PLATINO www.platino-alat.org PROJETO LATINO-AMERICANO DE INVESTIGAÇÃO EM OBSTRUÇÃO PULMONAR Organizadora: Ana MB Menezes PLATINO PROJETO LATINO-AMERICANO DE INVESTIGAÇÃO EM OBSTRUÇÃO PULMONAR Copyright © 2006 Associação Latino-Americana de Tórax (ALAT) O conhecimento médico é atualizado constantemente. Assim que novas informações se tornam disponíveis, são necessárias mudanças nos tratamentos, nos procedimentos, nos equipamentos e no uso de drogas. Os autores fizeram todo o possível para garantir que as informações apresentadas neste livro sejam precisas e atualizadas. No entanto, em função das constantes modificações na área, aconselhamos os leitores que confirmem se as informações, especialmente aquelas relativas ao uso de drogas, estão de acordo com a legislação e os padrões da prática atualmente en vigor. PROJETO LATINO-AMERICANO DE INVESTIGAÇÃO EM OBSTRUÇÃO PULMONAR Coordenação geral do Projeto PLATINO: Ana MB Menezes Tradução: Alicia Matijasevich Silvana Salazar Capa e diagramação: Gabriel Abad Associação Latino-Americana de Tórax http://www.alatorax.com/ Brasil Revisão: Equipe Projeto Platino Universidade Federal de Pelotas Programa de Pós-Graduação em Epidemiologia http://www.epidemio-ufpel.org.br/ Universidade Federal de São Paulo Escola Paulista de Medicina http://www.unifesp.br/ Chile Pontificia Universidad Católica de Chile http://www.puc.cl/ México Instituto Nacional de Enfermedades Respiratorias http://portal.iner.gob.mx/ Uruguai Universidad de la República Facultad de Medicina http://www.fmed.edu.uy// Venezuela Universidad Central de Venezuela http://www.ucv.ve/ É proibida a duplicação ou reprodução deste volume, no todo ou em parte, sob quaisquer formas ou por quaisquer meios (eletrônico, mecânico, gravação, fotocópia, distribução na Web e outros), sem permissão expressa da ALAT. www.platino-alat.org “Aproximar-se é um começo, manter-se juntos um progresso, trabalhar juntos um sucesso” . Henry Ford Agradecimentos COLABORADORES DO PROJETO PLATINO: Presidentes da ALAT: Carmen Lisboa (Chile) Carlos Torres (Colômbia) Carlos Luna (Argentina) Diretores do Departamento de DPOC da ALAT: Juan Manuel Luna (Guatemala) María Victorina López (Uruguai) Coordenação geral: Ana MB Menezes (Brasil) Cesar G Victora (Brasil) Pedro C Hallal (Brasil) Coordenação das espirometrias: Rogelio Pérez Padilla (México) Membros dos comitês: Bartolomé Celli (Venezuela) Roberto Rodríguez-Roisin (Espanha) Marc Miravitles (Espanha) Sonia Buist (EUA) William Vollmer (EUA) Responsável pela amostragem: Nilza Nunes da Silva (Brasil) Equipe de treinamento das entrevistas e trabalho de campo: Responsável pela avaliação antropométrica: Ana MB Menezes (Brasil) Isabel Freitas (Brasil) Laura Blanco (Uruguai) María Nelly Márquez (Uruguai) Wolney Lisboa Conde (Brasil) Carlos Augusto Monteiro (Brasil) Equipes locais (supervisores): José RB Jardim (Brasil) Rogelio Pérez Padilla (México) Adriana Muiño (Uruguai) María Victorina López (Uruguai) Gonzalo Valdivia (Chile) Julio Pertuzé (Chile) Carlos Tálamo (Venezuela) María Montes de Oca (Venezuela) Isabel Freitas (Brasil) Renata Levy (Brasil) Clarissa de Lacerda Nazario (Brasil) Dolores Moreno (Venezuela) Fernando Giménez (Uruguai) Laura Blanco (Uruguai) Eng. Daniel Labounora (Uruguai) Marcela Araya Bannout (Chile) Mónica Cifuentes Soro (Chile) Hilda Fuentes Yáñez (Chile) Francisco Franco (México) Alexander Corcho (México) Equipe de treinamento das espirometrias: Supervisores locais das espirometrias: Rogelio Perez Padilla (México) Juan Carlos Vásquez García (México) María Nelly Márquez (Uruguai) Fernanda W. Rosa (Brasil) Aquiles Camelier (Brasil) Oliver Nascimento (Brasil) María Nelly Márquez (Uruguai) Elisa Sánchez-Gallén (México) Abigail Guzmán (México) Marcela Araya (Chile) Dolores Moreno (Venezuela) Equipe de Investigadores Principais: Equipe de digitação: Daniel Pereira (Brasil) Danton Duro (Brasil) Companhia ndd Medical Technologies (espirômetro Easy-OneTM) Georg Harnoncourt (Switzerland) Juerg Anderauer (Switzerland) Andre Wetzel (Switzerland) Abreviações LIN ................. Limite Inferior da Normalidade MCS ................ Mental Component Scales AL ................... América Latina NHANES III ..... Third National Health and Nutrition Examination Survey ALAT ............... Associação Latino-Americana de Tórax NIOSH ............. Instituto de Saúde e Seguridade Ocupacional dos Estados Unidos ATS ................. American Thoracic Society BD .................. Broncodilatador BI ................... Boehringer Ingelheim BOLD .............. Burden of Obstructive Lung Disease CAPES ............. Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, Brasil CNPq ............... Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico, Brasil OMS ................ Organização Mundial da Saúde PCS ................. Physical Component Scales PFE ................. Pico de Fluxo Expiratório PLATINO .......... Projeto Latino-Americano de Investigação em Obstrução Pulmonar Pós-BD ............ Pós - broncodilatador R2 ................... Coeficiente de Correlação CVF ................. Capacidade Vital Forçada R2DP ............... Desvio Padrão do Coeficiente de Correlação DALY ............... Disability - Adjusted Life Year RF ................... Relação Fixa DCNT .............. Doenças Crônicas Não – Transmissíveis RS ................... Rio Grande do Sul, Brasil DP .................. Desvio Padrão SF-12 .............. Short Form - 12 DPOC .............. Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica TBC ................. Tuberculose Pulmonar ECRHS............. The European Community Respiratory Survey II VEF1 ............... Volume Expiratório Forçado no Primeiro Segundo ERS ................. Congresso Respiratório Europeu FAPERGS ......... Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado do Rio Grande do Sul, Brasil FEF25-75 ............ Fluxo Expiratório Forçado entre 25 e 73 por cento da Capacidade Vital Forçada FET ................. Tempo de Respiração Forçada GOLD .............. Global Initiative for Chronic Obstructive Lung Disease IMC ................. Índice de Massa Corporal Sumário Capítulo 6 Tabagismo Página 79 Ana MB Menezes, Pedro C Hallal Universidade Federal de Pelotas, Brasil Capítulo 1 Histórico, Objetivos e Metodologia Básica Página 1 Página 29 Página 45 Ana MB Menezes, Pedro C Hallal Universidade Federal de Pelotas, Brasil Capítulo 4 Valores de referência para espirometria Ana MB Menezes, Pedro C Hallal Universidade Federal de Pelotas, Brasil Página 107 Capítulo 9 Qualidade de vida e DPOC Página 117 José R. Jardim, Aquiles Camelier, Fernanda Rosa, Oliver Nascimento Universidade Federal de São Paulo, Brasil Página 53 Capítulo 10 Comorbidade e DPOC Página 125 Gonzalo Valdivia, Carmen Lisboa, Julio Pertuzé Pontificia Universidad Católica de Chile Rogelio Perez Padilla Instituto Nacional de Enfermedades Respiratorias, México Capítulo 5 Fatores de risco para DPOC Capítulo 8 Tratamento da DPOC Adriana Muiño García, María Victorina Lopez Varela Universidad de la República, Uruguay Rogelio Perez Padilla Instituto Nacional de Enfermedades Respiratorias, México Capítulo 3 Prevalência de DPOC Página 93 Carlos Tálamo, Maria Montes de Oca Universidad Central de Venezuela Ana MB Menezes, Cesar G Victora, Pedro C Hallal Universidade Federal de Pelotas, Brasil Capítulo 2 Espirometria no Estudo PLATINO Capítulo 7 Subdiagnóstico e sobrediagnóstico da DPOC Página 69 Capítulo 11 Discussão Ana MB Menezes, Pedro C Hallal Universidade Federal de Pelotas, Brasil Página 133 Histórico, Objetivos e Metodologia Básica Capítulo 1 Histórico, Objetivos e Metodologia Básica Ana MB Menezes Cesar G Victora Pedro C Hallal Introdução A Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica (DPOC) vem apresentando, mundialmente, um significativo aumento em prevalência e mortalidade. Segundo o Global Initiative for Chronic Obstructive Lung Disease (GOLD), a prevalência mundial da DPOC para todas as idades, em 2002, foi estimada em 11,6/1000, em homens, e 8,8/1000, em mulheres (WHO, 2005). Atualmente, a DPOC é a quarta causa de mortalidade no mundo (WHO,2005). Segundo o critério “Disability-Adjusted Life Year” - DALYs, ou seja, a soma de anos perdidos devido a mortes prematuras e anos vividos com incapacidade ajustados à severidade da incapacidade, a DPOC será a quinta causa de DALYs no mundo em 2020 (Murray, 1996). Dados da América Latina (AL) sobre esta doença são escassos, mas há indícios de que a DPOC também vem crescendo em prevalência e mortalidade em alguns países da AL (Ait-Khaled, 2001). O diagnóstico da DPOC deve ser suspeitado sempre que alguém apresentar tosse, catarro, dispnéia e/ou história de exposição a fatores de risco para esta. A confirmação deste diagnóstico será feita após realização 1 Capítulo 1 Histórico, Objetivos e Metodologia Básica de espirometria, preferencialmente pós broncodilatador (BD). Conforme o critério GOLD, a espirometria deverá mostrar um Volume Expiratório Forçado no primeiro segundo (VEF1) < 80% do valor previsto “e” uma relação VEF1/ Capacidade Vital Forçada (CVF) < 70%, após o uso de BD. Esses achados comprovam a obstrução ao fluxo de ar, sem total reversibilidade (GOLD, 2005). Uma das limitações deste critério diagnóstico é a necessidade da existência de valores de referência para as diferentes populações. Em razão disso, tem sido proposto por alguns autores uma definição de DPOC baseada na relação VEF1/CVF < 70% após o uso de BD, conhecida como “Relação Fixa” (Celli, Pontos-chave: ▪ ▪ ▪ ▪ ▪ ▪ 2004). A DPOC afeta marcadamente a qualidade de vida dos pacientes. O aumento da prevalência do tabagismo em países em desenvolvimento de mortalidade da DPOC, 4a causa atual de mortalidade. Para 2020, 5a causa de DALYs, no mundo. Raros estudos de base populacional na AL sobre DPOC. Suspeita de diagnóstico: paciente com tosse, catarro e dispnéia e/ou fatores de risco para DPOC. Confirmação do diagnóstico da DPOC: espirometria pós BD. ◊ Relação Fixa: VEF1/CVF<70%, pós BD. progressiva, conduzindo à perda de função pulmonar e à redução na sobrevida mas o fumo destaca-se como o maior responsável por esta doença. e ◊ GOLD: VEF1<80% do valor previsto e VEF1/CVF<70% Havendo a continuidade de seu principal fator de risco - o fumo - a doença é (Anthonisen, 1994). Sabe-se que existem outros fatores de risco para a DPOC, Aumento de prevalência mundialmente. ▪ ▪ Principal fator de risco para DPOC: fumo. Continuidade do tabagismo: pior prognóstico da doença. torna a DPOC um importante problema de saúde pública para estes, sendo acrescido de várias outras situações desfavoráveis decorrentes da pobreza nesses países. A epidemia do tabagismo seguir-se-á de outras epidemias causadas pelo fumo, sendo a DPOC uma das principais, pela sua elevada morbidade e mortalidade. 2 3 Capítulo 1 Histórico do Projeto PLATINO ANO 2000 - membros da Associação Latino-Americana de Tórax (ALAT) uniram-se para discutir a possibilidade da realização de um estudo de prevalência da DPOC, na AL. ANO 2001 - no Congresso Respiratório Europeu (ERS), realizado em Berlim, um grupo de membros da ALAT reuniu-se com diretores da Boehringer-Ingelheim (BI), que se mostraram interessados em financiar o estudo. DECISÕES TOMADAS NO ERS (2001) Histórico, Objetivos e Metodologia Básica Em janeiro de 2002, reuniram-se em São Paulo a diretoria da ALAT, um diretor da Boehringer-Ingelheim e pesquisadores dos cinco centros inicialmente escolhidos para assistirem à apresentação do projeto. O grupo reuniu-se novamente em Mazatlán, México, onde um dos membros da ALAT (Juan Luna, diretor do Departamento de DPOC da ALAT) criou um logotipo para o projeto com o respectivo nome de PLATINO. Com o avanço do projeto, algumas modificações foram feitas na lista de cidades incluídas: Buenos Aires (Argentina) e Bogotá (Colômbia) foram substituídas por Caracas (Venezuela) e Montevidéu (Uruguai). Nome do Projeto Ficou acordado no congresso em Berlim que a coordenação geral do estudo seria na cidade de Pelotas, RS, Brasil, sob a supervisão de Ana MB Menezes, médica pneumologista e epidemiologista, autora de estudo prévio de base populacional sobre o tema na AL. Também foi decidido naquele momento que cinco centros da AL seriam escolhidos para a realização do estudo. Um projeto que fosse representativo de toda AL seria inviável financeiramente. Para escolher os cinco centros, procurou-se eleger locais geograficamente representativos das diferentes regiões da AL. O critério de seleção das cidades foi baseado em seu tamanho e relevância em relação ao país. Sendo assim, Projeto LATino-americano de INvestigação em Obstrução pulmonar foram escolhidos inicialmente os seguintes países e cidades: Brasil (São Paulo), México (Cidade do México), Argentina (Buenos Aires), Chile (Santiago) e Colômbia (Bogotá). Nesta reunião, decidiu-se que seria elaborado um projeto sobre o estudo, a ser apresentado posteriormente para o grupo. O projeto deveria contemplar extensa revisão de literatura, dados locais dos centros escolhidos, os objetivos do estudo, as variáveis a serem estudadas, a logística, cronograma e orçamento. 4 5 Capítulo 1 Países com as respectivas cidades participantes do Projeto PLATINO (países do estudo em azul) Histórico, Objetivos e Metodologia Básica Colaboração com o Projeto BOLD Concomitantemente ao desenvolvimento do Projeto PLATINO, um grupo americano, liderado por Sonia Buist, Professor of Pulmonary Medicine & Critical Care Medicine, Portland, Oregon Health & Science University, vinha desenvolvendo um projeto similar ao PLATINO, a ser executado em países não pertencentes à AL - projeto BOLD (Burden of Obstructive Lung Disease). As equipes de pesquisadores de ambos os projetos decidiram utilizar um protocolo comum, permitindo que, no futuro, os dados pudessem ser comparados. A partir deste momento, as coordenadoras dos projetos PLATINO e BOLD, juntamente com os demais membros das equipes, passaram a trabalhar nos instrumentos a serem utilizados nos projetos. Decidiu-se que haveria um “Questionário Principal”, comum a ambos os projetos. A este questionário, poderiam ser acrescentados outros itens ou investigações do interesse de cada um dos projetos como também dos próprios centros. ANO DE 2002 ▪ ▪ ▪ ▪ ▪ 6 Reuniões dos dois grupos - PLATINO e BOLD - para elaboração dos instrumentos. Instrumentos elaborados originalmente em inglês e, posteriormente, traduzidos para o português e retraduzidos para o inglês por pessoas que desconheciam o projeto. O mesmo foi realizado para o espanhol, com tradução do português para o espanhol e retradução, com adaptações locais dos instrumentos para cada país do estudo na AL. Definição do espirômetro a ser utilizado em ambos projetos, após testagem de vários equipamentos na Cidade do México, por Rogelio Perez Padilla. Criação de um website para o Projeto PLATINO: www.platino-alat.org 7 Capítulo 1 Pontos-chave sobre o histórico do PLATINO: ▪ ▪ ▪ ▪ ▪ ▪ ▪ Histórico, Objetivos e Metodologia Básica Metodologia O delineamento do projeto O Projeto PLATINO foi uma iniciativa da ALAT. Cinco centros da AL identificados: São Paulo, Cidade do México, Montevidéu, Santiago e Caracas. foi transversal de base populacional, Elaboração do projeto detalhado e apresentação para a ALAT, BI e investigadores principais de cada centro. unidade amostral primária. Definição do centro coordenador das espirometrias na Cidade do México. foi composta por adultos com 40 Colaboração com o projeto BOLD. Elaboração de instrumentos com tradução e retradução, e escolha do espirômetro a ser utilizado. tendo os setores censitários como Setores Censitários ▪ A população-alvo do estudo anos ou mais, de ambos os sexos, por ser esta a faixa etária com maior ocorrência da DPOC. Criação do website do Estudo PLATINO: http://www.platino-alat.org. ▪ “Setores censitários” são grupamentos de domicílios classificados pelos Institutos de Geografia e Estatística de cada país, com números similares de domicílios e delimitados geograficamente. Os mapas dos setores censitários são atualizados periodicamente. Uma amostra de 800 pessoas por centro seria necessária para estimar uma prevalência da DPOC de até 30% (margem de erro de até quatro pontos percentuais). Para contemplar percentual de não resposta, sortearam-se 68 Objetivos do Projeto PLATINO Objetivo geral: ▪ ▪ Medir a prevalência da DPOC em cinco centros da América Latina ▪ ▪ ▪ ▪ ▪ 8 setor, o que totalizaria 1020 domicílios, onde se esperaria encontrar cerca de 1000 pessoas na faixa etária de 40 anos ou mais. Verificar a associação entre DPOC e alguns fatores de risco Objetivos específicos: ▪ “setores censitários” com 15 domicílios em “média” a serem visitados em cada Medir e comparar a prevalência da DPOC conforme diferentes definições: relação fixa, GOLD, ATS, ERS, sintomas, diagnóstico médico Medir a prevalência de fatores de risco conhecidos como: demográficos, socioeconômicos, fumo, exposição ocupacional, poluição intra e extradomiciliar, história familiar, hospitalizações por doença respiratória na infância Descrever a prevalência da DPOC conforme os diferentes fatores de risco Investigar o diagnóstico médico da DPOC Amostragem: ▪ ▪ ▪ ▪ Conhecer o manejo da DPOC Descrever as conseqüências sociais e econômicas da DPOC ▪ Cada área metropolitana foi dividida em dois estratos: a cidade-sede e os municípios periféricos. Considerou-se para sorteio da amostra também o nível econômico e a localização dentro da área metropolitana. Todos os setores censitários foram listados e a amostra foi selecionada com probabilidade proporcional ao tamanho da população do setor. Em cada setor sorteado, os domicílios foram recontados para atualizar seu número exato (conforme o crescimento ou não do setor, o número de domicílios a serem visitados era ajustado para mais ou para menos, mantendo-se a média de 15 domicílios por setor do cálculo original). Através de uma amostragem sistemática, um domicílio em cada “x” era visitado. 9 Capítulo 1 ▪ ▪ Histórico, Objetivos e Metodologia Básica Todos os moradores de 40 anos ou mais dos domicílios sorteados eram incluídos no estudo. As análises estatísticas do projeto levaram em conta o fato de que a amostragem foi realizada por setores censitários. Instrumentos Definição da DPOC No Projeto PLATINO foi utilizada a definição da DPOC chamada de relação fixa, ou seja, VEF1/CVF<70% pós BD. Também foram estimadas outras definições, conforme apresentado posteriormente nesta publicação. Exemplo da amostragem em São Paulo Dois estratos: cidade-sede e municípios periféricos; zonas geográficas: norte, sul, leste, oeste; setores censitários marcados em pontos azuis. Questionário O “Questionário Principal” utilizado para o Projeto PLATINO foi adaptado e modificado dos seguintes questionários originais: American Thoracic Society/Division Lung Diseases (Ferris, 1978), The European Community Respiratory Health Survey II (ECRHS II), Lung Health Study, 2002 e SF-12 (1995). Foram coletadas variáveis demográficas, socioeconômicas, relato de sintomas e doenças respiratórias, medicação utilizada para doenças de pulmão, diagnóstico médico de enfermidades respiratórias e determinadas CIDADE-SEDE comorbidades, história de tabagismo, realização de espirometria e de vacina anti-influenza, aconselhamento para cessação do tabagismo, questões sobre qualidade de vida, absenteísmo no trabalho e lazer, infecções respiratórias na MUNICÍPIOS PERIFÉRICOS infância, poluição intra-domiciliar e exposição a poeiras. Alguns países acrescentaram ao Questionário Principal, questões “suplementares” sobre sintomas do sono, uso de oxigênio, vacinação para Pneumococo, vitaminas, medicação anti-hipertensiva e utilização de serviços médicos. Um questionário reduzido foi aplicado aos indivíduos que se recusaram a responder o Questionário Principal abordando idade, sexo e tabagismo. Todos estes instrumentos podem ser encontrados no website do Projeto PLATINO (www.platino-alat.org). 10 11 Capítulo 1 Espirometria A espirometria foi realizada com aparelhos portáteis, à bateria e Histórico, Objetivos e Metodologia Básica Detalhes do controle de qualidade das espirometrias estão descritos no capítulo 2. sistema de ultra-som para medida dos fluxos respiratórios (Easy-One, da companhia NDD, Suíça). Cerca de 400 testes podiam ser armazenados na Outras perguntas referentes a infecções respiratórias nas últimas 3 memória do aparelho, sendo que todos os exames do dia eram repassados semanas, uso de medicações sob forma inalatória nas últimas 3 horas, fumo para um computador. A calibração dos espirômetros era realizada com seringa nas últimas duas horas e exercício físico intenso na última hora eram feitas de 3 litros, diariamente, antes dos entrevistadores irem para o campo. antes de o entrevistado realizar a espirometria, embora não fossem critérios Utilizaram-se bocais e espaçadores descartáveis para a inalação de 400 mcg de exclusão. de salbutamol (a espirometria era realizada pré e pós BD). Antes de os entrevistados realizarem os testes espirométricos, era Antropometria aplicado um pequeno questionário para assegurar que os mesmos não Foram realizadas duas medidas em cada entrevistado de altura preenchessem qualquer critério de exclusão e era também contado o pulso (estadiômetro portátil Seca com precisão de 0,1 cm), peso (balança eletrônica durante um minuto: Tanita, com precisão de 200 gramas) e circunferência da cintura (fita de fibra inextensível, com precisão de 0,1 cm), utilizando-se a média das mesmas Perguntas utilizadas para definir indivíduos não elegíveis para espirometria ▪ ▪ ▪ ▪ ▪ ▪ 12 pescoço. As técnicas dessas mensurações estão descritas detalhadamente no O(a) Sr(a) teve alguma cirurgia no seu pulmão (tórax) ou no abdômen, nos últimos 3 meses? website do Estudo PLATINO. O(a) Sr(a) teve um ataque de coração ou infarto, nos últimos 3 meses? Oximetria O(a) Sr(a) tem descolamento de retina ou fez alguma cirurgia de olhos, nos últimos 3 meses? 9500, Nonin Medical Inc.) colocado no dedo indicador da mão direita com as O(a) Sr(a) esteve internado por qualquer outro problema de coração, nos últimos 3 meses? O(a) Sr(a) está usando remédios para tuberculose, no momento? A Sra. está grávida, no momento? Não realizar espirometria ▪ ▪ para as análises. Em alguns centros também foi medida a circunferência do Para qualquer resposta afirmativa para as questões acima. Para pulso maior do que 160 batimentos por minuto (bpm) ou igual ou menor do que 60 bpm. A saturação de oxigênio era medida com oxímetro de pulso (Onyx pessoas sentadas e respirando ar ambiente. Eram tomadas 6 medidas a cada 10 segundos e calculada a média das mesmas (Beall et al, 1999). A oximetria foi realizada em três países: México, Uruguai e Venezuela. Controle de qualidade do estudo Com o objetivo de supervisionar o trabalho dos entrevistadores, os supervisores da pesquisa de cada centro do Estudo PLATINO revisitaram 10% dos entrevistados para aplicação de uma versão curta do questionário. Essa técnica permitiu que os mesmos confirmassem que a entrevista havia sido realmente feita, avaliassem a qualidade dos dados e ouvissem comentários 13 Capítulo 1 Histórico, Objetivos e Metodologia Básica dos entrevistados sobre o estudo e os entrevistadores que os haviam visitado. o trabalho em nível local. O comitê externo e o comitê executivo eram Em relação às medidas antropométricas, os entrevistadores passaram por solicitados a emitirem opinião quando necessário. Dois membros do projeto um processo de retreinamento na metade do trabalho de campo, com os BOLD - Sonia Buist e William Wollmer - participavam de reuniões e decisões nutricionistas ou antropometristas que os haviam treinado, em todos os tomadas sobre o Projeto PLATINO. centros do Estudo PLATINO. Comitês do Projeto PLATINO Estrutura organizacional do Projeto PLATINO Foram formados vários comitês com distintas funções no Projeto PLATINO, assim como dois centros de coordenação do projeto: um na cidade de Pelotas, Brasil - centro de coordenação geral do estudo e, outro, na Cidade do México, México - centro de coordenação das espirometrias. O centro de coordenação geral do estudo era responsável pela supervisão de todo o projeto, desde o contato com as pessoas-chave de cada centro participante do projeto, confecção dos instrumentos, tradução e retradução dos instrumentos, treinamento das equipes locais, visitas periódicas durante a realização do trabalho de campo a cada centro, armazenamento dos questionários originais, digitação, limpeza dos dados e confecção do banco de dados. Cada centro permanecia com uma cópia dos questionários. O centro de coordenação das espirometrias era responsável pelo treinamento das diversas equipes locais para aprendizagem dos testes espirométricos, recebimento via eletrônica (e-mail) das espirometrias semanalmente, com elaboração de um relatório para cada centro sobre o desempenho dos técnicos. Isto possibilitava que o investigador principal daquele centro pudesse acompanhar o andamento e a qualidade das espirometrias (detalhes no capítulo 2). As equipes locais eram coordenadas pelos investigadores principais, responsáveis pelo andamento de todo 14 15 Capítulo 1 Histórico, Objetivos e Metodologia Básica ◊ Os trabalhadores de campo eram considerados aptos para a Logística contratação, quando: ▫ O trabalho de campo do Projeto PLATINO foi realizado de forma progressiva, ou seja, iniciava-se o estudo em um centro e, quando o ▫ trabalho de campo estava finalizando, iniciava-se o segundo centro e, assim, consecutivamente. Devido ao fato do centro de coordenação geral do estudo ser no Brasil, optou-se por iniciar o projeto em São Paulo. A logística adotada ▫ para todos os centros seguiu a mesma metodologia: ▪ ▪ ▪ ▪ A coordenadora geral e os supervisores locais aprovavam o desempenho dos mesmos na aplicação dos questionários; O coordenador das espirometrias concedia-lhes um certificado como técnicos em espirometria, após realização de uma prova prática; O nutricionista ou o antropometrista detectavam um erro mínimo nas medidas antropométricas comparado ao padrãoouro (o próprio nutricionista/antropometrista). O investigador principal de cada centro organizava a equipe local; A coordenadora do projeto fazia contato com um expert local em amostragem, repassando ao mesmo os princípios básicos da amostragem do projeto; Era realizada a seleção dos setores censitários; Após o reconhecimento e atualização dos domicílios nos setores censitários, iniciava-se o treinamento da equipe de campo: ◊ Um grupo composto pela coordenadora geral do projeto, pelo coordenador das espirometrias e outro profissional do México com grande experiência em laboratório de função pulmonar, deslocavamse para o centro onde seria realizado o trabalho de campo e treinavam os supervisores, entrevistadores e técnicos locais; ◊ O projeto era apresentado para a equipe local destacando-se os aspectos principais; Ética O Projeto PLATINO foi submetido e aprovado pelo Comitê de Ética de cada centro. Todos entrevistados deveriam assinar o consentimento informado antes de participarem do estudo (os analfabetos forneciam sua impressão digital). Os bocais descartáveis e os espaçadores eram entregues para o entrevistado ao final da entrevista. Posteriormente, cada entrevistado recebia o laudo do teste espirométrico e a oferta de um serviço médico, caso a espirometria apresentasse alterações. Ainda era entregue a cada respondente uma lembrança do estudo como agradecimento pela participação: uma camiseta ou uma caneca com o logotipo e nome do projeto. ◊ Os entrevistadores e demais pessoas envolvidas no trabalho de campo deveriam ter no mínimo segundo grau completo; ◊ Técnicas de leitura e dramatização eram utilizadas para o treinamento do questionário; ◊ A duração do treinamento com a equipe central era de uma semana; ◊ O treinamento e a padronização das medidas antropométricas eram realizados por nutricionistas ou antropometristas locais; Processamento dos dados Todos os questionários eram fotocopiados, sendo que as cópias eram armazenadas em cada centro do estudo e os questionários originais enviados para o centro de coordenação. Era realizada uma revisão de todos os questionários pela equipe do centro de coordenação; as questões em aberto eram codificadas e era realizada dupla digitação dos dados no programa EpiInfo. 16 17 Capítulo 1 Histórico, Objetivos e Metodologia Básica Análise dos dados Todas as análises do Estudo PLATINO foram realizadas no programa STATA, levando em conta a amostragem por setores censitários. Análises descritivas, análises bivariadas, análises multivariáveis através da regressão de Poisson com estimativas das razões de prevalências e intervalo de confiança de 95% foram fornecidas para cada centro do estudo. Após o término do estudo nos cinco centros, criou-se um banco de dados único que foi disponibilizado para todos os investigadores do projeto. Para um melhor entendimento do banco de dados, um mapa de todas as variáveis foi criado, conforme a seguinte lógica: ▪ ▪ ▪ ▪ ▪ ▪ ▪ ▪ ▪ Variáveis do questionário principal iniciavam com a letra “p”. Variáveis referentes à espirometria iniciavam com a letra “e”. Equipe do Projeto PLATINO Variáveis referentes à antropometria iniciavam com a letra “a”. Variáveis referentes ao questionário de recusa iniciavam com a letra “r”. Variáveis novas criadas a partir de outras iniciavam com a letra “z”. Variáveis do questionário de qualidade de vida (SF-12) iniciavam com as letras “sf”. Variáveis referentes ao controle de qualidade dos questionários iniciavam com as letras “cq”. Variáveis referentes às questões suplementares iniciavam com a letra “s”. O nome de cada variável constava de: letra (p ou e ou a, etc) + número da pergunta + nome da variável. Exemplo: a pergunta do questionário principal sobre sexo do entrevistado correspondia à variável: p1sexo. Equipe do Brasil 18 19 Capítulo 1 Histórico, Objetivos e Metodologia Básica Equipe do Chile Equipe do Uruguai Equipe do México Equipe da Venezuela 20 21 Capítulo 1 Cronograma do Projeto PLATINO Histórico, Objetivos e Metodologia Básica Recusas e características dos não-respondentes Para que um estudo possa atingir os objetivos formulados, é preciso que o tamanho de amostra ao final do estudo seja condizente com o cálculo inicialmente proposto no projeto. Esta é uma das etapas difíceis de um projeto multicêntrico como este, já que as entrevistas foram realizadas nos domicílios e os entrevistados, além de responderem a um questionário bastante longo, precisavam realizar medidas de função pulmonar antes e depois do uso de um medicamento (BD). Além disso, era preciso que os mesmos realizassem medidas antropométricas de peso, altura e circunferência da cintura. Sendo a faixa etária do estudo adultos de 40 anos ou mais de idade, muitos deles trabalhavam durante o dia, o que exigia da equipe do estudo inúmeras visitas a determinados domicílios e, muitas vezes, as entrevistas deviam ser realizadas em finais de semana, feriados ou à noite. Esta estratégia para evitar recusas exige grande disponibilidade de tempo e dedicação ao estudo por parte da equipe, como também saber convencer a pessoa a ser entrevistada da importância de sua participação no mesmo. Metodologia De acordo com o cálculo de tamanho de amostra inicial, seria necessário entrevistar cerca de 800 pessoas em cada uma das cidades incluídas no Estudo PLATINO. Tendo em vista que toda pesquisa tem um certo número de pessoas que se recusam a participar ou não são encontradas, optou-se por incluir 68 setores censitários com uma média de 15 domicílios por setor; isto resultaria em 1020 domicílios. A metodologia deste tipo de estudo epidemiológico não permite substituições de pessoas ou domicílios, portanto, as recusas ou perdas não podem ser substituídas. Para o cálculo da taxa de respostas foi contabilizado, inicialmente, o percentual de recusas em nível de domicílios, posteriormente, em nível de 22 23 Capítulo 1 Histórico, Objetivos e Metodologia Básica pessoas e, por último, de recusas para a realização das espirometrias. O total Tabela 2. Número de espirometrias realizadas de recusas ou perdas do Estudo PLATINO refere-se aos três níveis. As exclusões do mesmo foram os casos que preencheram os critérios de exclusão explicitados anteriormente. Resultados 1. Taxas de resposta A tabela 1 mostra o número de indivíduos sorteados que preenchiam os critérios de inclusão do estudo e quantos se recusaram a participar da pesquisa ou não foram encontrados em nenhuma das tentativas da dupla de entrevistadores. A tabela 3 mostra o percentual total de resposta, multiplicando-se a taxa de resposta no nível do domicílio, questionário individual e espirometria. Tabela 3. Percentual total de resposta Tabela 1. Número de indivíduos sorteados Pontos-chave ▪ Dentre as pessoas entrevistadas, nem todas realizaram a espirometria, pois algumas preenchiam os critérios de exclusão e outras se recusaram a realizar o exame. A tabela 2 apresenta o número de pessoas entrevistadas em cada cidade, o número de pessoas não elegíveis para a espirometria, o número de pessoas que se recusaram a realizar a espirometria e o número ▪ ▪ As taxas de resposta variaram de 83,7% no Brasil a 68,9% na Cidade do México. O tamanho de amostra obtido em todos os centros foi maior do que o tamanho de amostra calculado no projeto (800 pessoas). O maior número de exclusões para espirometria foi na Cidade do México (46 pessoas), sendo que o maior número de recusas para espirometria foi em Montevidéu (26 pessoas). total de espirometrias conduzidas em cada local. 24 25 Capítulo 1 Histórico, Objetivos e Metodologia Básica Além de quantificar o número de pessoas que se recusaram a foi praticamente o mesmo entre tabagistas e não tabagistas. No entanto, a participar do estudo ou que não foram encontradas, é importante investigar diferença no percentual de resposta entre tabagistas e não tabagistas não foi se as mesmas são diferentes daquelas que foram efetivamente entrevistadas. estatisticamente significativa em nenhum dos centros. As informações do questionário dos não-respondentes foram obtidas para cerca de metade dos mesmos em cada cidade. Com base nessas informações, foi possível calcular as taxas de respostas conforme cada uma dessas variáveis (tabela 4). Tabela 4. Taxas de respostas comforme sexo, idade e tabagismo Pontos-chave ▪ ▪ ▪ O percentual total de recusas do Estudo PLATINO, considerando o fato de ser um estudo multicêntrico e com uso de medicação, foi considerado bom. As recusas para participação no estudo foram maiores entre os homens e pessoas mais idosas. Poucas pessoas preencheram critérios de exclusão para a realização de espirometria (o maior percentual foi de 3%). Referências bibliográficas World Health Organization. Chronic Respiratory Diseases. http://www. who.int/respiratory/copd/burden/en/index.html. (Accesado 31 de Septiembre,2005) Murray CJL, Lopez AD. Evidence-based health policy lessons from the global burden of disease study. Science 1996;274:740-743. Ait-Khaled N, Enarson D, Bousquet J. Chronic respiratory diseases in developing countries: the burden and strategies for prevention and management. Bulletin of the World Health Organization 2001;79(10):971-979. Como pode ser observado na tabela 4, em todos os centros, as pessoas do sexo masculino recusaram-se mais a participar do estudo do que as pessoas do sexo feminino. Em relação à idade, as pessoas mais velhas também foram as que mais se recusaram a realizar o estudo em três países (Brasil, México e Uruguai), enquanto que no Chile e na Venezuela a recusa foi maior entre pessoas de 50 a 59 anos de idade. Em quatro dos cinco países (Brasil, México, Chile e Venezuela), os tabagistas tiveram maior Global Strategy for the diagnosis, management, and prevention of chronic pulmonary disease. Updated 2005. Chapter 2. http://www.goldcopd.dk/ index_uk.htm. (Accesado 31 de Septiembre, 2005) Celli BR, MacNee W. Standards for the diagnosis and treatment of patients with COPD: a summary of the ATS/ERS position paper. Eur Respir J 2004;23(6):932-46. Anthonisen NR, Connett JE, Kiley JP, Altose MD, Bailey WC, Buist AS, et al. Effects on smoking intervention and the use of an inhaled anticholinergic bronchodilator on the rate of decline of FEV1. The Lung Health Study. JAMA 1994;272:1497-1505. percentual de recusas do que os não tabagistas; no Uruguai, este percentual 26 27 Capítulo 1 Ferris BG. Epidemiology Standardization Project (American Thoracic Society). Am Rev Respir Dis 1978;118(6 Pt 2):1-120. European Community Respiratory Health Survey II Steering Committee. The European Community Respiratory Health Survey II. Eur Resp J 2002;20(5):1071-9. BC Cancer Research Centre. Lung Health Study Questionnaire: BC Cancer Research Centre, 2004. Ware JE, Kosinski M, Keller SD. How to score the SF12 Physical and Mental Health Summary Scales. 2nd Edition ed. Boston: The Health Institute, New England Medical Center, 1995. Beall CM, Almasy LA, Blangero J, Williams-Blangero S, Brittenham GM, Strohl KP, Decker MJ, Vargas E, Villena M, Soria R, Alarcon AM, Gonzales C. Percent of oxygen saturation of arterial hemoglobin among Bolivian Aymara at 3,900-4,000 m. Am J Phys Anthropol 1999; 108:41-51. 28 Espirometria no Estudo PLATINO Capítulo 2 Espirometria no Estudo PLATINO Rogelio Perez Padilla 1. Introdução O Estudo PLATINO utilizou a espirometria como o método diagnóstico principal para a DPOC. Um estudo multicêntrico oferece grandes desafios em termos de controle e garantia da qualidade. A espirometria depende de um desempenho apropriado do aparelho, da qualificação do técnico e, além disso, diferentemente de outros métodos de laboratório, depende também de uma adequada interação entre o técnico e o sujeito. Esta interação está menos sujeita ao controle de qualidade do que outros fatores. À variação nos aparelhos, no desempenho dos técnicos e na interação com o técnico, denomina-se ruído do estudo e pode ser da mesma magnitude de algumas variações fisiológicas decorrentes das exposições. Por este motivo, reduzir o ruído no estudo é essencial. Para estudos multicêntricos utiliza-se freqüentemente um sofisticado sistema de comunicação. Os resultados espirométricos podem ser colocados em um website, entretanto, isto pode ser pouco confiável em países em desenvolvimento. Já o correio convencional é muito demorado e os serviços de correios privados podem ter custos elevados. 29 Capítulo 2 Espirometria no Estudo PLATINO A Sociedade Americana do Tórax emitiu recomendações importantes para o programa de controle de qualidade que incluem aparelhos e procedimentos (Miller, 2005), interpretação dos resultados (American Thoracic Society, 1991) e estratégias de controle de qualidade (American Thoracic Society, 2004). Entretanto, esses documentos não oferecem recomendações específicas para estudos multicêntricos. Em vários estudos de grande escala, foi utilizado um rigoroso controle de qualidade, tanto em estudos na população geral (Hankinson, 1999) quanto em estudos incluindo somente pacientes com DPOC (Enright, 1991). Estes estudos, entretanto, utilizaram espirômetros pouco práticos para serem utilizados na casa dos entrevistados. Neste capítulo descreveremos a qualidade das espirometrias no Estudo PLATINO. 2. Controle de qualidade das espirometrias 2.1 Espirômetros A primeira etapa no controle da qualidade é o uso de um único tipo de espirômetro em todos os locais onde vai ser realizado o estudo. Isto reduz de forma considerável a variabilidade, especialmente se os aparelhos têm desempenhos seguros e reprodutíveis. Para o Estudo PLATINO selecionamos um espirômetro portátil, à bateria, baseado no sistema de ultra-som para medida do tempo de trânsito (Easy-One, da companhia NDD, Suíça), com capacidade de armazenagem na memória do aparelho de até 400 testes, incluindo as três melhores manobras e gráficos. Todos os aparelhos usados no estudo foram programados com as mesmas opções, sendo apenas ajustados para a altitude média de cada cidade; foram utilizados os valores de referência provenientes do estudo NHANES III (Hankinson, 1999). Pontos-chave: ▪ CONTROLE DE QUALIDADE DAS ESPIROMETRIAS Baseou-se principalmente na padronização dos procedimentos seguindo recomendações internacionais. ▪ PASSOS PARA A PADRONIZAÇÃO a) Seleção adequada do aparelho, o qual foi o mesmo para todos os centros. b) Verificação independente e permanente da calibração. c) Realização de maneira uniforme de todos os procedimentos com o sujeito, assim como, seleção de provas, interpretação, valores de referência, sendo tudo descrito em um manual de procedimentos. d) Treinamento uniforme de todos os técnicos pela mesma equipe. Quando possível, foram mantidos os mesmos técnicos em todos os locais. e) Revisão centralizada da qualidade das espirometrias. 30 31 Capítulo 2 Espirometria no Estudo PLATINO 2.2 Verificação da calibração 2.3 Treinamento dos técnicos Diferentemente de outros aparelhos, o utilizado no Estudo PLATINO Todos os técnicos participantes tiveram um curso formal de treinamento não permitia ser calibrado. Entretanto, conforme o protocolo da pesquisa, a de dois dias ministrado pela mesma equipe. A certificação baseou-se no curso calibração era checada todos os dias com uma seringa de três litros (Hans de espirometria do Instituto de Saúde e Seguridade Ocupacional dos Estados Rudolph Inc. USA) antes de seu uso no campo. Disponibilizou-se uma seringa Unidos (NIOSH). Durante o curso, cada técnico completou, ao menos, dez para cada cidade incluindo um adaptador especial ao espirômetro. O objetivo testes em sujeitos saudáveis. Depois da certificação, os técnicos continuaram inicial foi ter um erro máximo de ±90 ml (±3%), o que é o recomendado pela realizando testes em pacientes e sujeitos saudáveis em uma clínica pulmonar, ATS e, posteriormente, um erro máximo de ±50 ml. Todos os testes, assim assim como foi feito durante a fase piloto do estudo. como os dados das verificações das calibrações, eram repassados diariamente para um computador. 2.4 Procedimentos espirométricos O volume da calibração é mostrado no eixo vertical e o dia do estudo Os sujeitos realizaram até 15 manobras expiratórias forçadas (as no eixo horizontal. Quase todas as calibrações estiveram dentro de 90 ml máximas aceitas pela equipe em uma sessão) com o objetivo de obter um (3%), como sugere a ATS (linhas horizontais) e a maioria dentro de 50 ml grau de qualidade A, ou seja, três provas aceitáveis com os dois melhores em todo o estudo. Na primeira cidade estudada, São Paulo, as calibrações valores de VEF1 e CVF sem ultrapassar a diferença de 150 ml , sendo estes melhoraram depois de trocar a seringa e sua conexão ao espirômetro. critérios mais rigorosos do que os propostos pela ATS, 1994 (American Thoracic Society, 1995) vigentes no momento dos estudos, e equivalentes ao 3.2 consenso da ATS - ERS, 2005 (Miller, 2005). A seguir, era administrado um BD +3% (salbutamol 200 μg) por via inalatória, utilizando-se um espaçador de 500 ml; após 15 minutos era repetida a prova. Todas as provas espirométricas foram Registrou-se unicamente a fase expiratória. Os critérios de exclusão para a espirometria estão descritos no capítulo 1. -3% 2.5 Níveis de controle da qualidade 2.8 Calibração 3 realizadas com o sujeito sentado, com pinças nasais e com bocal descartável. Foram planejados três níveis de controle da qualidade para obter a máxima comparabilidade entre os centros e ao longo do tempo. 2.6 Primeiro usou-se o mesmo aparelho, o qual inclui procedimentos e 0 50 Dias do início 100 Figura 1. Calibrações nas cinco cidades. 32 150 mensagens de controle de qualidade padronizados. Nosso padrão foi o critério de qualidade fornecido pelo espirômetro. Um nível simultâneo ao do aparelho foi o do técnico, em que cada manobra espirométrica era avaliada com o objetivo de obter grau A. Um segundo nível de controle foi aquele realizado 33 Capítulo 2 pelos supervisores locais das espirometrias, que revisaram todas as provas Espirometria no Estudo PLATINO 2.8 Limpeza final da base de dados identificando aquelas com problemas, independente do grau de qualidade Ao final do estudo em cada cidade, a lista de espirometrias era consignado pelo espirômetro, com a finalidade de repeti-las. Um terceiro conferida pela equipe do país e pelo centro de coordenação das espirometrias nível foi o centro de controle localizado na Cidade do México, que recebeu no México. Nesta fase, corrigiam-se todas as inconsistências de nomes, semanalmente por correio eletrônico, todas as provas realizadas. O centro códigos de identificação e dados antropométricos. Normalmente, chegava-se emitiu informes para cada cidade e técnico. à versão final da base espirométrica em duas ou três revisões. Esta base era ligada à base de dados do questionário em Pelotas, Brasil, e enviada de volta 2.6 Relatórios de qualidade para o centro e para os técnicos a cada centro. Poucas horas após o recebimento das bases de dados, era emitido um relatório de qualidade. O relatório avaliava vários critérios de reprodutibilidade intrateste, os resultados da verificação da calibração, o desempenho de cada técnico e a pontuação global do centro durante o estudo, em comparação com 2.9 Informe dos resultados Os participantes receberam um informe impresso em papel dos resultados espirométricos e sua interpretação. os outros locais. Cada técnico recebia um grau de qualidade baseado no número de testes espirométricos que satisfizessem os critérios ATS e a qualidade média dos testes realizados. Às provas de grau A outorgaram-se cinco pontos, às provas grau B (equivalentes ao critério ATS-1994, três manobras aceitáveis com os dois melhores VEF1 e CVF dentro de 200 ml) quatro pontos, às provas grau C (duas ou três manobras aceitáveis e reproduzíveis dentro de >200 e <=250 ml) três pontos, às provas grau D (duas ou três manobras aceitáveis sem reprodutibilidade) dois pontos, às provas grau E (uma manobra aceitável) um ponto e às provas grau F (sem manobras aceitáveis) zero ponto. Os resultados eram enviados para cada centro e os técnicos informados pessoalmente. Aqueles técnicos que tiveram um desempenho pior do que os restantes eram estimulados, tendo supervisão especial. Todas as dúvidas eram discutidas por correio eletrônico com o centro de qualidade no México. 2.7 Observações do supervisor das espirometrias Um informe adicional era enviado por correio eletrônico ao centro de controle no México, junto com a base de dados, contendo uma lista de observações relacionadas às espirometrias. Nas observações era possível solicitar que os testes fossem repetidos ou eliminados. 34 35 Capítulo 2 3. Resultados A maioria dos participantes do Projeto PLATINO (89%) não havia realizado previamente espirometrias. Devido à má qualidade, 5,2% dos testes espirométricos foram repetidos: 6,5% em São Paulo, 1,6% na Cidade do México, 5,3% em Caracas, 7,6% em Santiago e 4,7% em Montevidéu. Somente 38 verificações de calibração, de um total de 3428 (1,5%), resultaram em valores fora dos limites de ± 90 ml (±3%) recomendados pela ATS, e 92,3% estiveram dentro dos limites de ± 50ml. A maioria das calibrações fora da faixa aceita (39/43) ocorreu na primeira cidade estudada, Espirometria no Estudo PLATINO A máxima qualidade foi alcançada em Montevidéu, onde todos os técnicos tinham prévia experiência em espirometria. No total, 89% dos testes realizados nas cinco cidades obtiveram grau A e 94% satisfizeram os critérios de qualidade ATS-1994. A figura 2 mostra no eixo horizontal as espirometrias seqüenciais em grupos de 200, enquanto que o eixo vertical representa a proporção de testes que cumpriram os critérios ATS-1994 nas cinco cidades. A qualidade espirométrica se manteve ao longo do estudo, com pequenas variações entre as cidades, com poucos testes excluídos. e desapareceu depois da troca de seringa e conexão (ver figura 1). Excluindo São Paulo a primeira cidade estudada, 98% das calibrações estiveram dentro dos limites de 50 ml do padrão de 3 litros. México Montevidéu Santiago Caracas 1 O volume de calibração se manteve inclusive com variações no fluxo máximo do sinal da seringa, o que indica linearidade no aparelho. observamos dois períodos com um viés negativo pequeno no volume de calibração em Santiago e Montevidéu; o último de forma transitória. Durante esses períodos não houve mudanças, conservou se o operador; utilizaram-se las mesmas seringas e o tempo de vazão das seringas foi mantido, apenas um espirômetro teve uma falha na base de dados e foi trocado. 3.1 Qualidade das espirometrias 0.80 Testes com qualidade ATS Mesmo as calibrações tendo permanecido dentro do esperado, 0.60 0.40 0.20 Das 5315 espirometrias feitas antes do uso do BD, somente 38 (0,71%) não apresentaram manobras aceitáveis, e das 5183 espirometrias pós BD, somente 19 (0,37%) não alcançaram manobras aceitáveis. Outros critérios de qualidade podem ser observados na tabela 1. A figura 2 mostra que as espirometrias realizadas mantiveram-se de boa qualidade durante toda a duração do estudo nas cinco cidades, avaliadas pelas frações que cumpriram 0 0-200 200-400 400-600 600-800 800-1000 1000-1200 1200- Espirometrias Seqüenciais Figura 2. Qualidade das espirometrias nas cinco cidades. os critérios ATS-1994. A qualidade espirométrica foi ligeiramente melhor nas últimas cidades estudadas, onde um só supervisor cuidou dos testes. 36 37 Capítulo 2 Tabela 1. Percentagem de testes com diferentes graus de qualidade em cada cidade Espirometria no Estudo PLATINO 3.3 Testes excluídos e seus determinantes Um total de 38 testes foram excluídos (testes sem manobras aceitáveis). Os testes excluídos associaram-se com sujeitos maiores de 70 anos, estágios mais severos no GOLD, sexo feminino, ausência de escolaridade, ajustando por cidade e ordem da espirometria. A repetibilidade intrateste (dVEF1% e dCVF%) antes da administração do BD associou-se a variáveis similares, mas também aumentou com pontuações maiores do questionário SF-12 (domínio físico) em homens; em fumantes atuais ou ex-fumantes; e em sujeitos com PFE maior. Novamente, os modelos puderam explicar somente entre 7 e 8% da variabilidade. Em São Paulo, foram realizados 983 testes pré BD e 918 pós BD. Na Cidade do México, os respectivos números foram 1000 e 964. Em Montevidéu, 3.4 Técnicos em espirometria os números foram 885 e 884. Em Santiago, foram realizados 1173 testes pré Participaram do estudo um total de 64 técnicos, dos quais 47 não BD e 1140 pós BD e, em Caracas, 1294 e 1277, respectivamente. No total, tinham experiência prévia com espirometrias. Cada técnico realizou em média foram realizados 5315 testes pré BD e 5183 pós BD. 90 testes, com uma média de seis manobras antes e 5,6 após o uso de BD. A qualidade obtida pelos participantes do estudo é mostrada na tabela 1. Não 3.2 Qualidade espirométrica em diferentes locais A qualidade espirométrica foi um pouco menor na Cidade do México, foi observada correlação significativa entre o número e a qualidade dos testes realizados pelos técnicos. São Paulo e Santiago em comparação com Montevidéu e Caracas. A qualidade A dispersão do desempenho dos técnicos foi similar em todos os diminuiu com a idade, com baixa pontuação na seção da saúde mental do centros, visto que, somente 5% deles estiveram abaixo de -0,23 desvio- questionário SF-12, com estágios de GOLD mais severos. Por outro lado, a padrão da média. qualidade foi melhor naqueles que relataram uma saúde geral boa e entre fumantes atuais ou ex-fumantes. Somente de 5 a 7% da variabilidade das pontuações de qualidade pôde ser explicada por modelos que incluíssem esses fatores de risco. Quando o “pico de fluxo expiratório” (PFE) era incorporado aos modelos, a variabilidade explicada aumentava em 2% e o impacto da idade diminuía. O PFE é um indicador confiável do esforço realizado na espirometria, mas é um resultado da própria espirometria e não de determinantes prévios a ela. 38 39 Capítulo 2 4. Discussão Espirometria no Estudo PLATINO se assumir que mantendo os mesmos técnicos e supervisores em todo o estudo, a qualidade é mais uniforme, embora isso nem sempre seja possível, A comunicação com o centro de qualidade no México por correio principalmente em estudos multicêntricos. Também seria possível dispor de eletrônico foi eficiente e acessível para todas as cidades participantes. O centro mais informações se o mesmo grupo de técnicos estudasse as amostras de de qualidade fornecia informes automáticos rápidos aos locais, incluindo uma sujeitos de todos os países do projeto; entretanto, isto não é viável quando comparação do desempenho de cada local com os outros. são estudados países com diferentes idiomas. Em nosso estudo, o impacto espirométrico da cidade, dos técnicos e dos eventos prévios à espirometria foi Comparação da qualidade espirométrica entre o Estudo PLATINO e muito pequeno. Somente foram encontradas variações nos valores de VEF1, outros estudos CVF e VEF1/CVF dos testes com grau de qualidade 0 (sem manobras aceitáveis, A qualidade espirométrica global foi boa, similar em vários indicadores somente 38 testes), mas não em testes com grau de qualidade 1 ou maior, à do estudo NHANES III quando analisavam-se sujeitos da mesma idade. ou seja, com uma ou mais manobras aceitáveis. As variações decorrentes Por exemplo, no Projeto PLATINO, ocorreram menos testes sem manobras das diferentes cidades e de técnicos diferenciados são verdadeiras, e não se aceitáveis do que no NHANES III (0,7% vs. 1,3%) e mais testes com devem a variações na qualidade dos testes. Observamos também um aumento três manobras aceitáveis (96,7% vs. 95,9%). No entanto, nem todos os limítrofe e inconstante na qualidade dos testes ao longo do estudo. critérios podem ser comparados diretamente. Por exemplo, os critérios de reprodutibilidade no estudo NHANES III basearam-se nos critérios ATS de 1987 (Standarization of Spirometry, 1987), enquanto que o Projeto PLATINO baseou-se nos critérios de 1994. 4.1 Desempenho dos técnicos Como era previsto, existiram diferenças nas qualidades dos testes realizados por técnicos diversos, sem grande impacto nos resultados dos No Estudo PLATINO se obteve uma estabilidade na qualidade ao longo exames espirométricos, uma vez que os determinantes tradicionais foram do tempo, mas persistiram diferenças pequenas entre as cidades. Devido ao levados em consideração (estatura, gênero, índice de massa corporal, idade, fato de os aparelhos terem apresentado desempenho similar em todas as exposições, etc.). cidades, as diferenças podem ser explicadas pelas variações no desempenho dos técnicos, dos indivíduos ou da interação entre ambos. 4.2 Devem ser realizadas somente oito manobras por teste? Os resultados podem corresponder ao melhor desempenho nas É importante mencionar que em 6% dos testes, o melhor valor de populações estudadas devido ao fato de que somente 38 testes espirométricos VEF1 e a melhor qualidade do teste foram obtidos depois da oitava manobra; foram excluídos. Havendo qualidade idêntica entre os centros, a interpretação esta, no entanto, não deve ser a última do teste espirométrico, especialmente dos dados é facilitada, mas isto é difícil de ser obtido. O que se pode esperar se o sujeito está aprendendo a realizá-lo. Havendo necessidade de outras é que o ruído devido a variações do desempenho dos técnicos, centros e manobras deve ser sugerida a realização das mesmas em outro encontro, tal aparelhos seja pequeno em relação às mudanças na função pulmonar devido a como foi realizado no Estudo PLATINO. gênero, idade, altitude, etnia ou outros caracteres. A informação da qualidade e do técnico deve estar sempre disponível para o momento da análise. Pode40 41 Capítulo 2 Conclusões: Um controle de qualidade centralizado, via correio eletrônico, pode ser um bom sistema para monitoração da qualidade das espirometrias realizadas em locais distantes. Sugerimos que pelo menos 90% dos técnicos atinjam a qualidade mínima estabelecida pelo protocolo do estudo; ainda sugere-se manutenção da equipe de supervisores. Pontos-chave do Estudo PLATINO: ▪ ▪ ▪ ▪ ▪ ▪ ▪ 42 Um controle de qualidade das espirometrias centralizado é indispensável em estudos multicêntricos. Convém utilizar um mesmo tipo de aparelho e manter, dentro do possível, os mesmos técnicos e supervisores. Deve-se verificar a calibração dos aparelhos. O controle de qualidade da espirometria deve ser rigoroso, podendo, inclusive, ser superior ao mínimo estabelecido pelos organismos internacionais. Em muitos casos convém fazer mais de oito manobras e várias sessões espirométricas. Espirometria no Estudo PLATINO 5. Referências bibliográficas Miller, M. R., J. Hankinson, V. Brusasco, F. Burgos, R. Casaburi, A. Coates, R. Crapo, P. Enright, C. P. van der Grinten, P. Gustafsson, R. Jensen, D. C. Johnson, N. MacIntyre, R. McKay, D. Navajas, O. F. Pedersen, R. Pellegrino, G. Viegi, and J. Wanger. 2005. Standardisation of spirometry. Eur Respir J 26(2):319-38. ATS, 1991. Lung function testing: selection of reference values and interpretative strategies. American Thoracic Society. Am Rev Respir Dis 144(5):1202-18. ATS, 2004. 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Introdução Conforme descrito no capítulo 1, um dos objetivos principais do Projeto PLATINO era descrever a prevalência da DPOC em cinco áreas metropolitanas da AL. A escassez de literatura na AL sobre a prevalência da DPOC em estudos de base populacional motivou a ALAT a buscar pesquisadores da AL capazes de realizar a pesquisa (Menezes, 2004). Neste capítulo, mostra-se a prevalência da DPOC conforme diversos critérios propostos na literatura, assim como os dados sobre prevalência de sintomas relacionados à DPOC . 45 Capítulo 3 2. Metodologia Prevalência da DPOC 3. Resultados A figura 1 mostra a prevalência da DPOC (intervalo de confiança de No Projeto PLATINO, os critérios utilizados para avaliar a prevalência da DPOC foram divididos em três grandes grupos: 95%), nos cinco centros do Estudo PLATINO de acordo com o critério da relação fixa. Nota-se que a prevalência da DPOC em Montevidéu, Uruguai foi ▪ ▪ 1. Espirometria: GOLD, 2001 ou relação fixa (VEF1/CVF < 0,70 pós BD); ATS, 1994 (VEF1/CVF < 5o percentil e VEF1 < 100% do valor previsto); ERS, 1993 (VEF1/CVF < 88% do valor previsto para homens e < 89% do valor previsto para mulheres); GOLD, ATS/ ERS, 2004: ◊ Estágio 0 - tosse e catarro sem obstrução na espirometria; ◊ Estágio I - VEF1/CVF < 70% e VEF1 ≥ 80% do previsto; ◊ Estágio II - VEF1/CVF < 70% e VEF1 50 - < 80% do previsto; ◊ Estágio III - VEF1/CVF < 70% e VEF1 30 - < 50% do previsto; ◊ Estágio IV - VEF1/CVF < 70% ou VEF1 < 30% do previsto mais insuficiência respiratória crônica. 2. Sintomatologia: Tosse com catarro por três meses ao ano nos últimos dois anos caracterizando a bronquite crônica. Dispnéia aos esforços ou em repouso caracterizando o enfisema pulmonar. Chiado no peito no último ano também foi investigado para tentar identificar pacientes com asma brônquica e, conseqüentemente, tentar fazer o diagnóstico diferencial com DPOC. 3. Diagnóstico médico prévio: Era perguntado ao entrevistado sobre o diagnóstico médico de bronquite crônica, de enfisema pulmonar e da DPOC (esses dados estão apresentados no capítulo 7). mais do que o dobro da observada na Cidade do México. 19,7 (17,2-22,1) 20 18 16 16,9 (14,7-19,1) 15,8 (13,5-18,1) 14 % DPOC (relação fixa) ▪ 12,1 (10,3-13,9) 12 10 7,8 (5,9- 9,7) 8 6 4 2 O critério espirométrico da relação fixa (RF) é bastante simples e facilmente estimável. Sua principal vantagem é não necessitar de valores 0 São Paulo México Montevidéu Santiago Caracas de referência. Todos os demais critérios espirométricos utilizados requerem valores de referência, os quais nem sempre estão disponíveis para as populações específicas de cada pesquisa. O GOLD é um critério que avalia Figura 1. Prevalência da DPOC e intervalo de confiança de 95% conforme o critério da relação fixa, nos cinco centros do Estudo PLATINO. também severidade da doença através de seus vários estágios. 46 47 Capítulo 3 Prevalência da DPOC A figura 2 apresenta a prevalência da DPOC conforme os estágios A figura 3 mostra a prevalência da DPOC nos cinco países de acordo de severidade propostos pelo GOLD. Observa-se que a grande maioria das com os critérios espirométricos ATS (1994) e ERS (1993). Observam-se as pessoas apresentou o estágio 0 do GOLD, ou seja, presença de sintomas, mas mesmas tendências de prevalência detectadas nos critérios anteriormente sem obstrução na espirometria. No estágio I do GOLD, encontrou-se 5,2% de mencionados, ou seja, sistematicamente a prevalência da DPOC é menor prevalência da DPOC na Cidade do México e 12,5% em Montevidéu, sendo na Cidade do México e atinge os valores mais altos em Montevidéu. Ainda que o estágio II mostrou prevalências de 1,9% e 6,4%, respectivamente. A observa-se que a prevalência da DPOC conforme o critério ERS foi superior prevalência da DPOC em graus mais severos como III e IV apresentou valores em todos os centros à prevalência obtida pelo critério ATS. inferiores a 1% em todos os centros. 16 Estágios GOLD 0 I II ATS III IV 14 33,6 35 12 % DPOC (ATS e ERS) 30 % DPOC (GOLD) 25,3 25 23,2 23,1 19,1 20 15 12,5 8 6 4 10 1,9 0,2 6,4 6,4 5,2 4,6 0,9 4,9 0,5 0,2 0,6 0,1 4,9 0,7 0,1 0,7 0,3 0 São Paulo México Montevidéu Santiago Caracas Figura 2. Prevalência da DPOC conforme estágios GOLD nos cinco centros do Estudo PLATINO. 48 10 11 10,1 5 ERS 2 0 São Paulo México Montevidéu Santiago Caracas Figura 3. Prevalência da DPOC conforme o critério ATS e ERS nos cinco centros do Projeto PLATINO. 49 Capítulo 3 Prevalência da DPOC A figura 4 mostra a prevalência de sintomas de tosse e catarro, chiado no peito e falta de ar. A prevalência do sintoma falta de ar foi a mais elevada nos cinco centros do Projeto PLATINO, atingindo prevalências ao redor de 55% na Cidade do México e Santiago. Tosse e catarro ▪ ▪ ▪ Chiado no peito Falta de ar 60 ▪ A prevalência da DPOC nos países estudados variou de 7,8% no México a 19,8% no Uruguai. A prevalência da DPOC variou dependendo do critério utilizado. A maioria dos pacientes está nos estágios GOLD 0, I e II de severidade. O sintoma relatado com maior freqüência foi a falta de ar. 4. Referências bibliográficas 50 % Sintomas Respiratórios Pontos-chave: Menezes AM, Macedo SC, Gigante DP, et al. Prevalence and risk factors for Chronic Obstructive Pulmonary Disease according to symptoms and spirometry. J Chron Obstr Pulm Dis 2004; 1:173-179. Global Initiative for Chronic Obstructive Lung Disease. Guent: GOLD Documents and Resources: GOLD, 2005. 40 30 American Thoracic Society. Standards for the diagnosis and care of patients with chronic obstructive pulmonary disease. 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Foram descritas múltiplas aplicações para a espirometria no âmbito da clínica e da pesquisa (ATS, 1991; Ferguson, 2000); seu uso é essencial na avaliação dos pacientes com doenças respiratórias, especialmente asma brônquica e DPOC (Celli, 2000). A correta interpretação da espirometria requer uma comparação dos resultados obtidos com um padrão (Crapo, 2004) . O melhor padrão é o máximo resultado do mesmo sujeito, acompanhado longitudinalmente, o que somente em certas ocasiões é possível de se obter. Por exemplo, em grupos de trabalhadores com vigilância anual por risco no ambiente laboral. Contudo, é muito mais freqüente ter que comparar os resultados com valores de referência previamente publicados. Têm-se descrito normas para a seleção de valores de referência, os quais, em geral, devem basear-se em grandes amostras de populações comparáveis, com aparelhos e métodos 53 Capítulo 4 Valores de referência para espirometria espirométricos aceitos internacionalmente e analisados estatisticamente de Os critérios de inclusão e exclusão utilizados são similares aos de Hankinson e forma sólida (ATS, 1991). Em países da AL foram realizados vários estudos colaboradores (Hankinson, 1999), exceto pelo fato de que foram incluídos os de valores de referência, alguns dos quais estão publicados (Jauregui, 1993; maiores de 80 anos de idade e os que realizaram menos de duas manobras Gutierrez, 1996) (Martinez, 1973; Gutierrez, 1996; Oyarzun, 1996; Galindez, aceitáveis (Hankinson, 1999). Um total de 61 sujeitos “saudáveis” no Estudo 1998; Perez-Padilla, 2001, 2003; Rodriguez, 2002; PLATINO tiveram mais de 80 anos de idade, e foram mantidos na análise, já Cruz-Merida, 2004). Lamentavelmente, os aparelhos utilizados, o número de sujeitos estudados e que no futuro será cada vez mais comum avaliar idosos. a origem dos mesmos são inconsistentes, assim como a análise dos dados. O Para gerar equações de regressão, levou-se em conta a complexa Projeto PLATINO ofereceu uma grande oportunidade de estudar uma amostra seleção da amostra, usando os comandos “svy” do pacote estatístico Stata representativa da população de cinco cidades da AL com igual metodologia, (StataCorp 2003). Cada uma das variáveis espirométricas VEF1, CVF, PFE, aparelhos e controle de qualidade. O presente capítulo tem como objetivo VEF1/CVF, VEF6, VEF1/VEF6, FEF25-75 foi incorporada a um modelo de relatar os valores de referência espirométricos gerados em pessoas sem regressão múltipla, utilizando como preditores a idade e a estatura em cm, história de doença respiratória. para homens e mulheres. Calculou-se o limite inferior da normalidade (o percentil cinco que se estima subtraindo ao valor da média 1,645 vezes o desvio padrão dos modelos de regressão). 2. Metodologia Os métodos espirométricos foram descritos no capítulo 2. A população do estudo foi comparada também com a população norteamericana publicada por Hankinson e colaboradores (Hankinson, 1999), em que são relatados valores de referência para três grupos étnicos : caucásico, afro-americano e méxico - americano. 2.1 GERAÇÃO DE VALORES DE REFERÊNCIA Para a geração de valores de referência foram escolhidos os sujeitos presumivelmente saudáveis sob o ponto de vista respiratório, usando os seguintes critérios: ausência de sintomas respiratórios (tosse, catarro, chiado no peito ou dispnéia), sem diagnóstico médico de asma, DPOC, bronquite crônica ou enfisema pulmonar, com um índice de massa corporal menor de 30 Kg/m2 que negaram ter tido previamente tuberculose, câncer de pulmão e cirurgia pulmonar com ressecção do parênquima. Excluíram-se também todos os sujeitos fumantes de cigarro, charuto ou cachimbo no momento da entrevista e aqueles fumantes prévios que haviam fumado mais de 400 cigarros na vida. Também foram excluídos 23 sujeitos que realizaram menos de duas manobras espirométricas aceitáveis e oito sujeitos maiores de 90 anos. Do total de 5315 sujeitos com espirometria, 906 (17% da amostra) cumpriram estes critérios. 54 55 Capítulo 4 3. Resultados Valores de referência para espirometria euro-americanos e méxico-americanos, não é uniforme para as diferentes idades e estaturas, falhando especialmente nos sujeitos do Estudo PLATINO Na tabela 1, descreve-se a amostra de sujeitos saudáveis utilizada de estaturas mais baixas. Os valores do Estudo PLATINO dão um menor para a geração dos valores de referência e, na tabela 2, sua distribuição por erro médio e um menor desvio padrão do erro para a população estudada idade e local de origem. (0,05±16,7%) do que quaisquer das equações norte-americanas (do estudo Da amostra de sujeitos saudáveis, 95% cumpriram os critérios de NHANES), das quais a melhor é a de méxico- americanos (0,9±17,3%). qualidade propostos pela ATS (três provas aceitáveis e reprodutibilidade dos Observaram-se algumas variações entre a função pulmonar das dois melhores VEF1 e CVF dentro de 200 ml), e 89% do total conseguiram, cidades, mas em poucas ocasiões uma cidade variou por mais dos 4% dos adicionalmente, uma reprodutibilidade dentro de 150 ml tanto para o VEF1 valores médios gerais. Tampouco foram observadas mudanças atribuíveis à como para a CVF. Os sujeitos fizeram em média 6±3 manobras espirométricas altitude na amostra selecionada. e 18% completaram a prova corretamente em apenas três manobras. Somente 47 sujeitos tiveram espirometrias com menos de três manobras aceitáveis e 23 sujeitos tiveram menos de duas. A tabela 3 mostra as equações preditoras para as mulheres e a tabela 4, para os homens. Os resultados também são apresentados sob forma de normogramas para facilitar a interpretação (figuras 1 e 2). Para calcular o valor esperado para certa idade e estatura, podem ser utilizados os normogramas ou as equações. Por exemplo, para uma mulher de 45 anos de idade e 160 cm de estatura, com base na equação da tabela 4, o VEF1 esperado (litros)= (0,02699089x160) - (0,02398873x 45) - 0,51369779 = 2,72535311 e o limite inferior da normalidade é 2,72535311 - (1,645x0,38) = 2,10025311 podendo ser arredondados para 2,73 e 2,10 litros. A comparação com os valores de referência norte-americanos, gerados no estudo NHANES III para cada uma das raças, é mostrada na tabela 5. Os sujeitos saudáveis do Estudo PLATINO estão aproximadamente 20% acima no VEF1 e CVF esperados para os afro-americanos, e aproximadamente no mesmo nível dos caucasianos e méxico-americanos. Adicionalmente, quando os valores espirométricos dos sujeitos do Estudo PLATINO são expressos como percentagens do esperado para as três raças, persiste uma associação com idade e estatura, mais importante para a última (dados não mostrados). Desta forma, o ajuste médio da tabela, que parece aceitável para os valores 56 4. Discussão O presente estudo tem a vantagem de estar baseado em uma amostra grande, representativa da população de cinco grandes cidades da AL, e terem sido usados métodos padronizados de acordo com diretrizes internacionais. Neste sentido, o estudo representa um avanço considerável para a literatura. A qualidade das provas foi excelente. No entanto, a população foi estudada a partir dos 40 anos de idade, o que oferece uma desvantagem, já que se carece de informação referente aos valores de referência para indivíduos jovens. Sabe-se que a raça influi na função pulmonar, sendo o exemplo mais contundente o da raça negra, com valores em média 12% menores dos encontrados em sujeitos de raça branca com estatura similar. As diferenças entre méxico- americanos e caucásicos nos Estados Unidos são muito menores que entre afro-americanos e caucásicos, mas suficientes para que fossem propostas equações espirométricas diferentes no estudo NHANES III (Hankinson, 1999). Poder-se-ia esperar que a função pulmonar mudasse na AL nas diferentes raças, conforme a altitude e outras possíveis influências ambientais. Por exemplo, os habitantes de São Paulo e Caracas têm uma maior proporção de sujeitos de raça negra, Santiago e Montevidéu de caucásicos, 57 Capítulo 4 Valores de referência para espirometria enquanto que a Cidade do México incorpora mais populações indígenas, um programa para agendas eletrônicas Palm para os leitores interessados além de estar situada 2200 m acima do nível do mar. No entanto, a amostra (PLATINO-ALAT, 2004). obtida não foi suficientemente grande para fazer uma análise definitiva das Uma prática freqüente é estimar o limite inferior da normalidade variações da função pulmonar de acordo com a altitude, ainda que tenham (LIN) como uma porcentagem fixa do valor médio ou do valor esperado, sido identificadas algumas diferenças que poderão ser estudadas no futuro. usando freqüentemente 80% como limite inferior para VEF1 e CVF e, Por exemplo, não está clara a razão pela qual a capacidade vital em Santiago aproximadamente, 90% para VEF1/CVF. Uma porcentagem fixa da média e Montevidéu tendeu a ser maior do que nas outras cidades, nem por que a assume que a dispersão dos dados (desvio padrão) diminui nos sujeitos VEF1/CVF tendeu a ser maior no México. O incremento do PFE com a altitude com baixos valores espirométricos, ou seja, em sujeitos de maior idade e devido a uma baixa densidade do ar está bem documentado (Thomas, 1990; menor estatura, enquanto que, na realidade, estes valores mantiveram-se Welsh, 1993). White e colaboradores encontraram um incremento da função constantes. Da mesma forma, o LIN não é constante e se expressa como uma pulmonar com a altitude (VEF1 e CVF) (White, 1994), em um sentido não porcentagem da média. No nosso estudo, com adultos de 40 anos de idade observado em nosso estudo. Burri e colaboradores (Burri, 1984) relataram ou maiores e muitos sujeitos idosos, o LIN foi consideravelmente mais baixo que em sujeitos expostos à altitude ou à hipóxia, a função da via aérea está que 80%. Os LIN, em média, foram: VEF1 (72%), CVF (72%), VEF6 (73%), reduzida em comparação com o crescimento pulmonar ou o intercâmbio de VEF1/CVF (86%), VEF1/VEF6 (89,6%), PFE (70%), e FEF25-75 (39%). Desta gás. Mais recentemente, nos residentes de altitudes elevadas, encontraram- forma são gerados erros de interpretação quando se usa o valor fixo de 80% se valores mais altos de VEF1 e CVF comparados com os residentes ao nível e, portanto, convém trocar o LIN, definido estatisticamente como o percentil do mar da mesma origem étnica (Wood, 2003; Havryk, 2002), assim como cinco, que se aproxima ao subtrair do valor esperado médio 1,645 vezes o um aumento da VEF1/CVF, causando uma melhor função da via aérea. Desta desvio padrão (ver tabelas 3 e 4 e as figuras 1 e 2). forma, é possível supor que a altitude induza um crescimento heterogêneo das vias aéreas e do tamanho pulmonar, ainda que não se possa descartar que as diferenças funcionais entre as cidades sejam decorrentes das variações étnicas ou outros fatores ambientais que não a altitude. O uso da espirometria será favorecido se os métodos forem simplificados. A utilização de um único conjunto de valores de referência pode ajudar nesse sentido. Com relação à espirometria, o principal problema na atualidade é sua escassa utilização como ferramenta médica, sendo essencial promover seu uso racional, que inclui a comparação dos resultados com valores de referência apropriados. Consideramos que, apesar das limitações descritas, os valores propostos representam um avanço que, sem dúvida, contribuirá para o melhor uso da espirometria na AL. Estão disponíveis em forma eletrônica tabelas geradas com as equações de referência, assim como 58 59 Capítulo 4 Valores de referência para espirometria Tabela 2. Distribuição de sujeitos saudáveis conforme gênero, idade e local de origem. Projeto PLATINO. Total de 906 sujeitos entre 40 e 90 anos de idade e saudáveis do ponto de vista respiratório. SP= São Paulo, Brasil; MX= Cidade do México, México; MN = Montevidéu, Uruguai; SAN= Santiago de Chile, Chile; CA= Caracas, Venezuela 60 N= 635 mulheres entre 40 e 90 anos de idade. * A equação prediz VEF1/CVF somente com a idade e o gênero, e é a utilizada nos normogramas. O total de homens foi de 271 e de mulheres 635, resultando um total de 906. FET é o tempo expiratório médio em segundos. O critério ATS de 1994 inclui 3 manobras aceitáveis e VEF1 e CVF repetível dentro de 200 ml. Tabela 3. Equações de referência em mulheres. Projeto PLATINO. Tabela 1. Descrição dos sujeitos incluídos nas equações para geração dos valores de referência (média e desvio-padrão). 61 Capítulo 4 Valores de referência para espirometria Figura 1. Normograma relacionando a função espirométrica (VEF1, CVF e VEF1/CVF) com a idade e a estatura em homens. Figura 2. Normograma relacionando a função espirométrica (VEF1, CVF e VEF1/CVF) com a idade e a estatura em mulheres. Para obter o VEF1 e CVF cruza-se com uma régua a idade e a estatura apropriadas e lê-se o valor esperado no extremo direito da figura. O VEF1/CVF é lido na escala adjacente à idade. Para o normograma do VEF1/CVF, utilizouse a equação baseada somente na idade e não a baseada na idade e estatura. Ambas estão descritas no texto. Um valor aproximado do VEF1/CVF ajustado para idade e estatura pode ser obtido dividindo o VEF1 e o CVF esperados do normograma. Para obter o VEF1 e CVF cruza-se com uma régua a idade e a estatura apropriadas e lê-se o valor esperado no extremo direito da figura. O VEF1/CVF é lido na escala adjacente à idade. Para o normograma do VEF1/CVF, utilizouse a equação baseada somente na idade e não a baseada na idade e estatura. Ambas estão descritas no texto. Um valor aproximado do VEF1/CVF ajustado para idade e estatura pode ser obtido dividindo o VEF1 e o CVF esperados do normograma. 62 63 64 * Dados provenientes do estudo NHANES III, publicados por Hankinson e colaboradores. 635 mulheres, 271 homens, total 906 sujeitos. As médias e os desvios padrão (DP) estão estimados somente com os sujeitos dentro dos intervalos de idade considerados nos valores de referência. Para NHANES III sujeitos com idade de 85 ou menos e para Knudson de 80 anos ou menos. Tabela 5. Valores espirométricos (média ± desvio padrão) da população estudada expressos como porcentagem do esperado pelas equações de Hankinson e colaboradores, para vários grupos raciais norte-americanos. N= 271 homens entre 40 e 90 anos de idade * A equação que prediz VEF1/CVF somente com a idade e o gênero é a utilizada nos normogramas Tabela 4. Equações de referência em homens. Projeto PLATINO. Capítulo 4 Valores de referência para espirometria 65 Capítulo 4 5. Referências bibliográficas Quanjer, P. H., G. J. Tammeling, et al. (1993). “Lung volumes and forced ventilatory flows. Report Working Party Standardization of Lung Function Tests, European Community for Steel and Coal. Official Statement of the European Respiratory Society.” Eur Respir J Suppl 16: 5-40. Valores de referência para espirometria Perez-Padilla, R. (2002). “Population distribution residing at different altitudes: implications for hypoxemia.” Arch Med Res 33(2): 162-6. Perez-Padilla, R., J. Regalado-Pineda, et al. (2003). “Spirometric function in children of Mexico City compared to Mexican-American children.” Pediatr Pulmonol 35(3): 177-83. ATS (1995). “Standardization of Spirometry, 1994 Update. American Thoracic Society.” Am J Respir Crit Care Med 152(3): 1107-36. Rodriguez, M. N., M. J. Rojas, et al. (2002). “Generacion de valores de referencia para la evaluacion de la espirometria. Estudio en una poblacion Colombiana.” Acta Medica Colombiana 27(6): 389-397. Miller, M. 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Além do fumo, alguns estudos apontam um maior risco para DPOC entre: homens; idosos; pessoas com menor escolaridade; com menor índice de massa corporal; pessoas expostas à poluição; ou com história de internação por problemas respiratórios na infância, entre outros fatores de risco (Trupin, 2003; Smith, 2003; Shaheen, 1995). Para atingir o objetivo de conhecer os fatores de risco para DPOC, o Estudo PLATINO coletou informações sobre as variáveis mencionadas acima. Neste capítulo, são apresentadas as prevalências da DPOC, conforme tais variáveis. 69 Capítulo 5 Pontos-chave sobre fatores de risco para DPOC: ▪ ▪ ▪ Existem poucos dados sobre fatores de risco para DPOC na AL, principalmente com base em exame espirométrico pós BD. O tabagismo é o principal fator de risco para DPOC. Estudos na literatura indicam que pessoas do sexo masculino, de idade mais avançada, com menor escolaridade, com menor índice de massa corporal, expostas à poluição ou com história de internação por problemas respiratórios na infância têm maior risco para DPOC. 2. Metodologia Como anteriormente mencionado (capítulo 1), DPOC foi definida no Estudo PLATINO pela relação VEF1/CVF < 0,7 pós BD. As variáveis utilizadas como potenciais fatores de risco para DPOC no Estudo PLATINO foram coletadas da seguinte forma: Fatores de risco para DPOC ▪ ▪ ▪ Exposição à lenha: história de exposição à lenha na cozinha ou aquecimento da casa. Na análise, utilizou-se um ponto de corte de 10 anos ou mais. Internação por problemas respiratórios na infância: história de internação por problemas de pulmão na infância. Índice de massa corporal: peso e altura mensurados, sendo o índice de massa corporal calculado como o peso (kg) dividido pela altura (m2). Os sujeitos foram categorizados nos seguintes grupos: <18,5, 18,5-24,9, 25-29,9 e 30 kg/m2 ou mais. 3. Resultados A figura 1 mostra a prevalência da DPOC nos cinco países entre homens e mulheres. Em todos os locais, a prevalência da DPOC foi maior nos homens. Dentre todos os centros, em Montevidéu foi observado o maior percentual da DPOC entre os homens, enquanto entre as mulheres a prevalência foi muito parecida em São Paulo e Montevidéu. A menor prevalência da DPOC foi encontrada no México, tanto em homens quanto em mulheres, (Xu, 1994). ▪ ▪ ▪ ▪ 70 Sexo: masculino ou feminino. Cor da pele: auto-referida; para análise utilizaram-se as seguintes categorias: branco, preto, amarelo, indígena ou pardo. Escolaridade: última série completada na escola. Na análise, utilizaram-se os seguintes grupos: 0-2, 3-4, 5-8 e 9 anos ou mais de escolaridade. Exposição à poeira no trabalho: tempo de trabalho em locais com exposição à poeira. Na análise, utilizaram-se os seguintes grupos: nunca, 0-9, 10 anos ou mais. Exposição ao carvão: história de exposição ao carvão na cozinha ou aquecimento da casa. Na análise, utilizou-se um ponto de corte de 10 anos ou mais. Homens 30 Idade: idade em anos completos calculada pela data de nascimento e data da entrevista. Para análise, foram criadas três categorias de idade (40-49, 50-59 e 60 anos ou mais). 20 15 Mulheres 27,2 25 % DPOC ▪ ▪ 23,4 18,0 15,7 14,5 14,0 12,8 11,0 10,2 10 5,6 5 0 São Paulo México Montevidéu Santiago Caracas Figura 1. Prevalência da DPOC nos cinco países entre homens e mulheres. 71 Capítulo 5 Fatores de risco para DPOC A figura 2 apresenta o percentual da DPOC nos cinco centros conforme Tabela 1. Prevalência da DPOC conforme a cor da pele. as categorias de idade. Em todos os países houve um aumento no percentual da DPOC conforme aumenta a idade. A maior prevalência encontrada foi entre as pessoas com 60 anos ou mais residentes em Montevidéu, enquanto o menor valor foi observado nas pessoas de 40 a 49 anos da Cidade do México. 40-49 anos 35 50-59 anos 32,1 60 anos ou + 30,3 30 25,7 % DPOC 25 A prevalência da DPOC tendeu a diminuir com o aumento da escolaridade em 18,4 20 todos os países, exceto no México. A maior prevalência foi observada entre as 16,2 12,7 15 10 13,0 pessoas com 0-2 anos de escolaridade residentes em Santiago, enquanto o 9,8 8,4 7,1 4,6 5 0 A figura 3 apresenta a associação entre DPOC e escolaridade. 23,4 5,4 5,1 menor valor foi encontrado nos indivíduos com escolaridade entre 5-8 anos e 9 anos ou mais residentes no México (Prescott, 1999). 2,2 São Paulo México Montevidéu Santiago Caracas 0-2 anos 3-4 anos 5-8 anos 9 anos ou + 35 Figura 2. Percentual da DPOC conforme as categorias de idade. Não foram observadas tendências claras na associação entre DPOC e cor da pele. Em São Paulo e no México, o grupo com menor prevalência foi o dos pardos. Em Montevidéu, as pessoas com pele preta foram as que tiveram a menor prevalência da DPOC. Em Santiago e Caracas, as pessoas com pele 25 % DPOC A tabela 1 mostra a prevalência da DPOC conforme a cor da pele. 30 20 15 10 amarela apresentaram o menor risco. A maior prevalência foi observada entre 5 as pessoas com pele amarela em São Paulo e Montevidéu. No México, o 0 maior percentual foi observado entre os negros. Em Santiago e Caracas, os indígenas apresentaram o maior valor. 72 São Paulo México Montevidéu Santiago Caracas Figura 3. Associação entre DPOC e escolaridade. 73 Capítulo 5 Fatores de risco para DPOC A figura 4 mostra a associação entre exposição à poeira no local de Não trabalho e DPOC. Em todas as cidades, os únicos indivíduos com percentual 30 maior da DPOC foram aqueles expostos à poeira no local de trabalho por 10 anos ou mais. O menor percentual da DPOC foi encontrado entre as pessoas ou mais com poeira residentes em Montevidéu (Isoaho, 1994). % DPOC o maior valor foi observado entre os indivíduos que trabalharam por 10 anos 24,2 25 residentes no México que trabalharam menos de 10 anos com poeira, enquanto 19,1 20 17,1 15,2 Nunca 0-9 anos 12,4 7,9 8,2 7,6 5 22,9 20,8 0 20,7 20 % DPOC 10 anos ou + 16,5 15 10 25 Sim 28,9 17,5 17,9 16,9 México Montevidéu Santiago Caracas Figura 5. Associação entre DPOC e exposição ao carvão. 13,7 15 São Paulo 13,0 12 12,3 10 9,9 10 13,8 7,2 6,9 A figura 6 mostra a associação entre DPOC e exposição à lenha. Não foi observada uma associação clara entre exposição à lenha e DPOC. 5 0 Não São Paulo México Montevidéu Santiago 25 Caracas dois dos cinco países (Brasil e Uruguai), as pessoas com história de exposição ao carvão por 10 anos ou mais apresentaram prevalência maior da DPOC em 18,4 15,4 % DPOC A figura 5 mostra a associação entre DPOC e exposição ao carvão. Em 22,2 20 Figura 4. Associação entre exposição à poeira no local de trabalho e DPOC. Sim 16,9 16,4 16,9 14,6 15 11,5 10 7,7 8,2 5 comparação àquelas sem essa exposição. Nos outros locais, essa associação não foi observada. 0 São Paulo México Montevidéu Santiago Caracas Figura 6. Associação entre DPOC e exposição à lenha. 74 75 Capítulo 5 Fatores de risco para DPOC A figura 7 apresenta os dados para a variável internação por problemas Tabela 2. Associação entre DPOC e índice de massa corporal. de pulmão na infância. Em três das cidades (Mexico, Santiago e Caracas), as pessoas com histórico de internação por problemas respiratórios na infância apresentaram maior risco para DPOC. Nos outros dois locais, essa tendência não foi observada (Shaheen, 1994). 18 16 % DPOC 14 Não 19,7 20 Sim 18,9 16,8 15,9 16,0 15,8 13,8 12,5 12,1 12 10 ▪ ▪ 6 4 2 0 ▪ ▪ 7,8 8 Pontos-chave: São Paulo México Montevidéu Santiago Caracas Figura 7. Prevalência da DPOC conforme internação por problemas de pulmão na infância. A tabela 2 mostra a associação entre DPOC e índice de massa corporal (IMC). Em todos os países, houve uma associação inversa entre DPOC e IMC, ou seja, quanto maior o IMC menor a prevalência da DPOC. Os maiores valores foram observados nas pessoas com IMC abaixo de 18,5 kg/m2 residentes em ▪ ▪ ▪ ▪ São Paulo e Santiago, enquanto o menor valor foi observado nas pessoas com IMC igual ou maior a 30 kg/m2 residentes no México. 76 ▪ A prevalência da DPOC foi maior nos homens do que nas mulheres. A prevalência da DPOC associou-se diretamente com a idade, ou seja, o percentual da DPOC tende a aumentar com o aumento da idade. Não foi observada uma associação clara entre DPOC e cor da pele. A prevalência da DPOC associou-se inversamente com a escolaridade, ou seja, o percentual da DPOC tende a diminuir com o aumento da escolaridade. Pessoas com exposição à poeira no local de trabalho por 10 anos ou mais tiveram maior risco para DPOC. Não foi observada uma associação clara entre exposição ao carvão e DPOC, apesar de parecer que pessoas expostas por mais de 10 anos ao carvão têm um risco ligeiramente maior de desenvolverem a doença. Não foi observada uma relação clara entre DPOC e exposição à lenha. Pessoas com história de internação por problemas respiratórios na infância apresentaram um risco elevado para DPOC em três das cinco cidades do Estudo PLATINO. O índice de massa corporal associou-se inversamente com DPOC, ou seja, o percentual da DPOC tende a diminuir com o aumento do IMC. 77 Capítulo 5 4. Referências bibliográficas Doll R, Peto R, Boreham J, Sutherland I. Mortality in relation to smoking: 50 years’ observations on male British doctors. BMJ 2004;328:1519. Trupin L, Earnest G, San Pedro M, Balmes JR, Eisner MD, Yelin E, et al. The occupational burden of chronic obstructive pulmonary disease. Eur Respir J 2003;22:462-9. Smith KR, Mehta S. The burden of disease from indoor air pollution in developing countries: comparison of estimates. Int J Hyg Environ Health 2003;2006:279-89. Shaheen SO, Barker DJ, Holgate ST. Do lower respiratory tract infections in early childhood cause chronic obstructive disease? Am J Respir Crit Care Med 1995;151:1649-51. Xu X, Weiss ST, Bijcken B, Schouten JP. Smoking, changes in smoking habits, and rate of decline in FEV1: new insight into gender differences. Eur Respir J 1994;7:1056-61. Prescott E, Lange P, Vestbo J and the Copenhagen City Heart Study Group. Socioeconomic status, lung function and admission to hospital for COPD: results from the Copenhagen City Heart Study. Eur Respir J 1999;13:1109-14. Isoaho R, Puoluoki H, Huhti E, Kivela SL, Laippala P, Tala E. Prevalence of chronic obstructive pulmonary disease in elderly Finns. Resp Med 1994;88:571-80. Shaheen SO, Barker DJP, Shiell AW, Crocker FJ, Wield GA, Holgate ST. The relationship between pneumonia en early childhood and impaired lung function en late adult life. Am J Respir Crit Care Med 1994;149(3 Part 1):616-9. 78 Tabagismo Capítulo 6 Tabagismo Ana MB Menezes Pedro C Hallal 1. Introdução O tabagismo é um importante problema de saúde pública. Apesar de 40 anos passados desde o primeiro documento governamental sobre os prejuízos do fumo à saúde, o mesmo persiste como uma das principais causas de mortes evitáveis no mundo. De acordo com dados da Organização Mundial da Saúde, cinco milhões de pessoas morrem por ano em conseqüência das doenças provocadas pelo tabaco, o que corresponde a aproximadamente seis mortes por segundo. Cerca de 80% dessas mortes são no sexo masculino (Organização Mundial da Saúde, 2005). O tabagismo é o principal fator de risco para a DPOC. Segundo o Banco Mundial, enquanto a prevalência de fumo vem apresentando um decréscimo nos países desenvolvidos, o mesmo não está ocorrendo nos países em desenvolvimento, onde observa-se aumento da prevalência de fumantes (World Bank Publication, 1999). O sexo masculino representa o grupo no qual a redução do tabagismo está bem evidente; mulheres e adolescentes, por outro lado, vêm mostrando maior consumo de cigarros com o passar dos anos. 79 Capítulo 6 O efeito do fumo para a DPOC é de dose-resposta, ou seja, quanto maior a quantidade de cigarros fumados na vida, maiores serão as chances de Tabagismo 2. Metodologia As variáveis utilizadas para as análises de tabagismo estão descritas adquirir a doença. Outro dado de literatura bem reconhecido é a maior queda de função pulmonar em pacientes com DPOC que continuam fumando em abaixo. comparação àqueles que param de fumar, o que está fortemente associado à maior mortalidade (Fletcher, 1977). Sendo assim, um estudo multicêntrico sobre a prevalência da DPOC como o Projeto PLATINO, deveria avaliar em detalhe a epidemiologia do tabagismo na região. Neste capítulo, são apresentadas a metodologia empregada para avaliação do consumo de cigarro e os resultados do estudo. CIGARROS: ▪ ▪ ▪ Pontos-chave sobre tabagismo e DPOC: ▪ ▪ ▪ ▪ ▪ Cinco milhões de pessoas morrem por ano por doenças relacionadas ao tabaco. ▪ A prevalência de fumo vem aumentando em países em desenvolvimento, principalmente entre mulheres e adolescentes. ▪ Fumo é o principal fator de risco para DPOC. ▪ A interrupção do vício do fumo melhora o prognóstico de pacientes com DPOC. ▪ Fumo atual: qualquer quantidade de cigarros fumados nos últimos 30 dias. Número de cigarros fumados atualmente: número de cigarros fumados atualmente por dia. Número de cigarros fumados na vida: número de cigarros fumados, em média, por dia, em todo tempo de fumo na vida. Tipo de cigarro mais fumado atualmente: cigarro industrializado ou cigarro feito à mão. Tipo de cigarro mais fumado na vida: cigarro com filtro, sem filtro, de palha ou outro tipo. Idade de início de fumo regular: idade a partir da qual o indivíduo iniciou a fumar no mínimo um cigarro a cada 30 dias. Ex-fumante: fumo de cigarros alguma vez na vida (menos de um cigarro por dia em um ano foi considerado não fumante). As mesmas perguntas anteriores em relação à idade, quantidade e tipo de cigarro foram feitas para os ex-fumantes. Idade que parou de fumar: qualquer quantidade de cigarro. idade em que parou de fumar CACHIMBO OU CHARUTO: ▪ ▪ 80 Fumo de cachimbo ou charuto atual: 50 ou mais enchidas de cachimbo/charutos fumados nos últimos 30 dias. Fumo de cachimbo ou charuto na vida: fumo de cachimbo ou charuto alguma vez na vida. 81 Capítulo 6 Tabagismo 3. Resultados Homens PREVALÊNCIA DE TABAGISMO NO PROJETO PLATINO A figura 1 mostra que a maior prevalência de tabagismo foi observada em Santiago, Chile (39%), enquanto a menor foi em São Paulo, Brasil (24%). Cabe ressaltar que, quanto à prevalência de não-fumantes, a Cidade do México mostrou o maior percentual (56%), sendo o menor valor observado em Santiago (33%). O percentual de pessoas que nunca fumaram foi totalmente igual (43%) em três cidades (São Paulo, Montevidéu e Caracas). % Fumo Atual 60 50 40 30 20 Mulheres 43 38 33 30 36 34 26 25 19 17 10 0 São Paulo México Montevidéu Santiago Caracas Figura 2. Prevalência de fumo atual conforme sexo. Em relação à idade, a prevalência de tabagismo foi inversamente Não fumante Ex-fumante Fumante atual 100 29 39 28 26 24 tabagismo atual. Este resultado foi similar para todos os centros do estudo 70 anos ou mais residentes em Montevidéu. Montevidéu 43 28 México 33 43 São Paulo 56 0 30 29 19 33 40 20 (figura 3). O maior percentual foi observado nos indivíduos de 40-49 anos residentes em Santiago, enquanto o menor valor foi observado naqueles de 43 % Fumo 80 60 proporcional, ou seja, quanto maior a idade menor foi a prevalência de Santiago Caracas Figura 1. Prevalência de tabagismo nos cinco centros do Projeto PLATINO. A figura 2 mostra que a prevalência de tabagismo no sexo masculino foi mais alta do que no sexo feminino, em todos os centros do Projeto PLATINO. O maior percentual de fumo (43%) foi observado em homens de Santiago e o menor foi de 17% nas mulheres mexicanas. Figura 3. Prevalência de fumo atual conforme idade. 82 83 Capítulo 6 Tabagismo Quanto à escolaridade, os dados da figura 4 indicam que em todos tabagismo. Em relação à escolaridade, a figura 4 sugere que quanto maior os países, exceto a Venezuela, as pessoas com maior escolaridade tenderam a escolaridade, maior o percentual de fumo. No entanto, sabe-se que o a apresentar maior prevalência de tabagismo. O maior valor foi observado percentual de fumo tende a diminuir com a idade, e também que pessoas naqueles com nove anos ou mais de estudo residentes em Santiago, enquanto mais velhas apresentam menor escolaridade média do que as gerações mais o menor percentual foi obtido entre aqueles com baixa escolaridade residentes jovens. Assim, após emprego de uma técnica estatística que “elimina” o efeito na Cidade do México. da idade, notou-se que a escolaridade avançada não é um fator de risco para fumo nos países investigados. A figura 5 mostra a quantidade de cigarros fumados por dia entre os homens fumantes. Nota-se que Montevidéu e São Paulo foram os centros com maior proporção de pessoas fumando mais de uma carteira de cigarros (> 20 cigarros) por dia. Ao contrário, o maior percentual de pessoas fumando menos de dez cigarros por dia foi observado na Cidade do México. Figura 4. Prevalência de fumo atual conforme escolaridade. A avaliação de fatores de risco para uma determinada doença envolve, além dos gráficos mostrados acima, o uso de técnicas estatísticas mais avançadas. No Projeto PLATINO, tais ferramentas foram empregadas para se confirmar a associação entre tabagismo e sexo, idade e escolaridade. O maior risco de fumo entre os homens, observado na figura 2, foi confirmado após uso de regressão logística. O mesmo ocorreu para idade. Assim, podese concluir que o sexo masculino e a idade jovem são fatores de risco para 84 Figura 5. Quantidade de cigarros fumados por dia, em homens. 85 Capítulo 6 Tabagismo A figura 6 mostra esses resultados para as mulheres. Nota-se que o Nunca fumou percentual de mulheres que fumam mais de uma carteira de cigarros (>20 Ex-fumante Fumante atual 25 cigarros) por dia é bem pequeno se comparado ao observado nos homens. Os países com maior proporção de mulheres fumando menos de dez cigarros por dia foram México e Chile. % DPOC 20 15 10 5 0 São Paulo Santiago México Montevidéu Caracas Figura 7. Associação entre tabagismo e DPOC. A tabela 1 mostra a idade de início do fumo entre os fumantes atuais e ex-fumantes. Nota-se que a cidade com maior proporção de pessoas começando a fumar antes dos 13 anos foi São Paulo, tanto entre os homens Figura 6. Quantidade de cigarros fumados por dia, em mulheres. quanto entre as mulheres. O percentual de pessoas começando a fumar na idade de 18 anos ou mais foi maior no México do que nos outros países. A figura 7 apresenta a associação entre tabagismo e DPOC nos cinco centros do Projeto PLATINO. Observa-se que fumantes ou ex-fumantes apresentam as maiores prevalências de DPOC nos cinco centros. A associação entre ex-fumantes e DPOC, provavelmente, deve-se ao fato de que estas pessoas pararam de fumar por apresentar maior severidade da doença. 86 87 Capítulo 6 Tabagismo Tabela 1. Idade de início do fumo entre os fumantes atuais e exfumantes de acordo com sexo, nos cinco centros do Projeto PLATINO. 2,6% 6,5% Filtro Palha 0,9% Papel Sem filtro 90,0% Figura 8. Tipos de cigarro fumados. A figura 9 mostra a freqüência da DPOC conforme o tipo de cigarro fumado. Nota-se que os fumantes de cigarros feitos à mão apresentaram as maiores prevalências da DPOC, seguidos por aqueles que fumam cigarro industrializado sem filtro. Os pacientes que fumam cigarros com filtro tiveram risco da DPOC bem maior do que aqueles que nunca fumaram, mas menor do que aqueles que fumam outros tipos de cigarro. 40 37,5 35 32,1 28,7 % DPOC 30 25 20 15 15,5 10,6 10 A figura 8 mostra que a maioria dos fumantes faz uso de cigarros com 5 filtro. Depois destes, os cigarros sem filtro foram os mais usados, seguidos 0 pelos cigarros feitos à mão (de papel e de palha). Nunca fumou Filtro Sem filtro Papel Palha Figura 9. Prevalência da DPOC conforme o tipo de cigarro fumado mais freqüentemente. 88 89 Capítulo 6 Tabagismo O uso de charuto ou cachimbo na vida ou atualmente também foi avaliado no Projeto PLATINO. O país com maior percentual de fumo desses produtos na vida foi o Uruguai, seguido pelo Brasil e Chile. O consumo atual foi maior na Venezuela seguido do Brasil (figura 10). Atual Alguma vez/vida 10 9,7 9,5 % Fumo charuto / cachimbo ▪ ▪ ▪ ▪ ▪ 8,4 ▪ ▪ 8 5,5 6 ▪ 4,5 4 2 Pontos-chave: ▪ 1,8 A prevalência de fumo variou de 24 a 39%. A prevalência de fumo foi maior nos homens do que nas mulheres. O percentual de fumo diminuiu com o aumento da idade. O tabagismo não se associou claramente com escolaridade, após ajuste para sexo e idade. O país com maior percentual de pessoas começando a fumar antes dos 13 anos foi o Brasil (ambos os sexos). 90% dos fumantes usam cigarro industrializado com filtro. O risco da DPOC é maior nas pessoas que fumam cigarros feitos à mão. O percentual de uso de charuto ou cachimbo na vida variou de 4,5%, no México, a 9,7%, no Uruguai. Em todos os países, menos de 2% das pessoas entrevistadas faziam uso atual de charuto ou cachimbo. 1 0,5 0,4 0,3 0 São Paulo México Montevidéu Santiago Caracas Figura 10. Percentual de pessoas que usaram charuto ou cachimbo na vida ou atualmente nos cinco centros do Projeto PLATINO. 4. Referências bibliográficas http://www.who.int/health_topics/tobacco/ (Acessado 15 de Agosto, 2005). World Bank. Curbing the Epidemic: Governments and the Economics of Tobacco Control. World Bank Publication: Washington, 1999. http://www.surgeongeneral.gov/library/reports.htm (Acessado 9 de Setembro, 2005). http://www.who.int/tobacco/en/tobacco free initiative (Acessado 10 Junho, 2004). Fletcher C, Peto R. The natural history of chronic airflow obstruction. BMJ 1977;1:1645-1648. 90 91 Capítulo 6 92 Subdiagnóstico e sobrediagnóstico da DPOC Capítulo 7 Subdiagnóstico e sobrediagnóstico da DPOC Carlos Tálamo Maria Montes de Oca 1. Introdução Do ponto de vista epidemiológico, existem dois aspectos muito importantes relacionados ao diagnóstico da DPOC: a) subdiagnóstico: sujeitos que têm a doença, mas não foram diagnosticados; b) sobrediagnóstico: sujeitos sem a doença, mas que foram diagnosticados incorretamente. Os resultados do Estudo PLATINO, além de terem avaliado a prevalência de DPOC e seus fatores de risco, também serviram para averiguar se os sistemas de saúde estão capacitados para identificar os sujeitos com DPOC, o que reflete a magnitude do subdiagnóstico. Por outro lado, a presença de sintomas freqüentes da DPOC, como a dispnéia, tosse e catarro pode gerar diagnósticos médicos incorretos. Sendo assim, o conhecimento do subdiagnóstico e sobrediagnóstico pode auxiliar as autoridades de saúde, médicos e outros especialistas a reconhecer os sujeitos com DPOC, particularmente aqueles em fase precoce da doença, assim como pode orientar a conduta em relação al diagnóstico incorreto. Outro aspecto muito importante é a falta de conhecimento que a maioria dos pacientes tem sobre a doença. Em fases precoces da doença 93 Capítulo 7 desconhecem sua condição ou ficam receosos em consultar o médico pelos sintomas respiratórios. Em conseqüência, a maioria dos pacientes Subdiagnóstico e sobrediagnóstico da DPOC 2. Metodologia com doença leve não recebe aconselhamento para abandonar o fumo ou O subdiagnóstico refere-se à ausência de diagnóstico médico prévio receber tratamento farmacológico adequado. Além disso, alguns tratamentos da doença (enfisema, bronquite crônica ou DPOC) em indivíduos com indicados a pacientes com DPOC não são adequados para a severidade da obstrução espirométrica ao fluxo de ar (VEF1/CVF < 0,7); sobrediagnóstico doença ou não estão de acordo com os consensos atuais (Lundback, 2003; representa os indivíduos com diagnóstico médico prévio da doença (enfisema, Roche, 2001). bronquite crônica ou DPOC) que não apresentavam obstrução ao fluxo de ar Neste capítulo, apresentaremos a prevalência de subdiagnóstico na espirometría. As variáveis utilizadas no Projeto PLATINO para analisar subdiagnóstico e sobrediagnóstico em cinco cidades de AL e os fatores associados aos mesmos. e sobrediagnóstico foram: SINTOMAS: Pontos-chave sobre subdiagnóstico e sobrediagnóstico: ▪ ▪ ▪ Incapacidade dos sistemas de saúde para identificar adequadamente os sujeitos com DPOC. ▪ ▪ ▪ ▪ Falta de conhecimento dos pacientes sobre a DPOC e seus sintomas. Falta de estudos epidemiológicos de base populacional que incluam valores espirométricos. Tosse geralmente sem estar resfriado. Catarro que vem do pulmão ou difícil de expulsar sem estar resfriado. Chiado no peito nos últimos 12 meses. Dificuldade respiratória ou falta de ar ao caminhar mais rápido do que o normal em um trajeto plano ou em uma pequena subida. DIAGNÓSTICO MÉDICO: ▪ ▪ ▪ Bronquite Crônica - diagnóstico médico de bronquite crônica alguma vez na vida. Enfisema - diagnóstico médico de enfisema alguma vez na vida. DPOC - diagnóstico médico da DPOC alguma vez na vida. ESPIROMETRIA: ▪ ▪ 94 Algum médico ou outro profissional da saúde lhe pediu que soprasse em um aparelho (denominado espirômetro ou pico de fluxo) para conhecer a função de seus pulmões na vida? O(a) Sr(a) fez este exame nos últimos 12 meses? 95 Capítulo 7 3. Resultados Subdiagnóstico e sobrediagnóstico da DPOC Tabela 2. Prevalência de subdiagnóstico da DPOC nos cinco centros do Estudo PLATINO. O número de sujeitos com VEF1/CVF < 0,7 pós BD foi 758. Deste total, somente 86 indivíduos (11,3%) tinham diagnóstico prévio de enfisema, bronquite crônica ou DPOC. Portanto, houve um número elevado de pessoas que não foram identificadas ou diagnosticadas previamente. A descrição da população que apresentou obstrução com e sem diagnóstico prévio da DPOC é apresentada na tabela 1. Tabela 1. Diagnóstico médico prévio em sujeitos com VEF1/CVF < 0,7 pós BD, nos cinco centros do Estudo PLATINO. A tabela 3 descreve as características da população com obstrução com ou sem diagnóstico prévio de enfisema, bronquite crônica ou DPOC, nos cinco centros do Estudo PLATINO. Idade, sexo, escolaridade e consumo de tabaco foram similares entre o grupo de sujeitos obstruídos com diagnóstico prévio correto e o grupo sem diagnóstico prévio (tabela 3). Os sintomas respiratórios (tosse, catarro, chiado no peito e dispnéia) foram mais freqüentes no grupo de sujeitos com diagnóstico prévio correto de enfisema, bronquite A prevalência de subdiagnóstico da DPOC variou entre as cidades crônica ou DPOC (figura 1). Este mesmo grupo apresentou um grau maior estudadas, atingindo o valor mais alto em Montevidéu e o mais baixo na de obstrução ao fluxo de ar representado por valores significativamente mais Cidade do México (tabela 2). baixos de CVF, VEF1 e VEF1/CVF (tabela 3). Estes achados indicam que o diagnóstico da DPOC baseado em fatores de risco e sintomas conduz a um elevado subdiagnóstico da doença e confirma a importância da espirometria para a adequada identificação destes pacientes. 96 97 Capítulo 7 Subdiagnóstico e sobrediagnóstico da DPOC Tabela 3. Descrição da população obstruída (VEF1/CVF < 0,7 pós BD) com e sem diagnóstico prévio de enfisema, bronquite crônica ou DPOC nos cinco centros do Estudo PLATINO. Subdiagnóstico Diagnóstico Prévio Total DPOC 100 83,2 (%) Sintomas resporatórios 80 60 74,2 61,7 59,2 50,9 46,7 40 34,1 27,5 31,1 24,5 38,9 28,1 20 0 Tosse Catarro Chiado no peito Dificuldade respiratória Figura 1. Sintomas respiratórios em sujeitos com obstrução (VEF1/CVF < 0,7 pós BD) com e sem diagnóstico prévio correto de enfisema, bronquite crônica ou DPOC, nos cinco centros do Estudo PLATINO. A percentagem de sujeitos que haviam realizado espirometria prévia em algum momento da vida foi significativamente menor no grupo de sujeitos sem diagnóstico prévio em relação aos sujeitos com diagnóstico prévio correto (figura 2). No entanto, é importante ressaltar que somente 52% dos sujeitos com diagnóstico prévio e obstrução haviam realizado uma espirometria anteriormente. 98 99 Capítulo 7 Subdiagnóstico e sobrediagnóstico da DPOC Sim Tabela 4. Descrição da população com diagnóstico prévio correto e incorreto de enfisema, bronquite crônica ou DPOC nos cinco centros do Estudo PLATINO. Não % Espirometria 100 76.2 80 60 52.2 47.8 40 23.8 20 0 Diagnóstico Prévio Correto Sem Diagnóstico Prévio Figura 2. Espirometria em algum momento da vida em sujeitos com obstrução (VEF1/CVF < 0,7 pós-BD), nos cinco centros do Estudo PLATINO. A tabela 4 apresenta as características da população com diagnóstico médico prévio incorreto e correto de enfisema, bronquite crônica ou DPOC. Do total de sujeitos com diagnóstico prévio (237) somente 86 tinham obstrução ao fluxo de ar pós BD (diagnóstico correto), sendo que os demais (151) não tinham obstrução (sobrediagnóstico). O grupo de sujeitos com sobrediagnóstico tinham menor idade, exposição ao tabaco e grau de obstrução (VEF1 e VEF1/ CVF), assim como: menos sintomas de tosse, catarro e chiado em relação ao grupo de sujeitos com diagnóstico correto. Quanto à dificuldade respiratória, não foi observada diferença significativa entre os dois grupos (tabela 4). O percentual de sujeitos que haviam realizado espirometria prévia em algum momento da vida foi significativamente menor no grupo com diagnóstico incorreto (23,8%), em comparação aos que tinham um diagnóstico correto (52,3%). 100 101 Capítulo 7 4. Discussão Subdiagnóstico e sobrediagnóstico da DPOC A análise dos dados descritivos sobre a população com obstrução (tabela 3 e figura 1) indica que os sujeitos com mais sintomas e obstrução O Projeto PLATINO é o primeiro estudo multicêntrico sobre a mais severa têm maior probabilidade de serem diagnosticados. Quanto ao prevalência da DPOC na AL, assim como, o primeiro a ser publicado utilizando sobrediagnóstico, os resultados sugerem que a presença de dificuldade espirometria pré e pós BD para determinar a obstrução ao fluxo de ar (Menezes, respiratória está sendo utilizada como sinônimo de DPOC, explicando a 2005). Os resultados do Estudo PLATINO revelam uma alta prevalência de igual freqüência de dispnéia nos grupos com diagnóstico correto e incorreto. subdiagnóstico da DPOC, alcançando 12,7% e variando de 6,9% na Cidade do Este fato reforça a necessidade da realização de estudos espirométricos na México a 18,2% em Montevidéu. Do total de indivíduos diagnosticados com avaliação dos sujeitos com dispnéia para estabelecer um diagnóstico definitivo DPOC pela espirometría, 88,7% (672 de 758) não haviam sido diagnosticados da DPOC. previamente. É bem conhecido que o diagnóstico da DPOC deve ser considerado A prevalência de subdiagnóstico de obstrução ao fluxo de ar foi em toda pessoa que tenha tosse, catarro, dispnéia e história de exposição previamente descrita em outros países (Lundback, 2003; Mannino, 2000; a fatores de risco para a doença. Os critérios diagnósticos atuais (Pauwels, Fukuchi, 2004), e as estimativas variam entre 3,2% e 12%. Os resultados 2001; Celli, 2004) sinalizam que a espirometria é o padrão-ouro, ou seja, uma do Estudo PLATINO coincidem com os apresentados nestes trabalhos. No forma objetiva de medir a obstrução ao fluxo de ar, sendo essencial para o entanto, a magnitude do problema parece ser maior em nossa população. diagnóstico da DPOC e seguimento dos pacientes com DPOC. No entanto, As diferenças na idade, prevalência de tabagismo, metodologia e o critério existe uma ampla sub-utilização da espirometria pelos médicos. espirométrico usado para definir DPOC podem explicar parcialmente as diferenças na prevalência de subdiagnóstico da DPOC nestas populações. No presente estudo demostra-se que somente 20% dos sujeitos com DPOC haviam realizado uma espirometria na vida e isto foi significativamente Outro achado do Estudo PLATINO que merece uma consideração menor no grupo do subdiagnóstico, 15,8% vs 52,3% no grupo com diagnóstico especial é a diferença na prevalência do subdiagnóstico da DPOC encontrada prévio (figura 2). No grupo com sobrediagnóstico também se observou nos diferentes locais, com a mais alta em Montevidéu e a mais baixa na uma sub-utilização similar da espirometria (23,8%). O uso insuficiente da Cidade do México. Este achado é difícil de explicar. Como foi mencionado espirometria encontrado no presente estudo e em trabalhos prévios sugere no capítulo 1, uma das qualidades do Estudo PLATINO é a consistência da a necessidade de implementar programas educacionais específicos dirigidos metodologia utilizada em todos os países. Portanto, as diferenças entre a clínicos gerais e incrementar a disponibilidade de espirômetros na atenção cidades dificilmente podem ser atribuídas a problemas metodológicos. Uma médica primária para aumentar as possibilidades diagnósticas da DPOC. possível explicação poderia ser a diferença nos critérios diagnósticos utilizados Em conclusão, os resultados sobre o subdiagnóstico e sobrediagnóstico pelos sistemas de saúde dos diferentes países. Infelizmente, o delineamento encontrados no Estudo PLATINO mostram a gravidade destes problemas nas do estudo não permite investigar estas diferenças. O grande número de cinco cidades da AL. Os especialistas em saúde pública devem implementar sujeitos sem diagnóstico prévio da DPOC encontrado neste estudo deve ser medidas com a finalidade de melhorar a detecção precoce e o diagnóstico considerado pelas autoridades de saúde pública para implementar estratégias correto de sujeitos portadores da DPOC. com os critérios diagnósticos estabelecidos pelos organismos internacionais. 102 103 Capítulo 7 Pontos-chave sobre subdiagnóstico e sobrediagnóstico: ▪ ▪ ▪ ▪ Prevalência elevada de subdiagnóstico em DPOC. Prevalência elevada de sobrediagnóstico em DPOC. Sub-utilização da espirometria em DPOC. A presença de dispnéia pode levar a sobrediagnosticar DPOC. Subdiagnóstico e sobrediagnóstico da DPOC Menezes AM, Perez-Padilla R, Jardim JR, et al. Chronic obstructive pulmonary disease in five Latin American cities: The PLATINO study. Lancet 2005; 366: 1875-1881. Mannino DM, Gagnon RC, Petty TL et al. Obstructive lung disease and low lung function in adults in the United States: data from the National Health and Nutrition Examination Survey, 1988-1994. Arch Intern Med 2000;12;160:1683-9. Pena VS, Miravitlles M, Gabriel R, et al. Geographic variations in prevalence and underdiagnosis of COPD: results of the IBERPOC multicentre epidemiological study. Chest 2000;118:981-9 Isoaho R, Puolijoki H, Huhti E, et al. Prevalence of chronic obstructive pulmonary disease in elderly Finns. Respir Med 1994;88:571580. 5. Referências bibliográficas Lundback B, Lindberg A, Lindstrom M, et al. Obstructive Lung Disease in Northern Sweden Studies. Not 15 but 50% of smokers develop COPD? Report from the Obstructive Lung Disease in Northern Sweden Studies. Respir Med 2003;97:115-22 Renwick DS, Connolly MJ. Prevalence and treatment of chronic airways obstruction in adults over the age of 45. Thorax 1996;51:164168. Fukuchi Y, Nishimura M, Ichinose M, et al. 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Standards for the diagnosis and treatment of patients with COPD: a summary of the ATS/ERS position paper. Eur Respir J 2004;23:932-46. 104 105 Capítulo 7 106 Tratamento da DPOC Capítulo 8 Tratamento da DPOC Adriana Muiño García María Victorina Lopez Varela 1. Introdução El tratamiento de los pacientes con DPOC ha sido bien definido e O tratamento dos pacientes com DPOC tem sido bem definido nos consensos internacionais (Celli, 2004; Pauwels, 2001). Os dados do Projeto PLATINO permitem conhecer os padrões de tratamento, tanto em termos de medidas preventivas quanto em relação ao uso de medicação respiratória na etapa estável. Um diagnóstico preciso, em etapas precoces da doença, permite uma correta manipulação destes pacientes, reduzindo os fatores de risco e adequando o tratamento conforme a severidade. Neste sentido as normas GOLD resumem os objetivos gerais do tratamento nos seguintes pontos: ▪ ▪ ▪ ▪ ▪ ▪ ▪ ▪ Prevenir a evolução da doença. Controlar ou aliviar os sintomas. Aumentar a tolerância ao exercício. Melhorar o estado de saúde. Prevenir e tratar as complicações. Prevenir e tratar as exacerbações. Diminuir a mortalidade. Prevenir ou minimizar os efeitos colaterais do tratamento. 107 Capítulo 8 Tratamento da DPOC A cessação do tabagismo e a exposição a outras fumaças são as medidas mais efetivas para evitar o desenvolvimento da doença e deter sua progressão (Anthonisen, 1994). Todo fumante deve receber aconselhamento médico para deixar de fumar e tratamento farmacológico para a dependência do tabaco, já que existe suficiente evidência sobre a efetividade da substituição de nicotina e bupropiona (Fiore, 2000; Consensus Statement, 2000). Em relação à vacina anual contra o vírus influenza, a mesma pode reduzir em até 50% as complicações severas e a mortalidade neste grupo de pacientes (Nichol, 1999). O tratamento farmacológico deve estabelecer-se de forma individualizada baseado na presença de sintomas respiratórios, tendo como finalidade melhorar a tolerância ao exercício, reduzir a freqüência e severidade Pontos-chave: Manejo da doença na etapa estável Redução dos fatores de risco: ▪ ▪ Vacina antigripal. Abandono do tabagismo. Tratamento farmacológico: ▪ ▪ Alivia os sintomas, melhora a capacidade de exercício, reduz a freqüência e severidade das exacerbações e melhora o estado de saúde dos pacientes. Não detém a deterioração da função pulmonar. das exacerbações e melhorar a saúde geral. Não foi comprovado que o tratamento modifique o curso evolutivo da doença, a qual leva à deterioração Medicamentos da função pulmonar (Anthonisen, 1994; Calverly, 2001; Scanlon, 2000). Broncodilatadores: Em termos gerais, é aconselhado o uso escalonado e progressivo da medicação respiratória, conforme os estágios de severidade 0 - 4 do GOLD. A medicação disponível de primeira escolha são os broncodilatadores, uso ▪ ▪ recomendado pela via inalatória e combinado, se a situação clínica assim o requerer. A teofilina via oral é efetiva, mas devido ao seu potencial de toxicidade, seu uso limita-se aos casos em que não exista disponibilidade de broncodilatadores inalados (Pauwels, 2001). São os principias agentes farmacológicos para o controle dos sintomas e recomenda-se seu uso pela via inalatória. Devem ser indicados em forma regular ou conforme a presença de sintomas. Glucocorticóides inalados: ▪ Somente estão indicados para pacientes com DPOC severo (VEF1<50%, exacerbações freqüentes). O papel dos glucocorticóides no tratamento da DPOC é controverso, já que não modifica significativamente a inflamação da via aérea, nem seu curso evolutivo (Burge, 2000; The Lung Health Study Research Group, 2000). Portanto, sua indicação pela via inalatória está limitada aos pacientes com estágios mais avançados e exacerbações freqüentes; desaconselha-se o uso prolongado dos corticosteróides pela via oral, reservando-se esta via somente para as exacerbações severas (Spencer, 2001). A evidência atual não recomenda o uso de outras medicações como mucolíticos e xaropes, já que não foi comprovada sua eficácia (Poole, 2001). 108 109 Capítulo 8 2. Metodologia Tratamento da DPOC 3. Resultados Realizou-se diagnóstico espirométrico da DPOC em 758 indivíduos, os O questionário do Estudo PLATINO incluiu perguntas relacionadas quais foram classificados conforme grau de severidade da doença (estágios ao uso de medidas preventivas (quadro 1) e variáveis relacionadas ao GOLD). As características gerais e os sintomas respiratórios de cada grupo manejo farmacológico da DPOC (quadro 2). estão descritos na tabela 1. Medidas preventivas: os indivíduos com obstrução ao fluxo de ar e história de tabagismo foram 52, sendo que desses apenas 52,7% receberam Quadro 1. Variáveis investigadas no Projeto PLATINO sobre as medidas preventivas da DPOC. TABAGISMO Aconselhamento médico para deixar de fumar (para fumantes e exfumantes): Alguma vez na vida Nos últimos 12 meses Algum tratamento receitado por médico para parar de fumar: Tipo de medicamento (substituição nicotínica, bupropiona ou outros) Algo não receitado por médico para parar de fumar ou outros métodos como hipnose, acupuntura, laser. USO DE VACINAS (todos os participantes) Vacina antigripal nos últimos 12 meses aconselhamento para parar de fumar alguma vez na vida. A vacinação antigripal foi realizada por 27,6% dos indivíduos, sendo sua realização diretamente proporcional à severidade da doença. Este comportamento não foi observado para o tratamento farmacológico para parar de fumar (figura 1), visto que os indivíduos no estágio GOLD IV apresenta severa obstrução. Analisadas estas medidas preventivas em cada um dos centros participantes, foram encontradas diferenças na administração da vacina antigripal, variando entre 5,1% em Caracas e 52% em Santiago do Chile (figura 2). As medidas de aconselhamento médico para o abandono do tabagismo tiveram prevalência semelhante em São Paulo, Cidade do México, Santiago e Montevidéu, embora em Caracas esta prevalência tenha sido mais reduzida ( figura 2 ). Quanto ao tratamento farmacológico, e seguindo os estágios GOLD (figura 3), observa-se que seu uso é crescente com o aumento da severidade Quadro 2. Variáveis investigadas no Projeto PLATINO sobre o manejo farmacológico da DPOC. Uso de medicação respiratória (todos os participantes): Alguma medicação para os pulmões, brônquios ou respiração nos últimos 12 meses. Nome do fármaco e forma de apresentação. Freqüência de uso: a maioria dos dias; conforme sintomas, ou ambos. Freqüência mensal: quantos meses ao ano (trimestre). da doença, como é o esperado. Ainda assim, somente 73% daqueles indivíduos no estágio mais severo receberam medicação no último ano, sendo que apenas 25% destes mantiveram a medicação durante 10-12 meses por ano (figura 3). O manejo terapêutico dos pacientes com DPOC no Estudo PLATINO variou conforme os países, seja no uso de medicação no último ano (14,1% no México vs. 35,9% em Santiago), ou em sua forma de apresentação, destacando-se que o uso da via inalatória foi de 22,2% em São Paulo vs 75,7% em Montevidéu (Figura 4). 110 111 Capítulo 8 Tratamento da DPOC Tabela 1. Características gerais dos pacientes com DPOC (RF), conforme estágios GOLD e fatores associados. Aconselhamento médico alguma vez na vida para cessação do tabagismo Vacina antigripal 70 63 52 50 51 50 % DPOC Medicação para cessação do tabagismo 57 60 46 39 40 30 Aconselhamento médico atual para cessação do tabagismo 28 39 25 20 8 10 3 13 3 I 1 II III 0 IV Figura 1. Condutas preventivas conforme estágios GOLD. Aconselhamento médico alguma vez na vida para cessação do tabagismo Vacina antigripal Aconselhamento médico atual para cessação do tabagismo Medicação para cessação do tabagismo 70 60 58 55 55 52 53 % DPOC 50 40 31 10 **MRC escala de dispnéia do Medical Research Council 29 30 20 *no mínimo 3 meses ao ano 44 0 24 14 20 14 5 São Paulo 3 Santiago 5 México 5 2 Montevidéu 5 3 2 Caracas Figura 2. Condutas preventivas conforme os centros participantes. 112 113 Capítulo 8 Tratamento da DPOC Medicação no último ano Inaladores Maioria dos dias 80 10-12 meses 63 61 63 % DPOC 60 50 50 28 15 15 10 38 35 35 34 30 20 ▪ 44 40 12 II III Medicação no último ano Inaladores Maioria dos dias 10-12 meses 76 80 % DPOC 59 58 60 10 0 38 36 18 24 30 20 14 7 São Paulo 30 23 Santiago 21 30 26 21 10 México Montevidéu Caracas Figura 4. Tratamento farmacológico conforme os centros participantes. 114 Pauwels R BA, Calverley P, Jenkins CSH. Global strategy for the diagnosis, management and prevention of chronic obstructive pulmonary disease. NHLBI/WHO global iniciative for chronic obstructive lung disease(GOLD) workshop summary, Am J Respir Crit Care Med 2001(163):1256-1276. Fiore MC, Bailey WC, Cohen SF., Treating Tobacco Use and Dependence: Clinical Practice Guidelines. Rockville, Md: Dept of Health and Human Services, 2000. 50 20 A forma de administração e freqüência da medicação respiratória não esteve adequada às normas internacionais. Anthonisen N CJ, Kiley J, Effects of smoking intervention and the use of aninhaled anticholinergic bronchodilator on the rate of decline of FEV1. JAMA 1994(272):1497-1505. 70 22 Um percentual pequeno dos pacientes com DPOC recebeu a medicação respiratória. Celli BR MW, Members C, Standars for the diagnosis and treatment of patients with COPD: a summary of the ATS/ERS position paper. Eur Respir J 2004(23):932-946. IV Figura 3. Tratamento farmacológico conforme os estágios GOLD. 30 O uso preventivo da vacinação antigripal mostrou baixa cobertura. 4. Referências bibliográficas I 30 O aconselhamento médico para o abandono do fumo não foi realizado para todos os fumantes conforme preconizado. 25 23 0 40 ▪ ▪ ▪ 73 70 Pontos-chave: Consensus Statement, Panel, Representatives. A Clinical Practice Guideline for Treating Tobacco Use and Dependence.A Public Health Service Report. JAMA 2000(283):3244-3254.6, Nichol K BL, Nelson A.Relation between influenza vaccination and outpatients visits, hospitalization, and mortality in elderly person with chronic lung disease. Ann Intern Med 1999(130):397-403. Calverley P.Modern treatment of chronic obstructive pulmonary disease.Eur Respir J. 2001;18(Suppl 34):60s-66s. 115 Capítulo 8 Scanlon P, Connet J, Waller L, Altose M, Bailey W, AS, B, Smoking Cesation and lung function in mild to moderate chronic obstructive pulmonary disease. The Lung Health Study. Am J Respir Crit Care Med 2000(161):381390. Burge P CP, Jones P, Spencer S, Anderson J, Masler T. Ramdomised, double blind, placebo controlled study of fluticasone propionatte in patients with moderate to severe chronic obstructive pulmonary disease: the ISOLDE trial. BMJ 2000(320):1297-1303. The Lung Health Study Research Group. 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O termo qualidade de vida passou a fazer parte do Index Medicus há menos de 30 anos. Particularmente na última década, tem se reconhecido a importância do ponto de vista do paciente em relação a sua doença, bem como a eficácia das medidas terapêuticas empregadas. Em decorrência disto, foram desenvolvidos uma série de questionários de qualidade de vida relacionados à saúde para uso em pacientes com DPOC, sendo os mesmos extensamente utilizados nos estudos de intervenção terapêutica. A finalidade dos questionários de qualidade de vida é avaliar o estado de saúde dos pacientes sob a sua ótica. 117 Capítulo 9 2. Metodologia Foi aplicado o questionário Short Form SF-12 a todos os entrevistados, sendo que as doze perguntas do questionário avaliavam dois dominios: o Qualidade de vida e DPOC 3. Resultados 3.1 Qualidade de vida na população geral e nos pacientes com DPOC físico (PCS) e o mental (MCS). O algoritmo de cálculo da pontuação do SF-12 Levando-se em consideração a amostra total dos cinco países, nota- (para a análise do PCS e MCS) levou em consideração a média da população se que os escores de qualidade de vida medidos pelo questionário SF-12 norte-americana de 1998 (Ware, 1998). foram próximos à média de 50 (Jenkinsonb, 1997) (valor médio do PCS SF- O SF-12 é um questionário criado a partir do SF-36. Assim como o SF- 12 = 51,62+8,1 e MCS SF-12 = 51,36+10,0). O valor 50 ou acima de 50 é 36, é um questionário genérico e a sua pontuação pode variar de 0 a 100%. considerado normal (Gandek, 1998). Os domínios físico e mental, PCS e MCS, A justificativa do processo de desenvolvimento do SF-12 teve como base a medem aspectos distintos da qualidade de vida e observamos que não houve possibilidade de produzir uma versão mais curta, associada a uma maior correlação entre eles, fato descrito na literatura (Ware, 1996). exatidão, com o menor efeito de perda de sensibilidade e especificidade nos No entanto, ao analisarmos o grupo de pacientes DPOC (diagnosticados extremos da doença. Estes efeitos são conhecidos como “teto” e “chão”, onde pela relação fixa, ou seja, VEF1/CVF < 70% pós BD), pode-se notar que eles no limite próximo da normalidade o questionário tende a pontuar como normal apresentam uma menor qualidade de vida no domínio físico (PCS), comparados e, nos casos de maior gravidade, a pontuação piora desproporcionalmente. aos indivíduos sem DPOC (figura 1). Apesar de a diferença entre as duas As vantagens relatadas do SF-12 são: o conteúdo e formato, as populações em todos os países ser significativa, em São Paulo, Montevidéu opções de períodos de lembrança, as opções de pontuação e sua padronização e Caracas os escores foram normais ou muito próximos da normalidade. É (Jenkinsona, 1997). interessante observar que não ocorreu alteração no domínio mental (MSC), Em relação ao conteúdo e formato, o SF-12 foi desenvolvido a partir isto é, as duas populações se comportaram do mesmo modo (dados não da seleção dos 12 itens que tiveram a melhor propriedade de correlação apresentados). Em relação a este achado existe a possibilidade de estarem com cada domínio de origem do SF-36, o que confere uma boa validade de ocorrendo dois fatos: a) que os pacientes com DPOC não apresentem qualquer construção. A sua versão é curta, tornando-o um questionário muito prático desvio do componente mental; b) que o questionário SF-12, no seu domínio (Jenkinsonb, 1997). mental, tenha um poder discriminatório reduzido para detectar alterações que talvez não sejam grandes. Deve-se chamar a atenção para o fato de que a escala do domínio mental-MSC não foi dicriminatória em nenhum dos aspectos avaliados neste capítulo: população geral, gravidade da obstrução brônquica, gênero e índice de massa corporal. 118 119 Capítulo 9 Qualidade de vida e DPOC 60 52 50 50 49 47 50 52 48 50 52 50 40 30 20 10 0 São Paulo p = 0,04 Santiago p = 0,11 México p = 0,005 Montevidéu p = 0,007 DPOC (GOLD I) SEM DPOC (GOLD) COM DPOC (RF) Caracas p < 0,001 Figura 1. Qualidade de Vida (saúde física) e DPOC. 3.2 Qualidade de vida nos pacientes com DPOC segundo o GOLD Pontuação média do SF-12 (PCS) Pontuação média do SF-12 (PCS) SEM DPOC (RF) 60 50 52 51 49 52 50 49 50 44 DPOC (GOLD II - IV) 50 49 51 51 48 45 40 40 30 20 10 0 São Paulo p < 0,001 Santiago p < 0,001 México p < 0,001 Montevidéu p < 0,001 Caracas p = 0,09 Figura 2. Qualidade de Vida (saúde física) e DPOC (GOLD). 3.3 Qualidade de vida segundo o índice de massa corporal Quanto à análise da qualidade de vida relacionada ao grau de obstrução, O Projeto Platino constatou que nos cinco centros estudados há altas segundo os estágios GOLD (figura2), os pacientes foram separados em dois prevalências de sobrepeso e obesidade e poucas pessoas com IMC abaixo de grupos: (a) estágio GOLD I, que incluiu os indivíduos com volume expiratório 18,5 kg/m2 (figura 3). Observou-se que em todos os centros, os dois extremos, forçado no 1º segundo entre 79 e 50 % do valor previsto; (b) estágios GOLD ou seja, pacientes obesos e pacientes desnutridos, tiveram os menores II, III e IV, que incluiu os pacientes com valores previstos de VEF1 abaixo de escores de qualidade de vida comparados aos demais grupos. No entanto, o 50%. Esta divisão se deveu ao fato de que o grupo de pacientes GOLD III e valor mais baixo do escore do domínio físico (PSC) foi sempre encontrado nos IV era de número reduzido e de ter sido observado em estudos anteriores que pacientes com valor de IMC mais baixo. Nas cidades de Montevidéu e Caracas, a qualidade de vida medida pelo Questionário Saint George (Antonelli, 2003) os escores de qualidade de vida foram normais ou praticamente normais, sofre uma significativa diminuição com obstrução brônquica abaixo de 50% apesar de os menores valores serem no grupo dos pacientes desnutridos. do valor previsto. Com exceção de Santiago, onde o escore médio para pacientes do grupo GOLD I foi menor do que do grupo mais obstruído, nos demais países observou-se que, quanto mais severa a obstrução pior a qualidade de vida em relação ao domínio da saúde física. Em Caracas, a diferença entre os grupos não atingiu a significância estatística. 120 121 Capítulo 9 Qualidade de vida e DPOC IMC (km/m²) 18,5 - 24,9 IMC (km/m²) 25,0 - 29,9 IMC (km/m²) > 30 60 52 52 50 49 50 49 43 44 46 50 50 48 50 52 52 50 50 49 53 52 51 40 30 20 10 0 São Paulo p < 0,001 Santiago p < 0,001 México p < 0,001 Montevidéu p < 0,001 Homem Pontuação média do SF-12 (PCS) Pontuação média do SF-12 (PCS) IMC (km/m²) <18,5 60 50 valores médios abaixo do escore normal, com exceção da cidade de Montevidéu. Deve-se considerar que na cidade de São Paulo, apesar de o valor estar abaixo do normal, ele esteve muito próximo da normalidade. 122 47 53 49 50 53 52 10 0 São Paulo p < 0,001 Santiago p < 0,001 México p < 0,001 Montevidéu p < 0,001 Caracas p = 0,01 Figura 4. Qualidade de Vida (saúde física) e sexo. Pontos-chave: ▪ Além disso, os homens sempre tiveram um valor médio de qualidade de vida considerado normal. Por outro lado, as mulheres, em regra, apresentaram 51 20 Figura 3. Qualidade de Vida (saúde física) e IMC. escore de qualidade de vida no domínio físico do que as mulheres (figura 4). 51 30 p = 0,034 Em todos os cinco países os homens apresentaram maior média no 50 40 Caracas 3.4 Qualidade de vida segundo o sexo 53 Mulher ▪ ▪ ▪ A média do escore de qualidade de vida no domínio físico dos pacientes com DPOC moderada a muito grave foi abaixo da média considerada normal. A média do escore de qualidade de vida no domínio mental não diferiu entre os sujeitos com ou sem DPOC. As mulheres latino-americanas tiveram médias no escore de qualidade de vida no domínio físico inferiores às dos homens. Pacientes desnutridos e obesos tiveram escores médios de qualidade de vida no domínio físico abaixo do normal. 123 Capítulo 9 4. Referências bibliográficas Ware JE, Kosinski M, Keller SD. How to score the SF-12 Physical & Mental Health Summary Scales. 3rd edn ed. Lincoln RI: QualityMetric Inc, 1998 Jenkinsona C, Layte R. Development and testing of the UK SF-12 (short form health survey). J Health Serv Res Policy 1997; 2:14-18 Jenkinsonb C, Layte R, Jenkinson D, et al. A shorter form health survey: can the SF-12 replicate results from the SF-36 in longitudinal studies? J Public Health Med 1997; 19:179-186 Gandek B, Ware J, Aaronson NK, et al. Cross-validation of item selection and scoring for the SF-12 Health Survey in nine countries: results from the IQOLA Project. International Quality of Life Assessment. 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A população maior de 60 anos de idade ultrapassará 20% da população na região da AL, no ano 2050, e a projeção de mortalidade nos países em desenvolvimento sofrerá importantes mudanças nos perfis de mortalidade. Para o ano 2050, estima-se que a DPOC estará dentro das principais causas de morte da população destes países, com 36% de aumento projetado em um reduzido prazo de tempo (tabela 1). 125 Capítulo 10 Tabela 1. Mortalidade em países em desenvolvimento, ano 2000 e estimativa 2050. Percentagens conforme causas específicas de morte. Comorbidade e DPOC A presença de comorbidade pode estar também associada a uma maior incidência da DPOC, o que é fisiopatologicamente plausível, considerando os mecanismos de base inflamatória e imunológica que esta doença apresenta. A DPOC é também um diagnóstico primário ou secundário freqüentemente referido nos pacientes hospitalizados por causas derivadas de doenças não respiratórias (Holguin, 2005). No presente capítulo, será apresentada uma breve descrição dos principais achados da comorbidade referida nos diferentes centros do Projeto PLATINO. Fonte: (Ebrahim, 2005) Comorbidade e DPOC A comorbidade, descrita como a coexistência simultânea de doenças de natureza distinta da DPOC no paciente portador desta condição (Last John, 2001), constitui um fator associado ao pior prognóstico da DPOC. Sua presença relaciona-se ao maior risco de desenvolver o evento determinante na mortalidade dos pacientes afetados pela DPOC: os episódios de descompensação da doença (Antonelli, 1997). Pontos-chave sobre comorbidade e DPOC: ▪ ▪ ▪ ▪ ▪ Na região da AL são relatadas elevadas prevalências das DCNT. A maior prevalência da DPOC observa-se na população maior de 40 anos, grupo no qual muitas DCNT têm também maior prevalência. A comorbidade é um fator prognóstico independente na DPOC. A presença de comorbidade, em especial DCNT, em pacientes portadores da DPOC é de elevada prevalência. Doenças cardiovasculares (cardiopatia isquêmica, hipertensão arterial) e diabetes mellitus constituem doenças freqüentes nos pacientes portadores da DPOC. O Estudo PLATINO permitiu conhecer a realidade da DPOC em cinco cidades da AL, caracterizando essa doença conforme seus fatores de risco. Adicionalmente, o estudo avaliou outras variáveis relacionadas a esta doença, entre elas as comorbidades. Considerando que nos estudos clínicos de pacientes com DPOC a presença de comorbidade constitui com freqüência um critério de exclusão, a informação obtida no Projeto PLATINO permite uma visão geral sobre a importância da associação deste fator com DPOC em nível populacional (Sin, 2005). Algumas doenças e condições de caráter crônico auto-referidas pelos entrevistados, o que constitui uma estimativa da comorbidade associada à DPOC, foram investigadas no Estudo PLATINO. 126 127 Capítulo 10 Comorbidade e DPOC 2. Metodologia A estimativa da comorbidade no Estudo PLATINO foi feita através do 45 auto-relato de algumas doenças específicas. As perguntas do questionário 40 utilizado no Projeto PLATINO foram as seguintes: Hipertensão Gastrite Cardíaca Diabetes TBC Doença cérebro-vascular Câncer de pulmão 41 35 Algum médico ou profissional da saúde lhe disse que o(a) Sr(a) tem ou teve: ▪ ▪ ▪ ▪ ▪ ▪ ▪ Doenças do coração? Hipertensão arterial (pressão alta)? Açúcar no sangue (diabetes)? Câncer de pulmão? Acidente vascular cerebral (derrame, trombose, isquemia)? Tuberculose pulmonar (complexo primário)? Gastrite ou úlcera? 35 34 31 % Comorbidades Comorbidades: auto-relato do diagnóstico médico. 38 36 31 30 30 30 25 23 20 15 12 11 10 5 0 17 16 15 15 3 3 1 1 São Paulo 2 México 0 10 9 8 7 6 1 2 Montevidéu 4 0 1 1 0 Santiago 0 Caracas Figura 1. Prevalência de comorbidades no Estudo PLATINO. As respostas positivas encontradas foram consideradas como uma estimativa da prevalência destas condições. O diagnóstico relatado de gastrite ou úlcera péptica também foi elevado (30,5%), sendo Santiago a cidade com o maior valor e Caracas a 3. Prevalência de comorbidade no Projeto PLATINO Neste capítulo serão apresentados dados sobre comorbidade dos participantes do Projeto PLATINO sem procedimentos de ajuste ou padronização conforme a idade dos participantes. A hipertensão arterial foi a comorbidade detectada com maior freqüência em todas as cidades, atingindo 35% dos sujeitos entrevistados. O maior valor foi observado em São Paulo e o menor em Caracas (figura 1). 128 cidade com o menor valor. A região da AL tem altos níveis de infecção pelo Helicobacter Pylori, condição relacionada com doença do trato digestivo. A terceira condição de maior freqüência relatada foram as doenças cardiovasculares, as quais podem incluir diversas doenças. A percentagem relatada dessas doenças foi de 13%, com pouca variação entre as cidades. O diabetes foi auto-referido por aproximadamente 10% dos entrevistados, apresentando valores mais elevados em São Paulo e Cidade do México. Nesta última cidade foi também observada a maior freqüência de sobrepeso e obesidade. 129 Capítulo 10 Comorbidade e DPOC A tuberculose pulmonar (TBC) é ainda uma doença infecciosa relevante na região, sendo sua incidência variável na AL. A prevalência média observada Hipertensão foi de 2,3%. A estimativa da prevalência de TBC variou entre 5,9% na cidade Gastrite Cardiaca Diabetes TBC Doença cérebro-vascular 50 de Santiago a 0,9% na cidade de Caracas. 44 A prevalência relatada de doenças cérebro-vasculares foi baixa nas 41 40 cinco cidades avaliadas e o câncer de pulmão foi raramente referido. Calculou-se a prevalência da DPOC utilizando a relação fixa VEF1/CVF < 70 % DPOC Prevalência da DPOC conforme comorbidade referida 34 30 20 27 17 18 19 14 pós BD em cada subgrupo de doenças auto-referidas no Estudo PLATINO (figura 2). Foram encontradas diferenças estatisticamente significativas em 18 22 24 19 15 14 8 9 8 10 20 10 8 18 15 22 19 18 13 10 14 8 7 favor de uma maior prevalência da DPOC para as seguintes doenças: - História auto-referida de doença cérebro-vascular. - História auto-referida de TBC . - História de câncer pulmonar. 0 São Paulo México Montevidéu Santiago Caracas Figura 2. Prevalência da DPOC conforme comorbidades nos cinco centros. Encontrou-se diferença estatisticamente significativa em favor de uma menor prevalência da DPOC em sujeitos com auto-relato de diabetes na cidade de Montevidéu. Pontos-chave: ▪ ▪ ▪ ▪ 130 O envelhecimento progressivo da população da AL está propiciando uma maior prevalência da DPOC e o risco de comorbidade associada. Constatou-se uma elevada prevalência auto-referida das sete condições avaliadas no Estudo PLATINO. Hipertensão arterial e doenças cardiovasculares foram as doenças de maior prevalência relatada nas cinco cidades estudadas. Tuberculose pulmonar, doença cérebro-vascular e câncer de pulmão associaram-se positivamente com uma maior prevalência da DPOC em algumas das cidades estudadas no Projeto PLATINO. 131 Capítulo 10 4. Referências bibliográficas Ebraim Sh, Smeeth L, Non-Communicable diseases in low and midle-income countries: a priority or a distraction? , Int J Epidemiol 2005; 34: 961966 Last J, Editor, A dictionary of Epidemiology, 4th Edition, Oxford University Press, 2001 Antonelli Incalzi R, Fuso L, De Rosa M, Forastiere F, Rapiti E, Nardecchia B, Pistelli R, Co-morbidity contributes to predict mortality of patients withchronic obstructive pulmonary disease, Eur Respir J 1997; 10: 27942800 Sin D, Paul S, Chronic Obstructive Pulmonary Disease as a Risk Factor for Cardiovascular Morbidity and Mortality, Proc Am Thorac, 2005; 2: 811 http://www.paho.org/spanish/ad/dpc/nc/carmen-info.htm. CARMEN (Accesado el 15 Octubre, 2005) OPS, iniciativa Holguin , Folch E, Redd S, Mannino D. Comorbidity and Mortality in COPDRelated Hospitalizations in the United States. Chest.2005; 128: 2005-2011. 132 Discussão Capítulo 11 Discussão ANA MB MENEZES PEDRO C HALLAL 1. Aspectos metodológicos Esse foi o primeiro estudo multicêntrico sobre DPOC na América Latina. A similaridade de protocolo entre as cidades investigadas garante a comparabilidade dos resultados; por exemplo, o equipamento utilizado e o controle de qualidade das espirometrias foram idênticos em todas as cidades investigadas. Os percentuais de não respondentes também podem ser destacados, visto que, para um estudo que incluía um exame complementar, as taxas de resposta foram elevadas em comparação à literatura na área. Para ilustrar a qualidade do processo amostral, destaca-se que a composição das amostras do estudo PLATINO foi similar aos dados censitários de cada região (www.platino-alat.org). Outro aspecto relevante foi a utilização de espirometria para detecção de DPOC, visto que vários estudos anteriores baseavam-se apenas em sintomas ou diagnóstico médico. Ainda mais relevante foi a opção pela realização de espirometria antes e depois do uso de BD, uma estratégia que visa a excluir os sujeitos asmáticos do diagnóstico de DPOC. 133 Capítulo 11 Discussão O rigoroso controle de qualidade desde a fase de seleção dos um estudo de acompanhamento seria ideal para que investigássemos o domicílios, incluindo as visitas domiciliares e a espirometria (ver capítulo prognóstico dos indivíduos incluídos nesse estudo. Deve-se considerar ainda 2) também deve ser destacado. A utilização de exames espirométricos sem que somente áreas urbanas foram estudadas e, portanto, estudos em zonas padronização poderia levar a conclusões errôneas. Neste sentido, optou-se rurais são necessários. Ainda pode-se mencionar que, por questões logísticas por seguir as normas da ATS para garantir a qualidade das espirometrias. A e financeiras, apenas cinco cidades foram incluídas no estudo PLATINO, e existência de um centro coordenador das espirometrias (México) auxiliou no pesquisas em outros locais devem ser incentivadas. processo de padronização e controle de qualidade dos dados espirométricos. No mesmo sentido, optou-se por centralizar a coordenação do estudo 2. Principais resultados na cidade de Pelotas (Brasil), tornando padronizados os procedimentos de Cerca de 90% dos exames espirométricos realizados preencheram revisão dos questionários, codificação, digitação e análise. Outro aspecto a os critérios de qualidade atuais da ATS e ERS. Esse percentual foi ainda ser mencionado é que pessoas-chave da equipe visitaram todos os países mais elevado se consideramos os critérios de 1994. A prevalência de DPOC para treinarem os supervisores de cada centro, garantindo dessa forma utilizando o critério principal (relação fixa) variou de 7,8% no México a 19,7% comparabilidade entre os trabalhos realizados. em Montevidéu. O percentual de indivíduos com DPOC severa ou muita severa (estágios III e IV da classificação GOLD) foi inferior a 1% em todos Um outro ponto fundamental para o sucesso do projeto foi a os centros. A comparação de diversos critérios diagnósticos permite avaliar a participação de experts em diversas áreas, por exemplo, epidemiologistas, influência da definição escolhida para o projeto PLATINO em relação a outros estatísticos, pesquisadores renomados na área respiratória de outros países. estudos. A inclusão de sintomas e diagnóstico médico, e sua comparação com O apoio recebido de diversas instituições (ALAT, Boehringer-Ingelheim, CNPq, os achados espirométricos, revela a importância da utilização da espirometria FAPERGS, Centro de Pesquisas Epidemiológicas da Universidade Federal de para o diagnóstico da DPOC. Pelotas) também foi fundamental para o andamento do projeto. Valores de referência para espirometria em indivíduos latinoA parceria científica com um estudo similar - BOLD realizado americanos foram criados com base nos resultados do estudo PLATINO (ver concomitantemente em outros países - muito colaborou para a padronização capítulo 4). Tais equações, específicas por sexo, idade e altura, podem ser de metodologias e discussão de estratégias de ação. Publicações e futuros usadas na prática clínica e em futuros estudos na região. Estes valores são projetos combinando dados dos estudos PLATINO e BOLD estão sendo fundamentais porque antes deles, estudos latino-americanos eram obrigados planejados para o avanço do conhecimento científico na área da DPOC. a utilizar valores de referência derivados de outras populações e, portanto, não específicos para sujeitos da AL. O programa para análise dos resultados Algumas limitações metodológicas também devem ser mencionadas. A utilização de um delineamento transversal permite o estabelecimento da espirométricos com base nos resultados do estudo PLATINO está disponível na página eletrônica do projeto (www.platino-alat.org). prevalência e análise de alguns fatores associados à DPOC. No entanto, 134 135 Capítulo 11 Os seguintes grupos apresentaram prevalências significativamente maiores de DPOC: homens, idosos, indivíduos com baixa escolaridade, fumantes e ex-fumantes, expostos à poeira por 10 anos ou mais no local de trabalho e indivíduos com índice de massa corporal baixo. Esses achados estão de acordo com relatos prévios na literatura especializada. A prevalência de tabagismo no Estudo PLATINO variou de 24% em São Paulo a 39% em Santiago. Esse percentual foi maior nos homens do que nas mulheres em todos os centros. A prevalência de fumo atual tendeu a decrescer com a idade, sendo o inverso observado para os ex-fumantes. A grande maioria dos fumantes (90%) utiliza cigarro com filtro, seguido pelos cigarros sem filtro (6,5%). Um percentual elevado de indivíduos com DPOC nunca havia sido diagnosticado como portador de DPOC. Além disso, o Projeto PLATINO encontrou um percentual relativamente alto de sobrediagnóstico ou diagnóstico incorreto. Discussão 3. Conclusões O sucesso obtido nesse projeto comprova que é possível a realização de estudos multicêntricos na AL. Altas taxas de resposta e dados de qualidade foram obtidos neste projeto. A utilização de investigadores locais auxiliou no andamento logístico do projeto, visto que essas pessoas conheciam as peculiaridades de cada região. Pessoas-chave do Projeto PLATINO visitaram todos os centros, com o objetivo de padronizar a coleta de dados no estudo. As equipes formadas nestes cinco centros poderão realizar estudos futuros de forma independente. A prevalência de DPOC observada na AL é alta, e consistente com dados da literatura especializada. O principal fator de risco para essa doença, o tabagismo, apresenta uma freqüência ainda elevada na região, especialmente em Santiago. Estratégias urgentes são necessárias para o combate ao uso de tabaco na AL. No futuro, pretende-se acompanhar os indivíduos incluídos nesta fase do Estudo PLATINO para avaliar o prognóstico e evolução da doença. O tratamento da DPOC não parece estar sendo feito de acordo com as recomendações internacionais. As prevalências de aconselhamento médico para parar de fumar e do uso da vacina antigripal são baixas. O tratamento farmacológico dos sujeitos com DPOC não está de acordo com as normas internacionais, tanto em relação à forma de administração quanto em relação à freqüência de uso dos medicamentos. Indivíduos com DPOC apresentam escores médios de qualidade de vida piores no domínio físico em comparação àqueles sem a doença, mas não foram detectadas diferenças no domínio mental. A freqüência de algumas comorbidades é elevada e a presença de algumas comorbidades está associada com a ocorrência de DPOC. 136 137 Capítulo 11 138 Apoio educacional de: