UNIVERSIDADE CASTELO BRANCO ATUALIZA ASSOCIAÇÃO CULTURAL ENFERMAGEM DO TRABALHO JENNIFER FERREIRA ALMEIDA ACIDENTE DE TRABALHO COM MATERIAL PERFUROCORTANTE ENTRE PROFISSIONAIS DE ENFERMAGEM NO AMBIENTE HOSPITALAR: uma revisão bibliográfica SALVADOR 2010 JENNIFER FERREIRA ALMEIDA ACIDENTE DE TRABALHO COM MATERIAL PERFUROCORTANTE ENTRE PROFISSIONAIS DE ENFERMAGEM NO AMBIENTE HOSPITALAR: uma revisão bibliográfica Monografia apresentada à Universidade Castelo Branco/ Atualiza Associação Cultural, como requisito parcial para obtenção do título em Enfermagem do Trabalho sob orientação do Profº Fernando Reis do Espírito Santo. SALVADOR 2010 A447a Almeida, Jennifer Ferreira Acidente de trabalho com material perfurocortante entre profissionais de enfermagem no ambiente hospitalar: uma revisão bibliográfica / Jennifer Ferreira Almeida. – Salvador, 2010. 53f.; 50 cm. Orientador: Prof. Dr. Fernando Reis do Espírito Santo Monografia (pós-graduação) – Especialização Lato Sensu em Enfermagem do Trabalho, Universidade Castelo Branco, Atualiza Associação Cultural, 2010. 1. Enfermagem do trabalho 2. Acidente de trabalho 3. Equipe de enfermagem 3. Material perfurocortante I. Espírito Santo, Fernando Reis II. Universidade Castelo Branco III. Atualiza Associação Cultural IV. Título. CDU 616-083 Ficha catalográfica elaborada pela Bibliotecária Adriana Sena Gomes CRB 5/ 1568 JENNIFER FERREIRA ALMEIDA ACIDENTE DE TRABALHO COM MATERIAL PERFUROCORTANTE ENTRE PROFISSIONAIS DE ENFERMAGEM NO AMBIENTE HOSPITALAR: uma revisão bibliográfica Monografia para obtenção do grau de Pós-Graduado em Enfermagem do Trabalho. Salvador,_____ de_________ de______. EXAMINADOR: Nome: _________________________________________ Titulação: _________________________________________ PARECER FINAL: ___________________________________________________________________________ ___________________________________________________________________________ ___________________________________________________________________________ ___________________________________________________________________________ ___________________________________________________________________________ ___________________________________________________________________________ ___________________________________________________________________________ Dedico esta monografia a toda minha família, em especial aos meus pais, Raimundo e Edna, que em nenhum momento mediram esforços para realização dos meus sonhos. Obrigado por tudo. AGRADECIMENTOS Fruto de muito estudo, dedicação e persistência, este trabalho contou com o apoio e a colaboração de algumas pessoas, as quais dedico os meus agradecimentos especiais: Agradeço a Deus pelo dom da vida, renovando a cada provação que se apresente, e nos sonhos que se concretizam, como este agora que se torna realidade. Aos meus pais, Raimundo e Edna, por serem exemplos de vida, dedicação, amor e por terem me fornecido condições para me tornar a profissional que sou. Aos meus irmãos, Pamela e Anthony, pelo amor incondicional e apoio sempre demonstrado. Aos meus familiares e amigos pela inigualável convivência. Ao meu orientador, Fernando Reis, pelos valiosos momentos de discussão e conhecimentos compartilhados. Sem sonhos, as perdas se tornam insuportáveis, as pedras do caminho se tornam montanhas, os fracassos se transformam em golpes fatais. Augusto Cury RESUMO No ambiente hospitalar concentram-se pacientes acometidos pelas mais variadas patologias, assistidos por diferentes categorias de profissionais da saúde. Entre esses profissionais destacam-se os trabalhadores de enfermagem que permanecem vinte quatro horas junto ao paciente prestando assistência direta. È durante essa assistência que a equipe de enfermagem manipula materiais perfurocortantes como, lâminas, agulhas, scalp e, conseqüente, expõe-se a vários riscos, podendo adquirir diversas patologias e lesões em decorrência dos acidentes de trabalho. Várias pesquisas realizadas sobre acidentes com materiais perfurocortantes têm sido imprescindíveis para as mudanças das práticas de trabalho. Este estudo objetiva evidenciar, na literatura, as doenças ocupacionais que acometem os profissionais de enfermagem no ambiente hospitalar decorrentes de acidentes de trabalho com material perfurocortante, identificando os principais riscos ocupacionais. O desenho metodológico é de uma pesquisa bibliográfica, exploratória, de abordagem qualitativa. O levantamento bibliográfico foi feito a partir de consulta na base de dados da biblioteca virtual SCIELO (Scientific Electronic Library Online), além de periódicos, livros e outras publicações eletrônicas de respaldo em território nacional. Achados os escritos considerados relevantes, partiu-se para a seleção dos principais conteúdos relacionados ao tema em questão formando-se a partir daí um conjunto bibliográfico necessário à realização do trabalho. Foram encontrados vários artigos pertinentes sobre o assunto, sendo que para a escolha de alguns em detrimento de outros, adotou-se por características previamente selecionadas. Dentre estas características foram inclusas as publicações que identificavam os riscos ocupacionais, acidentes de trabalho com material perfurocortante, trabalhadores de enfermagem e ambiente hospitalar. Conclui-se que os todos os profissionais da enfermagem, principalmente os auxiliares de enfermagem, estão diante de uma alta exposição ocupacional e, portanto, vulneráveis a adquirir AIDS, hepatite B e C devido a manipulação direta com objetos perfurocortantes. Vários fatores contribuem para a ocorrência dos acidentes de trabalho entre eles: conhecimento insuficiente sobre as doenças ocupacionais; falta do uso de equipamentos de proteção individual e pouca conscientização da gravidade dos riscos. Palavras-chave: Acidentes de trabalho, ambiente hospitalar, equipe de enfermagem, material perfurocortante ABSTRACT In hospitals focus patients affected by several diseases, assisted by various categories of health professionals. Among these professionals stand out nursing workers who remain twenty four hours with the patient providing direct assistance. It is for such assistance to the nursing staff handles sharps such as blades, needles, scalp, and, consequently, is exposed to various risks and can get various diseases and injuries due to accidents at work. Several surveys conducted on accidents with sharps have been instrumental to the changes in work practices. This study aims to highlight the literature, the occupational diseases that affect nursing professionals in hospitals due to occupational accidents with needlestick injuries, identifying the main occupational risks.Our methodology is a literature search and exploratory, qualitative approach. The literature review was done by searching the database of the virtual library SCIELO (Scientific Electronic Library Online), in addition to periodicals, books and other electronic publications in support of the national territory. The written findings considered relevant, broke for the selection of the main topics related to the subject matter forming thereafter a bibliographic set required to perform the work. We found several articles relevant to the subject, and for the choice of some over others, was adopted by features previously selected. Among these features were included publications that identified occupational risks, occupational accidents with needlestick injuries, nurses and hospital personnel. It follows that all Healthcare professionals, especially nursing assistants, are faced with a high occupational exposure, and therefore vulnerable to acquiring AIDS, hepatitis B and C because direct manipulation with sharp objects. Several factors contribuite to the occurrence of accidents at work among them: insufficient knowledge about occupational diseases, lack of use of personal protective equipment and little awareness of the seriousness of the risk. Keywords: Occupational accidents, hospital, nursing staff, needlestick LISTA DE ABREVIAÇÕES AIDS Síndrome da Imunodeficiência Adquirida CAT Comunicação de Acidente de Trabalho CCIH Comissão de Controle de Infecção Hospitalar CDC Centers for Disease Control and Prevention CIPA Comissões Internas de Prevenções de Acidentes EPI Equipamento de Proteção Individual HBV Vírus da Hepatite B HCV Vírus da Hepatite C HIV Vírus da Imunodeficiência Adquirida SCIELO Scientific Electronic Library Online SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO...................................................................................................02 2. REVISÃO DA LITERATURA...........................................................................06 2.1 Papel da Enfermagem....................................................................................06 2.2.O Ambiente Hospitalar..................................................................................10 3. ACIDENTES DE TRABALHO..........................................................................14 3.1 Breve Histórico da Saúde do Trabalhador.....................................................14 3.2 Os profissionais de enfermagem e o acidente de trabalho............................19 3.3 Prevenção dos acidentes envolvendo a equipe de enfermagem....................27 4. CONSIDERAÇÕES FINAIS..............................................................................31 REFERÊNCIAS ANEXOS 2 1. INTRODUÇÃO Apresentação do objeto de estudo Considera-se enfermagem como sendo a arte de cuidar e a ciência cuja essência e especificidade são o cuidado ao ser humano, individualmente, na família ou em comunidade de modo integral e holístico, desenvolvendo de forma autônoma ou em equipe atividades de promoção, proteção, prevenção, reabilitação e recuperação da saúde. Os trabalhadores de enfermagem, durante a assistência ao paciente, estão expostos a inúmeros riscos ocupacionais causados por fatores químicos, físicos, mecânicos, biológicos, ergonômicos e psicossociais, que podem ocasionar doenças ocupacionais e acidentes de trabalho. (MARZIALE; RODRIGUES, 2002) É no ambiente hospitalar que os acidentes ocasionados, principalmente pela manipulação de material perfurocortante, como por exemplo agulhas, scalps, bisturis, ocorrem com grande frequência na execução do trabalho, pois a enfermagem permanece vinte quatro horas junto ao paciente e consequentemente o contato com microorganismos patológicos se torna inevitável. Quando o acidente ocorre com material contaminado pode acarretar doenças como a Hepatite B (transmitida pelo vírus HBV), Hepatite C (transmitida pelo vírus HCV) e a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida - AIDS (transmitida pelo vírus HIV). O acidente pode ter repercussões psicossociais, levando a mudanças nas relações sociais, familiares e de trabalho. As reações psicossomáticas pós-profilaxia, utilizada devido à exposição ocupacional e ao impacto emocional, também são aspectos preocupantes. (MARZIALE; NISHIMURA; FERREIRA, 2004) Segundo a Lei nº. 8.213, de 24 de julho de 1991, alterada pelo Decreto nº. 611, de 21 de julho de 1992, no artigo 19º.,“acidente do trabalho é aquele que ocorre pelo exercício do trabalho, a serviço da empresa ou ainda, pelo serviço de trabalho de segurados especiais, provocando 3 lesão corporal ou perturbação funcional que cause a morte, a perda ou redução da capacidade para o trabalho, permanente ou temporária. Os acidentes de trabalho representam um sério problema nas instituições de saúde tanto pela freqüência como ocorrem quanto pela gravidade que acometem a saúde desses trabalhadores, por isso a saúde dos trabalhadores deve ser encarada com a mesma importância que a de usuários dos serviços de saúde, visto que o trabalho exerce um papel fundamental nas condições de vida do homem. È importante levar em conta que a qualidade na atenção a saúde depende das condições em que esse trabalho é realizado, evitando que os profissionais sofram desgastes, doenças ou acidentes de trabalho. Justificativa A idéia de abordar esse tema surgiu da própria experiência de vida laboral, por conviver diariamente com as situações que os profissionais de saúde passam no ambiente hospitalar. As atividades desses trabalhadores são desenvolvidas com o objetivo de promover o bem estar do semelhante, mas inúmeras vezes, não são levadas em conta alguns determinantes que poderão desencadear agravos a sua própria saúde. Dentre esses profissionais, destaca-se a equipe de enfermagem que, na execução de suas atividades diretamente com o paciente, manipulam objetos contendo sangue e fluidos corpóreos capazes de transmitir inúmeras doenças. Várias pesquisas realizadas sobre acidentes com materiais perfurocortantes têm sido imprescindíveis para as mudanças das práticas de trabalho. Têm alertado para a necessidade de conscientização dos profissionais e instituições de saúde pública e privada sobre os riscos da exposição ocupacional, principalmente a materiais biológicos. Diante dos múltiplos fatores associados a esses acidentes, da importância da adoção de estratégias preventivas para minimizar o problema e em decorrência do fato que a alteração do estado de saúde dos profissionais pode interferir significativamente no cuidado com o paciente, torna-se indispensável uma atenção voltada a saúde desses profissionais. Assim, justifica-se realizar um estudo sobre acidentes de trabalho com material perfurocortante entre a equipe de enfermagem num ambiente hospitalar. 4 Problema Quais as doenças ocupacionais acometem os profissionais de enfermagem no ambiente hospitalar devido aos acidentes de trabalho com material perfurocortante? Objetivo Evidenciar, na literatura, as doenças ocupacionais que acometem os profissionais de enfermagem no ambiente hospitalar decorrentes de acidentes de trabalho com material perfurocortante, identificando os principais riscos ocupacionais. Metodologia Todo conteúdo desta monografia, no que diz respeito aos acidentes de trabalho com material perfurocortante entre profissionais de enfermagem no ambiente hospitalar, foram sintetizados e construídos através de uma pesquisa bibliográfica. A pesquisa bibliográfica é, na concepção de Gil (1991), desenvolvida a partir de material já elaborado, constituído principalmente de livros e artigos científicos. O método a ser adotado neste trabalho foi de um estudo exploratório, de abordagem qualitativa. Para construção da pesquisa, essencialmente foi feita o levantamento e a leitura bibliográfica sobre acidentes de trabalho entre a equipe de enfermagem no ambiente hospitalar. O levantamento bibliográfico foi feito a partir de consulta na base de dados da biblioteca virtual SCIELO, além de periódicos, livros e outras publicações eletrônicas de respaldo em território nacional. Achados os escritos considerados relevantes, partiu-se para a seleção dos principais conteúdos relacionados ao tema em questão formando-se a partir daí um conjunto bibliográfico necessário à realização do trabalho. Foram encontrados vários artigos pertinentes sobre o assunto, sendo que para a escolha de alguns em detrimento de outros, adotou-se por características previamente selecionadas. 5 Dentre estas características foram inclusas as publicações que identificavam os riscos ocupacionais, acidentes de trabalho com material perfurocortante, trabalhadores de enfermagem e ambiente hospitalar. O trabalho teve início com a elaboração do projeto de pesquisa. A orientação ficou sob os cuidados de um único orientador. O que se produziu, era encaminhado para avaliação do orientador e este analisava e propunha as modificações e correções que deveriam ser realizadas. Estrutura do trabalho Este estudo está estruturado em dois momentos. No primeiro, se aborda o papel da enfermagem e o ambiente hospitalar. Nesse momento será discutido sobre o surgimento da enfermagem como ciência enfocada na arte do cuidado e sobre o ambiente hospitalar definindo os principais riscos existentes neste local. No segundo, uma abordagem sobre acidentes de trabalho discorrendo história da saúde do trabalhador e suas transformações, analisando, primeiramente, a história na sua forma geral e logo após, passando a uma análise mais específica, no Brasil. Após, aborda-se os profissionais de enfermagem e o acidente de trabalho bem como, a prevenção dos acidentes perfurocortante envolvendo a equipe de enfermagem. E por último, são feitas as considerações finais a respeito de todo conteúdo expostos nos referidos capítulos e mantendo consonância com os objetivos primeiramente estabelecidos. 6 2. REVISÃO DA LITERATURA 2.1 Papel da Enfermagem O cuidar sempre esteve presente na história humana, como forma de viver e de se relacionar. Nas diversas civilizações, o cuidado tecnológico também se fez presente, porém apresentavase muitas vezes indiferenciado das práticas de cura. O cuidado nasce de um interesse, de uma responsabilidade, de uma preocupação e de um afeto, o qual geralmente inclui, de maneira implícita, o maternar e o educar, que por sua vez, contribui para o crescimento. (ULRICHSEN; VARGENS, sp) A enfermagem é uma profissão cuja essência é o cuidado ao ser humano individualmente, na família ou comunidade de modo integral e holístico, desenvolvendo atividades de promoção, proteção, recuperação da saúde e prevenção de doenças. Ao longo da história, embora não existisse a enfermagem como conhecemos hoje, sempre houve pessoas que precisavam de cuidados e cuidadores. Essa profissão surgiu do desenvolvimento e evolução das práticas de saúde no decorrer dos períodos históricos. Antigamente, no período pré-cristão, as doenças eram interpretadas como uma punição de Deus ou poder do demônio. Com isso os sacerdotes ou feiticeiras exerciam as funções de médicos e enfermeiros. O tratamento consistia em afastar os maus espíritos por meio de sacrifícios. Mais tarde os sacerdotes adquiriram conhecimentos sobre plantas medicinais e passaram a ensinar pessoas, delegando-lhes funções de enfermeiros e farmacêuticos. As práticas de saúde instintivas foram as primeiras formas de prestação de assistência. Num primeiro estágio da civilização, estas ações garantiam ao homem a manutenção da sua sobrevivência, estando na sua origem, associadas ao trabalho feminino, caracterizado pela prática do cuidar nos grupos nômades primitivos, tendo como pano-de-fundo as concepções evolucionistas e teológicas. (PERILLOS; SANTOS, 2006) 7 As práticas de saúde mágico-sacerdotais, abordavam a relação mística entre as práticas religiosas e de saúde primitivas desenvolvidas pelos sacerdotes nos templos. Este período corresponde à fase de empirismo, verificada antes do surgimento da especulação filosófica que ocorre por volta do século V a.C. Essas ações permanecem por muitos séculos desenvolvidas nos templos que, a princípio, foram simultaneamente santuários e escolas, onde os conceitos primitivos de saúde eram ensinados. Posteriormente, desenvolveram-se escolas específicas para o ensino da arte de curar no sul da Itália e na Sicília, propagando-se pelos grandes centros do comércio, nas ilhas e cidades da costa. Naquelas escolas pré-hipocráticas, eram variadas as concepções acerca do funcionamento do corpo humano, seus distúrbios e doenças, concepções essas, que, por muito tempo, marcaram a fase empírica da evolução dos conhecimentos em saúde. O ensino era vinculado à orientação da filosofia e das artes e os estudantes viviam em estreita ligação com seus mestres, formando as famílias, as quais serviam de referência para mais tarde se organizarem em castas. As práticas de saúde no alvorecer da ciência - relacionam a evolução das práticas de saúde ao surgimento da filosofia e ao progresso da ciência, quando estas então se baseavam nas relações de causa e efeito. Inicia-se no século V a.C., estendendo-se até os primeiros séculos da Era Cristã. (PERILLOS; SANTOS, 2006) A prática de saúde, antes mística e sacerdotal, passa agora a ser um produto desta nova fase, baseando-se essencialmente na experiência, no conhecimento da natureza, no raciocínio lógico - que desencadeia uma relação de causa e efeito para as doenças - e na especulação filosófica, baseada na investigação livre e na observação dos fenômenos, limitada, entretanto, pela ausência quase total de conhecimentos anatomofisiológicos. Essa prática individualista volta-se para o homem e suas relações com a natureza e suas leis imutáveis. Este período é considerado pela medicina grega como período hipocrático, destacando a figura de Hipócrates que como já foi demonstrado no relato histórico, propôs uma nova concepção em saúde, dissociando a arte de curar dos preceitos místicos e sacerdotais, através da utilização do método indutivo, da inspeção e da observação. Não há caracterização nítida da prática de Enfermagem nesta época. (PERILLOS; SANTOS, 2006) 8 As práticas de saúde monástico-medievais focalizavam a influência dos fatores sócioeconômicos e políticos do medievo e da sociedade feudal nas práticas de saúde e as relações destas com o cristianismo. Esta época corresponde ao aparecimento da Enfermagem como prática leiga, desenvolvida por religiosos e abrange o período medieval compreendido entre os séculos V e XIII. Foi um período que deixou como legado uma série de valores que, com o passar dos tempos, foram aos poucos legitimados a aceitos pela sociedade como características inerentes à Enfermagem. A abnegação, o espírito de serviço, a obediência e outros atributos que dão à Enfermagem, não uma conotação de prática profissional, mas de sacerdócio. Até meados do século XIX, era praticamente nula a assistência aos enfermos nos hospitais, onde a insalubridade aumentava ainda mais o número de mortos. A enfermagem passou a ter maior ênfase com Florence Nightingale. Ela estabeleceu as bases da atual organização internacional voltada ao socorro de doentes e feridos, seja em época de paz ou de guerra. Florence não conhecia o conceito de contato por microorganismos, uma vez que este ainda não tinha sido descoberto, porém já acreditava em um meticuloso cuidado quanto à limpeza do ambiente e pessoal, ar fresco e boa iluminação,calor adequado, boa nutrição e repouso, com manutenção do vigor do paciente para a cura. Em 1854, a Inglaterra, a França e a Turquia declaram guerra à Russia: é a Guerra da Criméia. Os soldados ingleses acham-se no maior abandono. A mortalidade entre os hospitalizados é de 40%. Florence partiu para Scutari com 38 voluntárias entre religiosas e leigas vindas de diferentes hospitais. Algumas das enfermeiras foram despedidas por incapacidade adaptação e principalmente por indisciplina. Florence é incomparável: estende sua atuação desde a organização do trabalho, até os mais simples serviços como a limpeza do chão. Aos poucos, os soldados e oficiais um a um começam a curvar-se e a enaltecer esta incomum Miss Nightingale. A mortalidade decresce de 40% para 2%. Os soldados fazem dela o seu anjo da guarda e ela será imortalizada como a "Dama da Lâmpada" porque, de lanterna na mão, percorre as enfermarias, atendendo os doentes. Durante a guerra contrai tifo e ao retornar da Criméia, em 1856, leva uma vida de inválida. (ANDRADE, 2008) 9 A enfermagem moderna nasce neste período, reproduzindo a divisão social do trabalho entre duas categorias distintas: a “lady-nurse” e a “nurse”. As “nurses” eram destinadas ao serviço dos hospitais, prestando cuidado direto ao paciente sob supervisão da “lady-nurse”. Enquanto as “nurses” executavam o trabalho manual na enfermagem moderna, as “lady-nurses”, eram preparadas para o ensino e a supervisão do pessoal, em nome de um saber teórico mais profundo da profissão, realizava as tarefas ditas intelectuais. (TONINI; FLEMING, 2002) Após a guerra, Florence fundou uma escola de Enfermagem no Hospital Saint Thomas, que passou a servir de modelo para as demais escolas que foram fundadas posteriormente. A disciplina rigorosa, do tipo militar, era uma das características da escola nightingaleana, bem como a exigência de qualidades morais das candidatas. O curso, de um ano de duração, consistia em aulas diárias ministradas por médicos. (PERILLOS;SANTOS, 2006) A teoria de Florence Nightingale focalizou a mudança e manipulação do ambiente do paciente, para colocá-lo nas melhores condições possíveis para que a natureza agisse. Enfatizou também que as enfermeiras devem aliviar e evitar sofrimento e dor desnecessários. A filosofia de Nightingale lançou os alicerces para outros teóricos da enfermagem e influenciaram-nos. (ULRICHSEN; VARGENS ,sp) È influenciada pela divisão do trabalho proposta por Florence Nightingale que a enfermagem surge como uma atividade exercida exclusivamente por: enfermeiros, técnicos de enfermagem, auxiliares de enfermagem e parteiras. Sendo o enfermeiro o líder da equipe e profissional de nível superior. Os técnicos e auxiliares exercem atividades de nível médio como: participam da assistência de enfermagem, executam ações assistenciais, exceto as privativas do enfermeiro, prestam cuidados de higiene e conforto ao paciente etc. A enfermagem é uma profissão que está presente em todas as instituições assistenciais tanto no setor público quanto no setor privado, sendo que no âmbito hospitalar está presente nas 24 horas de todos os 365 dias do ano. Estes dados, por si só, já demonstram que a qualidade das ações de enfermagem interfere, diretamente, na qualidade da assistência em saúde. 10 Pelo fato dos auxiliares e técnicos de enfermagem prestar uma assistência direta ao paciente, manipulando objetos perfurocortantes durante a execução de procedimentos de enfermagem, representam a categoria profissional que mais se acidentem no local de trabalho. Isso pode ser comprovado por um estudo realizado por Barboza et al, sobre Acidentes de trabalho com pérfuro-cortante envolvendo a equipe de enfermagem de um hospital de ensino, o qual notou que dos 272 acidentes com perfurocortantes notificados a categoria que mais se acidentou foram os auxiliares de enfermagem (76,5%). (BARBOZA; SOLER; CIORLIA,2004) Os diversos profissionais de saúde, apesar de suas especificidades de conhecimentos e de prática, ao exercerem o seu trabalho no âmbito institucional, majoritariamente, o desenvolvem como parte de um trabalho coletivo. Esse trabalho envolve, basicamente, a avaliação de um indivíduo ou grupo, seguida da indicação e/ou realização de uma conduta terapêutica. O trabalho assistencial em saúde é gerado por necessidades/carências relacionadas à saúde e é dirigido a um objeto compartilhado - seres humanos que necessitam deste trabalho profissional e que são totalidades complexas e multidimensionais. O resultado do trabalho em saúde não é um produto material. O produto é indissociável do processo de produção, é a própria assistência que é produzida e consumida simultaneamente. (PIRES, 2009) 2.2 O Ambiente Hospitalar O hospital é a parte integrante de um sistema coordenado de saúde, cuja função é dispensar a comunidade assistência médica, preventiva e curativa, inclusive serviços extensivos a família, em seu domicilio. È um local destinado ao atendimento de doentes, para proporcionar o diagnóstico e os tratamentos necessários. Historicamente, os hospitais surgiram como lugares de acolhimento para os doentes e peregrinos, durante a idade média. Analisando suas origens vemos, portanto, que o hospital era tido apenas, como um retiro de indigentes enfermos. Muitos, aliás, ainda o são, embora se dispensem aos internados atenções médicas condizentes com a situação da época. O primeiro hospital brasileiro, que existe até hoje, foi fundado com esse objetivo, sendo esta a causa do seu nome: Santa Casa de Misericórdia, em Santos, iniciativa de Brás Cubas, em 1543. Como todos os outros da época, principalmente na Europa, estavam subordinados à Igreja Católica. Os hospitais subordinados 11 ao Islã, também existiam e, eram superiores em condições de higiene, cuidados, instalações e medicamentos, sendo que o mais pretensioso foi fundado no século X. (ANVISA) Com o elevado número de atendimento e com uma enorme circulação de pessoas o ambiente hospitalar pode conter focos de infecção podendo ser transmitida ao ser humano. Esse ambiente, incluindo o ar, água e as superfícies que cercam o paciente guarda íntima relação com as infecções hospitalares, podendo através deste, proporcionar focos de contato e de transmissão. (Martins,2007) Vários são os riscos ocupacionais existentes nos hospitais, capazes de causar doenças. O conceito de risco é bidimensional, representando a possibilidade de um efeito adverso ou dano, a incerteza da ocorrência, a distribuição no tempo e a magnitude do resultado desfavorável. Assim, de acordo com essa definição, situação ou fator de risco é uma condição ou conjunto de circunstâncias que tem o potencial de causar um efeito adverso, que pode ser: morte, lesões, doenças ou danos à saúde e à propriedade ou ao meio ambiente. (NEVES, 2007) Classicamente, os fatores de risco para a saúde e segurança dos trabalhadores presentes ou relacionados ao trabalho, de acordo com a Organização Pan-Americana da Saúde no Brasil, podem ser classificados em cinco grandes grupos: físicos; biológicos; ergonômicos e psicossociais; químicos e de acidentes. (NEVES, 2007) Consideram-se riscos físicos as diversas formas de energia a que possam estar expostos os trabalhadores tais como, ruído, vibrações, pressões anormais, temperaturas extremas, radiações ionizantes, radiações não ionizantes, como o infra-som e ultra-som. (CHIODI; MARZIALE, 2006) Os riscos químicos são aqueles que abrangem todos os agentes químicos, ou seja, poeiras, névoas, gases, vapores e as substâncias químicas que estão presentes no processo de trabalho de enfermagem, como as utilizadas durante a desinfecção e esterilização de materiais e nos tratamentos medicamentosos do paciente. 12 Os ergonômicos estão relacionados à adequação entre o homem e o trabalho, como por exemplo: levantamento de peso, ritmo excessivo de trabalho, monotonia, repetitividade, postura inadequada de trabalho, etc. O freqüente levantamento de peso para movimentação e transporte de pacientes e equipamentos, a postura inadequada e flexões de coluna vertebral em atividades de organização e assistência podem causar problemas à saúde do trabalhador, tais como fraturas, lombalgias e varizes. Os riscos de acidentes são: arranjo físico inadequado, máquinas e equipamentos sem proteção, ferramentas inadequadas ou defeituosas, iluminação inadequada, armazenamento inadequado e outras situações de risco que podem contribuir para acidentes. Riscos psicossociais são aquelas características do trabalho que funcionam como “estressores”, ou seja, implicam em grandes exigências no trabalho, combinadas com recursos insuficientes para o enfrentamento das mesmas. E por fim os riscos biológicos que são representados por microorganismos patogênicos, como as bactérias, fungos, bacilos, parasitas, protozoários e vírus. Estes podem causar danos á saúde do trabalhador, proveniente do contato com pacientes portadores de doenças infecciosas, infecto-contagiosas, parasitárias e da manipulação de matérias contaminados. Estes são os responsáveis pelo maior número de injúrias sofridas pelos profissionais de saúde, principalmente a enfermagem, devido a periculosidade das tarefas realizadas durante a assistência ao paciente. Portanto, o ambiente hospitalar deve manter condições higiênicas básicas, regras de segurança para a preservação da integridade física da equipe de saúde. Assim, a antecipação, o reconhecimento, a avaliação e o domínio dos riscos existentes irão propiciar segurança, conforto e higiene aos profissionais. Os riscos, já definidos anteriormente, devem ser analisados, visando sua eliminação ou controle. O tratamento dos mesmos deve ocorrer através de um conjunto de ações que possa ser viabilizado, a compreensão de sua natureza pode ser levada a efeito, pois toda a tomada de decisão deve ser fundamentada tecnicamente em conceitos básicos que visam: 13 - reconhecer os riscos para caracterizá-los e saber dos agentes que estão presentes no ambiente de trabalho; - avaliar os riscos para saber quantificá-los e verificar a sua magnitude; - controlar os riscos, adotando medidas técnicas, administrativas, preventivas ou corretivas de diversas naturezas, com intuito de eliminar ou minimizar os riscos existentes. 14 3. ACIDENTES DE TRABALHO O acidente do trabalho ocorre pelo exercício da função do trabalhador em seu local de trabalho, provocando lesão física ou psicológica ou a perda temporária ou permanente da capacidade de trabalho, levando até a morte, dependendo da gravidade do acidente que ocorrem na maioria das vezes de forma imprevisível embora perceba-se antecipadamente pelas condições de trabalho, os riscos a que os empregados estão expostos, e são várias as situações em que o empregado encontra-se nessas condições podendo ser considerado como acidente de trabalho quando: a) o empregado está executando serviço sob ordem da empresa; b) em viagem à serviço da empresa, independentemente do veículo utilizado; c) no percurso residência-trabalho ou vice-versa; d) o acidente relacionado ao trabalho cause algum tipo de dano físico ou psicológico que impeça o trabalhador de exercer sua função; e) contaminação de doença pessoal na área de trabalho; f) em atividades de lazer, isto é, quando o empregado encontra-se defendendo a empresa em campeonatos esportivos. Não se considera acidente de trabalho aquele que agrave ou complique conseqüências de acidentes anteriores. Estes acidentes ocorrem em função de alguns determinantes como: - condições inseguras no ambiente de trabalho como: a má iluminação, a temperatura, o ruído excessivo, etc.; - condições de tempo como: longas jornadas de trabalho, horas extras, etc.; - a não utilização de equipamentos de proteção fornecidos pela empresa; - a execução incorreta de tarefas pelo trabalhador; - condições sociais como: desestrutura familiar e econômica, falta de lazer, etc. Tais determinantes contribuem para que o trabalhador venha a sofrer acidentes que poderão resultar no afastamento do mesmo de suas funções por um determinado tempo ou até mesmo a morte. 3.1 Breve Histórico da Saúde do Trabalhador 15 A saúde é uma condição essencial e fundamental para o convívio social do trabalhador. A força de trabalho humana vem ao longo dos séculos escrevendo capítulos de lutas e mudanças na história da sociedade e nas complexas relações do modo de produção vigente no mundo. Desde os primórdios do mundo do trabalho o acidente fez parte do cotidiano dos trabalhadores. No entanto, ganha visibilidade a partir do século XIX, com o avanço do processo de industrialização e das lutas operárias dele decorrentes. Enquanto fenômeno que rompe com a lógica do trabalho, o acidente sempre existiu. Mais do que isso, podemos afirmar que ligados à dinâmica da sociedade, que está sempre em movimento, acidentes sempre farão farte do cenário social. (BRAGA, 2000). Vivia-se à preocupação com a urbanização crescente, com as questões de alimentos para o povo, saneamento, as grandes epidemias. A medicina começa a se tornar coletiva, urbana e social. E é justamente aí, que surge um fato novo, que modificaria todo um sistema econômico mundial, com reflexos sociais e para a saúde das populações européias: a REVOLUÇÂO INDUSTRIAL. (FRIAS; SILVA, 1999) A medicina do trabalho, enquanto especialidade médica surge na Inglaterra, na primeira metade do século XIX, com a Revolução Industrial. Naquele momento, o consumo da força de trabalho, resultante da submissão dos trabalhadores a um processo acelerado e desumano de produção, exigiu uma intervenção, sob pena de tornar inviável a sobrevivência e reprodução do próprio processo. (MENDES;DIAS,1991) Até o início da Revolução Industrial existem poucos relatos sobre acidentes e doenças provenientes do trabalho, uma vez que, neste período, predominava o trabalho escravo e manual. Com o advento da máquina a vapor, a produtividade aumentou e o trabalhador passou a viver em um ambiente de trabalho agressivo, ocasionado por diversos fatores, dentre eles, a força motriz, a divisão de tarefas e a concentração de várias pessoas em um mesmo estabelecimento. Nesse contexto, os riscos de acidentes e doenças originadas do trabalho começaram a surgir com rapidez. (GONÇALVES; MIRANDA, 2008) 16 A aglomeração humana em espaços inadequados propiciava a acelerada proliferação de doenças infecto-contagiosas, ao mesmo tempo em que a periculosidade das máquinas era responsável por mutilações e morte. (GOMEZ; COSTA,1997) Acidentes graves, mutilantes e fatais, acometeram os trabalhadores, não poupando sequer mulheres e crianças a partir de seis anos, pela possibilidade de lhes serem pagos salários mais baixos. A situação só se modificaria com intensos movimentos sociais, que obrigou os políticos e legisladores, a introduzirem medidas legais de controle das condições e dos ambientes de trabalho. Sendo criada em 1802, na Inglaterra, a primeira Lei de proteção ao trabalhador, “Lei de Saúde e Moral de Aprendizes”, que estabelecia a jornada de trabalho em doze horas diárias, proibia o trabalho noturno, regulamentava a idade mínima para trabalhar e estabelecia a obrigatoriedade de medidas de melhoramento no ambiente de trabalho, sendo obrigatório um ambiente arejado, limpo e seguro aos funcionários. Foi a primeira conquista da classe trabalhadora no que concerne a higiene e segurança do trabalho. Em 1833, o "Factory Act Lei das Fábricas" ampliaria as medidas de proteção aos trabalhadores. A presença de um médico no interior das unidades fabris representava, ao mesmo tempo, um esforço em detectar os processos danosos à saúde e uma espécie de braço do empresário para a recuperação do trabalhador, visando o seu retorno à linha de produção, num momento em que a força de trabalho era fundamental à industrialização emergente. Instaurava-se assim o que seria uma das características da Medicina do Trabalho, mantida até hoje, onde predomina na forma tradicional: sob uma visão eminentemente biológica e individual, no espaço restrito da fábrica, numa relação unívoca e unicausal, buscam-se as causas das doenças e acidentes. (GOMEZ; COSTA,1997) Conceitualmente, pode-se dizer que a Saúde do Trabalhador surge enquanto uma prática social instituinte, que se propõe a contribuir para a transformação da realidade de saúde dos trabalhadores, e por extensão a da população como um todo, a partir da compreensão dos processos de trabalho particulares, de forma articulada com o consumo de bens e serviços e o conjunto de valores, crenças, idéias e representações sociais próprios de um dado momento da história humana. (JAKOBI, 2008) 17 A preocupação por prover serviços médicos aos trabalhadores começa a se refletir no cenário internacional também na agenda da Organização Internacional do Trabalho (OIT), criada em 1919. (MENDES; DIAS, 1991) O Brasil na condição de país colonizado e com um desenvolvimento tecnológico tardio, tem sua economia baseada na mão-de-obra escarva e agrícola. A preocupação com a saúde do trabalhador só ocorreu a partir do surgimento de epidemias como a febre amarela, a cólera e a peste, que matou dezenas de trabalhadores, ocasionando assim, prejuízo para a economia da época. É durante o ciclo do café que ocorre a divisão internacional do trabalho e a saúde pública volta-se para o combate das epidemias, com destaque para o sanitarista Osvaldo Cruz. Entretanto, a intervenção da saúde pública nas fábricas é insatisfatória pela falta de condições de trabalho na época. (PEREIRA, 2001) No Brasil, a enfermagem do trabalho assim como as demais profissões de segurança e medicina do trabalho foi incorporada nas empresas como obrigatória, pois o governo tinha emergência em reduzir o elevado índice de acidente no início dos anos 70, quando o Brasil se consagrou campeão mundial de acidente de trabalho. O governo impôs que as empresas contratassem profissionais especializados como médico do trabalho, enfermeiro do trabalho, engenheiro de segurança do trabalho e técnico de segurança do trabalho. O primeiro documento legal a dar uma orientação geral sobre acidentes de trabalho foi o Código Comercial Brasileiro de 1850. Em 1919, a Lei 3724, tratou dos acidentes do trabalho adotando a teoria do risco profissional ou a teoria da responsabilidade objetiva do empregador. Em 1934, a Constituição Federal assegurava a previdência nos casos de acidentes do trabalho e em 1937, a Constituição criava o seguro nos casos de acidente. Em 1944, o Decreto-Lei 7036, conceituou, de forma mais clara, o acidente de trabalho, como sendo aquele que provoca lesões corporais e delineou o acidente de trajeto. 18 Em 1953, é baixada a Portaria n.º 155/53, que regulamenta a atuação das CIPAS, no Brasil, proporcionando a participação dos funcionários em treinamentos e palestras que contribuam para o conhecimento de ações que beneficiem sua segurança e bem estar no local de trabalho. Em 1988 o povo brasileiro conquistou o direito universal à saúde, disposto na Constituição da Republica federativa do Brasil. Em seu Artigo 196 temos: “a saúde como um direito de todos e um dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”. O texto da Carta Magna, em seu Artigo 1988, afirma ainda que “... As ações e serviços de saúde integram uma rede regionalizada e hierarquizada e constituem um sistema único...” e, em seu Artigo 200, está definido que “... ao Sistema Único de Saúde compete... executar as ações de Saúde do Trabalhador...”, assim como “... colaborar na proteção do meio ambiente, nele compreendido o do trabalhador...” A Lei Orgânica da Saúde nº. 8080/90 também coloca no artigo 6º, parágrafo 3ºa “... saúde do Trabalhador como um conjunto de atividades que se destina, por meio de ações de vigilância epidemiológica e sanitária, a promoção e proteção da Saúde do Trabalhador, assim como visa à recuperação e à reabilitação dos trabalhadores submetidos aos riscos e agravos advindos das condições de trabalho”. Visando a subsidiar as ações de diagnóstico, tratamento e vigilância da saúde e o estabelecimento da relação da doença com o trabalho e das condutas decorrentes, o Ministério da Saúde, cumprindo a determinação contida no art. 6º.§ 3º, inciso VII, da referida lei, elaborou uma lista de doenças relacionadas ao trabalho, publicada na Portaria MS N. 1.339 (18 de novembro de 1999). Essa lista é também adotada pela Previdência Social, para a caracterização dos acidentes do trabalho (Decreto n. 3.048/99)”. O objetivo principal da constitucionalização da segurança do trabalho é evitar ou reduzir os riscos a que estão expostos os trabalhadores, dando-lhes melhores condições de trabalho através de normas, onde, as Empresas devem respeitar a saúde do trabalhador, 19 proporcionando-lhes um ambiente, senão saudável, mas com riscos mínimos à saúde. (RANGEL, 2004) 3.2 Os profissionais de enfermagem e o acidente de trabalho O corpo humano precisa estar em equilíbrio, gozando de saúde física, mental, psíquica e emocional. Para promover a saúde e o bem-estar é preciso garantir atividade física em condições adequadas, uma alimentação qualitativa e quantitativamente adequada e sono separado para alívio das tensões e cargas que o indivíduo está normalmente sujeito na vida cotidiana. Havendo excesso ou carência em alguns destes, o sistema físico e/ou psicoemocional do indivíduo se desequilibra, o que compromete o bem-estar físico. (VIEIRA, 2005) Por ser uma atividade eminentemente social, o trabalho exerce um papel fundamental nas condições de vida do homem. Produz efeito positivo, quando é capaz de satisfazer as necessidades básicas de subsistência, de criação e de colaboração dos trabalhadores. Por outro lado, ao realizá-lo, o homem expõe-se constantemente aos riscos presentes no ambiente laboral, os quais podem interferir diretamente em sua condição de saúde. (CANINI et al, 2002) Sobrecarga de trabalho, fatalidade, culpa própria ou negligência e precariedade das condições de trabalho ocasionam as lesões e danos mais freqüentes. Esses geram problemas osteomúsculo-articulares, ferimentos perfurocortocontusos, lacerações, feridas, contusões, dentre outros. (PINHO et al, 2007) Um estudo realizado por Stephan et al, sobre topologia do risco de acidentes do trabalho em Piracicaba, SP, concluíram que o tipo de lesão mais freqüente entre casos foi a contusão, acomentendo 45,2% dos trabalhadores, seguida por entorse (17,5%), ferimento corto-contuso (10,7%), fraturas (9,5%). E a principal causa imediata foi: acidente com máquinas ou equipamentos (22,1%), queda de objetos (21,7%) e esforço/peso (13,3%). 20 Os acidentes de trabalho provocam além de mortes, incapacidades permanentes e temporárias. No Brasil, dos 376.240 agravos ocupacionais registrados no ano 2000, 81% resultaram em incapacidade temporária, 4% em incapacidade permanente e 1% em óbitos. Na Bahia, em 2000, analisando-se todos os benefícios concedidos por problemas de saúde pela Previdência Social, observou-se que 9,6% dos acidentes de trabalho causaram incapacidade permanente total. (ARAÚJO et al, 2009) Nas últimas décadas, devido as transformações ocorridas nos processos produtivos, as relações entre trabalho e saúde dos trabalhadores têm sido abordados em vários estudos. Questões como os acidentes de trabalho entre os trabalhadores de determinadas categorias profissionais têm sido objeto desses estudos. Dentre estas categorias profissionais, destacamse os profissionais de saúde, especialmente os atuantes em ambiente hospitalar, tendo em vista as inúmeras circunstâncias desgastantes presentes em seu cotidiano laboral. Os hospitais são considerados locais tipicamente insalubres na medida em que propiciam a exposição dos trabalhadores da área da saúde a inúmeros riscos. Esses podem ser caracterizados em físicos, químicos, fisiológicos, psíquicos, mecânicos e principalmente os biológicos, inerentes ao trabalho nessa instituição. A exposição aos riscos biológicos é preocupante, uma vez que são causadores de muitos problemas de saúde dos trabalhadores, pois, ao executarem atividades que envolvem o cuidado direto e indireto aos pacientes, estão freqüentemente expostos às infecções transmitidas por microorganismos presentes no sangue ou outros fluidos orgânicos. (BALSAMO; FELLI, 2006) Sabe-se que os trabalhadores da saúde, que atuam na área hospitalar, estão expostos a inúmeros acidentes de trabalho, principalmente àqueles causados por materiais perfurocortantes e fluidos biológicos. Nos últimos tempos têm aumentado a preocupação com acidentes causados por este tipo de material, devido ao risco de o trabalhador contrair a Síndrome da Imunodeficiência Adquirida (AIDS) e o vírus da Hepatite B e C. (RIBEIRO; SHIMIZU, 2002) A doença pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV) é um distúrbio da imunidade mediada por célula, causada por um vírus da subfamília Lentivirinae (família Retroviridae), 21 caracterizada por infecções oportunísticas, doenças malignas (como o sarcoma de Kaposi e o linfoma não-Hodgkin), disfunções neurológicas e uma variedade de outras síndromes. A síndrome de imunodeficiência adquirida (AIDS ou SIDA) é a mais grave manifestação de um espectro de condições HIV- realcionadas. (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2001) Hepatite é termo genérico para inflamação do fígado que, convencionalmente, designa alterações degenerativas ou necróticas do hepatócitos. Pode ser aguda ou crônica e ter como causa uma variedade de agentes infecciosos ou de outra natureza. Na hepatite B, o vírus é encontrado em todas as secreções e excreções do corpo, mas, aparentemente, apenas o sangue, o esperma e a saliva são capazes de transmiti-lo. (MINISTÉRIO DA SAÚDE, 2001) Os ferimentos com agulhas e material perfurocortante, em geral, são considerados extremamente perigosos por serem potencialmente capazes de transmitir mais de 20 tipos de patógenos diferentes, sendo o vírus da imunodeficiência humana (HIV), o da hepatite B e o da hepatite C, os agentes infecciosos mais comumente envolvidos. (BRASIL, 2006) Sarquis et al, em um estudo sobre acidentes com instrumentos perfurocortantes entre trabalhadores de enfermagem, demonstraram que 70% dos acidentes com perfurocortantes ocorreram com objeto perfurante. Destes, as agulhas de injeção foram os mais freqüentes (52%). Os objetos cortantes representados pelos objetos de vidros (pipetas, ampolas e frasco de aspiração), ocorreram com uma porcentagem de 20%. O risco de transmissão de SIDA através deste tipo de acidente é bastante, porém, estima-se que seja em torno de 0,37 a 0,5%, a hepatite B varia de 6,0 a 40,0%, enquanto que a hepatite C varia de 3,0 a 6,0%, sendo que o risco aumenta em função do tempo de atividade, em conseqüência da maior exposição. Trabalhos indicam que 1 em cada 270 profissionais da área de saúde é contamina pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV) em acidentes de trabalho. (BARBOZA et al, 1999) Um estudo realizado por MACHADO et al, que investigaram o risco de infecção pelo vírus da Imunodeficiência Humana (HIV) em trabalhadores da saúde, constataram que, de 36 casos de acidentes estudados, 17 foram por perfuração com agulhas contaminadas e um por ampola 22 quebrada, totalizando 50% dos acidentes ocorridos. Os resultados da pesquisa foram negativos quanto à soroconversão. Observe-se que uma a quatro soroconversões positivas por HIV acontecem a cada 1.000 punções acidentais. O interesse pela questão dos acidentes de trabalho e principalmente o acompanhamento do trabalhador após acidente com objetos perfurocortante potencialmente contaminado por material biológico, aumentou no início dos anos 80, com o surgimento do HIV/AIDS. (VIEIRA; PADILHA, 2008) O primeiro caso de transmissão ocupacional da infecção pelo HIV foi documentado em 1984, na Inglaterra, quando uma enfermeira sofreu um acidente pérfuro-cortante e 13 dias após começou a apresentar sintomas de infecção aguda causados por esse vírus tendo no 49º dia o seu exame para HIV revelado positivo, fato que desencadeou pânico entre os profissionais da saúde, motivando discussões e estudos sobre essa temática, o que possibilitou avanços na área da saúde ocupacional e nas práticas de controle da infecção hospitalar. (BALSAMO; FELLI, 2006) Conforme dados registrados pelo Centers for Disease Control and Prevention (CDC), 57 trabalhadores apresentaram soroconversão ao HIV após exposição ocupacional e 139 foram considerados como casos suspeitos até dezembro de 2001. O acidente percutâneo foi responsável por 48 casos, seguido da mucocutânea, cinco casos. Em dois casos, houve associação dessas exposições e, em dois casos, ela aconteceu com material desconhecido. Os fluidos envolvidos foram sangue (49 casos), fluido com sangue visível (1 caso), fluido inespecífico (4 casos) e concentrado de vírus em laboratório (3 casos). Descrevem ainda que 27 trabalhadores desenvolveram AIDS. (BALSAMO; FELLI, 2006) Segundo a referida instituição, as conseqüências da exposição ocupacional aos patógenos veiculados pelo sangue não são só os referentes às infecções, mas também os relativos ao trauma psicológico ocasionado pela espera do resultado de uma possível soroconversão e mudanças nas práticas sexuais, no relacionamento social e familiar, efeito das drogas profiláticas, entre outros. (MARZIALE; RODRIGUES, 2002) 23 Desde os primórdios, a enfermagem é exercida majoritariamente por mulheres, considerandose que cuidados aos enfermos mostram-se cultural e socialmente apropriados para o trabalho feminino. Existem diferenças para o exercício profissional entre homens e mulheres, além de ser comum a sobrecarga de trabalho das mulheres, visto que, muitas vezes, conciliam atividades domésticas, às vezes em mais de um local de exercício profissional, o que representa desgaste físico e mental que, cedo ou tarde, pode repercutir em agravos à saúde. ( BARBOZA; SOLER, 2003) Balsamo et al, em um estudo sobre acidentes de trabalho com exposição aos líquidos corporaes humanos em trabalhadores da saúde de um hospital universitário, observaram que a força de trabalho é predominantemente feminina nas unidades estudadas, isso significa que as mulheres acidentam-se duas vezes mais do que os homens, fato que deve ser melhor analisado. A mulher, de maneira geral, insere-se no mercado de trabalho como forma de contribuir para o aumento da renda familiar, submetendo-se a dupla ou tripla jornada de trabalho, o que propicia desgaste físico e emocional, expondo-a a maior risco de acidentes. O trabalho de enfermagem na instituição hospitalar caracteriza-se pelo cuidado nas 24 horas do dia, permitindo a continuidade da assistência aos pacientes. Nesse cuidado aos pacientes, os trabalhadores de enfermagem utilizam instrumentos de trabalho como: agulhas, lâminas de bisturi, tesouras, pinças, materiais de vidro e muitos outros instrumentos que são perfurantes e cortantes. Cuidam muitas vezes de pacientes agressivos, agitados, ansiosos ou em estado crítico, onde encontram dificuldade de realizar os procedimentos com segurança. Além disso, o trabalho de enfermagem nesta instituição, caracteristicamente, tem um ritmo acelerado, é realizado em pé, com muitas caminhadas e sob a supervisão estrita; é normatizado, rotinizado e fragmentado. (SARQUIS; FELLI, 2002) Entre os profissionais de saúde que atuam no ambiente hospitalar, a enfermagem se expõe mais continuamente aos riscos de acidentes com ferimentos perfurocortantes. Dentre os profissionais da equipe de enfermagem, os auxiliares e técnicos, estão mais expostos a esse tipo de acidente por executarem vários procedimentos invasivos, sendo os materiais perfurocortantes uma dos principais instrumentos de trabalho na prática diária. 24 Em um estudo realizado por Spagnuolo et al, no município de Londrina, com dados sobre a acidentes com material biológico, os auxiliares de enfermagem (39,5%) é a categoria profissional que mais se acidenta. Nesse mesmo estudo foi notória a freqüência com que ocorriam acidentes com materiais perfurocortantes (92,5%). Os não perfurocortantes totalizaram 7,5%. Dentre os materiais perfurocortantes, se destacaram lâminas de bisturi, scalp e agulhas, principalmente no ato recorrente de reencape. Apesar da diferença metodológica os dados acima assemelham-se ao estudo realizado por Sarques et al com instrumentos perfurocortantes, no que diz respeito ao contingente de trabalhadores. Observaram que a maior parte pertencem a categoria profissional auxiliar de enfermagem (70,6%). Nesse mesmo estudo verificaram que dos 82 acidentados, 66 eram auxiliares de enfermagem, 12 atendentes de enfermagem e 4 eram enfermeiros. Isso parece ser explicado pelas atividades que realizam junto aos pacientes, administrando medicamentos e assistindo diretamente, bem como realizando procedimentos de emergência. Essas atividades colocam o auxiliar de enfermagem em exposição contínua ao risco de acidente. Vários são os fatores de risco identificados como favorecedores de contaminação nos acidentes de trabalho envolvendo objetos perfurocortantes, entre eles destacam-se: a profundidade e extensão do ferimento, a presença de sangue visível no instrumento que produziu o ferimento, o reencape de agulha que foi colocada diretamente na veia ou artéria de paciente portadores de infecções Shimizu et al, notaram em seu estudo que esses acidentes ocorrem, em geral, devido à prática de reencape de agulhas antes do descarte, transporte de medicação a ser realizada sem bandeja, luvas de procedimentos maiores que o tamanho das mãos, falta de habilidade, agitação psicomotora do pacientes, entre outros. No estudo de Balsamo et al, verificaram que os acidentes ocorreram predominantemente na situação categorizada como "ato inadequado na realização do procedimento". Nessa categoria estão descritas as situações em que o comportamento do trabalhador foi, em parte, o responsável pelo desencadeamento do acidente. A segunda maior proporção dos acidentes ocorreram "durante o procedimento", e está relacionada à atividade propriamente dita. Os 25 acidentes relacionados ao "descarte inadequado por outro trabalhador" leva a pensar que, diante da magnitude dos problemas que envolvem os acidentes com materiais perfurocortantes descartados em locais impróprios, faz-se necessário sensibilizar os trabalhadores para o problema, buscando a sua mudança de comportamento. Os acidentes que foram "decorrentes de movimento inesperado do paciente", apontam que as reações dos pacientes frente a um procedimento invasivo devem ser antecipadamente avaliadas, objetivando proporcionar maior segurança a todos. É importante ressaltar que o risco existe e que nem só o conhecimento técnico sobre os procedimentos é suficiente para sua execução segura. Esses resultados mostram que é imprescindível o estabelecimento de mudanças na prática em que o trabalho ocorre e a revisão dos procedimentos desenvolvidos, no sentido de considerar esse tipo de exposição. O acidente de trabalho em nosso país deve ser comunicado imediatamente após sua ocorrência, por meio da emissão da Comunicação de Acidente de Trabalho (CAT), que deve ser encaminhada à Previdência Social, ao acidentado, ao sindicato da categoria correspondente, ao hospital, ao Sistema Único de Saúde (SUS) e ao Ministério do Trabalho. (MARZIALE; RODRIGUES, 2002) O fato da comunicação do acidente de trabalho ser procedimento facultativo é um problema grave, pois, muitas vezes, o acidente não gera nenhuma das situações previstas na definição de acidente de trabalho, nem tampouco, no momento ou muito próximo desse, fica caracterizada a transmissão. Legalmente, esse tipo de acidente não teria comunicação compulsória, realizada apenas quando a doença se desenvolve. Percebe-se claramente, nesse caso, a falta de componente preventivo. (CAIXETA; ANADERGH, 2005) No estudo realizado por Benatti, em um hospital na cidade de Campinas/SP, investigou os acidentes do trabalho quanto à sua notificação por meio da CAT e detectou que, no total, 49,5% dos acidentes não haviam sido notificados. A autora comenta que em vários casos os trabalhadores não sabiam onde notificar o acidente, percorrendo caminhos sempre diversos, e muitas vezes interrompiam a notificação face às dificuldades deparadas em seu percurso. 26 A não notificação dos acidentes de trabalho entre a equipe de enfermagem, se deve ao fato de que a maioria desses profissionais são de nível médio, desconhecendo a importância da notificação por meio da CAT. Muitos, alias não sabem que a CCIH, oferece orientações quanto às medidas de biossegurança, e realizam condutas pós-exposição. A notificação dos acidentes do trabalho é uma exigência legal e através dela são fornecidos dados relativos ao número e distribuição dos acidentes e as características das ocorrências e das vítimas e a apresentação destes resultados através de estatísticas constituem base indispensável para a indicação, aplicação e controle de medidas prevencionistas. (NAPOLEÃO et al, 2000) Apesar de, legalmente, ser obrigatória a emissão da CAT, observa-se, na prática, a subnotificação dos acidentes de trabalho. O sistema de informação utilizado apresenta falhas devido à concepção fragmentada das relações de saúde e trabalho, marcada por uma divisão e alienação das tarefas dos profissionais responsáveis pelo registro da CAT, os quais privilegiam o cumprimento de normas burocráticas, mas não o envolvimento profissional com a questão acidentária. (MARZIALE; RODRIGUES, 2002) Devido à subnotificação, são escassos os dados que permitam construir indicadores das condições de trabalho e saúde dos profissionais. O número de acidentes notificados permite quantificar e construir alguns indicadores de saúde, como por exemplo, coeficientes de mortalidade, letalidade e riscos potenciais de acidentes. Esses indicadores permitem uma avaliação criteriosa sobre o homem e o ambiente onde ele exerce seu trabalho. A grande maioria dos ATs que atinge os profissionais de enfermagem e compromete a sua saúde, está relacionada ao instrumento de trabalho utilizado no desempenho da função, ao ritmo do trabalho empreendido na jornada, e às contingências pessoais da vida particular destes trabalhadores. Esses fatores contribuem para a ocorrência desses acidentes. Ademais, “todo grupo social tem direito a condições de vida compatíveis com sua sobrevivência e com o desenvolvimento de suas potencialidades e projetos. Esta é uma exigência ética permanente para a epidemiologia e para a planificação das ações de saúde e bem-estar”. (SECCÔ et al, 2003) 27 3.3 Prevenção dos acidentes envolvendo a equipe de enfermagem As doenças profissionais constituem um grave problema de saúde pública em todo o mundo, mas historicamente os profissionais de saúde não foram considerados categoria de alto risco para acidentes de trabalho. Porém, a partir do século XX começou-se a relacionar riscos biológicos a doenças que atingiam especificamente os trabalhadores da área da saúde. (CAVALCANTE et al, 2006) O impacto da alta incidência de infecção pelo vírus da Hepatite B, C e HIV tem gerado nos profissionais de saúde no âmbito hospitalar uma grande preocupação com a ocorrência de acidentes com materiais perfurocortantes. (OLIVEIRA et al, 2005) No Brasil, as preocupações com medidas profiláticas e o acompanhamento clínicolaboratorial em relação aos trabalhadores de saúde expostos ao risco de acidentes de trabalho só se deu a partir da epidemia de infecção pelo HIV/Aids, no início da década de 80 e de forma ainda muito incipiente. (SPAGNUOLO et al, 2008) Nessa mesma década desencadearam-se condutas pré e pós-exposições, indicadas para prevenir o risco de exposição aos patógenos de transmissão sangüínea de profissionais de saúde pelo Vírus da Imunodeficiência Humana (HIV) e pelos vírus da hepatite B e C no ambiente de trabalho. Sabe-se que este tipo de acidente, quando ocorre, deve ser tratado como emergência médica, uma vez que para atingir maior eficácia, as intervenções necessitam ser iniciadas logo após a ocorrência deste. (SPAGNUOLO et al, 2008) Os trabalhadores de saúde, principalmente os da enfermagem, precisam ter cautela durante a prestação do cuidado, principalmente nos casos em que há exposição com conteúdo biológico, a fim de reduzir a chance da aquisição de HIV, hepatite B e C. O Center for Disease Control (CDC) criou, em 1988, um conjunto de recomendações destinadas aos profissionais de saúde, com o propósito de diminuir o risco de contaminação por HIV e Hepatite B Vírus (HBV) no caso de contato com sangue e fluídos corporais. No 28 Brasil, essas recomendações foram inicialmente traduzidas como precauções universais e, atualmente, são denominadas de precauções-padrão. (SHIMIZU; RIBEIRO, 2002) Para que as atividades desenvolvidas pela equipe de enfermagem ocorram com segurança é necessário o uso dos equipamentos de proteção individual, pois as maiores fontes de contaminação são a perfuração cutânea. Para prevenir a contaminação acidental com riscos biológicos, de acordo com BRASIL (2007), devem ser utilizados os seguintes EPI: - Usar luvas, quando a atividade a ser desenvolvida possibilitar o contato com fluídos corpóreos, tais como soro, plasma, urina, ou sangue total; - Usar protetor facial, como óculos de segurança, principalmente quando houver possibilidade de espirros de fluidos; - Usar vestimentas de proteção, como aventais, quando o risco biológico for reconhecido; O uso de tais medidas pressupõe que todos os profissionais podem ser potencialmente infectados com patógenos. Conseqüentemente, esses devem se prevenir com medidas de barreira, sempre que houver possibilidade de contato com sangue ou fluidos corporais. Faz-se necessário, porém, destacar que as precauções-padrão podem ajudar a reduzir, mas não eliminam o risco de exposição ocupacional. (SHIMIZU; RIBEIRO, 2002) Um estudo realizado por Benatti et al, sobre exposições ocupacionais por fluidos copóreos entre trabalhadores de saúde e sua adesão à quimioprofilaxia, verificou que apesar de não ter sido observada nenhuma soroconversão a qualquer dos patógenos estudados (HIV, HBV, HCV), os acidentes aconteceram em situações em que as medidas preventivas nem sempre foram atendidas, tendo em vista que os pacientes-fonte são desconhecidos em 44,9% dos acidentes. O maior problema parece estar relacionado ao descarte ou acondicionamento inadequado dos resíduos, pois os dados demonstraram que a maioria (79,4%) dos acidentes foi causada por agulhas. Nesse caso, se o acidente tivesse ocorrido no momento do procedimento, o paciente fonte não seria desconhecido. 29 È preciso que, além do fornecimento dos EPIs e das informações quanto ao seu uso, seja dedicada uma atenção particularizada, voltada para cada trabalhador de enfermagem, enfatizando a importância da adesão das medidas de segurança. Um dos principais fatores que podem influenciar a ocorrência de acidentes com material perfurocortantes, estão na não adesão às precauções pelos trabalhadores de enfermagem, durante o cuidado prestado. E os condicionantes para esta não adesão estão relacionados tanto aos fatores institucionais (relacionados ao trabalho), como aos individuais (relacionados ao trabalhador). (VIEIRA; PADILHA, 2008) O fato da equipe de enfermagem ser composta em sua maioria por porfissionais de nível médio, pode ser um fato predisponente para os acidentes, pois desconhecem a real necessidade do uso de EPIs. Tal fato pode ser demonstrado num estudo realizado por Brandi et al, sobre ocorrência de acidente do trabalho por material perfurocortante entre trabalhadores de enfermagem de um hospital universitário da cidade de campinas, estado de São Paulo. Notaram que os enfermeiros (64,7%) são os trabalhadores que mais estavam utilizando luvas no momento do acidente. Isso pode ser justificado pelo melhor preparo profissional e formação escolar da categoria. O menor índice ficou para a categoria mais despreparada profissionalmente, os atendentes de enfermagem (33,3%). (BRANDI et al, 1998) Muitas instituições adotaram as precauções padrão como medidas de proteção aos trabalhadores, porém, estudos recentes realizados, tanto no Brasil como no exterior, têm demonstrado que, mesmo assim, a exposição e a infecção continuam ocorrendo de maneira elevada. De fato, a aplicação das precauções não é suficiente para garantir as medidas de prevenção, devendo fazer parte das estratégias as reflexões a respeito das mudanças de comportamento e as causas dos acidentes. A não adesão ou a baixa adesão às recomendações da utilização de barreiras de proteção é uma realidade, o que leva a indagar sobre outros fatores que podem estar contribuindo para esse tipo de comportamento. (BALSAMO; FELLI, 2006) Quando se consegue coletar todas as informações a respeito de um acidente, pode-se analisar os dados para priorizar metas e esforços em unidades de maior risco, identificando a sua real causa, no sentido de determinar se as ocorrências requerem aperfeiçoamento técnico na realização dos procedimentos, aquisição de dispositivos mais seguros, mudança de 30 comportamento dos funcionários, ou se há falhas no suprimento de equipamentos de proteção individual e coletiva. (BALSAMO; FELLI, 2006) Toda instituição de saúde deve ter um protocolo quando se tem ocorrência de acidentes ocupacionais com exposição a sangue e fluidos corpóreos em que constem recomendações profiláticas pós-exposição e acompanhamento desse trabalhador, pelo menos, durante seis meses após a exposição. Além disso, há também a necessidade de profissionais treinados para lidarem com tais acidentes, visto que a ocorrência do mesmo acarreta ao trabalhador sensação de frustração, vivência de ter adquirido uma doença, assim como, receio de ser menosprezado pelos colegas, tanto do seu meio social como do profissional. (VIEIRA; PADILHA, 2008) No Brasil, o Ministério da Saúde tem disponibilizado manuais de orientação aos profissionais de saúde com normas para prevenção e protocolos de conduta em face de acidentes ocupacionais com material biológico. Essas condutas devem ser divulgadas entre os profissionais e adotadas em estabelecimentos de saúde, incluindo consultórios e hospitais. 31 CONSIDERAÇÕES FINAIS Ao termino desta pesquisa bibliográfica e com base na análise das produções científicas, acerca da temática é necessário realizar algumas recomendações acerca dos acidentes de trabalho ocasionados no ambiente hospitalar pela equipe de enfermagem. O trabalho é um dos elementos que interferem nas condições e qualidade de vida do homem e, portanto na sua saúde. Dentre os profissionais da área de saúde que se expõe constantemente aos riscos existentes no trabalho, a equipe de enfermagem é a mais vulnerável devido a manipulação com objetos contendo material biológico, como por exemplo, os perfurocortantes. Essa exposição acontece principalmente no ambiente hospitalar devido o elevado número de atendimento e com uma enorme circulação de pessoas contendo focos de infecção podendo ser transmitida aos profissionais existentes neste ambiente. Esse estudo evidenciou que os auxiliares de enfermagem é a classe profissional mais vulnerável ao acidentes devido aos procedimentos executados, como administração de medicamentos, cuidado direto a pacientes agitados, punções venosas com scalps, descarte inadequado de perfurocortantes, reencape de agulhas etc. Existem vários microorganismos patogénicos que podem ser transmitidos de doente para o profissional de saúde e, também, do profissional de saúde para o doente. As principais doenças infecto-contagiosas a que estão expostas a enfermagem são: hepatite B, hepatite C e AIDS. Devido risco de contrair essas doenças, o acidente gera na equipe de enfermagem repercussões psicossociais sendo necessário adotar medidas de prevenção contra os acidentes de trabalho. A prevenção dos acidentes ocupacionais é a primeira estratégia para reduzir os riscos de infecções por agentes patológicos transmitidos pela manipulação de objetos perfurocortante contendo material biológico. Deste modo, as precauções padrão e o cumprimento rigoroso das 32 normas de controle da infecção, bem como a orientação da equipe quanto a sua proteção são fundamentais. Essas precauções são medidas profiláticas, que devem ser empregadas por todos que lidam ou têm contato com pacientes, independente do diagnóstico ou estado presumido de infecção. Aplicam-se não só ao sangue, bem como a todos fluidos corpóreos, secreção, excreções, pele não intacta, mucosa, contendo ou não sangue visível. Apesar do conhecimento por parte de alguns profissionais de enfermagem quanto à importância da utilização de precauções universais, como o uso de EPIs (equipamentos de proteção individual), higienização das mãos, descarte de agulhas em locais apropriados durante a assistência ao paciente, a adoção dessas precauções não ocorrem regularmente e, conseqüentemente amplia o número de acidentes de trabalho. O estudo verificou que os auxiliares de enfermagem (profissionais de nível médio) desconhecem a importância do uso de EPIs durante a assistência e a notificação dos acidentes por meio da CAT. A subnotificação desses acidentes aumenta o risco de aquisição das doenças infectocontagiosas, pois muitos profissionais desconhecem as condutas a serem adotadas pósexposição e a que recorrerem no momento do acidente. Além disso, a subnotificação desses acidentes não mostra a real magnitude do problema. O profissional de enfermagem que realiza tarefas ou procedimentos que possam resultar numa exposição a agentes infecciosos deve conhecer as medidas e princípios de controle da infecção, os riscos que existem após um acidente de trabalho e os princípios de atuação após a exposição. O risco ocupacional está inerente à profissão e irá continuar se as medidas de prevenção não forem adotas por estes trabalhadores. Os resultados evidenciaram que mesmo com todo o conhecimento e informação disponível a respeito dos riscos ocupacionais e das formas de preveni-los, infelizmente ainda são elevados os números de acidentes e doenças ocasionados por estes. As instituições de saúde devem contemplar um protocolo de atuação no caso de ocorrência de acidente de exposição a sangue 33 ou a outros produtos biológicos, no exercício da sua atividade profissional, para registro imediato, avaliação, aconselhamento, tratamento e seu seguimento. REFERÊNCIAS ANDADRE, A.I. História da Enfermagem. 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