Voluntariado: O Desafio de Gerir Sonhos Coletivos Uma

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Voluntariado: O Desafio de Gerir Sonhos Coletivos
Uma Escuta aos Gestores de Três Organizações Sem Fins lucrativos
Autores: Élida Mara Lopes da Costa, Monikely de Oliveira Silva, Mônica Narjara Alves Carlos,
Samuel Lázaro Luz Lemos
Orientador: Ana Cristina Batista dos Santos, M.Sc.
Instituição de origem: Universidade Federal Rural do Semi-árido – UFERSA (Curso de
Administração e Grupo de Estudos e Pesquisas em Administração – GEPAR, UFERSA/CNPQ).
Introdução
No Brasil, o voluntariado vem crescendo de forma expressiva, todavia, esse crescimento
parece vir acompanhado de uma progressiva evasão, sendo a má gerência dos trabalhadoresvoluntários apontada como uma das causas das desistências (OLIVEIRA; BEZERRA, 2007).
Muitos gestores parecem não saber lidar com o trabalho gratuito, tanto no que se refere ao nível de
atribuição de responsabilidades quanto às formas de controle dos resultados da ação coletiva.
Contra este pano de fundo, este estudo se ocupou com uma escuta aqueles que
desempenham o papel de gestores de trabalhadores-voluntários, tendo como objetivo compreender a
visão dos dirigentes de três organizações sem fins lucrativos sobre os desafios que eles enfrentam
na gestão de voluntários.
Metodologia
De acordo com o objetivo proposto, realizou-se uma pesquisa qualitativa exploratória que
focava, do ponto de vista qualitativo, a compreensão de fenômenos sociais, e, no que se refere ao
seu caráter exploratório, visava proporcionar maior familiaridade com o problema objeto do estudo
(RICHARDSON, 1985).
O universo da pesquisa era composto por três organizações sem fins lucrativos, todas
sediadas em um mesmo município: (i) uma associação desportiva e cultural que realiza trabalhos de
conscientização juvenil através do esporte; (ii) uma instituição filantrópica formada por jovens com
idade entre 12 e 21 anos, a qual valoriza o crescimento pessoal através da ajuda mútua e ao
próximo; e, (iii) uma escola pública em que trabalham funcionários e voluntários. A escola é
referência no estado no tocante à mobilização de voluntários.
Os dados foram conseguidos utilizando entrevistas; três delas feitas com gestores, cada um
sendo ouvido uma vez; tal método foi usado pela possibilidade de coletar informações através da
fala dos atores sociais (MINAYO, 2000). A amostra foi por acessibilidade (MATTAR, 2001) dos
pesquisadores ao universo de pesquisa. Paralelamente às entrevistas, conversas informais foram
realizadas com membros das entidades para melhor aprofundamento da realidade pesquisada.
Resultados
As entrevistas expressam um ponto de partida comum: o início do trabalho voluntário esteve
associado, nas três organizações pesquisadas, ao compartilhar de sonhos comuns - melhoria da
escola, do bairro, melhor formação dos jovens da cidade - entre parentes, amigos e pessoas da
comunidade, o que parece ser para eles muito significativo para a continuidade desses serviços. As
relações de informalidade e fraternidade são bastante perceptíveis nas falas, quase não havendo
referência a situações de intriga nos grupos. Os gestores comumente promovem eventos de
confraternização visando ao fortalecimento dos vínculos.
No tocante à gestão de pessoas, algumas especificidades foram percebidas quanto à
“seleção”, “remuneração”, “incentivos” e “demissão” de pessoal.
Quanto à “seleção”, além do desejo de abraçar a causa, o “candidato a voluntário” é avaliado
em aspectos ligados ao caráter, mais do que em relação a aspectos técnicos: “qualquer pessoa pode
entrar, desde que tenha uma boa índole” (entrevistado).
Sobre a “remuneração”, foram narrados ganhos pessoais como reconhecimento, respeito,
bem ao próximo (entrevistado). Pode-se dizer que as entidades dão muitos incentivos, exceto
financeiros, pelos serviços prestados. São prêmios simbólicos que visam gerar a satisfação pessoal e
envolvimento com a causa.
Eles afirmam serem necessárias “políticas de incentivo” e acompanhamento constante. Para
que os voluntários se mantenham interessados na continuação do trabalho que realizam, os gestores
estão sempre buscando formas de motivação, fazendo com que o voluntário se sinta como parte
fundamental para que o objetivo da entidade seja alcançado com sucesso.
A “demissão” também não é descartada nas falas. Para eles, o afastamento do voluntário é
necessário sempre que suas práticas não estiverem coerentes com a filosofia da organização.
Aspectos como postura e conduta pessoal inadequada podem justificar a saída do voluntário.
Como um dos desafios internos, verificou-se a necessidade de imposição de regras; seja em
um estatuto (na associação desportiva), um código moral e escrito (na entidade filantrópica) ou em
uma reprodução da ética voluntária dos “amigos da escola” (na escola). Assim, os critérios de
“seleção” são “formalizados”, podendo-se afirmar que os gestores exigem alguns atributos para
“aceitar” o voluntário. Outro aspecto relevante é que a tomada de decisão oscila entre a “soberania
do coletivo” e o poder de mando derivado da localização hierárquica de um voluntário ocupante de
cargo.
Um desafio externo apontado pelos entrevistados foi o da disputa política que envolve a
cidade. Há uma emergência de conflitos internos e externos decorrentes de escolhas políticas
discrepantes, o que acaba afetando o trabalho dos voluntários e o desempenho das organizações.
Uma compreensão possível é que os aspectos estruturais formais são, para os entrevistados,
tão conducentes à garantia da filosofia das entidades e alcance dos objetivos, quanto a idéia de
compartilhar sonhos comuns, por uma motivação altruísta, percebida no início das organizações e
no ingresso dos voluntários. Assim, informalidade e formalidade parecem ser igualmente
necessárias para o sucesso dessas entidades.
Conclusão
Os resultados deste estudo apontam que a motivação dos voluntários em aderir à “causa”
passa diretamente por uma identificação com a filosofia e com os objetivos dessas organizações,
pois, quanto mais eles se identificam, mais se envolvem e se esforçam para que os sonhos
individuais derivem para ações coletivas transformadoras do próprio ambiente em que vivem.
O desafio dos gestores estaria então em manter os voluntários focados na filosofia e nos
objetivos para os quais as organizações foram criadas. Os resultados parecem sugerir que, no
cotidiano organizacional, independente das organizações visarem ou não o lucro, o gerenciamento
delas passa, de maneira geral, por critérios objetivos como a definição de regras e a escolha de um
modelo de estrutura que “regule” a ação e o comportamento das pessoas; e, especificamente quanto
à gestão de pessoas, as tradicionais práticas de seleção, remuneração, incentivos e até desligamento
de pessoal não são eliminadas, mas adequadas às características específicas desse tipo de
organização.
Referências Bibliográficas
MATTAR, F.N. Pesquisa de Marketing. Edição compacta. 3 ed. São Paulo: Atlas, 2001.
MINAYO, M. C. S. O desafio do conhecimento: pesquisa qualitativa em saúde. 7. ed. São Paulo:
Hucitec/ Rio de Janeiro: Abrasco, 2000.
OLIVEIRA, Francisco Correia; BEZERRA, Rosa Maria Munguba. Fatores que geram evasão no
trabalho voluntário. In: I Encontro de Gestão de Pessoas e Relações de Trabalho, 2007, Natal,
Anais, Natal, ANPAD, 2007, 1 CD.
RICHARDSON, R.J. et alli. Pesquisa social: métodos e técnicas. São Paulo: Atlas, 1985.
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