leucocitoses ou leucopenias linfomonocitárias (que ocorrem com predomínio dos linfócitos e dos monócitos), teoricamente, são sugestivas destes processos. Estes conceitos carecem de revisão, uma vez que na prática, com relativa frequência, nos deparamos com quadros de diarreia e com manifestações respiratórias, comprovadamente, causados por infecções virais, a exemplo do Rotavírus e do próprio VSR, que não seguem qualquer padrão leucocitário, inclusive com a determinação da Proteína C Reativa (PCR), ora, com valores bem elevados indicativos de um processo de origem bacteriana e não viral. Evocando a microbiologia (miscelânea): - Todos os cocos são Gram-positivos, exceto os do gênero Neisseria meningitidis e gonorrhoeae. - Ao contrário, todos os bacilos são Gram-negativos com exceção do Clostridium tetani, Corynebacterium diphtheriae e da Listeria monocytogenes. Nas infecções causadas por Gram-positivos, espera-se uma leucocitose com neutrofilia, enquanto que as infecções causadas por Gram-negativos são ou deveriam ser chanceladas pelas leucopenias com neutrofilia. Cumprem exceções às regras: as infecções causadas pelo Haemophilus influenzae, Shiguella sp e as infecções do trato urinário alta (Pielonefrites) causadas pela Escherichia coli, Proteus mirabilis, Klebsiella oxytoca, entre outras bactérias Gram-negativas. Na maioria destes casos, o leucograma, paradoxalmente, segue um padrão de infecção causada por Gram-positivo. Com relação à Bordetella pertussis, o que vai de encontro com o academicismo, é que por ser um coco-bacilo Gram-negativo, deveria ocorrer leucopenia com neutrofilia e não leucocitose com linfocitose, principalmente nos valores assinalados. A disparidade destes resultados, que fazem as exceções às regras, podem impor dificuldades na abordagem diagnóstica e terapêutica de alguns processos infecciosos, no sentido de introduzir antimicrobianos ou de manter um tratamento sintomático. Em se tratando da Coqueluche, com outras implicações quanto à notificação compulsória, isolamento e tratamento dos contactantes. Transmissão: - Através do contato direto (gotículas). - O período de contagiosidade , em que o paciente deve ficar isolado, vai de sete dias do contato com o doente até as primeiras três semanas do paroxismo da tosse. No entanto, o isolamento pode ser suspenso após sete dias do término do antibiótico, daí a importância de se instituir o tratamento precoce. Se a pessoa permanecer assintomático por duas semanas após o contato com o doente, ela pode ser considerada livre da doença. Exames subsidiários: Além do leucograma e da determinação da PCR, os raios X de tórax podem revelar um comprometimento intersticial. Em determinados casos, mais em pré-escolares, o borramento da silhueta cardíaca com o aspecto do coração franjado, fortalece a suspeita diagnóstica. Tratamento: MACROLÍDEOS Como medida profilática, deve ser extensivo a todos os contactantes domiciliares (íntimos). A recomendação do Ministério da Saúde é para dar prioridade, nos primeiros seis meses de vida, à azitromicina: 5 mg/Kg/ dia (5 dias- uma dose diária)- primeira dose dobrada. Alternativas: Claritromicina (posologia variável de acordo com o peso e idade em duas tomadas - 7 dias). Eritromicina (40/50 mg/Kg/dia em 4 tomadas- 7 a 14 dias). Nos casos de não disponibilidade ou de intolerância aos macrolídeos: Sulfametoxazol/ Trimetropin (SMZ/TMP)- 40 mg/Kg/dia em duas tomadas. *A azitromocina, além do comodismo posológico, não tem os efeitos colaterais registrados com a claritromicina e da eritromicina, quando administradas no primeiro mês de vidahepatotoxidade e associação com Estenose Hipertrófica de Piloro, por promoverem contração da musculatura lisa. Isolamento (do paciente e contactantes que trabalham com crianças): 5 dias a contar do início do tratamento.