UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA EM GEOGRAFIA ALIAN PAIVA DE ARRUDA OS “FAROFEIROS” EM EXCURSÃO NAS LAGOAS DE ARITUBA, BOÁGUA E CARCARÁ (NÍSIA FLORESTA/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar NATAL-RN 2010 UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES DEPARTAMENTO DE GEOGRAFIA PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO E PESQUISA EM GEOGRAFIA ALIAN PAIVA DE ARRUDA OS “FAROFEIROS” EM EXCURSÃO NAS LAGOAS DE ARITUBA, BOÁGUA E CARCARÁ (NÍSIA FLORESTA/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar Prof. Dra. Edna Maria Furtado Orientadora NATAL-RN 2010 Divisão de Serviços Técnicos Catalogação da Publicação na Fonte / Biblioteca Central Zila Mamede Arruda, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar / Alian Paiva de Arruda. – Natal, 2010. 137 p. : il. Orientador: Edna Maria Furtado. Dissertação (Mestrado) – Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes. Programa de PósGraduação e Pesquisa em Geografia. 1. Espaço (Geografia) 2. Turismo. 3. Excursionismo. 4. Lazer – Turismo. 5. Arituba, Lagoa de (RN). 6. Boágua, Lagoa de (RN). 7. Carcará, Lagoa de (RN). 8. Nísia Floresta (RN). I. Furtado, Edna Maria. II. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. III. Título. RN/UF/BCZM CDU 911.6:379.85 ALIAN PAIVA DE ARRUDA OS “FAROFEIROS” EM EXCURSÃO NAS LAGOAS DE ARITUBA, BOÁGUA E CARCARÁ (NÍSIA FLORESTA/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar Dissertação de mestrado apresentada ao Programa de Pós-Graduação e Pesquisa em Geografia, da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, para obtenção do título de Mestre em Geografia. Orientadora: Profª Dra. Edna Maria Furtado NATAL-RN 2010 ALIAN PAIVA DE ARRUDA OS “FAROFEIROS” EM EXCURSÃO NAS LAGOAS DE ARITUBA, BOÁGUA E CARCARÁ (NÍSIA FLORESTA/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar A dissertação intitulada Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar, apresentada por Alian Paiva de Arruda, foi aprovada e aceita como requisito para obtenção do grau de mestre em Geografia. Aprovada em: 11/06/2010. ______________________________________ Profª Dra. Edna Maria Furtado Universidade Federal do Rio Grande do Norte-UFRN Orientadora ______________________________________ Profª Dra. Rita de Cássia da Conceição Gomes Universidade Federal do Rio Grande do Norte-UFRN Membro ______________________________________ Profª Dra. Adyr Balastreri Rodrigues Universidade de São Paulo-USP Membro Dedico a vocês: Kado, Kada, Beto, Adília, Anny, Samuel, André (in memoriam) e Jan, irmãos da Av. 06; Ariosvaldo Araújo e família, lá da Av. 11; Rebecca e Bárbara, filhas da lagoa da Ilhota. AGRADECIMENTOS A realização desta pesquisa representa para mim mais uma etapa vencida, resultado de muito trabalho, persistência, angústia e paixão. Então, é chegada a hora de reconhecer a importância da família e dos velhos e novos amigos que estiveram comigo nesta caminhada, o que me permite dizer que é muito bom ter a quem agradecer. A princípio agradeço a Ariosvaldo, meu companheiro, e a Rebecca e Bárbara, minhas filhas, aos quais agradeço imensamente pelo amor, incentivo nas horas de cansaço, provocações, tolerância e compreensão pela ausência. Registro minha gratidão aos meus sete irmãos, inclusive os que perdi pois, cada um, ao seu modo, contribuiu efetivamente na minha formação pessoal, ocupando os lugares dos meus pais. No âmbito acadêmico, meus agradecimentos à Edna Maria Furtado, professora orientadora, que imensamente contribuiu através da sua experiência na abordagem geográfica do turismo e com seus gestos de confiança me permitindo trilhar nos caminhos desta pesquisa; do mesmo modo que agradeço aos professores e queridos amigos João Mendes, Irene Araújo e Gilene Moura pelo acolhimento e disponibilidade de sempre. Sou grata, também, a todos os demais professores que, ao longo deste curso de mestrado, provocaram inquietações e despertaram em mim a importância do rigor na vida acadêmica, com destaque para Maria Adélia A. Souza, Adyr Balestreri Rodrigues, Aldo Dantas e Rita de Cássia C. Gomes. Não posso deixar de mencionar minha gratidão aos amigos da Secretaria Municipal de Saúde de Natal, dos quais sempre tive o apoio para realizar as atividades ao longo do curso, e, também, nas horas de cansaço. De um modo especial, agradeço à Marisa Sandra, Maria Cristiana e demais amigos da Vigilância Ambiental e à Aglailde cuja solidariedade foi indispensável na reta final. Por fim, agradeço aos meus amigos de turma: Aglene, Joseara, Kelson, Larissa Viera e Mariana e aos parceiros da pesquisa de campo: Carlos Henrique, Amires, Ebba Lind e Thiago. Muito obrigada a TODOS e até a próxima! RESUMO Esta dissertação analisa “uma outra face do turismo potiguar”, a face não planejada, negligenciada e segregada da atividade turística. Trata-se do estudo do excursionismo, uma prática de lazer turístico realizada por turistas com baixo poder de consumo, denominados pejorativamente de “farofeiros”, pelo senso comum. O recorte espacial da pesquisa compreende as lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN), onde se observa nos dias de domingo e feriados a chegada de centenas de excursionistas, oriundos da Região Metropolitana de Natal, de outros municípios do entorno e de estados vizinhos, como Paraíba e Pernambuco. O objetivo desta pesquisa é analisar como se dá a apropriação do espaço pela prática do excursionismo enfocando suas relações com outros agentes sociais os quais, também, se apropriam de um território turístico. A discussão teórica considera o consumo do espaço pela prática do lazer turístico e a apropriação por distintos agentes sociais, utilizando categorias de análise como produção do espaço, território e lazer. A pesquisa de campo foi realizada por meio de entrevistas e aplicação de questionários, junto aos excursionistas, organizadores das excursões, comerciantes locais, representantes do poder público municipal e da categoria profissional de bugueiros; além disto, o registro fotográfico, diálogos informais e a observação em campo foram instrumentos metodológicos importantes. A partir dos dados realizaram-se análises estatísticas e elaboração de mapas temáticos os quais expressam os fluxos estabelecidos pelos excursionistas e a segregação da atividade. Com a pesquisa, pode-se afirmar que a prática do excursionismo é negligenciada pelo poder público, pois esta contraria a intencionalidade dos agentes hegemônicos presentes neste território turístico uma vez que este visam o desenvolvimento de uma atividade lucrativa, voltada para turistas com maior poder de consumo. Observa-se nesta face ignorada do turismo potiguar, tida como “pobre” e “suja”, a existência de conflitos entre os distintos agentes sociais: turistas, comerciantes locais e poder público, ao mesmo tempo em que, também, desperta o interesse e é apropriada pelo setor informal e formal da economia. O excursionismo é um fenômeno expressivo, uma prática social relevante, realizada por cidadãos que compõem a classe trabalhadora os quais, para terem um dia de lazer, utilizam-se de práticas alternativas de consumo e burlam variadas estratégias de segregação que lhes são impostas neste território turístico, comportamentos que, em parte justifica a alcunha de “farofeiro” dada a estes turistas. Palavras-chave: Excursionismo. Lazer turístico. Espaço. Território turístico ABSTRACT This thesis analyzes “another side of Potiguar tourism”, the unplanned side, neglected and kept out of touristic activities: excursionism, a leisure practice enjoyed by tourists with low consumer power, and who are commonly referred by the pejorative term “farofeiros” (picnic lovers). The geographic research sites considered for this study include Arituba, Boágua and Carcará lakes in Nísia Florest, Rio Grande do Norte, where on Sundays and holidays the arrival of hundreds of excursionists, from around the metropolitan region of Natal, from surrounding municipalities, and neighboring States, such as Paraíba and Pernambuco, can be observed. The objective of this study is to analyze the appropriation of the physical site by the practice of excursionism, focusing on its relation to other social agents that also appropriate a designated touristic area. The theoretical discussion considers the use of the space by the touristic leisure practice and the appropriation by distinct social agents, using categories of analysis, such as, production of the space, territory and leisure. The field work was completed with interviews and questionnaires administered to excursionists, excursion organizers, local merchants, representatives of the public setor from the municipalities, and professional dune buggy drivers; besides this, photos, informal dialogue and field observations were important methodological instruments used. From the data, statistical analysis and the development of thematic maps demonstrating the established flux between excursionists and the segregated activity were done. With this research, one can affirm that the practice of excursionism is neglected by the public sector, contrary to the intention of the hegemonic agent‟s intentionality present in this touristic territory which aim at the development of a lucrative activity, geared toward tourists with greater spending power. This ignored and neglected faction of Potiguar tourism is considered “poor” or “dirty”, and generate conflicts among the distinct social agents: tourists, the market and the public sector, simultaneously peaking interest, which is then appropriated by the informal sector and formal economy. Excursionism is an expressive phenomenon, a socially relevant practice, enjoyed by citizens of the working class who, in order to have a day of leisure, use alternative consumer practices and subvert various strategies of segregation that are imposed within these tourist areas, behavior that, in part, justifies the nickname, “picnic lovers”, given to these tourists. Keywords: Excursionism. Tourist Leisure. Physical Space. Tourist Areas LISTA DE ILUSTRAÇÕES FOTOGRAFIAS 3- Ônibus de excursão estacionados nas proximidades da lagoa de Boágua...................................................................................................... Ônibus de excursão estacionados nas proximidades da lagoa de Carcará...................................................................................................... Excursionistas na lagoa de Boágua, Nísia Floresta/RN............................ 4- Excursionistas na lagoa de Boágua, Nísia Floresta/RN............................ 23 5- Excursionistas Iraquianos (sunitas e xiitas) no lago Habbaniya, Iraque... 26 6- Vista parcial do trecho viário Natal-Pirangi do Norte da RN-063, na década de 1960: município de Parnamirim............................................... Vista parcial do trecho viário Natal-Pirangi do Norte da RN-063, na década de 1960: município de Nísia Floresta......................................... Vista parcial do trecho viário Pirangi do Sul-Búzios-Tabatinga, praia de Búzios, litoral de Nísia Floresta/RN........................................................... Estabelecimentos comerciais instalados na margem da lagoa: Arituba, ano 2001................................................................................................... Estabelecimentos comerciais instalados na margem da lagoa: Boágua, ano 2001................................................................................................... Estabelecimentos comerciais instalados na margem da lagoa: Carcará, ano 2001................................................................................................... Instalações físicas dos estabelecimentos comerciais em Arituba, ano 2010......................................................................................................... Instalações físicas dos estabelecimentos comerciais em Boágua, ano 2010......................................................................................................... Instalações físicas dos estabelecimentos comerciais em Carcará, ano 2010......................................................................................................... Condições do acesso: entroncamento da RN-063 com estrada carroçável que liga à lagoa de Carcará.................................................... Condições do acesso: estrada carroçável que interliga as lagoas pelo interior do município.................................................................................. Área de estacionamento na lagoa: Arituba............................................... 12- 7891011121314151617- 22 22 23 58 58 59 64 64 64 66 66 66 70 70 70 18- Área de estacionamento na lagoa: Boágua.............................................. 70 19- Área de estacionamento na lagoa: Carcará.............................................. 70 20- Lixo encontrado na área utilizada pelos excursionistas: Arituba............... 71 21- Lixo encontrado na área utilizada pelos excursionistas: Boágua.............. 71 22- Chegada dos “farofeiros” na lagoa: Arituba.............................................. 74 23- Chegada dos “farofeiros” na lagoa: Boágua............................................. 74 24- Chegada dos “farofeiros” na lagoa: Carcará............................................. 74 25- Apropriação das margens das lagoas pelo comércio local: Arituba.......... 87 26- Apropriação das margens das lagoas pelo comércio local: Boágua......... 87 27- Apropriação das margens das lagoas pelo comércio local: Carcará........ 87 28- Carro popular atolado no trecho que dá acesso à lagoa do Urubu........... 89 29- Território dos excursionistas: Arituba........................................................ 90 30- Território dos excursionistas: Boágua....................................................... 90 31- Território dos excursionistas: Carcará....................................................... 90 32- Ocupação de acessos públicos pelos comerciantes locais em Arituba: ampliação predial da barraca.................................................................... 33- Ocupação de acessos públicos pelos comerciantes locais em Arituba: porta de entrada de banheiros.................................................................. 34- Comércio local voltado para excursionistas em Boágua: entrada do parque aquático......................................................................................... 35- Comércio local voltado para excursionistas em Boágua: casa de show... 36- Placa ilustrativa do discurso ambiental presente no território turístico..... 37- Construções abandonadas utilizadas por excursionistas na lagoa de Arituba: área interna.................................................................................. 38- Construções abandonadas utilizadas por excursionistas na lagoa de Arituba: área externa................................................................................. 39- O dia de lazer na lagoa: Arituba................................................................ 91 91 94 94 99 103 103 104 40- O dia de lazer na lagoa: Boágua............................................................... 105 41- O dia de lazer na lagoa: Carcará.............................................................. 105 MAPAS 1234567- Mapa de localização do recorte espacial da pesquisa: lagoas de Arituba, Boágua e Carcará em Nísia Floresta (RN)................................ Mapa de localização dos acessos viários de Nísia Floresta (RN).......... Mapa de localização dos territórios dos comerciantes locais e dos e dos excursionistas na lagoa de Arituba, Nísia Floresta (RN).................. Mapa de localização dos territórios dos comerciantes locais e dos excursionistas, lagoa de Boágua, Nísia Floresta (RN)............................ Mapa de localização dos territórios dos comerciantes locais e dos excursionistas, lagoa de Carcará, Nísia Floresta (RN)............................ Mapa de localização das unidades emissoras de excursionistas: intermunicipais e interestaduais.............................................................. Mapa de fluxo turístico entre bairros de Natal (RN), emissores dos excursionistas, e as lagoas de Arituba, Boágua e Carcará..................... 38 55 83 84 85 114 115 QUADROS 12- Relação dos estabelecimentos comerciais cujos responsáveis foram entrevistados............................................................................................ Estabelecimentos de serviços de alimentação por lagoa, ano 2010....... 40 64 TABELAS 1- Opinião dos excursionistas sobre discriminação..................................... 96 2- Opinião sobre o espaço físico disponível aos excursionistas................... 96 34- Avaliação sobre a existência de conflitos durante as excursões nas unidades receptoras.................................................................................. Avaliação dos excursionistas a respeito da limpeza nas lagoas............... 100 5- Avaliação sobre a existência de receptores de lixo.................................. 100 6- Destino do lixo produzido pelos excursionistas ........................................ 100 7- Avaliação sobre a existência das instalações sanitárias........................... 101 8- Como resolve as necessidades fisiológicas.............................................. 102 9- Perfil dos excursionistas por gênero......................................................... 106 10- Perfil dos excursionistas por faixa etária................................................... 106 11- Nível de escolaridade dos excursionistas................................................. 107 12- Situação ocupacional dos excursionistas.................................................. 108 13- Atuação profissional dos excursionistas................................................... 108 14- Renda média dos excursionistas.............................................................. 109 15- Avaliação do consumo nas lagoas............................................................ 110 16- Média anual de excursões........................................................................ 111 17- Avaliação sobre as excursões nas lagoas de Nísia Floresta.................... 112 18- Lugar preferido para excursões................................................................ 116 19- Avaliação sobre o que os excursionistas gostam na paisagem das lagoas........................................................................................................ 20- Motivo das excursões................................................................................ 97 117 117 21- Avaliação sobre a alcunha de “farofeiro”................................................... 118 22- Avaliação sobre andar em grupo de “farofeiros”....................................... 119 SUMÁRIO 1 NOTAS INICIAIS DA PESQUISA........................................................... 12 2 DO ENCONTRO COM O OBJETO À PESQUISA DE CAMPO............. 2.1 OS “FAROFEIROS” EM EXCURSÃO, O CONTEXTO........................... 2.2 A DISCUSSÃO DE CONCEITOS: DO ESPAÇO AO EXCURSIONISMO.................................................................................. 2.3 A PESQUISA DE CAMPO: EXPLICAÇÃO DOS PASSOS DADOS....... 19 21 AS LAGOAS DE ARITUBA, BOÁGUA E CARCARÁ NA ROTA DO TURISMO POTIGUAR: UMA LEITURA SOBRE O PROCESSO DE PRODUÇÃO DO ESPAÇO..................................................................... 3.1 REFLEXÃO SOBRE O PROCESSSO DE PRODUÇÃO DO ESPAÇO................................................................................................. 3.2 A INTERVENÇÃO DO ESTADO E A INFRA-ESTRUTURA URBANA NECESSÁRIA AO TURISMO NAS LAGOAS......................................... 3.3 A APROPRIAÇÃO DO ESPAÇO PELO COMÉRCIO LOCAL, TURISTAS E PODER.PÚBLICO MUNICIPAL........................................ 28 36 3 UM “FAROFEIRO” INCOMODA MUITA GENTE, DOIS “FAROFEIROS” INCOMODAM MUITO MAIS: COMPREENSÃO DOS CONFLITOS TERRITORIAIS........................................................ 4.1 REFLEXÃO SOBRE UM TERRITÓRIO DE USO TURÍSTICO.............. 43 44 49 60 4 4.2 “FAROFEIROS”, PODER PÚBLICO E COMERCIANTES LOCAIS: CONFLITOS EXISTENTES E AS ESTRATÉGIAS DE SEGREGAÇÃO 4.3 A INFRA-ESTRUTURA DISPONÍVEL, UM DESRESPEITO AO CIDADÃO............................................................................................... 74 77 79 97 UMA OUTRA FACE DO TURISMO POTIGUAR: OS EXCURSIONISTAS EM DISCUSSÃO................................................... 104 5.1 PERFIL DOS EXCURSIONISTAS: GÊNERO, FAIXA ETÁRIA, ATUAÇÃO PROFISSIONAL E RENDA.................................................. 105 5.2 OS FLUXOS ESTABELECIDOS E AS MOTIVAÇÕES DOS EXCURSIONISTAS................................................................................. 110 5 5.3 OS EXCURSIONISTAS E A ALCUNHA DE “FAROFEIRO”................... 118 6 120 NOTAS FINAIS DA PESQUISA............................................................. REFERÊNCIAS....................................................................................... 125 APÊNDICES........................................................................................... 129 12 1 NOTAS INICIAIS SOBRE A PESQUISA O que dizer, hoje, sobre os novos rumos da pesquisa nas ciências humanas? Parece que nunca a crise dos paradigmas foi tão profunda, por nos sentirmos tão vulneráveis, os caminhos estão abertos e livres, deixando-nos à vontade para caminhar, convictos de que erraremos e acertaremos. [...]. Devemos privilegiar temas de relevância social que dêem à sociedade respostas para seus anseios mais profundos, para suas necessidades mais prementes. Adyr Balastreri Rodrigues O tema desta dissertação, intitulada Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar, desenvolveu-se após alguns questionamentos sobre a prática social do excursionismo, verificada nestas lagoas desde a década de 1990, onde em dias de domingos e feriados percebe-se a chegada de centenas de excursionistas os quais são denominados “farofeiros” pelo senso comum. Sobre o termo “farofeiro” dado aos excursionistas entende-se nesta pesquisa que é preconceituoso e pejorativo. Logo, sobre sua utilização ao longo deste trabalho é necessário enfatizar que se dá livre de qualquer preconceito por parte da pesquisadora, sendo usado sempre entre aspas no sentido de reproduzir o pensamento do senso comum ou de transcrever a fala de algum entrevistado. Assim, a utilização da palavra “farofeiro” já no título deste trabalho tem como objetivo expor de modo enfático a temática proposta, que é discutir sobre o que se denominou nesta pesquisa como sendo “uma outra face do turismo potiguar”, a face da atividade turística que é realizada pelas massas, a qual se mostra “pobre” e “feia”, que é negligenciada pelo poder público e repudiada por diversos agentes sociais nos espaços turísticos onde ocorre. É nesta “outra face” que se percebe o excursionismo, uma prática social entendida aqui como uma modalidade de turismo popular cuja demanda turística corresponde, predominantemente, às classes sociais menos favorecidas e que diante de seu baixo poder de consumo utiliza-se de alternativas criativas e de menores custos para ter direito a um dia de lazer em áreas de atratividade turística. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 13 Trata-se de um fenômeno social, comum, que ocorre, normalmente, em dias de domingo e feriados, dada a disponibilidade de tempo livre dos excursionistas, em sua maioria trabalhadores, os quais realizam uma viagem de poucas horas em direção às áreas de praias, lagoas, rios, balneários levando junto comida, bebida, churrasqueira, carvão, guarda-sol, cadeiras, entre outros itens que caracterizam a prática dos “farofeiros”. É válido observar que segundo a definição da Organização Mundial de Turismo (OMT), as pessoas que realizam excursões são denominadas excursionistas ou “visitantes de um dia”, e não turistas, pois não realizam pernoite. Contudo, apoiando-se na discussão realizada por Rodrigues (1997, p.113) que compreende a atividade como “turismo de um dia”, é que os excursionistas, são tratados nesta pesquisa, também, como turistas. Mas, antes de elucidar os pontos primordiais desta pesquisa cujo enfoque é a “face” negligenciada do turismo potiguar é importante um breve esclarecimento sobre a “face” privilegiada desta atividade e que não se restringe ao estado do Rio Grande do Norte. Trata-se do turismo enquanto uma atividade econômica rentável, planejada, inserida nos planos de governos federais, estaduais e municipais e viabilizada por políticas públicas. Uma atividade gerenciada por órgãos públicos, que atrai investimentos externos e desperta o interesse do setor privado. Uma “face” que se volta para o turismo de massa, na qual se estabelece várias formas da parceria público-privada e onde estão envolvidas grandes operadoras de turismo, como a CVC, TAM Viagens, Stella Barros que elaboram pacotes turísticos e são vendidos pelas agências de viagens. Outro esclarecimento importante é a definição adotada de turismo que nesta pesquisa é entendido como um fenômeno social, contemporâneo e complexo, que pressupõe uma descontinuidade espaço-temporal, uma quebra com o cotidiano e que tem no espaço seu principal objeto de consumo. É uma atividade moderna, que envolve a produção de espaços, apropriação de territórios e um consumo turístico, sobretudo, nas cartografias urbanas, apesar de ser desenvolvida nos mais diversos lugares do mundo. Trata-se de uma prática que permite análises, sob diversas óticas e que para sua realização envolve o deslocamento de pessoas pelo território, com incidências territoriais específicas, quer nas áreas de dispersão (emissoras), nas áreas de deslocamento ou nas áreas ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 14 de atração (receptoras) da demanda turística (CRUZ, 2002; FONSECA, 2005; FURTADO, 2005; GOMES, R., 2009; RODRIGUES, 1997). Neste sentido, realiza-se nesta pesquisa uma abordagem geográfica do turismo enquanto prática social, pondo-se em discussão um tema de grande relevância, pois o “excursionismo”, o “turismo das massas”, o “turismo de um dia”, “das excursões de farofeiros”, o turismo “do povão” é uma forma pela qual as classes menos abastadas da sociedade exercem sua cidadania e fazem valer o direito ao lazer. Discute-se aqui sobre uma forma de turismo que não é “pensada” pelo poder público e que ocorre à mercê das políticas públicas de turismo. Que ocorre em espaços produzidos e apropriados para o turismo de massa e que revela conflitos entre agentes sociais distintos, resultando numa prática marginalizada e segregada, conforme discursos e práticas observados ao longo da pesquisa, especialmente por parte de representantes do poder público municipal e comércio local que demarcam territórios nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará, recorte espacial da pesquisa. Para o início do estudo a questão central foi: como se dá a apropriação do espaço pela prática do excursionismo nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN) e sua relação com os agentes sociais diretamente envolvidos: comerciantes locais, bugueiros profissionais e poder público municipal? Ao mesmo tempo, outros questionamentos foram levantados e deram corpo à pesquisa dentre eles: como se dá o processo de produção do espaço turístico em questão? Quais os conflitos territoriais existentes diante do uso por diversos agentes? Quem são estes excursionistas e como se apropriam do espaço? Neste sentido, a hipótese que sustentou a discussão, foi de que, na área da pesquisa, a apropriação do espaço pelo excursionismo, realizado por turistas de baixo poder aquisitivo, se dá entre relações conflituosas, pois contraria a intencionalidade do mercado local, representados por comerciantes e prestadores de serviços locais, como barraqueiros e bugueiros; e, também, do poder público municipal os quais visam o aproveitamento do espaço turístico das lagoas com turistas de maior potencial de consumo. O objetivo geral desta pesquisa é de analisar como se dá a apropriação do espaço pela prática do excursionismo nas referidas lagoas; e para isso estabeleceuse como objetivos específicos: compreender o processo de produção do espaço; ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 15 estudar as relações existentes entre excursionistas, comerciantes locais e poder público municipal; e, conhecer os excursionistas que se apropriam deste espaço, considerando o perfil, a origem, os fluxos e as motivações que levam centenas de excursionistas, em dias de domingos e feriados, à área em estudo. Para a análise do fenômeno foi necessário ampliar a escala de observação, compreendê-lo além das lagoas, entender sua ocorrência no município de Nísia Floresta, o qual integra a Região Metropolitana de Natal e considerar sua proximidade com a capital, Natal, cuja distância aproximada é de 25 km, o que viabiliza diversos fluxos turísticos, inclusive de excursionistas. Outro aspecto importante foi perceber que o excursionismo se dava ao sul do litoral oriental potiguar, área de investimentos diretos das políticas públicas para o desenvolvimento da atividade turística, desde a década de 1980, o que propiciou a inclusão das lagoas na rota do turismo sol e mar, consolidado nesta porção do estado do Rio Grande do Norte e que, atualmente, caracteriza com mais intensidade o turismo potiguar. Ou seja, foi relevante observar que o turismo de caráter popular se realiza em espaços que interessam ao turismo de massa, onde as lagoas assumem o papel de mais um produto turístico a ser consumido pelos turistas que visitam os dois principais pólos turísticos do estado: Natal e Pipa. Nesta perspectiva, o recorte temporal delimitou-se da década de 1990 aos dias atuais, período em que se observa a prática do excursionismo nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará, conforme identificado na pesquisa; ao mesmo tempo em que se dão na área de estudo resultados diretos e indiretos de políticas públicas para o desenvolvimento do turismo potiguar, dotando a área de pesquisa de uma infra-estrutura urbana, principalmente, de acessos viários, que vem possibilitando fluxos turísticos de excursionistas, oriundos de vários municípios da Região Metropolitana de Natal, do interior do Rio Grande do Norte e até de estados vizinhos, como Paraíba e Pernambuco. Em termos de desenvolvimento metodológico realizou-se na pesquisa de campo, ao longo de dois anos, a observação in loco, conversas informais, entrevistas estruturadas através de questionários, junto aos agentes sociais envolvidos, como excursionistas, organizadores de excursão, comerciantes locais e representantes do poder público municipal. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 16 A pesquisa documental se deu através de sites oficiais, pela internet, além das solicitações diretas em órgãos públicos dentre os quais: Departamento de Estradas e Rodagens do Rio Grande do Norte (DER), Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente (IDEMA) e Secretaria Municipal de Turismo e Meio Ambiente (Prefeitura Municipal de Nísia Floresta). Além da etapa empírica, realizou-se a busca pelo aporte teórico o qual foi encontrado em bancos de teses e dissertações, periódicos e revistas eletrônicas, de modo que se obteve colaborações de outras ciências através de estudos realizados sobre a temática do excursionismo nas Ciências Sociais e pelo Turismo, como exemplo. Para a análise do fenômeno, foi estabelecido o diálogo com autores que subsidiaram a discussão como: Adyr Balestreri Rodrigues, Milton Santos, Guilherme de Alcântara, John Urry, Edna Maria Furtado, Silvia Rubino, Rita de Cássia Ariza Cruz, entre outros, na perspectiva de uma abordagem interdisciplinar, uma vez que a temática do excursionismo envolve categorias de análises como espaço, território, lazer e segregação as quais nortearam a discussão sobre a prática do excursionismo. A dissertação está organizada em cinco partes, relacionadas entre si apontando as respostas ao objetivo geral da pesquisa, ao mesmo tempo que possuem certa autonomia de compreensão, pois cada uma atende aos objetivos específicos deste estudo. As reflexões teóricas estão dispostas sempre que necessárias, visando uma indissociabilidade entre o teórico e o empírico, de modo a gerar uma melhor compreensão do fenômeno do excursionismo. Assim, na primeira parte da dissertação intitulada Do encontro com o objeto à pesquisa de campo, realizou-se uma exposição da problemática, justificativa, questionamentos, hipótese e objetivos traçados, além de uma discussão teórica que fundamenta o excursionismo, e por fim, argumenta-se sobre a opção metodológica que dá sustentação às análises posteriores. Na segunda parte, como explicita o título, As lagoas de Arituba, Boágua e Carcará na rota do turismo potiguar, uma leitura sobre o processo de produção do espaço, refletiu-se sobre o processo de produção do espaço para o uso turístico, considerando as repercussões das políticas públicas de infra-estrutura que possibilitaram a entrada das lagoas na rota do turismo potiguar; além de caracterizar ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 17 os modos atuais de apropriação do espaço pelo poder público, comércio local, e os vários tipos de turistas que visitam as lagoas. Em seguida, no capítulo intitulado: Um “farofeiro” incomoda muita gente, dois “farofeiros” incomodam muito mais: compreensão dos conflitos territoriais, a pesquisa voltou-se ao estudo das relações existentes entre os agentes sociais diretamente envolvidos com o excursionismo neste território turístico, enfatizando as práticas e discursos do poder público municipal como, também, dos comerciantes locais. No quarto capítulo, denominado Uma outra face do turismo potiguar: os excursionistas em discussão, o enfoque foi analisar o perfil dos excursionistas, quanto ao gênero, renda salarial, atuação profissional; e, ao mesmo tempo, conhecer os fluxos estabelecidos pelas excursões, no território potiguar, e quais as motivações que mobilizam os excursionistas às lagoas em estudo. E, por fim, discorre-se sobre as considerações finais desta pesquisa, que aqui, numa antecipação das respostas aos questionamentos que subsidiaram a investigação, destacamos que a apropriação do espaço pelos excursionistas nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará, é conflituosa, pois contraria os interesses de agentes sociais diretamente envolvidos: excursionistas, poder público municipal e a maioria dos comerciantes locais. Observou-se que é uma prática que incomoda o poder público municipal o qual reage negligenciando e segregando a atividade através da omissão no seu papel de ordenador do uso do território. Um incômodo facilmente percebido junto aos comerciantes locais que utilizam estratégias de segregação, ao impor barreiras físicas e simbólicas demarcando territórios. A realidade denuncia que o espaço, que atualmente exerce uma função turística, se vê contraditoriamente apropriado pelo turismo de massa e, também, das massas. Enfim, pode-se dizer que os excursionistas burlam variadas estratégias de segregação e que a prática ocorre meio a relações que, normalmente, contrariam e incomodam outros agentes envolvidos. Mas a pesquisa apontou, também, que apesar do baixo poder de consumo os turistas de classes populares já se apresentam como uma demanda turística economicamente interessante para alguns agentes do mercado, uma vez que mobiliza, na área da pesquisa, um expressivo ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 18 fluxo de pessoas há, pelo menos, duas décadas, o que acaba por repercutir de modo significativo no setor formal e informal da economia. É válido ressaltar que a realização desta pesquisa é compreendida como o início de uma caminhada acadêmica, em que foram dados os primeiros passos, permitindo, aqui, análises embasadas em um corpo teórico e empírico, cujas entrelinhas apontam novos caminhos de investigação, os quais poderão servir de subsídios para outros estudos mais aprofundados. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 19 2 DO ENCONTRO COM O OBJETO À PESQUISA DE CAMPO O respeito ao indivíduo é a consagração da cidadania, [...]. A cidadania é uma lei da sociedade que, sem distinção, atinge a todos e investe cada qual com a força de se ver respeitado contra a força, em qualquer circunstância. Milton Santos O caminho percorrido para o “encontro” com o objeto de investigação desta pesquisa que envolve a apropriação de espaços turísticos pelas classes populares, como um exercício da cidadania em busca do direito ao lazer, iniciou-se ainda na graduação, a partir de um estudo de minha autoria sobre o turismo potiguar no qual, sob outro enfoque, foi abordada a relevância que a atividade turística e as políticas públicas de turismo exercem nas transformações espaciais do litoral oriental potiguar, tomando como recorte a Praia de Pirangi do Norte-Parnamirim/RN (sobre o assunto ver ARRUDA, 2006). Com a entrada no Programa de Pós-Graduação e Pesquisa em Geografia (PPGe), surge a oportunidade de ampliar os estudos sobre o turismo potiguar, desta vez, considerando a atratividade turística das lagoas de Nísia Floresta, município, também, localizado ao sul do litoral oriental potiguar. Contudo, a construção dos propósitos desta pesquisa se deu após importantes discussões acadêmicas, como resultado dos momentos de orientação e das relevantes colaborações do exame de qualificação no qual foram apontadas outras possibilidades de estudo. E, com a aproximação teórica, foi possível enxergar, no entorno das lagoas de Arituba, Boágua e Carcará, o problema de investigação desta pesquisa: a prática social do excursionismo, um turismo realizado pelas classes populares. De grande relevância, também, foi a experiência enquanto moradora do município, à margem da lagoa da Ilhota, nas proximidades da área de estudo1. A partir do que foi possível perceber a existência de conflitos entre diversos agentes que se apropriavam deste espaço entre eles: moradores “nativos”, proprietários das 1 Esta lagoa não está inserida no recorte espacial da pesquisa pois não atende aos critérios metodológicos estabelecidos e esclarecidos na última seção deste capítulo. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 20 residências secundárias, e mais recentemente, com a chegada dos primeiros “farofeiros”, todos compartilhando da lagoa para o lazer. Outro aspecto importante para este “encontro” foi ter observado desde a década de 1990 a construção e melhorias constantes na rodovia estadual conhecida como Rota do Sol, obras cujos recursos são provenientes do Programa para o Desenvolvimento da Atividade do Turismo (PRODETUR/RN). Uma rodovia na qual se verifica intenso fluxo de turistas seja através de passeios de buggy ou mesmo de ônibus de excursão. Mas, de modo subjetivo, um sentimento foi plantado pela professora Maria Adélia Aparecida de Souza, em sua passagem por esta Universidade, ainda no primeiro semestre de 2008, quando em seu discurso estava o apelo para que os trabalhos de pesquisa preocupassem-se com os “pobres”. Que tarefa difícil! Como falar de “pobre” discutindo o turismo potiguar, cuja produção acadêmica volta-se para o planejamento da atividade econômica, políticas públicas, turismo receptivo, atração de grandes empreendimentos imobiliários, etc.? A minha pouca experiência acadêmica não permitia vislumbrar ou defender a relevância de outro enfoque, a não ser, analisar mais uma vez, esta face do turismo potiguar. E, neste sentido, as provocações da professora Maria Adélia acabaram me remetendo às palavras manuscritas pela minha mãe quando ainda jovem já demonstrava sua preocupação com o próximo, com os menos abastados “da serra”, sempre inquietada com a indagação: “E os outros?”2. Por todo o exposto, afirmo que a associação dos elementos aqui apontados com mais um retorno à área da pesquisa, numa manhã de um domingo de sol3 possibilitaram o “encontro” com um objeto de investigação de relevância social: na paisagem da lagoa de Boágua encontravam-se vinte ônibus estacionados, oriundos de outros municípios e estados, pelos quais foram transportadas centenas de pessoas, ávidas por um dia de lazer, turistas conhecidos pejorativamente como um 2 Esta indagação está contida num manuscrito de autoria de Eliza Paiva de Luna (acervo pessoal), escrito na década de 1960, quando foi oradora da turma do 3º ano pedagógico do Ginásio “Regina Coeli” de Limoeiro (PE). 3 A pesquisa de campo, normalmente, se dava de segunda à sábado, por motivações pessoais da pesquisadora, porém o excursionismo só pode ser observado num dia de domingo, dada a própria especificidade do fenômeno. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 21 “bando de farofeiro” que realizam uma viagem de poucas horas passar um dia diferente num território turístico. 2.1 OS “FAROFEIROS” EM EXCURSÃO, O CONTEXTO Após o “encontro” com o objeto de investigação o exercício foi a leitura da paisagem que permitiu a contextualização do fenômeno da excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará, em Nísia Floresta/RN. Segundo Santos (2008, p.103), “Paisagem e espaço não são sinônimos”, a paisagem é o conjunto das formas, de objetos reais e concretos, de elementos naturais e artificiais que fisicamente caracterizam uma área, referente a uma porção, possível de ser percebida pela visão, e que, num dado momento, exprimem heranças que representam as sucessivas relações localizadas entre homem e natureza, juntando objetos passados e presentes. Contudo, Santos (2008) adverte que para alcançar o conhecimento, as formas contidas na paisagem, dão um ponto de partida, mas está longe de oferecer sozinhas, uma explicação. Segundo Rodrigues (1997) uma das formas de entender o espaço geográfico é a partir da paisagem pois esta contém a energia necessária para estimular as dez modalidades sensoriais pelas quais contata-se o mundo externo, dentre elas a visão, a audição, o olfato, que se combinam na percepção e possibilitam captar uma parte da realidade, mas esta autora alerta, ler a paisagem é muito mais complexo do que ver e percebê-la. Assim, para a análise inicial do fenômeno, a noção de paisagem foi importante, permitindo perceber “os farofeiros” em excursão. Entretanto, foi a compreensão de Santos (2008, p.103) sobre o espaço, que propiciou uma releitura sobre esta outra face do turismo potiguar para quem “o espaço são essas formas mais a vida que as anima”, é sempre presente, uma construção horizontal, mediante acumulações e substituições, onde a ação das diferentes gerações se superpõe. Nesta perspectiva, a categoria de espaço tornou-se mais significativa para contextualizar e interpretar o fenômeno do excursionismo, “a face ignorada, mas não ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 22 abolida, que vem se impondo, como face escondida sob a face reconhecida” como no dizer de François Ricci (1974 apud Santos, 2008). Com estas noções partiu-se a verificar a intensidade do fenômeno4, os fluxos existentes e o perfil dos excursionistas nas lagoas em estudo e, a partir da observação do número de ônibus que chegam aos domingos e feriados cada qual trazendo uma média de cinqüenta passageiros, pode-se constatar que se tratava de uma prática intensa e comum. Para fins de ilustração da demanda de excursionistas que freqüentam as lagoas em estudo aponta-se o relato de alguns entrevistados. Segundo Eugênio Domingos5 comerciante da lagoa de Arituba, no feriado de primeiro de janeiro de 2010, contabilizou-se trinta e dois ônibus de excursão, o que significa uma média de 1.600 excursionistas; em relação à Boágua, Flávio César6 afirma: “aqui já chegou a ter cinqüenta e seis ônibus num dia de domingo”, totalizando cerca de 2.800 excursionistas; por fim, o fenômeno se assemelha em Carcará pois segundo Oziel Enéas7, “teve domingo de dar sessenta ônibus aqui” o que representa a chegada de três mil excursionistas numa pequena faixa de terra nesta lagoa (ver fotografias 1 e 2). 1 2 Fotografias 1 e 2 - Ônibus de excursão estacionados nas proximidades da lagoa de Boágua (1) e Carcará (2). O dia de lazer destes excursionistas se dá em meio ao som das batucadas, do cheiro do churrasco, dos banhos em águas transparentes que encantam adultos 4 É válido notar que sobre esta demanda turística não existem dados estatísticos em nenhum órgão municipal. 5 Proprietário da Pastelaria e Petiscaria Gosto da Terra, entrevistado em 30 jan. 2010, lagoa de Arituba. 6 Proprietário do Balneário Boágua, entrevistado em 7 fev. 2010, lagoa de Boágua. 7 Proprietário da Barraca do Oziel e Palhoção Casa Show, entrevistado em 13 fev. 2010, lagoa de Carcará. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 23 e crianças, e das sombras das árvores, onde redes são armadas (ver fotografias 3 e 4). A alegria destes visitantes é estampada nos rostos mesmo que só disponham de uma estreita faixa de terra às margens das lagoas onde é comum encontrar amontoados de lixo, cercas e muros. 3 4 Fotografias 3 e 4- Excursionistas na lagoa de Boágua, Nísia Floresta/RN. Ao se observar o espaço, objetos e ações anunciam que outros agentes sociais, também, se apropriam deste, além dos excursionistas. A presença de agentes de mercado é verificada através dos vários ônibus fretados que servem ao deslocamento dos excursionistas; pelos comerciantes de alimentos e bebidas, picolé ou churrasquinho; pelos que alugam brinquedos aquáticos (caiaques e pedalinho); do mesmo modo que se verifica a apropriação do espaço por turistas das segundasresidências (casas de veraneio ou granjas) que ocupam a outra margem da lagoa; bem como, do poder público municipal que demarca seu território com placas de sinalização, as quais informam que as lagoas estão inseridas na Área de Proteção Ambiental Bonfim-Guaraíra8. Assim, ao observar que neste espaço encontram-se diferentes sujeitos sociais, cada qual se apropriando conforme sua intencionalidade, levantam-se questões sobre: apropriação do espaço, relações de poder, formação de territórios e existência de conflitos. O fenômeno aqui observado é comum, também, em outros estados brasileiros, como no caso do litoral paulista estudado por Rodrigues (1997, p. 119), 8 A Área de Proteção Ambiental (APA) Bonfim/Guaraíra, está situada nos municípios de Nísia Floresta, São José de Mipibu, Goianinha, Senador Georgino Avelino, Tibau do Sul e Arês, criada pelo Decreto Estadual/RN 14369, de 22 de março de 1999. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 24 Como deslocamentos de lazer, o fenômeno mais expressivo no Estado de São Paulo, do ponto de vista do número de pessoas que se desloca, são as excursões domingueiras cuja demanda é representada por elementos das camadas sociais economicamente menos privilegiadas da população, pejorativamente conhecidos como „farofeiros‟. Ainda segundo Rodrigues (1997) é através de “excursões piratas” que a viagem, sinônimo de status social, é vendida e aos domingos descem centenas de ônibus em direção às praias, em especial as que se localizam na Baixada Santista, dada a sua proximidade da metrópole paulista. Porém, estas excursões acontecem com restrições impostas pelo poder público, do tipo multas e colocação de obstáculos que impedem o acesso dos ônibus às praias paulistas. E, assim, “fere-se por iniciativa oficial os direitos básicos do cidadão, garantidos por lei, como o direito de ir e vir e o uso da praia, que é patrimônio público” (RODRIGUES, 1997, p. 120). A respeito das excursões no litoral paulista Rubino (2004, p.1), também, enfoca e caracteriza a prática na praia de Bertioga, Num domingo de janeiro de 1993 a pacata cidade de Bertioga [...], amanheceu completamente tomada por ônibus de excursão, um verdadeiro mar de pessoas ávidas por passar um dia de lazer na praia. Este dia ficou marcado na vida dos cidadãos bertioguenses e dos turistas que presenciaram tal situação de superlotação da cidade, que apesar de oferecer infra-estrutura por meio do terminal turístico, não suportou a presença de aproximadamente 1.200 ônibus de excursão que acessaram ao mesmo tempo o município. Rubino (2004) enfatiza que desde a década de 1990 o excursionismo tem sofrido inúmeras restrições no município de Bertioga, uma vez que não tem oferecido condições adequadas para receber este público, além de ser comum a intervenção da polícia local no sentido de controlar o fluxo de excursionistas, através da formação de bloqueios nas entradas do município para impedir o excesso de excursionistas. Contudo, apesar das ações restritivas, pelo descaso na infraestrutura ou por bloqueios policiais, Bertioga ainda convive com o excesso de ônibus de excursões clandestinas. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 25 A “invasão” das praias por estes excursionistas é visto também em Mangaratiba, município do litoral do estado do Rio de Janeiro, conforme aponta o estudo de Alcântara (2005, p. 82), A farofa e a galinha, as bebidas em isopores, instrumentos musicais, as falas e brincadeiras em tom elevado, a bebedeira e suas possíveis conseqüências para a perturbação da ordem e da tranqüilidade dos lugares destino, imagens consagradas desse tipo de prática social, representam hábitos presentes em segmentos das nossas classes populares. Alcântara (2008) afirma que a maioria das excursões chega aos domingos, trazendo excursionistas com baixo poder aquisitivo os quais são oriundos das zonas oeste e norte do Rio de Janeiro e da baixada Fluminense. É válido enfatizar que esta prática é comum em outras regiões do território brasileiro, como demonstra, o estudo realizado por Ribeiro (2007), que observa os conflitos decorrentes da prática do excursionismo na Ilha do Mosqueiro em Belém (PA); bem como, em outras partes do mundo, apresentando-se sempre como uma manifestação social segregada e inferiorizada (URRY, 2001). Segundo Urry (2001) pode-se dizer que as origens deste tipo de deslocamento, realizado pelas classes trabalhadoras, em busca de um dia de lazer, tem seus registros iniciais em sociedades industriais avançadas. Para este autor os balneários marítimos da Inglaterra, já no século XIX, assumiam valores diferentes ao olhar do turista dependendo do “tom social” dos lugares que recebiam as massas de trabalhadores, Desenvolveu-se uma „hierarquia‟ do balneário e certos lugares passaram a ser vistos como corporificações do turismo de massa, a serem desprezados e ridicularizados. Grandes diferenças de „tom social‟ se estabeleceram em lugares que, de resto, eram semelhantes. Alguns desses lugares -os balneários da classe trabalhadora- desenvolveram-se rapidamente como símbolos do „turismo de massa‟, lugares de inferioridade que representavam tudo aquilo que os grupos sociais dominantes consideravam de mau gosto, comum e vulgar. (URRY, 2001,p.35) Como tentativa de mitigar o fenômeno, restrições quanto ao uso destes balneários foram impostas, conforme anuncia Urry (2001, p.35). ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 26 No entanto, à medida que os banhos de mar tornaram-se relativamente mais favorecidos, ficou mais difícil, para os grupos socialmente dominantes, restringir o acesso. [...]. Em 1824 o terreno do balneário foi cercado e instalou-se uma guarita, com entrada paga a fim de excluir as „classes impróprias‟. Entretanto, apesar das restrições impostas o excursionismo é uma realidade expressiva seja no litoral inglês ou iraquiano (fotografia 5); nas praias do litoral paulista (Praia Grande, Bertioga, Ubatuba, São Vicente) e carioca (Mangaratiba e Cabo Frio), nas margens do Lago Paranoá (Brasília) ou no litoral potiguar (Praia de Pipa, lagoa do Boqueirão, Lagoa da Cutia) e, também, nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará em Nísia Floresta. Fotografia 5- Excursionistas Iraquianos (sunitas e xiitas) no lago Habbaniya, Iraque. Fonte: <http://blog.estadao.com.br/blog/carranca/opiscinaoderamosdebag da>. Acesso em: 28 jan. 2010. O contexto apresentado sobre esta atividade, a qual recebe variadas denominações “excursão de farofeiros”, “turismo da classe trabalhadora”, “turismo de um dia”, “piquenique”, demonstra que esta atividade turística é marcada por relações conflituosas entre os que buscam um dia diferente de lazer e os agentes mais favorecidos da sociedade, os quais se expressam através de atitudes segregadoras que ferem, sobretudo, a cidadania. Neste sentido, a discussão do excursionismo torna-se relevante objeto de investigação, pois aborda de modo específico um direito previsto na Declaração Universal dos Direitos do Homem9, que no Artigo 24, estabelece: todo o homem tem 9 Disponível em: <http://www.fundap.sp.gov.br/ouvidoria/dados/dudh.pdf>. Acesso em: 03 jan. 2010. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 27 direito a repouso e ao lazer; ao mesmo modo que é compreendido como um direito social pela Constituição da República Federativa do Brasil10: o. Art. 6 São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (grifo nosso). É através do excursionismo que o direito ao lazer é buscado, por cidadãos que compõem uma parcela da sociedade com baixo poder aquisitivo, os quais se agrupam, na maioria das vezes, entre familiares e amigos e se deslocam de seu lugar de residência a lugares com atratividade turística. Uma prática que “invade” espaços produzidos para segmentos da sociedade com maior poder de consumo e que acaba burlando as restrições impostas, resultando em conflitos territoriais entre os distintos agentes sociais nas unidades receptoras, como resume a letra da música: Nós vamos invadir sua praia, do grupo Ultraje a Rigor. Daqui do morro dá pra ver tão legal O que acontece aí no seu litoral Nós gostamos de tudo, nós queremos é mais Do alto da cidade até a beira do cais Mais do que um bom bronzeado Nós queremos estar do seu lado Nós 'tamo' entrando sem óleo nem creme Precisando a gente se espreme Trazendo a farofa e a galinha Levando também a vitrolinha Separa um lugar nessa areia Nós vamos chacoalhar a sua aldeia Mistura sua laia Ou foge da raia Sai da tocaia Pula na baia Agora nós vamos invadir sua praia Daqui do morro dá pra ver tão legal O que acontece aí no seu litoral Nós gostamos de tudo, nós queremos é mais Do alto da cidade até a beira do cais 10 Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 03 jan. 2010. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 28 Mais do que um bom bronzeado Nós queremos estar do seu lado Agora se você vai se incomodar Então é melhor se mudar Não adianta nem nos desprezar Se a gente acostumar a gente vai ficar A gente tá querendo variar E a sua praia vem bem a calhar Não precisa ficar nervoso Pode ser que você ache gostoso Ficar em companhia tão saudável Pode até lhe ser bastante recomendável A gente pode te cutucar Não tenha medo, não vai machucar Por todo o contexto em que se dá o excursionismo, a análise desta prática social se torna relevante através de uma abordagem geográfica, e, nesse sentido se discorre, em seguida, sobre conceitos fundantes, do espaço ao excursionismo, a partir das relevantes contribuições de estudos realizados sobre a temática. 2.2 A DISCUSSÃO DE CONCEITOS: DO ESPAÇO AO EXCURSIONISMO Nesta parte do trabalho, define-se o objeto de estudo da pesquisa e o modo de abordagem. Inicialmente retoma-se a compreensão corrente do termo excursionismo, que se refere à realização de viagens organizadas em grupo, caracterizadas por um menor custo, cujas finalidades são diversas: seja comercial, a exemplo os “sacoleiros” que viajam para Caruaru-PE; de cunho religioso, como as romarias à cidade de Padre Cícero Romão no Crato-CE; e, também, por lazer onde pessoas se deslocam para áreas de praia, rios, açudes, barragens ou lagoas. Diante do exposto, ressaltamos que o excursionismo, é discutido neste estudo como uma forma de lazer, uma modalidade de turismo. Uma abordagem que é realizada por poucos estudiosos, o que é comentado por Alcântara (2005, p.12), Que diferente! As pessoas acham inusitado um trabalho sobre farofeiros. Todo mundo sabe que as excursões de farofeiros existem e todos identificam o que é. Mas por que tanta surpresa? Uma razão pode estar ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 29 relacionada ao fato que no mundo acadêmico dominado pela classe média, essa prática é desvalorizada. Na verdade, para muitos é invisível, ou se não o é, ao menos muitas pessoas gostariam que fosse. Entretanto, apesar do pequeno número de trabalhos a respeito da temática, esta pesquisa contou com relevantes trabalhos realizados por geógrafos, turismólogos, cientistas da comunicação social e sociólogos, nos quais a atividade é abordada a partir de categorias de análises como espaço e lazer. A princípio, é necessário ressaltar que se pretende neste estudo a interpretação geográfica de um fenômeno social, realizado por parcelas da sociedade que anima as formas espaciais. O espaço é aqui entendido conforme Santos (2008) anuncia: um resultado da inseparabilidade entre sistemas de objetos e sistemas de ações; um híbrido, cujas formas possuem um conteúdo, um misto de fixos e fluxos como sugere este autor para a análise do objeto de estudo da geografia que é o espaço geográfico. Assim, no sistema de ações que compõe o espaço, uma delas compreende o excursionismo, ação realizada por uma parcela da sociedade cuja intenção é a prática do lazer e que é atraída por um sistema de objetos naturais (como a lagoa) e viabilizada por tantos outros objetos artificiais (meios de transportes, estradas, etc.). Além da importância do espaço, outro pressuposto teórico para compreender o excursionismo é a categoria de lazer, entendido nesta pesquisa como propõe Dumazedier (1973, p. 34), O lazer é um conjunto de ocupações às quais o individuo pode entregar-se de livre vontade, seja para repousar, seja para divertir-se, recrear-se e entreter-se ou, ainda para desenvolver sua informação ou formação desinteressada, sua participação social voluntária ou sua livre capacidade criadora, após livrar-se ou desembaraçar-se das obrigações profissionais, familiares e sociais. Para este autor, o lazer é definido, nos dias de hoje, como sendo oposto ao conjunto das necessidades e obrigações da vida cotidiana, e apresenta-se como um elemento central na cultura de milhões de trabalhadores. O direito ao lazer resulta dos avanços das leis trabalhistas ao estabelecer uma carga horária máxima para o trabalhador, cujo tempo disponível é então, ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 30 apropriado para o lazer e descanso. Diz Rodrigues (1997) que, os movimentos sociais da classe trabalhadora conquistam um tempo livre diário, semanal e anual cada vez maior, e esse tempo passa a ser expropriado pela sociedade de consumo de massa que cria, então, novas necessidades. Dumazedier (1973) questiona se o lazer seria o novo ópio do povo, onde o operário contentar-se-ia em vender sua força de trabalho, como se fosse uma mercadoria, a fim de poder usufruir o produto dessa venda no tempo fora do trabalho. Ainda segundo este autor o lazer funda uma nova moral de felicidade e o homem é incompleto, atrasado, e de certo modo alienado, se não aproveita ou não sabe aproveitar seu tempo livre. Não adentraremos neste estudo na discussão conceitual sobre tempo livre, ócio, recreação, contudo, uma distinção se faz necessária para compreender o excursionismo, “turismo e lazer são atividades simbióticas, podendo existir lazer sem turismo, porém turismo pressupõe deslocamento e lazer” como aponta Rodrigues (1997, p. 80). Esta autora entende que foi introjetada na mente dos indivíduos uma nova necessidade – a do lazer, lato sensu e da recreação, esportes e turismo, no sentido mais restrito. Como expressão da ideologia, na sociedade contemporânea, a viagem turística é tida como necessidade, sendo incorporada artificialmente em prol das necessidades básicas do homem, o homem urbano, que constitui o chamado Homo turisticus ou Homo viajor, um produto da sociedade de consumo. Um sentimento que é alimentado pela insatisfação nascida dentro do quadro de vida urbano, pela vontade de romper com o cotidiano, escapar da rotina, vendendo-se o espaço turístico como paraíso. (RODRIGUES, 1997). Sobre a viagem, em particular, esta autora (idem, p.40) defende que, “é incorporada como uma necessidade fisiológica para a reposição de energias físicas e mentais [...]”. Afirma ter se tornado uma obrigação, e que nos dias atuais, quase todas as camadas sociais da população têm acesso à viagem, quer através dos sofisticados cruzeiros de volta ao mundo pelos que se encontram no ápice da pirâmide social, quer pelo domingo em praias através de ônibus de excursão, prazerosamente desfrutado pelas camadas sociais menos favorecidas da população. Rodrigues (1997) argumenta que a viagem funciona como importante meio promotor do “status social”, para aquisição de prestígio, e complementa, com ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 31 contribuições a esta pesquisa o turismo, antes restrito aos grupos sociais mais privilegiados, hoje se transforma em um produto da sociedade de consumo de massa e guardadas as devidas proporções, todos viajam, como os “farofeiros em excursão”. Nesse momento é importante trazer a definição de turismo de massa recorrendo-se a Cruz (2003, p.6) que diz, Turismo de massa é uma forma de organização do turismo que envolve o agenciamento da atividade bem como a interligação entre agenciamento, transporte e hospedagem de modo a proporcionar o barateamento dos custos da viagem e permitir, conseqüentemente, que um grande números de pessoas viagem. (grifo nosso) Diante do exposto por Cruz (2003), observam-se algumas semelhanças entre o turismo de massa e as “excursões de farofeiros” uma vez que estas, também, prescindem de uma organização, algumas vezes iniciada com meses de antecedência cujo pagamento da viagem pode até ser parcelado; outra semelhança diz respeito ao agenciamento realizado pelos organizadores da excursão junto às empresas de transportes; necessita-se, portanto, de um meio de transporte para o deslocamento, clandestino ou não (como as linhas especiais licenciadas pelo Ministério do Turismo); e que do mesmo modo, buscam, o barateamento dos custos da viagem (no âmbito desta pesquisa custam entre R$ 3,00 e R$ 45,00 dependendo da distância entre unidade emissora e receptora), o que acaba permitindo que um grande número de pessoas viagem. As excursões que se destinam às lagoas de estudo mobilizam fluxos de viajantes que chegam a 3.000 pessoas no tempo livre da classe trabalhadora, que é o dia de domingo e feriados. Entretanto, apesar destas semelhanças, compreender o excursionismo como turismo de massa contraria o pensamento de Cruz (2003, p.6), para esta autora turismo de massa não significa “turismo das massas”, pois estas Não fazem turismo porque não reúnem as condições materiais e imateriais necessárias para isso, ou seja, ou não têm os recursos financeiros necessários para empreender uma viagem ou não têm tempo livre, ou ainda não dispõem nem de uma nem de outra condição. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 32 Assim, com base nesta definição, discorda-se de Cruz (2003) uma vez que diante das semelhanças levantadas anteriormente, juntamente com os dados dispostos ao longo dos capítulos seguintes desta pesquisa permite inferir que as massas, entendidas como as camadas populares da sociedade também fazem turismo. Por tratar-se de turismo é importante enfatizar que é entendido como um fenômeno complexo, uma prática social e uma atividade produtiva, revestido de um tríplice aspecto com incidências territoriais específicas, como no dizer de Rodrigues (1997, p.83), Trata-se de um fenômeno que apresenta áreas de dispersão (emissoras), áreas de deslocamento e áreas de atração (receptoras). É nessas áreas que se produz o espaço turístico ou se reformula o espaço anteriormente ocupado. É aqui também que se dá o consumo do espaço. De outro modo a definição de turismo trazida por Cruz (2003, p.5), corrobora com a definição adotada nesta pesquisa, “é, antes de mais nada, uma prática social, que envolve o deslocamento de pessoas pelo território e que tem no espaço geográfico seu principal objeto de consumo”. O turismo é uma atividade transformadora de espaços e produtora de territórios, sobretudo, nas cartografias urbanas, mas que se desenvolve nos mais diversos lugares do mundo, revestida por um manto de complexidade que permite extensas análises, sob óticas diversas, como no dizer de Furtado (2007, p.120), que complementa, “[...] nesse sentido, como prática social configuradora de um conjunto de atividades econômicas, o turismo reproduz, como qualquer outro setor produtivo, as contradições do sistema capitalista”. Então, é partindo destes pressupostos, que o excursionismo é compreendido, enquanto uma prática social, voltada para o lazer turístico, apresentando uma dinâmica que rebate no espaço, mesmo que praticada por uma parcela da sociedade menos favorecida. É um fenômeno de massa que prescinde do espaço turístico, e de deslocamento, cabendo então, aos excursionistas, a denominação de “turistas”, ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 33 apesar de contraria as definições propostas pela Organização Mundial de Turismo (OMT), como visto anteriormente. Sobre a definição de excursionismo, a pesquisa apoiou-se na obra da Professora Adyr Balestreri Rodrigues, Turismo e Espaço, rumo a um conhecimento transdisciplinar (1997), na qual dois ensaios abordam a temática num estudo de caso sobre o litoral paulista: “Tempo livre como objeto de consumo e lazer dirigido como oportunidade de manipulação” e “O domingo na praia - felicidade ao preço da segregação”. Nestes estudos o excursionismo é discutido como expressão do lazer, focalizando a população pobre do Estado de São Paulo. Rodrigues (1997, p.112), defende que as excursões de um dia, pelo fato de incluir um razoável deslocamento do domicílio, podem conceitualmente, expressar um tipo de turismo, chamado “turismo de um dia”. A autora entende o fenômeno como uma expressão de lazer massificado, que prescinde do deslocamento e por esta mobilidade pode ser designada como excursionismo; aborda, também, as restrições, que são impostas por diversos agentes sociais, quanto ao uso do espaço por parte destes turistas; e menciona que as “excursões piratas” incluem-se no setor informal da economia. Outro geógrafo que abordou a temática foi Guilherme de Alcântara (2005), cuja obra é intitulada: “Abaixo a farofa! exclusão "legitimada" em territórios de praia”. O recorte espacial deste estudo compreende parte do litoral carioca, Cabo Frio e Mangaratiba, municípios que desde o final dos anos de 1990, apóiam-se num discurso em prol do desenvolvimento local e promovem intervenções voltadas para a reorganização dos seus espaços de consumo turístico, resultando em restrições quanto ao acesso das "excursões de farofeiros" às praias locais. Esta análise corrobora com a presente pesquisa quando, da mesma forma, a imagem negativa do "farofeiro" é usada pelo poder público como justificativa para a manipulação do território produtora de um padrão de marginalização que se apóia na privatização do espaço público. Para Alcântara (2005, p.65), Essas viagens de caráter popular não são uma categoria nova na sociedade brasileira. Há décadas que se organizam passeios e viagens de baixo custo, sem uso de grandes recursos. Como não poderia deixar de ser, dadas as condições socioeconômicas e também culturais da sociedade brasileira, ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 34 existe um vasto setor alternativo promotor de viagens, não diretamente vinculado ao grande capital ou às agências de viagem. Este autor concorda com a noção de que o excursionismo é uma modalidade de turismo quando defende que as excursões são segmentos de um “turismo popular” mesmo que se realize numa espécie de “circuito inferior do setor turístico”, caracterizado por relações predominantemente informais, como enfatiza Alcântara (2005, p.65), O setor se apresenta um tanto diversificado, no que diz respeito ao capital investido, à forma de organização e à clientela que atende. Compreende atividades marcadas pela flexibilidade, mobilidade e, na esmagadora maior parte das vezes, pela informalidade de suas relações [...]. Nessa perspectiva, Rodrigues (1997, p. 119), já havia defendido que, Esse tipo de mobilidade, não considerado turismo pelos critérios da OMT (Organização Mundial de Turismo), pode ser designado como excursionismo. Expressa-se por meio das chamadas „excursões piratas‟, uma vez que não é organizado por agência de viagem, enquadrando-se no setor informal da economia [...]. Outra contribuição, à compreensão do excursionismo, é trazida por Barreto (1995 apud Alcântara, 2005, p. 66) que argumenta sobre o perfil socioeconômico dos adeptos desta prática: A classe de baixa renda só pode fazer turismo de massas; é a faixa que mais pratica o turismo religioso, viaja de forma coletiva, normalmente de trem ou ônibus fretado, faz excursionismo ou, no máximo, turismo de fim de semana. Rubino (2004, p.10), no trabalho intitulado: “Políticas públicas de turismo: a hospitalidade pública ao excursionista em Bertioga” comenta: ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 35 No Brasil, o excursionismo é uma modalidade de turismo bastante praticado, pois a própria dimensão que o país apresenta propicia esta prática. Dentre esta modalidade, há o destaque para aqueles que procuram no seu tempo livre viajar para o litoral por meio de excursões organizadas ou por veículo próprio, não utilizando a estrutura para hospedagem no local visitado e que apresentam como costume levar seu próprio alimento e bebida. Este tipo de público é conhecido como „farofeiro‟. Neste estudo, Rubino (2004) analisa o excursionismo no litoral norte de São Paulo, praia próxima à capital paulista, município de Bertioga, onde a prática é intensa, mas por não existir infra-estrutura turística adequada nem políticas públicas que contemplem a hospitalidade para o excursionista a exclusão torna-se a principal solução para o incômodo gerado por estes turistas na unidade receptora. Diante do exposto por estes cientistas brasileiros, entende-se que excursionismo é uma prática social com implicações espaciais diversas, independente de sua finalidade (lazer, religiosidade ou comércio). No âmbito desta pesquisa, trata-se de uma atividade de lazer realizada pelos segmentos mais baixos da sociedade, que se organizam em grupos e que movimenta um grande contingente de pessoas. É um fenômeno de essência urbana dependente de um sistema de objetos e de ações para sua realização. Compreende-se que se trata do turismo das massas, sendo realizado pela classe trabalhadora que em seu tempo livre deslocam-se para vários lugares visando o direito ao lazer, mesmo que sua permanência seja inferior a vinte e quatro horas. Trata-se de uma atividade que para se realizar é necessário o agenciamento, a presença de um organizador de excursão, de meios de transportes e do cumprimento de normas a exemplo junto a órgãos ligados aos setores de transporte e de turismo. Sobre a denominação desta prática não existe consenso e sim, uma variedade de termos: excursão, “piqueniques”, “convescote”, “turismo de um dia”, “turismo das massas”, “turismo popular”, ”turismo das classes trabalhadoras” ou simplesmente, “ônibus de farofeiro”. Do mesmo modo que são inúmeras as denominações dadas a estes viajantes: “visitantes de um dia”, “excursionistas”, “turistas”, “povão”, “desordeiros”, “farofeiros”, ou, como foi constatado nesta pesquisa: “demolidores”, termos que permitem dizer sobre a forma marginalizada pela qual os excursionistas são vistos. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 36 Trata-se de “uma outra face” turismo que pela vertente econômica movimenta, de um modo mais intenso, o setor informal da economia, mas, que rebate, também, no setor formal, quer nas unidades emissoras, nas áreas de deslocamentos ou nas unidades receptoras destes turistas. Pois, percebe-se que para a realização desta atividade, importantes fixos se apresentam como os supermercados, bodegas, estradas, postos de gasolina, equipamentos de lazer, alimentação e entretenimento; gerando fluxos de pessoas e mercadorias, além de emprego e renda. Uma prática social realizada por cidadãos, que apesar de possuírem um menor poder aquisitivo, são, também, consumidores e não deixam de gerar tributos, seja no consumo de bebidas alcoólicas, na compra da caixa de isopor, do feijão, galeto, farofa ou do carvão itens facilmente identificados nas sacolas destes turistas. Uma manifestação social realizada por massas de trabalhadores que realizam viagens de poucas horas, para aproveitar um dia diferente de lazer, longe de seus domicílios. São turistas desinibidos, despojados e que resistem às mais variadas formas de segregação, explícitas e implícitas no espaço. Porém, seria errôneo dizer que os excursionistas representam apenas incomodo aos agentes sociais que juntamente com eles se apropriam dos territórios turísticos. Esta prática social desperta, também, o interesse de outros segmentos do mercado que percebem a relevância destes potenciais consumidores (este assunto será melhor abordado no terceiro capítulo). Assim, esclarecido alguns conceitos e denominações que subsidiarão as análises no decorrer da pesquisa, esclarece-se em seguida, questões metodológicas que pautaram a realização deste estudo. 2.3 A PESQUISA DE CAMPO: EXPLICAÇÃO DOS PASSOS DADOS A análise contida neste trabalho se atém às excursões que têm como locus para sua reprodução social as lagoas, diferentemente dos estudos de casos analisados que observaram a prática em áreas de praia. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 37 A pesquisa de campo se realizou em três lagoas do município de Nísia Floresta11, localizado ao sul da capital do estado do Rio Grande do Norte: Arituba, situada na faixa litorânea, na praia de Tabatinga; na lagoa de Boágua, na comunidade de Boágua e em Carcará na comunidade de Timbó, estas duas últimas localizadas mais ao interior do município de Nísia Floresta, como demonstra o mapa 1. 11 Este município apresenta em sua geomorfologia mais de vinte lagoas distribuídas pelo seu território, dentre elas estão: Alcaçuz, Amarela, Anjos, Arituba, Boacicca, Boágua, Bonfim, Carcará, Carnaúba, Custódia, Dourada, Dunas, Ferreiro Grande, Hiola, Ilhota, Lagoa dos Negros, Lagoa do Peixe, Lagoa do Pium, Lagoa Seca, Papari, Papeba, Papebinha, Redonda, Redondinha, Tacho, Teixeira, Urubu. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 38 Mapa 1- Mapa de localização do recorte espacial da pesquisa: lagoas de Arituba, Boágua e Carcará, Nísia Floresta (RN). Elaboração: Janny Lima, 2010. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 39 A definição do recorte espacial desta pesquisa não se deu forma aleatória, baseou-se em outros critérios, além da ocorrência do excursionismo, uma vez que esta prática social ocorre em vários lugares do Rio Grande do Norte, ao longo do litoral norte e sul, em áreas de praias e lagoas; bem como, no interior do estado no entorno de rios, barragens, entre outras paisagens que despertam o interesse dos excursionistas. Para a delimitação da área observou-se os seguintes critérios: a expressividade do fenômeno; que a área de ocorrência estivesse inserida na rota do turismo potiguar12, baseado no modelo sol e mar; a existência da acessibilidade à área da pesquisa; e que fosse possível perceber a as relações existentes entre os excursionistas, o poder público e os comerciantes locais. Com base nisto, a pesquisa realizou-se nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará, nas quais se observa desde meados da década de 1990, conforme dados da pesquisa, a chegada, nos dias de domingos e feriados, de vários ônibus de excursão. Estas lagoas estão inseridas na rota do turismo potiguar, pois situam-se entre os dois principais destinos turísticos do litoral oriental potiguar, Natal e Pipa, recebendo anualmente inúmeros turistas locais, nacionais e estrangeiros. Turistas que chegam às lagoas através de excursões, guias turísticos, em carros próprios ou em passeio de buggy realizados no denominado “Roteiro das águas” 13 ou Circuito das lagoas (ver mapa 1). Por fim, é nesta área que se concentra os agentes sociais que estabelecem uma interface direta com o excursionismo: poder público municipal e comerciantes locais, estes últimos representados por donos de barracas e de outros estabelecimentos comerciais presentes nas margens das lagoas. Agentes, com os quais o diálogo foi estabelecido o que possibilitou respostas aos questionamentos levantados neste estudo. 12 A menção sobre a rota do turismo potiguar ao longo deste estudo remete-se à atividade turística que se desenvolve no Litoral Oriental Potiguar, porção do Rio Grande do Norte onde a atividade, baseada no modelo sol e mar , se encontra consolidada (FONSECA, 2005). 13 Segundo o bugueiro profissional Júlio César, as lagoas do litoral sul, foram inicialmente descobertas pela atividade de motocross e posteriormente pela atividade dos passeios de buggy, a partir dos últimos anos de 1980, explorando áreas virgens e assim abrindo trilhas que davam acesso às diversas lagoas de Nísia Floresta. Entrevista em 01 de setembro de 2009, Natal/RN. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 40 Durante a pesquisa foram entrevistados representantes do poder público municipal (Secretaria de Turismo e Meio Ambiente, Secretaria de Tributação); representantes do Sindicato dos Bugueiros Profissionais do Rio Grande do Norte (SINDBUGGY); empresários de transporte rodoviário e motoristas de ônibus fretados; além de conversas informais com comerciantes ambulantes, os quais levantaram questões pontuais sobre a realização das excursões. A escolha dos comerciantes locais entrevistados considerou, inicialmente, o tempo de atuação destes nas lagoas na intenção de dialogar agentes sociais que vivenciam a prática do excursionismo há mais tempo. Bem como, foi considerada a existência de relações diretas com os excursionistas, seja na condição de vizinhos das áreas destinadas às excursões; pelas ações de repulsa para com os excursionistas através de placas proibitivas, as quais podem ser vistas em muitas das barracas nas lagoas; ou por estabelecerem relações comerciais com excursionistas como o aluguel de mesas ou oferta de parque aquático a um preço acessível ao perfil econômico destes turistas. Esta etapa do trabalho de campo realizou-se nos meses de janeiro e fevereiro de 2010 (Apêndice A), contemplando toda a área da pesquisa, conforme relacionado no quadro 1. Estabelecimento comercial La moni‟s – Bar e RestauranteBarraca do Galego Bar e Restaurante do Ednaldo Pastelaria e Petiscaria Gosto da Terra Crescer Comercial Distribuidora LTDA.Balneário Boágua: Toca do Tito Barraca do Cajueiro( Barraca de D. Laura) Barraca da Kelly Barraca do Oziel Palhoção Casa Show Tempo de existência do estabelecimento (entre 15 a 20 anos, década de 1990) 20 anos=1990 18 anos=1992 20 anos=1990 13 anos=1997 15 a 20 anos=1990 19 anos=1991 15 anos=1995 16 anos=1994 Quadro 1 – Relação dos estabelecimentos comerciais cujos responsáveis foram entrevistados. Com base nas entrevistas as análises foram realizadas, algumas falas estão reproduzidas na íntegra no corpo do trabalho, porém, visando respeitar a imagem e opiniões dos entrevistados, que por vezes foram enfáticos em marginalizar a atividade, seus nomes serão preservados. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 41 Quanto aos excursionistas, foram aplicados 74 questionários dos quais trinta e dois, em Boágua; vinte e oito, em Carcará e quatorze em Arituba (Apêndice B), uma amostragem que permitiu atender os objetivos da pesquisa. Os questionários foram formulados com questões abertas e fechadas e a escolha dos entrevistados visava contemplar o maior número de excursionistas por unidade emissora, ou seja, por local de origem das excursões de modo a se conhecer não apenas o perfil dos turistas, mas, também, os fluxos estabelecidos por esta prática. A abordagem aos excursionistas se deu na margem das lagoas, logo após que estes se instalaram, visando não gerar incômodo a estes cidadãos que se encontravam no seu dia de lazer. É importante ressaltar que algumas dificuldades foram encontradas, como a falta de receptividade de alguns excursionistas que se mostravam incomodados com a presença dos pesquisadores, inviabilizando a aplicação de um maior número de questionários; além de que, com o passar das horas, muitos estavam embriagados e por isto os questionários foram aplicados no horário entre nove e treze horas do dia para que não houvesse prejuízos ao conteúdo das respostas dos entrevistados. Esta etapa da pesquisa de campo foi realizada em três dias, englobando as três lagoas em estudo, privilegiando os dias de domingo e feriado, no mês de fevereiro de 2010. Foram entrevistados, também, alguns organizadores de excursão, os quais estavam responsáveis por excursões oriundas de João Pessoa (PB), e de outros municípios do Rio Grande do Norte como Brejinho, Goianinha, Macaíba, Monte Alegre e Natal. Os dados resultantes dos questionários e entrevistas realizadas em toda a área da pesquisa foram trabalhados estatisticamente e analisados de um modo geral; bem como se observou as especificidades de cada lagoa, permitindo análises pontuais sobre o fenômeno. Outros instrumentos metodológicos utilizados foram o registro fotográfico e o georreferenciamento de dados coletados na área da pesquisa que resultou na elaboração de mapas temáticos. Diante da escassez de estudos sobre o excursionismo no Rio Grande do Norte, o fenômeno foi estudado a partir da contribuição de pesquisas realizadas em outras regiões do país e, apesar das dificuldades encontradas como a deficiência de estudos sobre o recorte da pesquisa e de fontes primárias que subsidiassem as ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 42 análises; estes fatores constituíram-se num fator de motivação para realização deste trabalho. Assim, este estudo está calcado nas fontes primárias e secundárias disponíveis, somados ao trabalho de campo realizado no período aproximado de trinta dias nas três lagoas o que possibilitou analisar como se dá a prática do excursionismo e, por conseguinte, representa um avanço no sentido de construir uma base teórico-metodológica a respeito desta prática que se mostra expressiva no território potiguar. Portanto, é este o aporte teórico-metodológico que subsidia as análises nesta pesquisa. Concluída esta parte do trabalho, o capítulo seguinte aborda o processo de produção do espaço em que se observa desde a década de 1990 a chegada das excursões nas lagoas em estudo. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 43 3 AS LAGOAS DE ARITUBA, BOÁGUA E CARCARÁ NA ROTA DO TURISMO POTIGUAR: UMA LEITURA SOBRE O PROCESSO DE PRODUÇÃO DO ESPAÇO Ingressar no competitivo rol dos destinos turísticos nacionais e internacionais não é objetivo fácil de ser alcançado. [...] é resultado de um feixe de ações e relações, fatores endógenos e exógenos cujo comando, no mais das vezes, não pertence ao lugar receptor. Rita de Cássia Ariza Cruz Esta parte do trabalho tem como objetivo compreender o processo de produção do espaço em que se localizam as lagoas de Arituba, Boágua e Carcará, área onde desde a década de 1990 se observa o excursionismo. Para isto optou-se por realizar uma leitura das formas existentes, relacionando-as com as ações de agentes sociais distintos, dentre eles o Estado, agentes de mercado e os diversos tipos de turistas os quais se apropriam deste espaço que atualmente assume uma função turística. Nessa perspectiva alguns questionamentos foram levantados e nortearam a investigação. Como se dá o processo de produção do espaço? Quais os agentes sociais envolvidos? Qual a intencionalidade da produção e do uso deste espaço? Como as políticas públicas de turismo se inserem neste espaço? Quais as ações dos agentes e sua interface com o turismo potiguar? Como o excursionismo adentra nesta lógica? O pressuposto teórico da análise é o processo de produção do espaço, entendido enquanto um processo que se dá ao longo do tempo, formado por um sistema de objetos e de ações que permite a função turística, atualmente, percebida no recorte da pesquisa. A partir de um breve resgate histórico foi possível reconstruir etapas deste processo que remontam as principais intervenções do Estado, através de políticas públicas, que viabilizaram uma infra-estrutura urbana necessária para desenvolver a atividade turística e que propiciaram a entrada das lagoas em estudo no rol de unidades receptoras de turistas. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 44 As discussões apresentadas neste capítulo resultam do diálogo entre o aporte teórico e a empiria, utilizando-se dados e informações obtidos em documentos oficiais e na pesquisa de campo, de modo a atingir o objetivo proposto. É válido ressaltar que durante a pesquisa de campo surgiram alguns entraves junto a órgãos públicos, como a impossibilidade de repasse de dados oficiais, justificada pela inexistência de diagnósticos, relatórios técnicos e planos de ação da gestão municipal de Nísia Floresta; além da escassez de estudos que contemplem diretamente a área da pesquisa. Assim, a maioria dos dados aqui apresentados foi obtida a partir de entrevistas e aplicação de questionários junto às pessoas diretamente envolvidas no contexto (moradores do entorno das lagoas, bugueiros, comerciantes locais, excursionistas e representantes do poder público local), além da observação in loco. Diante disto, é válido salientar que as escalas de análise variam de acordo com a disponibilidade das informações e dos acontecimentos dos eventos. Para a compreensão da prática do excursionismo nas lagoas em estudo tornou-se necessário entender sua ocorrência numa interface direta com o papel que o município de Nísia Floresta assume no turismo do tipo sol e mar, contexto em que a paisagem de Arituba, Boágua e Carcará muito interessa ao turismo de massa que se desenvolve nesta porção do litoral oriental potiguar. 3.1 REFLEXÕES SOBRE O PROCESSO DE PRODUÇÃO DO ESPAÇO Refletir sobre o processo de produção do espaço requer retomar o conceituar do objeto de estudo da geografia, aqui entendido, como anuncia Santos (2008, p.63), O espaço é formado por um conjunto, solidário e também contraditório, de sistemas de objetos e ações, não considerados isoladamente, mas como o quadro único no qual a história se dá. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 45 É um híbrido, cujo resultado da conjugação entre estes sistemas, permite transitar do passado ao futuro, mediante a consideração do presente. Para este autor o espaço é social, ele não pode ser formado apenas pelas coisas, por objetos geográficos, naturais e artificiais, pois além de tudo inclui a sociedade. Santos (2008) entende que os objetos estão distribuídos sobre um território, formando a configuração espacial, mas por outro lado existem processos sociais representativo de uma sociedade, de um dado momento, que lhes dão vida, como aponta Santos (1985, p.2) que diz, Esses processos, resolvidos em funções, se realizam através de formas. Estas podem não ser originariamente geográficas, mas terminam por adquirir uma expressão territorial. Na verdade, sem as formas, a sociedade, através das funções e processos, não se realizaria. Este autor enfatiza que as formas geográficas contêm frações do social, elas não são apenas formas, mas forma-conteúdo, as quais mudam de significação com o movimento, a cada momento, e, é por isso, que o objeto geográfico está sempre mudando de significação, e a respeito Santos (1985, p.2) explica: O movimento dialético entre forma e conteúdo, a que o espaço, soma dos dois preside, é igualmente, o movimento dialético de todo social, apreendido na e através da realidade geográfica.[...] cada lugar está sempre mudando de significação, graças ao movimento social: a cada instante as frações da sociedade que lhe cabem não são as mesmas. Ou seja, a cada novo momento, impõe-se interpretar o que é mais característico do novo sistema de objetos e do novo sistema de ações. A ação, que é inerente à função, é condizente com a forma que a contém, assim, os processos ganham inteira significação, apenas, quando corporificados, sendo a ação tanto mais eficaz quanto os objetos são mais adequados. Neste sentido, Santos (2008, p. 91) destaca que através da noção de intencionalidade presente no espaço é possível uma outra leitura crítica das relações entre objeto e ação. “Essa noção é igualmente eficaz na contemplação do processo ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 46 de produção e de produção das coisas, consideradas como um resultado entre o homem e o mundo, entre o homem e o seu entorno”. Outra contribuição, na concepção de espaço produzido, das formas e da intencionalidade, vem de Andrade (1981, p.9) ao defender que, Ao ser analisado, sob enfoque geográfico, a organização de uma determinada porção do espaço, deve-se refletir sobre o processo que determinou a organização do espaço. Isto porque, o homem é sujeito no processo de produção do espaço, organizando o mesmo de acordo com seus interesses, com seus objetivos, em função da realização econômica das classes dominantes e lançando mão do capital e dos recursos técnicos de que dispõem [...]. Andrade (1981) interpreta a realidade geográfica da região Nordeste, e em especial o processo de produção do espaço do Rio Grande do Norte, corroborando com a discussão aqui defendida, ao entender-se que o espaço geográfico é social, que se transforma ao longo do tempo e não um produto acabado. Andrade (1985) enfatiza a importância de analisar o espaço em sua totalidade, pois o processo de produção do espaço não se volta apenas para interesses internos e locais, visa, também, atender interesses de externos que são os maiores beneficiários do sistema de utilização de recursos produzidos. É, então, através de uma abordagem centrada no espaço, sem adjetivações, e que visa compreender os processos sociais que o engendraram que se observa o excursionismo em territórios que atualmente exerce uma função turística e nesta perspectiva, o fenômeno do turismo inseri-se, como um processo social que produz espaço, como sugere Rodrigues (1997, p.61), Para iniciar as reflexões que seguem é fundamental insistir no fenômeno do turismo em toda a sua complexidade, expressa pelas relações sociais e pela materialização territorial que engendra no processo de produção do espaço. Segundo Rodrigues (1996, p.17) o turismo é uma prática social, econômica, política e cultural, é transformadora de espaços e situa-se dentre as mais expressivas das sociedades pós-industriais, ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 47 [...] movimenta, em nível mundial, um enorme volume de pessoas e de capital, inscrevendo-se materialmente de forma cada vez mais significativa ao cria e recria espaços diversificados.[...] De forma espontânea ou planejada está subordinado às políticas públicas, à iniciativa privada ou à parceria de ambas. (RODRIGUES,1996, p.17) Rodrigues (1996) afirma que esta atividade pode estar submetida aos centros de decisão do capitalismo corporativo hegemônico em nível global, assim como pode manifestar-se pontualmente, assumindo caráter doméstico e artesanal, como se apresenta nas lagoas em estudo. Para Cruz (2005) o turismo, antes de qualquer coisa, é uma prática social que tem no espaço seu principal objeto de consumo. Uma atividade moderna que transforma o espaço em mercadoria, inserindo-o no circuito da troca, como no dizer de Cruz (1999, p.14), O consumo do espaço pelo turismo é intermediado pelos sistemas de objetos e de ações que, numa relação dialética, formam o espaço. Esse consumo se dá através do consumo de um conjunto de serviços, que dá suporte ao fazer turístico. Cruz (2007) destaca, ainda, sobre as intervenções de agentes sociais de naturezas distintas no espaço produzido, como o Estado e o mercado os quais se inserem na lógica capitalista da produção do espaço, de modo a viabilizar a realização da atividade. O Estado, de modo subserviente ou não tem uma inquestionável hegemonia no processo de produção do espaço, através do papel de ente regulador das relações sociais e provedor de infra-estruturas, além de estabelecer as normas que regulam a vida pública e privada. Segundo Santos (2007, p. 27), “é doravante impossível analisar o espaço e sua evolução sem levar em conta o papel do Estado na vida econômica e social.” Entende que o Estado, juntamente com mercado, formam um par dialético, mas não elimina o fato de que exista um auxílio entre ambos, e o autor esclarece (1997, p. 100), O mercado é um fator de controle, um dado de unificação, um conjunto de elementos capazes de estabelecer um dado equilíbrio (equilíbrio geral da ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 48 economia). Age aparentemente sem violentar ninguém e passa de uma situação de equilíbrio para outra. O mercado é formado por agentes sociais, os quais, em situações de escalas local e regional, por vezes, tomam para si a hegemonia do processo de produção do espaço no sentido de assegurar a consecução de seus interesses. Mas, a produção do espaço turístico conta, também, com agentes nãohegemônicos e neste caso o papel dos turistas não pode ser negligenciado sendo indispensável reconhecer sua relevância na produção do espaço. Estado e agentes de mercado atuam no setor do turismo em função da existência de consumidores-turistas, os quais por vezes são inclusive responsáveis por alguns destinos turísticos e por novas dinâmicas nos processos de produção dos espaços turísticos dos quais se apropriam (CRUZ, 2007). Cruz (2007) destaca, ainda, que ao se abordar sobre a produção de um espaço turístico é necessário considerar que o turismo não se dá sob uma tábula rasa, sobre espaços vazios e sem donos, mas em lugares previamente ocupados por populações que se estabeleceram e onde vivem suas vidas cotidianas. Assim, a autora (2007, p.14) conclui: Não são apenas Estado, mercado e turistas que produzem os espaços relativos aos fazeres turísticos, mas também sociedades que vivem nesses lugares, parte delas transformada, por força de novas contingências, em empreendedores turísticos ou, mesmo, em muitos casos, atuando como contra-racionalidades às determinações hegemônicas. Assim, com base nestas noções sobre o processo de produção do espaço, é que se analisa a inclusão das lagoas de Arituba, Boágua e Carcará na rota do turismo potiguar, resultado da ação de agentes hegemônicos e não hegemônicos a partir da década de 1980. Com base nesse entendimento, lançou-se mão de identificar os momentos que marcam o processo de produção do espaço e o papel dos principais agentes sociais envolvidos, identificados nesta pesquisa como o: Estado, agentes do mercado local (comerciantes locais), turistas e sociedade local, dita “nativa”. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 49 Não se trata, conforme Santos (1985, 1988, 2008), de retraçar o passado, mas de reconhecer a cada momento o que é mais característico do novo sistema de objetos e de ações, pois, é através do movimento da sociedade, ao longo do tempo, que o espaço geográfico se transforma e se organiza, criando um novo leque de possibilidades e novos pontos de partida. Ainda segundo Santos (1996, 2008) é importante observar a realização da sociedade humana em processo, a qual se dá sobre uma base material, usando o espaço, o tempo e a materialidade a partir de ações diversas. Para ele, é o enfoque do espaço geográfico, como resultado da conjugação entre sistemas de objetos e sistemas de ações, que permite transitar do passado ao futuro, mediante a consideração do presente. É importante ressaltar que a análise pode parecer, por vezes, uma simples descrição, mas o que se perseguiu foi o objetivo de uma compreensão mais aprofundada sobre o empírico. Para tanto, utilizou-se de um breve resgate histórico, sem dissociar o espaço e o tempo, contextualizando a área da pesquisa como parte integrante do território nordestino, do município de Nísia Floresta, bem como a partir de seu papel no turismo potiguar, ou seja, uma análise que enfoca a participação da atividade turística no processo de produção do espaço, a partir de diferentes dimensões espaciais. Com base nestas reflexões é que partimos à continuação deste capítulo, de modo a compreender o espaço em sua totalidade, o processo da produção do espaço por diversos agentes que possuem uma interface direta com o excursionismo que se observa nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará. 3.2 A INTERVENÇÃO DO ESTADO E A INFRA-ESTRUTURA URBANA NECESSÁRIA AO TURISMO NAS LAGOAS Como visto anteriormente, o turismo não ocorre num espaço vazio, mas ocupado historicamente, o estudo de Andrade (1981) aponta antigos usos e outros agentes sociais na história da porção litorânea do território norte-rio-grandense, em que se insere a área da pesquisa. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 50 De acordo com Andrade (1981) a produção do espaço do Rio Grande do Norte, nos moldes capitalistas, inicia-se no século XVI, com a conquista e exploração do território brasileiro em tempos de expansão européia, um momento marcado por relações existentes entre os índios tupis, o colonizador português e os latifundiários, produtores da cana-de-açúcar, período que se realiza a luz de atividades tradicionais como a pesca, a agricultura e o extrativismo. Mas, na intenção de atender aos objetivos deste estudo, o enfoque do processo de produção do espaço, em que se observa o excursionismo, se dá no contexto do turismo potiguar, podendo-se dizer, de acordo com Santos (2008), que é neste momento que o Estado modernizador aparece, como uma condição fundamental na criação e no fortalecimento das atividades modernas. Entende-se que neste período o espaço passa a ser produzido com uma finalidade turística. A partir da década de 1980, observa-se que a paisagem da porção do litoral oriental do RN onde se localiza Natal e municípios vizinhos, dentre eles, Nísia Floresta, passa a ser alterada pelas intervenções do Estado, através de políticas públicas, que acaba implantando uma infra-estrutura urbana necessária ao desenvolvimento da atividade turística. O estudo de Furtado (2008), a respeito do turismo potiguar, aponta que já na década de 1960 foram dados os primeiros passos para o desenvolvimento do turismo em Natal, com a instalação de alguns hotéis. No ano de 1971 foi criada a Empresa de Turismo do Rio Grande do Norte (EMPROTURN), com a finalidade de dinamizar esse setor no RN, especialmente na capital potiguar, como base em três linhas de ação: estudar as potencialidades turísticas locais, propagar as belezas de Natal e dotar a cidade de infra-estrutura urbana para o turismo. Porém, Furtado (2008, p.57) argumenta: “[...] somente a partir da década de 1980, quando as políticas de cunho industrializantes se esgotaram, o fenômeno do turismo passou a adquirir relevância e se firmou como atividade econômica.”; e afirma que os esforços do governo do estado em expandir o setor de turismo coincidem com o fechamento de diversas plantas industriais, oriundas dos incentivos da Superintendência de Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE). A partir de então, o espaço passou a ser produzido, em prol da atividade econômica do turismo no RN. Implantaram-se programas especiais com a finalidade ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 51 de fazer investimentos na infra-estrutura urbana, em áreas potencialmente turísticas, de modo a atrair capital externo para a capital potiguar. O estudo de Cruz (1999) aponta que dentre as ações do Estado de incentivo ao setor turístico no RN está o Projeto Parque das Dunas/Via Costeira (PD/VC), que construiu na capital potiguar, a Via Costeira, rodovia com 8,5 km de extensão, com o objetivo de atrair a instalação de redes hoteleiras, inserindo Natal no circuito nacional de destinos turísticos, o que segundo Gomes, R. (2009) trazia na sua essência a proposta de alavancar o turismo de massa no estado. Conforme Cruz (1999) o PD/VC foi o primeiro “megaprojeto turístico” concebido no Nordeste, cuja obra foi inaugurada em 1983, e é considerado um marco na expansão do turismo potiguar (CRUZ,1999; FONSECA, 2005; FURTADO, 2005; GOMES, R., 2009). Para Furtado (2005) este megaprojeto é um marco inaugural no estabelecimento de políticas públicas de cunho federal, estadual e/ou municipal direcionadas para a implantação e desenvolvimento do turismo regional e local proporcionando, na década de 1980, um boom no turismo potiguar. Nos anos de 1990, a atividade ganha maior destaque no cenário brasileiro, período de elaboração da Política Nacional de Turismo, tendo entre os objetivos esperados a redução das desigualdades regionais o que é entendido por Fonseca (2005, p. 92) da seguinte forma: A importância assumida pela atividade turística no país nas últimas décadas foi resultado de um esforço por parte do governo federal em diversificar as atividades produtivas e a economia do país, procurando abrir novas perspectivas de trabalho para a população e aumentar o ingresso de divisas com a captação de turistas internacionais. Neste contexto, o Estado brasileiro assume a função de um grande produtor do espaço para o turismo, através do papel normatizador e provedor de infraestrutura, o que é analisado por Cruz (2007, p.11), No Nordeste brasileiro, por exemplo, o Estado assume, com toda força, a partir do início dos anos 1990, a condução de um processo de adequação de territórios nordestinos a um uso turístico maciço e internacionalizado. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 52 Ainda segundo Cruz (2006, p.337), nesta década assistiu-se a consagração do neoliberalismo como paradigma econômico e político, bem como, [...] à fase possivelmente mais aguda da transição de um Estado interventor para um Estado parceiro do Mercado, o que se reflete no turismo, na forma de políticas públicas comprometidas com a produção e reprodução do capital [...] voltadas à criação de um novo sistema de objetos cuja materialidade é demandada pelo novo sistema de ações que se impõe. Este processo de criação de um novo sistema de objetos e ações para o desenvolvimento da atividade econômica do turismo se consolida por meio de um programa federal, e conta com forte atuação dos governos dos estados nordestinos. Trata-se da formulação de uma política pública na qual foram definidas macroestratégias de ação e quatro programas que compreendem as regiões brasileiras (sobre o assunto ver FONSECA, 2005). Dentre estes está o Programa de Ação para Desenvolvimento do Turismo no Nordeste (PRODETUR/NE), baseado no sol, praia, entretenimento e lazer. Para Cruz (2007), trata-se de uma política voltada à produção do espaço para o turismo, sobretudo litorâneo, através do qual, está sendo criado e recriado um sistema de objetos para um turismo maciço e internacionalizado. As ações voltam-se para melhorias nas condições de fluidez do território (ampliação e modernização de aeroportos, recuperação e construção de estradas, etc.), além de investimentos em gestão e promoção da atividade (capacitação profissional, marketing). Ainda segundo esta autora, o Programa é uma política de turismo, com forte caráter de uma política urbana, portanto, “uma política de urbanização para o turismo” (CRUZ, 2007, p.133), uma vez, que seu objetivo central é o provimento de infra-estrutura básica e de serviços públicos para áreas em expansão turística. Para execução do Programa, contou-se com contrapartidas financeiras do governo na esfera estadual e nacional, além de investimentos estrangeiros, através de empréstimos realizados junto ao Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). (sobre o assunto ver FONSECA, 2005; CRUZ, 1995, 1999; RODRIGUES, 1997; FURTADO, 2005). Assim, voltando à discussão para o contexto do turismo potiguar, dez anos após o PD/VC, em meados da década de 1990, o governo do estado do Rio Grande ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 53 do Norte inicia a implementação do Programa de Desenvolvimento do Turismo no Rio Grande do Norte (PRODETUR/RN), o qual, segundo Fonseca (2005, p.20), “promoveu um novo impulso ao turismo potiguar, propiciando sua inserção mais efetiva no fluxo turístico internacional e a atração dos investimentos turísticos de cadeias internacionais”. Segundo Fonseca (2005), os investimentos realizados na primeira fase deste programa (1996-2001), foram subdivididos em três componentes, Desenvolvimento institucional, Obras múltiplas e Aeroporto, contemplando seis municípios do litoral oriental potiguar: Ceará-Mirim, Extremoz, Natal, Nísia Floresta, Parnamirim e Tibau do Sul. Destacam-se aqui, apenas os que se deram na escala do município de Nísia Floresta. No componente Desenvolvimento institucional, deu-se a elaboração da base cartográfica e do Plano Diretor do município. É válido notar que foi nos anos 2000 que a prefeitura municipal instituiu em seu organograma a Secretaria Municipal de Turismo e Meio Ambiente. No componente Obras Múltiplas, destacam-se a construção do Binário de Pirangi, melhorias na estrada Pirangi - Barra de Tabatinga, estrada TabatingaCamurupin- Barreta, contemplando a Rota do Sol, uma espécie de corredor turístico que interliga o litoral sul oriental potiguar. Estes investimentos se deram ao longo de dois governos consecutivos de Garibaldi Alves Filho (gestão entre 1995-2002), merecendo destaque os que rebatem diretamente na área da pesquisa como as constantes melhorias na Rota do Sol, RN-063 (mapa 2), um importante eixo viário ao sul de Natal, que atravessa todo o município de Nísia Floresta na sua faixa litorânea e corta o seu interior . Uma rodovia entendida nesta análise como sendo estruturante para a atividade turística percebida nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará. É válido destacar que de acordo com informações de representantes da Secretaria de Turismo de Nísia Floresta e do Departamento de Estradas e Rodagens, outros investimentos estão sendo pleiteados em infra-estrutura urbana, para serem incluídos na próxima etapa do Programa, o PRODETUR Nacional, ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 54 dentre eles a implantação do projeto “Circuito das Lagoas” (informação verbal)14, que incidirá diretamente na área da pesquisa (mapa 2). Este projeto visa melhorias nas condições viárias no interior de Nísia Floresta, de modo a interligar as lagoas existentes no município através dos seguintes trechos rodoviários: RN-313 à Lagoa do Bonfim; contorno da lagoa do Bonfim; acesso à lagoa do Carcará e Boágua; e o trecho que liga a sede de Nísia Floresta à praia de Pirangi do Sul (BANCO DO NORDESTE, 2008). 14 Esta denominação foi utilizada pela então governadora do estado do Rio Grande do Norte, Vilma de Faria, em discurso proferido no município de Nísia Floresta durante a campanha eleitoral de 2008. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 55 Mapa 2 – Mapa de localização dos acessos viários de Nísia Floresta (RN). Elaboração: Janny Lima, 2010. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 56 A implantação desses trechos viários estava prevista como metas da segunda fase do PRODETUR/RN II (2005-2010), mas, segundo a Secretária Municipal de Nísia Floresta, Solange Portela, as obras foram inviabilizadas devido à crise financeira mundial de 2008 que impactou o orçamento inicial do projeto. Segundo dados oficiais (BANCO DO NORDESTE, 2008), o objetivo da implantação dos trechos viários é otimizar a atividade turística do município, disciplinar o uso do solo e minimizar os impactos negativos existentes quanto à ocupação e ao tráfego, além de possibilitar a ampliação ordenada do fluxo turístico, aproveitando-se do potencial paisagístico das lagoas de Nísia Floresta. Os referidos trechos, apesar de ainda serem de estradas carroçáveis, já possibilitam diversos fluxos turísticos como os que se dão através dos passeios de buggy; pelos que se destinam às segundas residências no entorno de lagoas como Boágua e Carcará e, também pelos ônibus de excursão. Além disto, estes trechos possuem relevância para a comunidade nativa e, também, para os que os utilizam em caminhadas, trilhas, esporte de aventura, cavalgadas, motocroos, etc. A respeito da implementação de obras voltadas para aumentar a fluidez do território, Cruz (2006) entende que corresponde a um tipo de ação estratégica emanada do Estado (sobretudo poderes públicos federais e estaduais) no sentido de desenvolver o turismo, tendo como objetivo maior tornar o território atrativo para o capital privado. Logo, pensando deste modo, pode-se inferir que a realização das obras que configuram o “Circuito das Lagoas” resultará em novas transformações no uso do território. Pelo exposto, pode-se dizer que a inserção de Arituba, Boágua e Carcará na rota do turismo potiguar, está diretamente ligada às políticas públicas de infraestrutura urbana para o desenvolvimento do turismo na porção sul do litoral oriental potiguar e neste contexto, as rodovias BR-101 e a Rota do Sol-RN-06315 (ver mapa 2), assumem a função de permitir fluxos de pessoas, mercadorias, informação e de capital, contemplando diretamente a área da pesquisa, uma vez que são os principais acessos viários às referidas lagoas. 15 Segundo os dados dos arquivos do DER, na década de 1980, a RN-063 se estendia até Pirangi do Sul, enquanto o trecho Nísia Floresta-Tabatinga, denominava-se RN-02. Na década de 1990 a RN063 passa a se chamar Rota do Sol e se estende por 52 km, partindo do complexo viário de Ponta Negra no entroncamento da BR-101 com a Av. Engenheiro Roberto Freire (Natal) até a sede municipal de Nísia Floresta, próximo ao entroncamento com a BR-101. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 57 A relevância destes fixos é abordada por Fonseca (2005) para quem, estas duas rodovias são estruturantes para a realização do turismo potiguar no litoral sul, pois servem de “corredor turístico” aos dois principais pólos turísticos do estado, onde se localizam diversos atrativos do turismo sol e mar (praias, dunas, lagoas, etc), concentram-se os principais serviços (meios de hospedagem, alimentação, entretenimento, etc.) e existe a infra-estrutura urbana necessária (acessos viários, telefonia, etc.) para o desenvolvimento da atividade. Visando uma melhor explicação, Fonseca (2005) aponta que o primeiro pólo, compreende Natal e municípios vizinhos: Ceará - Mirim, Extremoz, Nísia Floresta e Parnamirim; e o segundo, situa-se em Tibau do Sul, onde se localiza a praia de Pipa, o “paraíso turístico”, como é tratado por Araujo (2002). Cabe ainda comentar que a BR-101 é uma rodovia federal que acompanha toda a costa oriental potiguar servindo ao tráfego interestadual, pela qual se estabelecem diversos fluxos, inclusive de excursionistas entre as lagoas em estudo e outros estados do nordeste, como Paraíba e Pernambuco, já mencionado anteriormente. Para Cruz (2007), ao tratar da importância desta rodovia federal, o processo de “rodoviarização” do país, intensificado no país na década de 1970, e, especificamente, seus traçados litorâneos, como no caso da BR-101, objetivava, promover a integração nacional, melhorar e aumentar a fluidez das mercadorias, além de criar as condições materiais adequadas para a reprodução ampliada do capital. A autora destaca ainda que estas infra-estruturas viárias motivaram a urbanização turística de extensos trechos ao longo do litoral brasileiro, obras que foram complementadas por outras rodovias em estados litorâneos. No caso do Rio Grande do Norte é a rodovia estadual RN-063, conhecida como Rota do Sol, que se insere neste contexto. Esta rodovia vem sendo alvo de investimentos, desde meados do século XX, ao longo de vários governos estaduais, com a construção, ampliação e manutenção de trechos viários. Segundo dados do DER, no início da década de 1960 existia apenas o trecho Natal-Ponta Negra, o qual foi ampliado pelo governo estadual de Aluízio Alves (gestão 1961-1966), através da construção do trecho viário Ponta Negra-Pirangi do Norte, ligando a capital potiguar ao litoral de Nísia Floresta (fotografias 6 e 7). ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 58 6 7 Fotografias 6 e 7 – Vista parcial do trecho viário Natal-Pirangi do Norte da RN-063, na década de 1960: município de Parnamirim (6), município de Nísia Floresta (7). Fonte: Acervo fotográfico do DER. Naquela década, esta rodovia servia à base militar da Barreira do Inferno, localizada no litoral do município de Parnamirim; e também, às populações nativas desta faixa do litoral, estabelecendo o fluxo de pessoas e mercadorias. Conforme o estudo realizado por Pontes et al (1993), sobre o litoral de Nísia Floresta, esta rodovia seguia, da praia de Búzios em direção à Natal, e por ela era transportado areia e cascalho, material que seria utilizado na construção civil. Estes momentos foram relembrados pelo entrevistado Luís16, cujo pai trafegava pela referida rodovia em um caminhão carregado de areia, água, carvão para comercializar em Natal; ou com pessoas nativas de Pirangi do Sul e do entorno que iam semanalmente à capital “comprar na feira” como disse o entrevistado. Mas, é na década de 1980 que esta rodovia passa a ter relevância para atividade turística, com a construção do trecho Pirangi do Sul-Búzios–Tabatinga, obra realizada entre 1983-1986, durante o governo estadual de José Agripino Maia. A partir desta obra o fluxo de pessoas aumenta nesta parte sul do litoral oriental potiguar, cuja paisagem passa a ser marcada pela construção das segundas residências. A fotografia 8 ilustra de modo parcial a praia de Búzios e o principal trecho viário de acesso ao sul do litoral oriental potiguar: RN-063. 16 Luís Antônio C. Campos é nativo da praia de Pirangi do Sul e filho do Sr. Manoelzinho o qual desde a década de 1960 passou a realizar transporte de mercadorias e de pessoas no trecho Nísia Floresta-Natal. Atualmente, Luís é um dos responsáveis pela Empresa de Transportes Auto Viação Campos a qual possui concessão de transporte coletivo abrangendo a parte litorânea dos municípios de Nísia Floresta e Parnamirim. Entrevista em 30 de jan. 2010, Pirangi do Sul/Nísia Floresta/RN. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 59 Fotografia 8 – Vista parcial do trecho viário Pirangi do Sul-BúziosTabatinga- na altura da praia de Búzios, litoral de Nísia Floresta/RN. Fonte: Encarte de divulgação turística do Governo de Radir Pereira, ano de 1986. Acervo documental do DER. Ainda nos anos de 1980, outros investimentos foram realizados nesta RN, contemplando o trecho Tabatinga-sede de Nísia Floresta, em sentido à BR-101, pelo qual se têm acesso às lagoas de Boágua e Carcará. As obras foram realizadas ao longo dos governos de José Agripino e Geraldo Melo e num período aproximado de dez anos, este trecho viário passou de estrada carroçável a asfalto. Conforme percebido na pesquisa de campo, pode-se dizer que os investimentos realizados nestas rodovias (BR-101 e RN-063) quer na implantação ou nas melhorias de trechos viários, ao longo das últimas décadas, tornaram-se fator de atração do mercado, cujos agentes passaram a apropriar-se das lagoas como espaço propício à reprodução do capital, principalmente através dos produtos e serviços que podem ser oferecidos aos diversos turistas que se apropriam deste espaço até os dias atuais (venda de terras, construção de segundas residências, alimentação, brinquedos aquáticos, passeio de buggy, entre outros). Assim, infere-se que a partir destas rodovias são mobilizados diferentes fluxos de pessoas, de capital e de informação. Tal inferência se baseia na discussão realizada por Cruz (2007, p.56) que argumenta: A produção do espaço para o turismo passa, necessariamente, pelo aumento da fluidez do território e pela produção, conseqüentemente, de melhores condições de circulação. [...]. Mas, essas infra-estruturas não conferem maior mobilidade apenas a turistas e residentes. São, também e principalmente, um meio de assegurar maior mobilidade ao capital privado ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 60 que, [...], aproveita-se da valorização desses espaços para implementar seus empreendimentos. Por todo o exposto, considerando-se as intervenções do Estado, cujas obras em infra-estrutura possibilitou o aumento da fluidez no espaço, é possível afirmar que o processo de produção do espaço turístico das lagoas se deu em dois momentos: o primeiro, na década de 1980, caracteriza-se pela chegada das segundas residências e o segundo, a partir dos anos de 1990, marcado pela chegada do turismo de massa, quando o espaço passou a ser apropriado por outros agentes de mercado e por uma nova demanda turística onde se insere, também, o excursionista, como será discutido daqui em diante. 3.3 A APROPRIAÇÃO DO ESPAÇO: AGENTES DE MERCADO, TURISTAS E PODER PÚBLICO LOCAL A partir dos primeiros anos da década de 1980, pode-se dizer que o entorno das lagoas de Arituba, Boágua e Carcará, passa por uma outra fase do processo de produção do espaço, o qual, até então, era apropriado por nativos, cujo uso voltavase predominantemente para agricultura e pesca de subsistência, bem como, ao banho de pessoas e animais. Esta década é marcada pela chegada dos empreendedores imobiliários, os quis lotearam terrenos às margens e no entorno das lagoas, dando novas funções às formas existentes. Neste período o espaço passa a ser apropriado pelas segundas residências, propriedades de uma “elite”, em sua maioria oriunda de Natal, representada por médicos, políticos, juízes, entre outros, conforme relato de alguns moradores antigos podendo-se dizer que neste período se registra a chegada dos primeiros turistas, os proprietários das segundas residências, os quais sazonalmente utilizam estes imóveis, imprimindo a estas lagoas, deste período em diante, a função de espaços para o lazer turístico. Segundo Tulik (2001, p.9), a segunda residência é uma forma de alojamento turístico e recebe denominações diversas: ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 61 Casa de temporada, de praia, chalé, cabana, rancho, sítio, ou chácara de lazer são alguns termos comumente aplicados às propriedades utilizadas temporariamente, nos períodos do tempo livre, por pessoas que tem sua residência permanente em outro lugar. No contexto desta pesquisa as segundas residências são denominadas de “casas de praia”, como em Arituba, localizada na praia de Tabatinga; e por “granjas, no caso das segundas residências mais ao interior do município, no entorno das lagoas de Boágua e Carcará. Um tipo de apropriação do espaço que Segundo Lopes Junior (2000, p.41), está presente na paisagem do litoral sul de Natal, desde a década de 1980, compreendendo uma “franja de casas de veraneio” estendendo-se inclusive pelas praias de Nísia Floresta (Pirangi do Norte, Búzios e Tabatinga). Este momento é relatado por Eugênio, ex-veranista da praia de Tabatinga e atualmente comerciante local na lagoa de Arituba, que relembra a paisagem existente quando “a beira da lagoa era só junco”, referindo-se à mata ciliar que existia às margens da lagoas, retiradas por nativos para a confecção de produtos artesanais. Segundo o entrevistado no início da década de 1980: “Arituba era vendida como o paraíso”. Mas, pode-se dizer que foi a partir da década de 1990 que a função turística do espaço intensificou-se, e a área da pesquisa se consolidou na rota do turismo potiguar com a chegada do turismo de massa. Um processo de turistificação da lagoa que é relembrado por Sr. Antônio, morador nativo da comunidade de Timbó e que começou a trabalhar como barraqueiro em Carcará no início da década de 1990, [...] há vinte anos era só mato, só chegava aqui por uma vereda, era tudo fechado [...], aí os bugueiro foram chegando [...] traziam gringo, gente famosa (Romário jogador de futebol). [...] aí foi quando o povo daqui começou a se interessar [...]. Segundo os comerciantes locais o principal fator de atração para turistas nacionais e estrangeiros, que chegavam às lagoas através do passeio de buggy, já nos primeiros anos da década de 1990, era a paisagem mais “nativa”. Com a ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 62 presença destes turistas na área surge o interesse de pessoas nativas pela demanda com a qual passaram a estabelecer relações comerciais através das barracas instaladas nas margens das lagoas. Este período é, também, relatado por um dos bugueiros entrevistados, quando diz: “o que mais agradava aos turistas que visitavam estas lagoas era a paisagem natural, o banho em águas claras, a mata virgem, andar entre dunas [...] e depois voltar para o hotel onde estavam hospedados”. O passeio entre as lagoas, denominado “Passeio das Águas” ou “Roteiro Doce”, pelos bugueiros, ainda é realizado tendo como clientela os turistas que se hospedam em qualquer dos dois pólos turísticos mencionados anteriormente (Natal e Tibau do Sul). Com base nos dados da pesquisa, pode-se dizer que a categoria profissional dos bugueiros teve papel relevante na transformação das lagoas em destinos turísticos, uma vez que a prestação deste serviço possibilitou a destinação de vários turistas às áreas das lagoas, situação que é favorecida pelo fato do buggy ser um veículo adequado para trafegar em dunas e em estradas carroçáveis, infra-estrutura até hoje existente. Para um outro membro desta categoria: “foram os bugueiros que descobriram as lagoas de Nísia Floresta”. Fonseca (2005), em seu estudo sobre competitividade turística, reconhece que as lagoas estão dentre os atrativos turísticos mais visitados do município de Nísia Floresta17. Para a Secretária Municipal de Turismo e Meio-Ambiente, Solange Portela, o que ocorre neste município é o “turismo de passagem” onde as lagoas são mais uma opção de lazer aos que visitam o destino Natal, chegando a estas lagoas pelas rodovias já mencionadas anteriormente, principalmente, pela Rota do Sol. Conforme Furtado e Melo (2001), Entende-se como turismo de passagem o fluxo de pessoas que circulam e consome mercadorias e serviços, sem que haja permanências significativa, ou seja, o número de pessoas que passam é maior do que o número de pessoas que ficam. 17 Dentre os atrativos turísticos de Nísia Floresta/RN se destacam: as praias, falésias, dunas, a árvore centenária Baobá, o Túmulo da filha ilustre Nísia Floresta e o camarão, oferecido como o melhor do destino potiguar. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 63 Para estas autoras diante de investimentos realizados nesta rodovia (asfalto, duplicação), o fluxo de veículos e de pessoas vem aumentando significativamente, provocando transformações espaciais relevantes. Com base nisto, entendendo esta RN-063 como rodovia relevante no processo de transformação das lagoas, observou-se nesta pesquisa sobre o fluxo de pessoas, as mercadorias e serviços oferecidos nas lagoas. É então deste espaço que agentes sociais distintos se apropriam, dentre eles o Estado, através de suas políticas públicas; os turistas, de origem internacional, nacional, local e excursionistas; e agentes de mercado do setor formal e informal da economia: bugueiros, barraqueiros, vendedores ambulantes, proprietários das empresas de ônibus que servem às excursões, entre outros. É válido ressaltar que as análises apresentadas neste estudo contemplam as três lagoas enfatizando o que há de comum no processo de produção do espaço, porém, não se pretende ignorar as particularidades dos objetos presentes e das ações dos agentes sociais que as tornam diferentes. Os estabelecimentos comerciais, de um modo geral, estão em funcionamento nestas lagoas há quase vintes anos, o que remonta os primeiros anos da década de 1990. As fotografias 9, 10 e 11, referem-se às imagens das lagoas nos anos 2000, através das quais se percebe a apropriação do espaço por comerciantes locais e turistas. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 64 9 10 11 Fotografias 9, 10 e 11 – Estabelecimentos comerciais instalados na margem da lagoa de Arituba (9), Boágua (10) e Carcará (11), ano 2001. Fonte: Jornal Diário de Natal, 18 jul 2001. Conforme demonstram as ilustrações, a instalação física das barracas ou do parque aquático nas margens das lagoas destoam da paisagem “natural” que inicialmente atraiam os turistas. Atualmente a paisagem é marcada pela concentração de vinte e quatro comerciantes que atuam na área das lagoas, alguns na prestação de serviço de alimentação (bar, restaurante) e outros na área de entretenimento (parque aquático e/ou casa de show), conforme descrito no quadro 2. Lagoa de Arituba 1 La moni‟s – Bar e Restaurante 2 Barraca do Galego 3 Bar e Restaurante Brilho do Sol 4 Bar e Restaurante Arituba Point 5 Bar e Restaurante do Ednaldo 6 Barraca Legal 7 Pastelaria e Petiscaria Gosto da Terra Lagoa de Boágua 1 Crescer Comercial Distribuidora LTDA.- Balneário Boágua (Parque Aquático, Casa de show (forró) 2 Bar do Vaqueiro Lagoa de Carcará ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 65 1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 Barraca da Eliane Toca do Tito Pastelaria de D. Fátima Barraca da DORE (Maria das Dores) Barraca da Janete Barraca da Josefa Barraca do Cajueiro (Barraca de D. Laura) Toca do Carcará Barraca do Júnior Barraca da Dona Vilma Barraca da Kelly Barraca da D. Ivani Bar Dois Irmãos Barraca do Oziel Palhoção Casa Show Quadro 2- Estabelecimentos de serviços de alimentação por lagoa, ano 2010. De um modo geral caracterizam-se por um funcionamento regular ao longo do ano, o que significa a existência de uma demanda turística contínua que justifica tal funcionamento nestas lagoas. A sazonalidade da atividade é percebida, mas não representa algo relevante, pois segundo um entrevistado “o movimento é bom o ano todo”. De acordo com os dados obtidos na pesquisa, os proprietários atuais, dos referidos estabelecimentos, são de origem local (“nativos”), ex-veranistas, bugueiros, além de alguns proprietários de origem estrangeira que adquiriram alguns estabelecimentos nos anos 2000 (caso particular de Arituba). Diante da caracterização do comércio local que se desenvolve nas lagoas em função da atividade turística, é importante destacar que a geração de emprego e renda é uma realidade ao longo das duas últimas décadas, seja do tipo formal ou informal, de caráter temporário ou permanente, são empregados inúmeros cozinheiros, garçons, vendedores ambulantes, guias turísticos, entre outros. Não se pretende aqui fazer apologia à atividade econômica nem à qualidade dos empregos gerados, mas diante da realidade local, cuja população dispõe de poucas alternativas de emprego e renda, os postos de trabalho gerados pelo turismo configuram uma alternativa relevante, uma vez que é esta atividade que impulsiona a economia de Nísia Floresta, conforme argumentado pela Secretária Municipal de Turismo, Solange Portela. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 66 À maioria destes estabelecimentos são cobrados tributos municipais e estaduais como o Imposto Territorial Urbano (IPTU), taxas de alvará de funcionamento, e licenciamentos junto ao Instituto de Desenvolvimento Sustentável e Meio Ambiente (IDEMA), além de impostos trabalhistas. Fora deste contexto estão os que se encontram em situação irregular junto ao poder público local, como é o caso de alguns barraqueiros da lagoa do Carcará, uma vez que seus estabelecimentos estão em área de posse, impossibilitando a regularização dos serviços oferecidos junto aos órgãos competentes. As condições físicas destes estabelecimentos variam entre as lagoas conforme pode ser observado nas fotografias 12,13 e 14. 12 13 14 Fotografias 12, 13 e 14 – Vista parcial das instalações físicas dos estabelecimentos comerciais, em Arituba(12), Boágua(13) e Carcará(14), ano 2010. Na lagoa de Arituba, década de 1990, foi executado um projeto de urbanização viabilizado pelo poder público municipal, o qual construiu sete estabelecimentos comerciais voltados para a comercialização de alimentos, melhorando as condições sanitárias existentes. Segundo Eugênio (comerciante entrevistado), o projeto visava disciplinar o uso e ocupação das margens das lagoas, tendo como uma das preocupações a não contaminação da água da lagoa pelas ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 67 fossas existentes, o que resultou numa padronização na construção dos estabelecimentos. Em Boágua e Carcará, por sua vez, inexistem ações neste sentido. A construção dos estabelecimentos não obedece a nenhum projeto de urbanização, são construídos a gosto dos comerciantes, imprimindo formas que destoam da paisagem local. É válido ressaltar a existência de construções visivelmente precárias, cujas instalações sanitárias põem em questão a qualidade dos serviços oferecidos, como no caso de Carcará (figura 13). Observando as condições físicas dos estabelecimentos e a infra-estrutura existente quanto à rede de saneamento-básico, fornecimento de energia elétrica, telefonia, cobertura de telefonia móvel, por exemplo, aspectos que são relevantes para qualificar e viabilizar a atividade econômica do turismo infere-se que existe, entre as lagoas em estudo certa “hierarquia”, apesar de todas estarem inseridas na rota do turismo potiguar, o que interfere diretamente na escolha destas lagoas pela clientela turística. Como já foi mencionado não existem dados estatísticos sobre a demanda turística nas lagoas, mas, com a pesquisa, foi possível perceber que em relação ao recebimento de turistas Arituba encontra-se numa situação mais privilegiada, uma vez que se caracteriza por receber turistas das classes mais abastadas, seguida de Carcará e por último encontra-se Boágua a qual se caracteriza, principalmente, pela presença expressiva dos excursionistas. Compreende-se, então, que esta diferenciação na atratividade de turista a cada uma das lagoas está diretamente ligada às condições da infra-estrutura existente que acabam sendo um fator de seleção para a chegada de turistas com maior poder de consumo. Retomando as semelhanças existentes entre as lagoas destaca-se que o espaço de uso comum vem sendo apropriado por agentes da iniciativa privada seja com a construção de estabelecimentos comerciais na margem das lagoas, como também por uma gama de serviços informais, volantes, que ocupam a área: vendedores de picolé, de churrasquinho, vendedor de peixe com tapioca (ginga), de artesanato, e de produtos “piratas”, como óculos, CD, DVD, entre outros. Assim, caracteriza-se a apropriação do espaço pelos agentes de mercado, um mercado artesanal, mas que visam a obtenção do lucro e a sobrevivência dos ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 68 seus estabelecimentos comerciais junto a uma clientela turística variada. Um misto de turistas estrangeiros (portugueses, espanhóis, noruegueses) nacionais (paulistas, mineiros, brasilienses), regionais (paraibanos e pernambucanos), bem como os excursionistas oriundos de municípios vizinhos (Natal, Parnamirim, São Gonçalo, Canguaretama). Turistas com diferentes poder de consumo e que chegam às lagoas através de guias turísticos, bugueiros profissionais e amadores, em carro próprio, ou em excursões e sobre esta clientela é válido uma breve caracterização. Os turistas de origem nacional ou estrangeira são os clientes “preferidos” entre os comerciantes entrevistados. Eles freqüentam as lagoas há cerca de vinte anos e estão presentes ao longo das últimas duas décadas, com maior intensidade entre os meses de alta estação (outubro a março). Quanto aos dias da semana mais freqüentados por estes turistas difere em cada lagoa, ocorre de domingo a domingo, nas Lagoas de Arituba e Carcará; enquanto em Boágua, só passam nos dias de semana, pois segundo um dos bugueiros entrevistados “o domingo é o dia povão”, referindo-se à presença dos “farofeiros”. Para este entrevistado “o domingo devia ser feriado pro bugueiro, é bêbado em todo canto!”. Este depoimento é importante, pois sinaliza o incômodo gerado pelos excursionistas nestas lagoas, o que será abordado no terceiro capítulo. Uma outra parte da clientela turística refere-se aos visitantes que chegam em excursão ou em carro próprio, oriundos de municípios vizinhos, ou mesmo de outros estados como a Paraíba e Pernambuco. É importante destacar que estes fluxos são viabilizados pela curta distância (menos de uma hora) entre as lagoas e municípios como São José de Mipibu, Arêz, Canguaretama e da capital Natal. Segundo os comerciantes locais estes clientes são reconhecidos como “o povo daqui mesmo”. A demanda caracterizada pelo excursionista é comum nas lagoas desde os primeiros anos da década de 1990, como foi constatado na pesquisa e denuncia o relato de Seu José18, excursionista, freqüentador das lagoas em estudo, que diz, “a primeira vez que vim aqui faz mais de 15 anos”. Os ônibus de excursões são comuns apenas nos finais de semana, predominantemente nos domingos e, também, nos feriados, dada a disponibilidade 18 José Aparecido, 42 anos, excursionista oriundo de Natal/RN, bairro de Planalto. Pesquisa de campo, Lagoa de Boágua, 07 fev. 2010. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 69 de tempo livre destes turistas que representam uma parcela da classe trabalhadora. O fluxo de pessoas que movimenta caracteriza-se por dezenas de ônibus por mês, ao longo dos doze meses do ano. Por fim, outro tipo de “cliente” como se refere Kelly 19, são os que chegam em carro próprio, em pequenos grupos, oriundos, também, de municípios vizinhos. Segundo a comerciante freqüentam as lagoas “desde o início”, referindo-se aos anos de 1990. É interessante notar que apesar de alguns destes turistas, também, trazerem a farofa, a bebida e outros apetrechos (como fazem os excursionistas), mas não são tratados como “farofeiros”. Esta situação permite a conclusão de que a imagem negativa do excursionista está relacionada não apenas ao seu baixo poder de consumo, mas também por andar em “bando” e comportar-se “fora dos padrões” estabelecidos pelos comerciantes, o que será discutido no capítulo seguinte. Apesar das lagoas estarem inseridas na rota do turismo potiguar, o espaço revela deficiências que demonstram a fragilidade da atividade resultado da omissão e negligência do poder público local, o que é percebido por comerciantes e visitantes. Vivencia-se nas lagoas uma situação de descuido e de abandono a qual é facilmente observada tomando como exemplo alguns elementos da infra-estrutura básica relevantes à qualidade do produto turístico, como acessibilidade, estacionamento, segurança-pública, saneamento básico e coleta de resíduos sólidos. Elementos que agregam valor ao produto turístico e em determinados casos tornam-se decisivos para a seleção dos destinos que o turista elege visitar. Acessibilidade- O acesso principal às lagoas, como foi visto anteriormente, se dá pela BR-101 e RN-063, ambas oferecem condições satisfatórias aos fluxos turísticos. Porém a parte que compromete o acesso refere-se às estradas carroçáveis que ligam estas rodovias às lagoas (fotografias 15 e 16), as quais necessitam de manutenção constante, possuem uma sinalização precária e não oferece segurança aos que trafegam por elas. 19 Waldira Francisca é proprietária da Barraca da Kelly, como é conhecida na lagoa de Carcará. Pesquisa de campo, Lagoa de Carcará, 13 fev. 2010. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 70 15 16 Fotografia 15 e 16– Condições do acesso: entroncamento da RN-063 com estrada carroçável que liga à lagoa de Carcará (15), estrada carroçável que interliga as lagoas pelo interior do município (16). Estacionamento- As áreas que servem de estacionamento nas lagoas são, de um modo geral, as estreitas vias públicas existentes, as margens das lagoas e alguns terrenos de particulares que atualmente não estão sendo utilizados pelos proprietários (fotografias 17, 18 e 19). É importante ressaltar que diante desta deficiência existem estacionamentos particulares na área, cujos proprietários são os comerciantes locais e a permanência dos veículos está vinculada ao consumo dos turistas nos estabelecimentos. 17 18 19 Fotografias 17, 18 e 19 – Área de estacionamento na lagoa: Arituba (17), Boágua (18) e Carcará (19). ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 71 Segurança pública- Este serviço, também, é deficiente, conforme relato de um comerciante da lagoa de Carcará: “eles só vem aqui pra pegar o lanche”, referindose à prática abusiva de policiais militares que atuam na área os quais não oferecem a segurança devida. Outro fator que não oferece segurança é inexistência de bombeiros salva-vidas, apesar do risco eminente de afogamento por banhistas, o que vem sendo registrado nas lagoas de estudo nos últimos anos, sendo dois casos em Arituba e um em Carcará, no período entre dezembro de 2009 e janeiro de 2010. Saneamento-básico- Observou-se nas três lagoas a inexistência de saneamentobásico. A água utilizada pelos estabelecimentos comerciais é retirada de poços artesianos particulares e não é tratada; logo, não existe, também, tratamento de esgotos restando como alternativa para os comerciantes a construção de fossas sépticas nas margens das lagoas, com base nisto pode-se questionar sobre o risco eminente de contaminação do lençol freático, bem como, sobre a “qualidade” da água consumida e utilizada pelos banhistas. Coleta de resíduos sólidos- Este serviço é prestado pelo poder público municipal e de modo unânime, é avaliado pelos entrevistados como um serviço bastante precário, pois não atende às necessidades das lagoas. Sobre este relevante serviço, foram denunciadas a insuficiência no número de coletas que é feita apenas duas vezes por semana, a inexistência de garis assim como de coletores de lixo nas margens das lagoas, cabendo aos comerciantes realizar a manutenção da limpeza do lugar. As fotografias 20 e 21 retratam a situação de abandono do poder público em relação às lagoas que atinge com mais intensidade os excursionistas uma vez que nas áreas utilizadas por estes, o lixo se acumula: “passam de uma semana pra outra”, como relatou um entrevistado. 20 21 Fotografias 20 e 21 - Lixo encontrado na área utilizada pelos excursionistas: Arituba (20) e Boágua (21). ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 72 Ao questionar um representante do poder público municipal a respeito da implantação de uma melhor infra-estrutura nestas lagoas a resposta foi de que as ações dependem da facilidade de operacionalização, uma vez que “as questões ambientais engessam o poder público impedindo a realização de melhorias”. É importante notar que as lagoas em estudo situam-se numa Área de Proteção Ambiental (APA- Bonfim-Guaraíra) Outro aspecto que ajuda a entender a situação de descaso com as lagoas é de que o município desenvolve suas atividades com um reduzido quadro técnico em sua estrutura administrativa e não possui um plano de ação a nível local, para o desenvolvimento da atividade turística. Segundo um representante da Secretaria de Turismo de Nísia Floresta as ações são regidas pelas diretrizes do que é planejado em uma escala mais ampla 20 o que acaba dificultando a observação das especificidades do complexo fenômeno do turismo e das deficiências existentes diante do seu desenvolvimento. Deste modo, as necessidades mais prementes nas lagoas em estudo ficam sem o atendimento necessário. Mas, apesar da negligência do poder público local com a atividade turística que se desenvolve nas lagoas pode-se dizer que esta situação não impede a sua apropriação por diversos agentes de mercado e turistas, os quais possuem intencionalidades distintas no processo de produção do espaço, seja voltada para a reprodução capitalista ou para o desfrute do lazer. A partir desta visão geral sobre o processo de produção do espaço, pode-se observar os fluxos de pessoas e de mercadorias que são estabelecidos nestas lagoas e identificar a atuação do referidos agentes sociais. Podendo-se afirmar que neste processo o espaço passa por uma resignificação das suas formas, de acordo com as diretrizes do mercado e da estrutura produtiva vigente nas últimas três décadas. 20 Segundo dados do BANCO DO NORDESTE (2008), atualmente, o Pólo de Turismo Costas das Dunas é constituído por dezoito municípios e compreende todo o litoral oriental e parte do litoral norte do estado, no qual estão inseridos os municípios de: Arêz, Baía Formosa, Canguaretama, CearáMirim, Extremoz, Macaíba, Maxaranguape, Natal, Nísia Floresta, Parnamirim, Pedra Grande, São Gonçalo do Amarante, São José do Mipibu, São Miguel do Gostoso, Senador Georgino Avelino, Rio do Fogo, Tibau do Sul e Touros, o objetivo deste Pólo é fomentar o fortalecimento da atividade turística nesta região. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 73 Neste contexto, o Estado tem atuações variadas, às vezes, funciona como um grande agente modificador do espaço assumindo o papel de provedor das políticas públicas; e, em outros momentos, se omite da sua função de ordenar o uso do espaço para que este seja mais justo, menos desigual e com menores conflitos, o que se demonstra pelo abandono, omissão, inoperância do poder público local no que se refere aos problemas mais ínfimos, como uma coleta de lixo eficiente. O mercado e o consumo do espaço apresentam-se de várias formas: através dos loteamentos de terras que serviram à construção das segundas-residências, dos serviços de alimentação e entretenimento oferecidos aos vários turistas; nos ônibus fretados pelos excursionistas; na construção da infra-estrutura existente, ou no comércio ambulante presente. De qualquer modo o mercado está presente neste processo visando a obtenção do lucro e a reprodução do capital independente da intensidade. A demanda turística é diversificada as diferenças se dão quanto à origem e ao poder de consumo dos turistas, os quais se tornam desejados ou indesejados nestas lagoas, conforme os interesses e as condições de atuação dos comerciantes locais. Portanto, esta é a compreensão a respeito do processo de produção do espaço onde estão inseridas as lagoas em estudo, área que desde a década de 1980 passa a assumir uma função eminentemente turística. Contudo, antes de concluir este capítulo, é necessário enfatizar novamente que neste contexto está inserido o excursionismo, meio a diversos agentes sociais os quais se apropriam de modo diferente deste espaço turístico conforme interesses próprios, às vezes convergentes e outras divergentes, quer na forma de lazer ou visando a reprodução do capital. Então, nesta perspectiva, partimos para o próximo capítulo onde serão discutidos os conflitos existentes neste espaço, tomando-se como centro da discussão as relações estabelecidas entre os excursionistas, agentes do mercado local e a atuação do poder público municipal. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 74 4 UM “FAROFEIRO” INCOMODA MUITA GENTE, DOIS “FAROFEIROS” INCOMODAM MUITO MAIS: COMPREENSÃO DOS CONFLITOS TERRITORIAIS É no território, tal como ele atualmente é, que a cidadania se dá tal como ela é hoje, isto é, incompleta. Mudanças no uso e na gestão do território se impõem, se queremos criar um novo tipo de cidadania, uma cidadania que se nos ofereça como respeito à cultura e como busca da liberdade. Milton Santos Nesta parte do trabalho, intitulada: Um “farofeiro” incomoda muita gente, dois “farofeiros” incomodam muito mais, o objetivo é discutir sobre os conflitos territoriais existentes na lagoa de Arituba, Boágua e Carcará, tendo como enfoque de análise as relações estabelecidas entre os excursionistas (fotografias 22, 23 e 24), comerciantes locais e poder público municipal. 22 23 3 24 Fotografias 22, 23 e 24 – Chegada dos “farofeiros” na lagoa: Arituba (22), Boágua (23) e Carcará (24). O título deste capítulo que a princípio pode parecer engraçado21 tem o intuito de enfatizar o teor pejorativo que esta prática turística assume na sociedade, conforme demonstrado na área da pesquisa e em outros estudos (RODRIGUES, 21 A idéia deste título foi apreendida da musica infantil de domínio popular: “Um elefante incomoda muita gente, dois elefantes incomodam muito mais; três elefantes, incomodam muita gente [...]. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 75 1997; RUBINO, 2004; ALCÂNTARA, 2005) nos quais pode-se perceber o quanto o excursionismo é visto como depreciativo para as unidades receptoras desta demanda, o incômodo causado e os impactos desta prática como a mudança do “conteúdo social” dos lugares turísticos, como no dizer de Urry (2001). O termo “farofeiro” atribuído pelo senso comum ao excursionista demonstra a carga de preconceito que existe sobre estes cidadãos de classes populares que se destinam ao lazer, em qualquer destino turístico que se apropriem, como é analisado por Rodrigues (1997, p. 120), Trata-se porém de um fluxo de pessoas, visto pelos políticos, pelos moradores locais e pelos turistas de estratos sociais de maior poder aquisitivo, como verdadeiras „horda de desordeiros‟, acusados de causar sérios danos aos locais de destinos, gerando anarquia, depredação e agressão ao meio ambiente. Pode-se dizer que existe um consenso sobre a prática realizada por estas pessoas tidas com “pobres e mal educadas”, como demonstra, também, o estudo de Alcântara (2005) que diz, O que se verifica é que, [...], ao termo „farofeiro‟ se associa a imagem de um grupo social composto por pessoas pobres, mal educadas e bagunceiras. As excursões de farofeiros “não gastam”, “fazem arruaça” e “sujam”, e dessa maneira “só causam prejuízo” às comunidades receptoras. Diante da imagem negativa que o excursionismo assume, é importante se reportar, novamente, sobre o conceito defendido neste estudo (ver capítulo 1) como uma modalidade de turismo realizada por pessoas que representam a classe trabalhadora, mas que por serem de baixa renda sua presença vai de encontro com a intencionalidade de outros agentes presentes no espaço turístico das lagoas, cuja lógica é voltada para receber turistas dos estratos mais altos da sociedade, visando seu maior poder de consumo. Na área da pesquisa, a presença dos excursionistas não passa despercebida pelos diversos agentes sociais existentes. De um modo geral, muitos os rejeitam, mas alguns os aceitam, neste último caso, ocorre por parte de agentes do mercado ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 76 que percebem estes turistas como uma demanda lucrativa, uma vez que, apesar do seu baixo poder de consumo, movimenta, sobretudo, o setor informal da economia viabilizando, também, a reprodução do capital. O “incômodo” gerado por eles é percebido de várias formas seja no discurso assumido pelo poder público, barraqueiros e outros comerciantes locais, bem como pelas ações segregadoras demonstradas pelas barreiras físicas dispostas nas margens das lagoas e pela omissão do poder público em gerir o território turístico de modo a viabilizar uma infra-estrutura digna para estes turistas restando a estes visitantes serem tratados como “sujos” e “mal-educados”. Contudo, conforme demonstram as análises que se seguem a presença dos “farofeiros” é marcante e algumas barreiras são transpostas por eles, o que resulta em conflitos perceptíveis. Assim, as análises contidas neste capítulo visam entender como se dão os conflitos no território numa trama que envolve diretamente, agentes de mercado (barraqueiros e bugueiros), os excursionistas e o poder público local. E, nesta perspectiva, alguns questionamentos subsidiaram a pesquisa: como o poder público percebe e reconhece a presença dos excursionistas? Quais os discursos e práticas diante do fenômeno? Como se dá atuação do poder público local frente à demanda turística? Quais as estratégias de segregação por parte do mercado local para coibir o incômodo causado pelos “farofeiros”? Como os excursionistas percebem o território? Estas questões foram abordadas por meio de questionários, entrevistas e observação in loco, contemplando toda a área da pesquisa. Cabendo destacar que se trata de uma situação conflituosa por envolver agentes com intenções divergentes: os que querem ter direito a um dia de lazer, os excursionistas; os barraqueiros que querem comercializar seus produtos aos turistas com maior poder aquisitivo e assim obter maior lucro; e o poder público local que não quer a presença dos excursionistas pois, segundo a fala de um gestor local, “eles só deixam lixo”. Assim, a partir da análise do excursionismo dentro de um espaço turístico, foi possível perceber as fragmentações e contradições existentes. Trata-se da apropriação do espaço por agentes sociais concretos, pelo Estado, pelo mercado (através de seus agentes), e por turistas, inclusive os de baixo poder aquisitivo que representam um incômodo pois como defende Cruz (2007) a produção do espaço ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 77 envolve o seu uso e a apropriação que se dá por agentes sociais distintos e, nesse caso, o conflito termina por ser imanente ao processo. 4.1 REFLEXÃO SOBRE UM TERRITÓRIO DE USO TURÍSTICO No capítulo anterior analisou-se o processo de produção do espaço identificando as formas de apropriação de um território turístico por agentes hegemônicos e não hegemônicos, onde a presença o excursionista se insere e contraria o interesse de outros agentes que visam obter o lucro com turistas de maior poder de consumo, gerando conflitos que serão abordados neste capítulo. O conceito de território foi relevante para compreender o empírico, uma vez que, ao longo da pesquisa de campo observou-se a existência de territórios, onde as relações foram percebidas através das ameaças “sutis”, por parte de alguns entrevistados que representam o mercado local; por parte do poder público que por vezes mostrou-se indisponível para o repasse de informações públicas como se fossem privadas; bem como, por parte dos excursionistas, que sobre alguns questionamentos demonstravam-se “armados”, expressando demasiada irritação com a presença dos pesquisadores. Certamente, estas situações foram contornadas, uma vez que em qualquer abordagem junto a estes agentes, o pressuposto é de que estava se adentrando em territórios bem demarcados, o que foi possível pelo embasamento teórico a partir da contribuição de alguns estudiosos a respeito deste conceito geográfico. A discussão do território é vasta, porém a intenção, neste momento, é elucidar a tomada do melhor conceito para compreender os conflitos existentes na área de estudo tendo como elemento central a prática do excursionismo, ou seja, a apropriação do território pelos “farofeiros”. Para Raffestin (1993) espaço e território não são termos equivalentes, para este autor, o território se forma a partir do espaço e é resultado de uma ação conduzida por um ator que se apropria de um espaço concreta ou abstratamente e que acaba por territorializá-lo. É um espaço onde se projetou um trabalho, seja ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 78 energia ou informação, e que, por conseqüência, revela relações marcadas pelo poder. “é uma produção, a partir do espaço”. (RAFFESTIN, 1993, p.144). Santos e Silveira (2006), trazem também a preocupação sobre a distinção entre espaço e território, e para estes autores o que o interessa discutir é o território usado, sinônimo de espaço geográfico, através de uma análise sistemática da constituição do território, e, desta forma, Santos e Silveira (2006, p. 247) argumentam que, Quando quisermos definir qualquer pedaço do território, deveremos levar em conta a interdependência e a inseparabilidade entre materialidade, que inclui natureza, e o seu uso, que inclui ação humana, isto é trabalho e política. O território dessa forma é vivo, devendo ser considerado os fixos e os fluxos, sem desconsiderar o tempo, pois assim, “o território revela também as ações passadas e presentes, mas já congeladas nos objetos, e as ações presentes constituídas em ações”. (SANTOS E SILVEIRA, p.247), Contextualizado a discussão com a pesquisa, ao se tratar de um território com função turística, Cruz (2007, p.11) esclarece que: O uso turístico do espaço leva à formação do que temos habitualmente chamado de „território turístico‟, quer dizer, porções do espaço geográfico em que a participação do turismo na produção do espaço foi e ainda é determinante. Neste estudo, a autora chama a atenção que não existe território que seja exclusivamente turístico. Para Cruz (2007, p.11) o que existe de fato “são usos turísticos do território, ou seja, porções do espaço apropriadas por diferentes fins, incluindo-se e destacando-se a atividade do turismo”. Rodrigues (2006, p. 305), por sua vez, entende que o território turístico resulta da prática turística, ao mesmo tempo em que se concretiza e é transformado por ela, e enfatiza, ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 79 Um espaço apropriado torna-se território, expressão de poder, poder não somente do ponto de vista político, no sentido mais concreto de fundo dominial, mas expressando também poder no sentido mais simbólico, de apropriação por meio das representações sociais. É, portanto, com base nesta concepção de território, enquanto expressão de poder no sentido não só político, mas também simbólico que se dará a compreensão dos conflitos entre os sujeitos sociais que dividem o território turístico que compreende a área de estudo das lagoas de Arituba, Boágua e Carcará. 4.2 “FAROFEIROS”, PODER PÚBLICO E COMERCIANTES LOCAIS: CONFLITOS EXISTENTES E AS ESTRATÉGIAS DE SEGREGAÇÃO Para analisar os conflitos e as estratégias de segregação meio às relações estabelecidas entre “farofeiros”, poder público e comerciantes locais nas lagoas em estudo, é importante destacar de início que o excursionismo não é reconhecido como uma modalidade turística o que ajuda a compreender porque são vistos como “intrusos” neste território turístico. Como foi verificado junto ao poder público, não existem ações no contexto do turismo municipal, que incluam ou voltem-se diretamente para a realização desta atividade que acaba ficando a cabo dos agentes de mercado (proprietários de estabelecimentos comerciais instalados nas lagoas) os quais sentem-se “donos do pedaço”, como disse um excursionista entrevistado. Os comerciantes locais, por sua vez, sentem-se incomodados diante da presença do “pessoal dos piqueniques”, “ônibus de excursão”, “farofeiros”, “demolidores” ou simplesmente “povão”, os quais viajam por algumas horas para ter o dia um dia de lazer e para isso enfrentam situações que ferem a cidadania, cujos direitos são tolhidos, como o direito de ir e vir e o acesso ao espaço de uso comum: as margens das lagoas. Outro aspecto que é importante enfatizar é de que os conflitos existentes na área da pesquisa têm como motivos essenciais a divergência de interesses entre os comerciantes locais e excursionistas, pois enquanto os comerciantes se apropriam do espaço turístico visando a obtenção do lucro com a atividade turística viabilizada ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 80 por turistas com maior poder aquisitivo, os excursionistas se apropriam eminentemente para o lazer, de um modo econômico, não deixando os lucros almejados pelos donos de barracas nas lagoas, sendo esta a questão primordial dos conflitos existentes. Um contexto que resulta em estratégias de segregação não apenas por parte destes comerciantes, mas, também, por parte do poder público que negligencia de um modo geral a atividade turística que se desenvolve em Arituba, Boágua e Carcará. Nesta pesquisa a discussão teórica sobre a segregação não será aprofundada mas, é necessário elucidar que concorda-se com o que é defendido por Lefebvre (2001), para quem a segregação é uma estratégia de separação das classes sociais (consciente ou inconsciente); é regida mais ou menos facilmente pelos poderes públicos; bem como, pelas empresas. Conforme Lefebvre (2001, p.97), A segregação deve ser focalizada, com seus três aspectos, ora simultâneos, ora sucessivos: espontâneo (proveniente das rendas e das ideologias) – voluntários (estabelecendo espaços separados) – programado (sob o pretexto de arrumação e de plano). Esta concepção colabora com a intenção, por hora, pretendida: identificar as estratégias utilizadas pelo mercado e poder público local para dificultar a prática do excursionismo nas lagoas em estudo; e elucidar como se dá a atuação dos excursionistas, os quais burlam variadas tentativas de segregação o que acaba por instigar os conflitos territoriais conforme visto nesta pesquisa. Nesta perspectiva, observou-se que apesar de serem identificados os territórios dos comerciantes e dos excursionistas (mapas 3, 4 e 5) a separação física entre estes agentes não é efetiva e relações sociais conflituosas são estabelecidas, podendo-se dizer que estes territórios até se confundem em alguns momentos; e, por serem os interesses divergentes os conflitos entre excursionistas e barraqueiros são marcantes no espaço. Esta situação é percebida de imediato pela disputa por pequenas faixas de terras nas margens das lagoas, onde se encontram mesas, ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 81 cadeiras, brinquedos aquáticos, muros, cercas, dentre outros objetos fixos e móveis que cerceiam o direito à área de uso comum, almejada pelos excursionistas. Conforme demonstram os mapas 3, 4 e 5, a área física utilizada pelo turismo de massa é restrita quando comparada à extensão total das lagoas. A maior parte da área de uso comum possui um caráter privado, uma vez que, são apropriadas pela propriedade privada como extensão das segundas residências. Observou-se com a pesquisa de campo que os acessos públicos, nestas áreas, não são respeitados o que acaba sendo legitimado pela falta de ação do poder público local o qual se omite de ordenar o uso deste território permitindo assim sua privatização, uma forma de segregação que é justificada por um representante da prefeitura da seguinte forma: “vai abrir acesso público pra quê? Pra encher de farofeiro? Eu não vou arranjar problema pra mim!” A respeito desta apropriação indevida de um espaço de uso comum, é importante destacar a atuação do poder judiciário através do Ministério Público. Desde os anos 2000 este órgão vem realizando intervenções que tendem a minimizar os efeitos segregadores da apropriação das margens das lagoas, como a derrubada de muros, de cercas e a retirada de outros obstáculos físicos. É importante destacar que no entorno destas lagoas existem, ainda, grandes extensões de terras desocupadas (ver mapas 3, 4 e 5) mas a paisagem atrativa associada a outras vantagens como o preço da terra, a existência de uma infraestrutura turística (mesmo que precária) e algumas fragilidades nas leis vigentes são aspectos que despertam o interesse de grupos imobiliários com capital externo (FONSECA, 2005). Esta situação foi constatada durante a pesquisa de campo através de depoimento da comunidade local: “já tem gringo interessado no Carcará”, “tem gente grande de olho nesta lagoa”, referindo-se à Boágua enquanto em Arituba a chegada de capital estrangeiro está num estágio mais avançado, uma vez que no entorno desta lagoa já se encontra uma condomínio de segundas residências de um grupo de noruegueses, podendo-se afirmar que a área da pesquisa já está inserida na rota do capital imobiliário internacional. Este processo, ainda incipiente, decorre da inserção do produto turístico potiguar no turismo globalizado e pode ser entendido como indícios de uma ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 82 tendência: a internacionalização da atividade turística que é discutida por Fonseca (2007, p.215): A internacionalização é um movimento de fora para dentro, e inicia-se com a chegada de investidores estrangeiros que implantam empreendimentos ao longo do litoral potiguar, especialmente em sua porção oriental. Parte significativa desses empreendimentos possui grandes dimensões e traz inovações com relação à tipologia dos empreendimentos turísticos até então existentes, associando meios de hospedagens com casas de segunda residência e vastas áreas de lazer. Uma idéia que permite retomar o estudo de Rodrigues (1997, p.23) cuja análise sobre as nuances da atividade turística na América Latina corrobora com o que se pensa sobre à área desta pesquisa: Evidentemente que estas áreas funcionam até agora como espaços de reserva, mas tendem a atrair grandes fluxos num futuro bem próximo, promovidos pelas megaempresas. Contudo, não se pretende aprofundar tal discussão nesta pesquisa sendo aqui sinalizada, apenas, como uma tendência que poderá se confirmar num futuro próximo, uma vez que estando as lagoas de Arituba, Boágua e Carcará na rota do turismo potiguar, significa assumir posição na rede global desta atividade. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 83 Mapa 3 – Mapa de localização dos territórios dos comerciantes locais e dos excursionistas na lagoa de Arituba, Nísia Floresta (RN). Elaboração: Janny Lima, 2010. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 84 Mapa 4 – Mapa de localização dos territórios dos comerciantes locais e dos excursionistas na lagoa de Boágua, Nísia Floresta (RN). Elaboração: Janny Lima, 2010 ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 85 Mapa 5 – Mapa de localização dos territórios dos comerciantes locais e dos excursionistas na lagoa de Carcará, Nísia Floresta (RN). Elaboração: Janny Lima, 2010. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 86 Retomando o foco da discussão, as lagoas estão inseridas numa zona especial de proteção ambiental cujo uso deve ser regulado conforme está previsto no Plano Diretor do município, Art. 17 que diz, §2º A zona especial de proteção ambiental II-ZPA II constitui-se de áreas de domínio público ou privado, classificadas como áreas de manguezais, margens dos rios e lagoas ou que apresentem espécies ameaçadas ou em iminente extinção, classificadas em listas oficiais. Ao redor das lagoas, lagos, rios, cursos d‟água e nascentes não será permitida qualquer construção nas áreas situadas em faixa marginal, medida a partir do nível mais alto, contado da margem do espelho d água, em projeção horizontal, com largura mínima de: I) trinta metros, para o curso d‟água com menos de 10m (dez metros) de largura; II) cinqüenta metros, para o curso d‟água a partir de 10 (dez) até 50m (cinqüenta metros) de largura; [...]. (NÍSIA FLORESTA, 2008, p. 22) Apesar do que estabelece esta norma seu cumprimento não existe pois em nenhumas das lagoas estudadas as faixas mínimas, citadas acima, são respeitadas. Ao contrário, são ocupadas por construções prediais e pela disposição de objetos voltados para a realização do comércio local como: caiaques, pedalinhos, mesas e cadeiras, entre outros (fotografias 25, 26 e 27). Esta situação é ainda mais problematizada no período em que as lagoas estão com sua carga máxima de água, o que acaba por estreitar ainda mais a faixa de terra disputada entre comerciantes locais e os indesejados excursionistas. A respeito, o relato de um comerciante local da lagoa de Caracará, chama a atenção por evidenciar que os conflitos tornam-se mais evidentes neste período: “quando a lagoa enche eles ficam tudo aqui”, ou seja, numa estreita faixa de terra acaba por se amontoar turistas de vários perfis de consumo, então, a presença do “farofeiro” acaba afastando os outros clientes, disse o entrevistado. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 87 25 21 26 27 21 Fotografia 25, 26 e 27 – Apropriação das margens das lagoas pelo comércio local: Arituba (25), Boágua (26) e Carcará (27). É válido acrescentar que o Plano Diretor do município teve sua primeira versão elaborada no ano de 2001, como parte dos investimentos do PRODETUR/RN I (FONSECA, 2005) e no ano de 2007 foi revisado, o que permite dizer que a preocupação, em escala local, com o uso e ocupação do solo é algo recente e apesar de sua existência não significa um instrumento de fácil operacionalização, como foi destacado por um representante do poder público local. O que se vê hoje, resulta de um processo de privatização do território, iniciado com a abertura dos primeiros loteamentos e pelas construções das segundas residências (etapa do processo da produção do espaço já abordada no capítulo 2), quando a preocupação com acessos públicos, provavelmente, não foi “atentada” (ou não se quis fazer), tornando as lagoas quase que totalmente privadas, restringindo o seu uso à pequenas faixas de terra fazendo com que os turistas fiquem a mercê dos agentes de mercado para terem direito ao dia de lazer. A relevância do espaço público nesta discussão se baseia no seguinte entendimento: ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 88 A categoria de „espaço público‟, dentro de uma perspectiva geográfica, tem uma centralidade absoluta na condução de uma análise sobre a apreciação da cidadania hoje. De tal forma essas categorias estão associadas – espaço público e cidadania -, que a configuração e a transformação da primeira significam mudanças absolutas na segunda. (GOMES, P., 2006, p.188), Ainda segundo Gomes (2006) estes espaços estão sendo desfigurados através das invasões, apropriações, ocupações e se tornam cada vez mais, alvo de disputa e: “O encolhimento do espaço público corresponde a um recuo na vivência da cidadania” (GOMES, P., 2006, p.188). Nas áreas da pesquisa, observa-se que os agentes do poder público e do mercado reconhecem que o acesso às lagoas é restrito e que espaço público está sendo privatizado indo de encontro ao que prevê o Plano Diretor de Nísia Floresta (2007), onde o acesso aos recursos hídricos é tratado em artigo específico sobre a acessibilidade ao território municipal: Art. 95. As praias, lagoas, rios e demais corpos d água são bens públicos de uso comum, devendo ser assegurado, o seu livre acesso em qualquer direção e sentido [...]. (NÍSIA FLORESTA, 2008, p.53) Apesar desta norma estabelecida o que se vê in loco é exatamente ao contrário: a intensa precariedade de acessos públicos e em alguns casos a inexistência. O Plano Diretor do município, também, regulamenta sobre um outro direito dos cidadãos que tem sendo tolhido: o de ter acesso aos sistemas de circulação de um modo geral, aos espaços públicos, aos equipamentos e serviços de lazer o que deve ser possibilitado por vários meios de transportes de forma segura, eficiente, socialmente inclusiva e ambientalmente sustentável. É válido relembrar (ver capítulo 2) que as estradas carroçáveis que interligam a BR-101 e RN-063 às lagoas em estudo, não oferecem nenhuma destas condições, podendo-se dizer que esta situação funciona como fator de segregação para os que geram o incômodo, como os “farofeiros”. Mas, seria errôneo dizer que isto ocorre apenas em relação às lagoas da área de estudo, pois nas outras lagoas de Nísia Floresta (ver capítulo 1) observa-se que o ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 89 acesso é restrito uma vez que as condições das estradas que servem de acesso não possibilitam o fluxo de veículos como carros populares, ônibus de excursão, etc. (fotografia 28). Assim, o uso desta área que faz parte do denominado “Circuito das lagoas” (ver mapa 2) restringe-se aos veículos apropriados para trafegar em solos arenosos (em área de dunas), como buggy ou caminhonetas com tração nas quatro rodas o que não é comum entre as classes populares. Fotografia 28 – Carro popular atolado no trecho que dá acesso à lagoa do Urubu. Nesta perspectiva, é possível compreender a partir da infra-estrutura urbana existente e do processo de ocupação no entorno das lagoas, porque o excursionismo é mais intenso em Arituba, Boágua e Carcará, pois nestas lagoas, apesar das barreiras geradas pela privatização das margens pelas segundas residências e das dificuldades enfrentadas no acesso, ainda existe uma faixa de terra “disponível” de natureza privada, as quais tornaram-se os territórios dos excursionistas (fotografias 29, 30 e 31). ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 90 29 30 31 Fotografias 29, 30 e 31– Território dos excursionistas: Arituba (29), Boágua (30) e Carcará (31). O espaço público resume-se, de um modo geral, à área do banho e às poucas ruas que dão acesso às lagoas, algumas abertas por iniciativa dos comerciantes locais com o objetivo de viabilizar a chegada de clientes e não de “farofeiros”, situação que contraria alguns comerciantes em Carcará, por exemplo. É válido apontar que no caso específico de Arituba no momento da realização do projeto de urbanização (comentado no capítulo 2) houve certa preocupação com o espaço público, deixando-se ruas de três metros de largura entre as barracas construídas. Porém, constatou-se que alguns destes acessos estão sendo apropriados pelos barraqueiros sendo utilizados como extensão predial do estabelecimento (fotografia 32) ou como porta de entrada dos banheiros particulares (fotografia 33), o que acaba, também, dando um sentido privado a este acesso. Esta situação precisa de uma intervenção urgente por parte do poder público a fim de não ser cerceado os direitos de acesso ao espaço público e de ir e vir que é inerente a qualquer cidadão. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 91 32 33 Fotografias 32 e 33 – Ocupação de acessos públicos pelos comerciantes locais em Arituba: ampliação predial da barraca (32), entrada de banheiros (33). Além da segregação espacial que os excursionistas têm que burlar para terem garantidos os direitos de ir e vir e do acesso aos espaços públicos nestas lagoas, percebeu-se que outras estratégias são utilizadas nestes territórios turísticos para coibir a presença do “farofeiro” sendo que estas são percebidas de modo mais explícito em Arituba e Carcará, enquanto em Boágua é algo mais “discreto”. Dentre as estratégias está a delimitação de áreas específicas para que os ônibus de excursão estacionem e o local que os excursionistas devem ficar (ver mapas 3, 4 e 5) como demonstra a fala de um comerciante entrevistado questionado sobre a existência de um lugar específico para os “farofeiros”: “[...] pessoal de excursão é pra lá, aqui não! O lugar deles é lá!”. Tal delimitação de áreas destinadas à permanência dos excursionistas não resulta de nenhuma intervenção pública para organizar a o dia de lazer dos excursionistas, uma massa de turistas que comumente varia entre 500 a 3000 pessoas num dia de domingo ou feriado. As restrições e a “disciplina” são assumidas pelos comerciantes, através de objetos carregados de um conteúdo de segregação, como as cercas, que dificultam os acessos; ou através das placas proibitivas facilmente encontradas na área externa das barracas que alertam: “não aceitamos ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 92 comida e bebida em nossas mesas, obrigado.” ou, simplesmente: “proibido pessoal de excursão, piqueniques, etc.” Além de objetos materiais algumas ações comentadas pelos entrevistados revelam outras estratégias de segregação, como foi notado: como a proibição e restrições para o uso dos estabelecimentos comerciais, pelos “farofeiros”: alguns estabelecimentos “não deixam nem sentar”, ou “pra mim eles nem vem [...] quem já conhece sabe: nas mesas eu não permito! Em outros casos existir a negociação existe, é quando se permite a utilização das instalações com a condição de haja consumo no estabelecimento, ou que fiquem em áreas pouco privilegiadas: “os que trouxerem bebida e comida ficam lá traz”. Neste contexto está o aluguel de mesa aos excursionistas que pode ser entendida como negociação ao se cobrar R$ 15,00/dia na lagoa de Carcará ou como fator de expulsão, tomando o exemplo de Arituba, uma vez que, o valor cobrado chega a R$ 60,00/hora. A cobrança destes valores é vista por alguns excursionistas como abusivos os quais acabam por reclamar; outros, dizem que não tem o que fazer e pagam porque “agente não saiu de casa para se chatear”; enquanto uma minoria resiste e diz que a lagoa é pública e resistindo à segregação se instalam na faixa de terra interna das barracas culminando em conflitos com os comerciantes locais. As restrições aos excursionistas para o uso dos brinquedos aquáticos também é realidade, o valor do aluguel destes brinquedos varia entre R$ 3,00 e R$ 10,00 (por tempo determinado), mas segundo os responsáveis dos pedalinhos e caiaques os excursionistas não são clientes bem vistos, como justificou um entrevistado: “Agente não gosta de alugar pra farofeiro, não, eles são muito amostrados, chega no meio da lagoa quer pular, tudo bêbado, e se afogar é problema pra gente[...].” O que cabe ressaltar é que este comportamento não é exclusivo de “farofeiro”, mas apenas estes são “mal vistos” e carregam consigo um estigma de desordeiro. É comum, também a cobrança de taxas para utilizar instalações sanitárias dos estabelecimentos que variam entre R$ 3,00 e R$ 5,00, uma vez que não existem banheiros públicos para atender às necessidades fisiológicas dos excursionistas e segundo os comerciantes, “ninguém aqui tem obrigação de dar banheiro limpo, então, tem que cobrar!” ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 93 Além de todo o exposto as falas de alguns entrevistados são, por si só, esclarecedoras da forma como se insere o excursionismo no contexto das lagoas de Arituba, Boágua e Carcará. Para E. D, 52 anos, comerciante local: Esse sistema, desse pessoal demolidor [risos], é porque realmente em vinte anos eu nunca tive uma alegria, com ônibus de excursão [...] o farofeiro é aquele que vem e às vezes não traz nem comida, mas vem só pra depredar, esse é o que considero farofeiro [...] e outra, a maioria desse povo que vem nessas excursões, que ajuda a depredar, que joga lixo, que faz cocô na margem da lagoa, que não respeita nada, é um pessoal feio, assim,como se aparenta ser da periferia, puta merda [...]. Esse pessoal que vem [...] não todos [se policia, temendo generalizar], mas sempre vem uma turma embriagada, drogada, sei lá o que?! [...] esse, implica, chama a gente de ladrão, falta com respeito [...] o farofeiro é agressivo, é seboso [...] não chamo farofeiro, porque trouxe lanche [...] considero o farofeiro aquele que vem depredar, o comportamento nojento, me dá logo raiva, é o demolidor, vem desrespeitar, vem só desrespeitar. [...] [...] Vem de onde você imaginar [...] e tem o um troço ruim, que vem de outros estados, também, principalmente da Paraíba, ave Maria, de Bayeux é demais, homem é um negocio horrível esse povo [...] parece que é lugar só de gente ruim, juntaram só a escória humana e juntaram lá [referindo-se a Bayeux]. [...] tem que ter um trabalho de conscientização, esses ônibus quando chegar era para que nos tivéssemos aqui uma pessoa da prefeitura ou um policial, abordar quem é o responsável, dizer aqui nos temos essa norma, querem ficar aqui? É público, mas se constatar que você depredou vai pagar multa [...]. A fala reproduzida demonstra, sobretudo, o teor de marginalização que está vinculada à imagem do farofeiro ao mesmo tempo em que denuncia o incômodo da prática, o que é reforçado em um outro depoimento obtido junto à W.F, 45 anos, comerciante local, A excursão de ônibus, não! Porque eles são assim [...] eles trazem muito problema, [...] chegam, trazem as coisas: traz a comida, trazem a churrasqueira, não querem alugar mesa, humilha a gente, diz que vai ficar porque isso aqui público. Claro! Eles chegam tá tudo limpinho, tudo arrumadinho [...]. Eu não tenho obrigação de dar mesa de graça pra eles nem ceder o espaço de graça [...] até porque deixam muita sujeira, muito lixo, é muita bagunça [...], infelizmente, eu aceito, porque não tenho opção. Pelo exposto pode-se inferir conforme aponta Rodrigues (1997) que o preconceito com estes excursionistas tem origem no baixo poder de consumo e no ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 94 baixo nível de educação, resultando numa prática de baixo “tom social”. Para Alcântara (2005, p.78), “o discurso presente no senso comum constrói a realidade de uma forma que desqualifica a prática social e legitima a repressão sobre a mesma”. Contudo, apesar dos “farofeiros” representarem incômodo aos demais agentes em todas as lagoas em estudo, é possível perceber que as relações de conflitos se dá de modo mais intenso em Arituba, seguida de Carcará e com menor intensidade em Boágua. Nesta última, mais conhecida como “Balneário de Boágua”, a estratégia dos comerciantes locais não é de repulsa, ao contrário, tem a intenção eminente de ter os “farofeiros” como clientes, pois conforme um entrevistado a prática é produtiva e significa “trabalhar com dinheiro vivo”, é o caso particular onde os “farofeiros” tornam-se todos em “clientes em potencial”, disse o entrevistado. A especificidade de “agradar” aos excursionistas está relacionada com a oferta de produtos a um preço acessível. Em Boágua o “farofeiro” sente-se “bemvindo”, “acolhido”, para esta clientela o comércio local oferta, ao mesmo tempo, os seguintes produtos de entretenimento e lazer: o acesso ao parque aquático e à casa de show, conhecido dentre os excursionistas como “o forró” (fotografias 34 e 35), tudo pelo baixo custo de R$ 5,00 (cinco reais). Nesta espécie de complexo turístico para classes populares é permitida a entrada de comida e bebida, a utilização indiscriminada dos brinquedos aquáticos e ao forró, bem como o acesso às instalações sanitárias. 34 35 Fotografias 34 e 35 – Comércio local voltado para excursionistas em Boágua: entrada do parque aquático (34), casa de show (35). O olhar de um excursionista sobre essa lagoa resume o sentimento da maioria: “aqui é um paraíso”, o que permite inferir que Boágua assume o primeiro ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 95 lugar na preferência dos “farofeiros” na hora de decidir o destino das excursões, em relação à Arituba e Carcará dada as opções de lazer que lhes são oferecidas. Apesar deste tratamento especial não se pretende afirmar que a parcela dos excursionistas, mesmo sendo uma minoria, que não entra neste complexo, não causa incômodo, uma vez que recai sobre estes a responsabilidade por toda a sujeira fora do parque aquático e, do mesmo modo que acontece nas demais lagoas em estudo, os que não são clientes deste estabelecimento comercial são vistos como “sujos” e “mal-educados”. Com base no que foi observado sobre Boágua, pode-se inferir que a expressividade do excursionismo nesta lagoa não é aleatória, está ligada ao fato deste território turístico não ter conseguido, até então, atrair um contingente mais abastado do turismo de massa, seja turistas ou novos comerciantes; ou por não ter sido apropriado pelos grandes empreendimentos imobiliários que já se avizinham como disse o comerciante local entrevistado. Esta situação “marginal” de Boágua em relação à Carcará e, sobretudo, à Arituba possui relações não apenas com o baixo “tom social” impresso ao território pela expressiva demanda de excursionistas que a freqüenta desde a década de 1990. Mas, também, pela inexistência de uma infra-estrutura urbana que viabilize a fluidez de turistas e de capital no território, o que certamente seria alterado com a concretização do “Circuito das Lagoas”, projeto que resultaria em implicações espaciais diversas podendo, inclusive, tornar inviável “o paraíso dos farofeiros”. Feitas as considerações sobre a especificidade de Boágua, retoma-se uma escala mais ampla de análise dos conflitos na área geral da pesquisa. Conforme no que foi exposto neste capítulo pode-se afirmar que, de um modo geral, o excursionismo é uma prática social segregada onde os agentes de mercado e do poder público utilizam várias estratégias para inibir e inviabilizar a presença dos “farofeiros”, principalmente em Arituba e Carcará. Contudo, pode-se dizer com base nos números apresentado nas tabelas 1 e 2, que a maioria dos excursionistas não percebem as formas de segregação, as ações de repulsa e o discurso de marginalização presentes de várias formas no espaço, uma vez que 88% dos entrevistados responderam que não sentem nenhum tipo de discriminação neste território turístico (tabela 1). ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 96 Tabela 1- Opinião dos excursionistas sobre discriminação. Se sente discriminado? Sim Não Total Área da pesquisa 9 65 74 % 12% 88% 100% Outro aspecto que permite tal conclusão é o fato de passar despercebido pela maioria dos excursionistas o fato das excursões serem direcionadas a áreas específicas nestas lagoas; de terem acesso restrito à margem da lagoa; e de que no pedaço do território que é permitido a permanência encontra-se marcado por muros e cercas, as quais, por si só, denunciam que a disponibilidade daquele espaço é temporária até que o proprietário ocupe este espaço. Esta constatação pode ser conferida pelos números da tabela 2: 93 % dos entrevistados avaliam como suficiente o espaço que é reservado aos excursionistas (ver mapas 3, 4 e 5), o que demonstra, também, a passividade da sociedade mesmo quando seus direitos são tolhidos, como demonstra a fala de um entrevistado: “aqui tá bom demais”, ou seja, esta fala e os números apresentados apontam a satisfação dos excursionistas com o lugar que podem ficar. É interessante notar que nenhum dos entrevistados se mostrou interessado em ocupar uma outra faixa da margem da lagoa. Apesar de perceberem que nestas lagoas existe “o outro lado”. Tabela 2- Opinião sobre o espaço físico disponível aos excursionistas. Como avalia o espaço que estão É apertado O espaço dá para todos Gostaria de ocupar outro lugar da lagoa Não respondeu Total Área da pesquisa % 4 69 0 1 74 5% 93% 0% 1% 100,00% Ainda no sentido de conhecer a passividade dos excursionistas em relação aos demais agentes neste território perguntou-se sobre a existência de algum tipo de problema, do tipo discussões, brigas ou intervenções policiais, durante a realização de excursões nas unidades receptoras (tabela 3) e a respeito 96 % dos excursionistas responderam que nunca passaram por problemas desta natureza pondo em questão a imagem vinculada aos “farofeiros” de serem violentos. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 97 Tabela 3 - Avaliação sobre a existência de conflitos durante as excursões nas unidades receptoras. Tem ou teve algum tipo de problema em relação aos comerciantes ou poder público Sim Não Total Área da pesquisa % 3 71 74 4% 96% 100% Esta passividade, porém, tem seus limites uma vez que foi comum o relato de comerciantes sobre o tratamento agressivo de alguns excursionistas diante da cobrança de taxas para utilizar o espaço público das lagoas, o que já foi discutido neste capítulo. 4.3 A INFRA-ESTRUTURA DISPONÍVEL, UM DESRESPEITO AO CIDADÃO Com vistas a concluir este capítulo foram analisadas as condições da infraestrutura que é utilizada pelos excursionistas no seu tão sonhado dia de lazer. No contexto desta pesquisa não se encontram terminais turísticos como os que existem no litoral paulista, os quais foram analisados por Rodrigues (1997) e Rubino (2004). Segundo Rodrigues (1997, p.115), na década de 1980, [...] foram instalados, diversos pontos do litoral paulista, os chamados terminais turísticos, objetivando, segundo o discurso oficial, oferecer o „lazer com dignidade para o povo‟ [...]. Consta de sanitários com duchas, áreas cobertas para piqueniques, guarda-bagagem, posto de saúde, posto policial e posto de salvamento [...]. Mas, na verdade, estas construções tinham como maior objetivo tirar os “farofeiros” das praias, diz Rodrigues (1997, p.116): Trata-se, portanto, de uma política segregacionista e discriminatória, visando não incomodar os „consumidores de maior poder aquisitivo‟ que alimenta expressiva produção de mercadorias e circulação de capital, passando pelo mercado imobiliário, pela indústria da construção civil na produção da segunda residência, pelo crescimento do setor de comércio e ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 98 serviços, mobilizados na produção do espaço turístico nos países capitalistas. Alternativas legitimadas pelo poder público que visam a segregação e a exclusão dos “farofeiros”, um problema também percebido nas praias cariocas conforme demonstra o estudo de Colpo, Azevedo e Abreu (200?, p.8), que analisam a construção do Piscinão de Ramos como sendo uma grave “solução higienizadora” para “livrar” a Zona Sul da cidade do Rio de Janeiro da inoportuna presença dos “descamisados” oriundos das classes desfavorecidas. Em Arituba, Boágua e Carcará a situação torna-se ainda mais problemática, pois a omissão do poder público gera não só a segregação, como também, provoca os conflitos entre os agentes locais presentes neste território turístico. É importante relembrar que no capítulo 2 as deficiências na infra-estrutura e a negligência do poder público local já foram abordadas, então, o que se pretende aqui é enfatizar alguns elementos que se mostram precários na área da pesquisa como inexistência de banheiros públicos e de uma limpeza urbana adequada, que acabam alimentando os conflitos entre comerciantes, poder público e excursionistas. Não se pretende neste estudo retirar dos excursionistas a responsabilidade que muitos têm pela sujeira, mas de enfatizar que, principalmente, o poder público local tem o poder de minimizar os conflitos que se dão por este motivo aparente. Estes conflitos estão contidos nos discursos dos comerciantes locais e do poder público e estão embasados no discurso ambiental (fotografia 36) vigente na sociedade atual. Então, sendo os excursionistas tidos como “mal-educados, pobres e sujos” recai sobre eles a culpa da “degradação ambiental” causada pelo lixo deixado por eles nas lagoas. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 99 Fotografia 36 – Placa ilustrativa do discurso ambiental presente no território turístico. O apelo de respeito à natureza presente nas placas colocadas para o “farofeiro” ler, representa bem o discurso ambiental, pois o que se percebeu implicitamente junto aos comerciantes entrevistados é que a maior preocupação deles é “proteger as tetas” e não o meio-ambiente. Para os agentes do mercado local as lagoas representam uma fonte lucro há mais de duas décadas e a presença do “farofeiro”, uma vez que “só trazem sujeira” acaba por desqualificar este território turístico. Nesta perspectiva, é importante ressaltar que não existe muita diferença quanto à degradação ambiental causada pelo lixo deixado pelos excursionistas farofeiros e pela existência entre as fossas sépticas das barracas instaladas na margem das lagoas as quais se apresentam como um fator de risco, eminente, de poluição ambiental. Tomando como referência o “olhar do turista” questões neste sentido, foram abordadas. Sobre a limpeza das lagoas pode-se dizer que, de um modo geral, o lixo é comum no território dos excursionistas, o que foi percebido in loco e reclamado pelos comerciantes locais (ver capítulo 2) uma vez que não existe uma limpeza regular e suficiente por parte do poder público. Porém, os dados da tabela 4 demonstram o contrário. Esta área foi considerada como limpa por 41 % dos entrevistados. Enquanto 30% avaliam que a limpeza está mais ou menos, ou seja, não está tão sujo que não dê para ficar. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 100 Tabela 4 – Avaliação dos excursionistas a respeito da limpeza nas lagoas. Avaliação da limpeza Limpo Sujo Mais ou menos Não respondeu Total Área da pesquisa % 30 20 22 2 74 41% 27% 30% 3% 100% Contudo, para que possa ser exigido o exercício de limpeza por parte dos excursionistas ou de qualquer outro cidadão que freqüente a lagoa é preciso que existam, no mínimo, coletores de lixo dispostos na área (tabela 5). Uma deficiência observada por 74% dos entrevistados que responderam que inexistem depósitos de lixo nas áreas destinadas às excursões e, sobre a sujeira na lagoa de Arituba, durante a entrevista, um excursionista se defende: “quando a gente chegou já estava sujo”. Tabela 5 – Avaliação sobre a existência de receptores de lixo. Existência de lugar para colocar lixo Área da pesquisa % Existe Não Existe Não sabe responder 8 55 11 11% 74% 15% Total 74 100% Considerando ainda a existência de um discurso ambiental vigente o qual está presente nas lagoas e, de modo intenso, no cotidiano das pessoas diante dos constantes apelos da mídia para esta questão, os excursionistas foram questionados, sobre a destinação que davam ao lixo produzido durante o seu dia de lazer. Como resultado, 53% afirmaram que levam consigo os resíduos produzidos (principalmente as embalagens de produtos), enquanto 43% arrumam o lixo antes de sair, acreditando que o serviço de limpeza será feito pelo poder público local (tabela 6). Tabela 6 - Destino do lixo produzido pelos excursionistas. O destino do lixo Nem liga Arruma antes de sair Leva embora Não respondeu Total Área da pesquisa 3 30 39 2 % 4% 41% 53% 3% 74 100% ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 101 Os dados não permitem desconstruir o estigma de “sujo” dos “farofeiros”, pois, apesar de apenas 4% terem afirmado que não se responsabilizam pelo lixo produzido, o somatório de 96% certamente não representa uma verdade completa, uma vez que assumir, em uma entrevista, que o lixo produzido não foi destinado corretamente, é algo que causa um certo constrangimento ao entrevistado. Mas a questão é saber se existe uma infra-estrutura disponível para atender ao “farofeiro” ou qualquer outro turista, que queira colocar o lixo no lugar certo: uma lixeira por exemplo. Assim, corrobora-se com a discussão iniciada no capítulo 2, sobre a negligência do poder público local com a limpeza das lagoas. Uma situação que compromete a qualidade do produto turístico como um todo, pois foi comum encontrar turistas indo embora das lagoas dada a sujeira encontrada. Podendo-se inferir que este processo de desqualificação das lagoas não deve ser associado aos excursionistas mas, sobretudo, omissão do poder público local quanto à infraestrutura existente. Cabe ainda ressaltar que ser limpo independe de classe social e do nível educacional dos cidadãos. Afinal, jogar lixo no chão não é ação exclusiva do “farofeiro”. Outro questionamento foi sobre a existência de instalações sanitárias públicas e adequadas (tabela 7) para que atendam suas necessidades fisiológicas ao longo do dia de lazer. 53% dos entrevistados perceberam que não existem e 14% responderam que existiam banheiros públicos, mas sem se dar conta de que faziam referência aos banheiros das barracas cujo acesso estava vinculado ao consumo nestes estabelecimentos comerciais. Tabela 7– Avaliação sobre a existência de instalações sanitárias. Existência de banheiro público Área da pesquisa % Existe Não Existe Não sabe ou não respondeu 10 39 25 14% 53% 34% Total 74 100% Diante desse quadro de deficiências, perguntou-se a esses cidadãos sobre as alternativas que recorriam para atender suas necessidades fisiológicas ao longo do dia. Este questionamento foi motivo de risos, mas percebeu-se muita sinceridade nas respostas, como se fosse o momento de denunciar a realidade (tabela 8), o que ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 102 acabou por confirmar a reclamação dos comerciantes locais: 49% responderam que utilizam a lagoa ou de algum mato do entorno, em caso de necessidade. Esta cena foi presenciada in loco e pode-se afirmar que para ter um dia de lazer esta parcela da sociedade passa por vários momentos de constrangimento, seja por ter que atender suas necessidades fisiológicas escondida no “matinho” ou por ter que pedir, ou mesmo pagar por um banheiro privado, serviço que não é oferecido de bom grado e para isso se cobra até R$ 5,00 numa das lagoas, problema que pode ser exacerbado se uma família em excursão tiver três crianças que precisem utilizar um banheiro. Tabela 8- Como resolve as necessidades fisiológicas. Como resolve as necessidades fisiológicas Recorre à lagoa ou mato Pede a alguém Paga para usar o banheiro Não respondeu Total Área da pesquisa % 44 16 34 5 10822 49% 15% 31% 5% 100% Apesar de todo o exposto, a paisagem, por si só, denuncia as precárias instalações disponíveis a alguns excursionistas que chegam a utilizar por ter a necessidade de economizar neste dia de lazer. Sujeitam-se inclusive a condições sub humanas para atender suas necessidades fisiológicas. As fotografias 37 e 38 referem-se às instalações físicas, de propriedade privada que encontram-se abandonadas na área da pesquisa, as quais são utilizadas por alguns excursionistas. As imagens demonstram claramente o descaso do poder público local com a prática do excursionismo e que, conseqüentemente, rebate no território turístico como um todo. 22 Neste questionamento alguns entrevistados emitiram mais de uma opinião. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 103 Fotografias 37 e 38 – Construções abandonadas utilizadas por excursionistas na lagoa de Arituba: área externa (37), área interna (38). Portanto, pode-se concluir que as relações existentes entre o poder público local, comerciantes locais e excursionistas são conflituosas, pois estes agentes apropriam-se do território com objetivos divergentes. A prática do excursionismo é segregada no espaço mas acaba acontecendo à revelia do mercado local e também, do poder público e mesmo com as variadas estratégias de segregação, os “farofeiros acabam burlando-as de modo a não abrir mão do seu dia de lazer, apropriando-se do espaço. Tudo isto acontecendo num território turístico que visa atender os anseios de uma demanda turística pertencentes às camadas da sociedade com maior poder aquisitivo e também aos interesses dos comerciantes e poder público local. Neste território turístico onde as margens das lagoas são disputadas e marcadamente apropriadas pelo comércio local, confrontando-se com a apropriação do por parte dos “farofeiros”, os conflitos são inevitáveis e são visíveis no espaço situação que é reforçada pela omissão do poder público municipal o qual não assume sua função de ordenar o território em prol de minimizar conflitos e torná-lo menos contraditório. Compreendida a forma como se dão as relações entre excursionistas, mercado local e o poder público municipal, passamos ao capítulo seguinte visando conhecer um pouco mais sobre os excursionistas os quais são compreendidos nesta pesquisa como parte integrante de “uma outra face do turismo potiguar”. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 104 5 UMA OUTRA FACE DO TURISMO POTIGUAR: OS EXCURSIONISTAS EM DISCUSSÃO O ser humano tem também a necessidade de acumular energias e a necessidade de gastá-las, e mesmo de desperdiçá-las no jogo. Tem necessidade de ver, de ouvir, de tocar, de degustar, e a necessidade de reunir essas percepções no „mundo‟. A essas necessidades antropológicas socialmente elaboradas [...] acrescentam-se necessidades específicas [...]. Trata-se da necessidade de uma atividade criadora, de obra [...], necessidades de informação, de simbolismo, de imaginário, de atividades lúdicas. Henry Lefebvre Neste capítulo apresenta-se por fim, o que foi denominado nesta pesquisa como sendo “uma outra face do turismo potiguar”. A discussão aqui apresentada tem como objetivo conhecer um pouco mais sobre os excursionistas que se apropriam das lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (fotografias 39, 40 e 41). Assim, o objetivo é analisar, de um modo geral, o perfil dos excursionistas; conhecer os fluxos estabelecidos entre as unidades emissoras e as unidades receptoras desta demanda; identificar as motivações destes turistas ao se apropriarem das lagoas e conhecer a percepção destes sobre esta prática de lazer. É válido relembrar, conforme visto nos capítulos anteriores, que esta “face” da atividade turística é negligenciada pelo Estado, sobretudo na instância municipal e realizando-se de forma segregada e marginalizada por outros agentes sociais presentes no território, eminentemente pelo poder público municipal e comerciantes locais. Entretanto, é de extrema valia para os que a realizam. 39 ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 105 40 41 Fotografias 39, 40 e 41 – O dia de lazer na lagoa: Arituba (39), Boágua (40) e Carcará (41). Fonte: Alian Paiva (foto 39), pesquisa de campo, nov. 2009. Carlos Henrique (foto 40 e 41), nov. 2009. A análise apresentada é resultado dos seguintes questionamentos sobre estes excursionistas: qual o lugar de origem? Quais as motivações que as trazem aqui? O que os atraem na paisagem? Como se sentem neste território turístico, “farofeiros” ou turistas? Os instrumentos metodológicos foram conversas informais, observação in loco e aplicação de questionários aos excursionistas e organizadores de excursão o que propiciou o levantamento dos dados e as análises aqui apresentadas. 5.1 PERFIL DOS EXCURSIONISTAS: GÊNERO, FAIXA ETÁRIA, ATUAÇÃO PROFISSIONAL E RENDA Analisando o perfil dos excursionistas a partir do gênero observa-se que não existe uma diferença expressiva entre homens e mulheres, conforme aponta a tabela 9. Dentre os entrevistados 57 % eram mulheres23 e 43 % eram homens uma diferença que pode ser justificada pela presença de muitas mães, desacompanhadas, o que segundo conversas informais dava-se pelo fato de muitos dos pais estarem trabalhando naquele dia. Assim, o dia de lazer da família fica, então, à cabo da figura materna que se responsabiliza pelas crianças, jovens (filhos, sobrinhos, netos), e, também por idosos (avós, sogras). Outra inferência que é feita 23 É importante ressaltar que o maior percentual do gênero feminino entre os excursionistas pode estar relacionado à maior disponibilidade das mulheres em colaborar com a pesquisa. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 106 a respeito da presença feminina neste espaço é de que estas ocupam, cada vez mais, o mercado de trabalho e se dão como direito utilizar este dia para o lazer. Tabela 9- Perfil dos excursionistas por gênero. Gênero Homens Mulheres Total Área da pesquisa 32 42 % 43 % 57 % 74 100 % No tocante à faixa etária observou-se um equilíbrio entre o número de jovens adultos e idosos (tabela 10). É válido notar que o número de crianças nestas excursões é bastante representativo conforme observado durante a pesquisa de campo, não estando demonstrado no referido quadro, uma vez que os questionários foram aplicados aos adultos dos grupos. Os dados demonstram que cerca de 60% dos entrevistados estão entre 20 e 40 anos (35% entre 20-30 anos e 26 % entre 3140 anos), representando uma demanda jovem que pode, em parte, justificar o comportamento “folgado” que é mencionado de modo pejorativo por alguns comerciantes locais. É desta faixa etária que vem a “bagunça”, aqui entendida pela brincadeira inerente a este dia de lazer, porém não se nega a possibilidade de abusos, mas isto não é exclusivo dos excursionistas de modo a torná-los repudiados por alguns neste território turístico. Tabela 10 – Perfil dos excursionistas por faixa etária. Faixa etária Área da pesquisa % < 20 anos 20-30 anos 31-40 anos > 40 anos 5 26 19 24 7% 35% 26% 32% Total 74 100% Com base nestes dados é possível perceber o quão é importante que o poder público preocupe-se com uma infra-estrutura mínima de apoio aos excursionistas, através da instalação e manutenção de banheiros públicos, serviço de limpeza urbana, presença de salva-vidas de modo a se evitar os afogamentos que vem sendo registrados nos últimos anos nas lagoas do município e fornecer condições dignas de lazer a estes cidadãos sem que seja reforçada a segregação, como no caso paulista (ver capítulo 4). ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 107 Sobre o nível educacional, a tabela 11 demonstra que se trata de uma prática realizada por pessoas com baixo nível de escolaridade, onde apenas 36 % concluíram o ensino médio, enquanto 57 % não ultrapassaram do ensino fundamental (este número totaliza os que possuem o ensino fundamental completo (38% e incompleto 19%). Os dados sobre o nível educacional dos excursionistas demonstram-se relevantes para quando o poder público resolver intervir na ordenação do espaço turístico através do diálogo com os excursionistas, cabendo aqui a sugestão de ações educativas para minimizar os conflitos. Tabela 11- Nível de escolaridade dos excursionistas. Escolaridade24 Analfabeto Alfabetizado Ens. Fund. Completo Ens. Fund. Incompleto Ens. Médio Ens. Superior Não Respondeu Total Área da pesquisa 1 0 16 8 15 2 0 % 2% 0% 38% 19% 36% 5% 0% 42 100% Os números da tabela 12 demonstram que estes cidadãos não são “vagabundos” como é pregado pelo senso comum. A realidade sobre a situação funcional dos excursionistas demonstra exatamente o contrário: 72% dos entrevistados estão empregados, 9% já trabalharam e vivem de aposentadorias, e apenas 8% estão desempregados. É válido notar que 5% recebem algum tipo de benefício do sistema previdenciário brasileiro, ou, estão inseridos em programas sociais como o “Bolsa Escola”, do governo federal. Os dados permitem desconstruir o discurso segregador e marginalizador de que os excursionistas que freqüentam as lagoas de estudo são “um bando de marginais” ou “desocupados”. 24 Esta questão foi levantada em apenas 42 questionários do universo de 74 questionários aplicados, representando 57% da amostragem, o que não trouxe prejuízos à pesquisa pois permitiu corroborar com o que vem sendo observado em outros estudos de casos sobre o baixo nível de escolaridade dos excursionistas (sobre o assunto ver RODRIGUES, 1997; RUBINO, 2004; ALCÂNTARA, 2005). ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 108 Tabela 12– Situação ocupacional dos excursionistas. Situação ocupacional Área da pesquisa % Empregado Desempregado Recebe benefício do governo Aposentado "Do lar"/sem renda 53 6 4 7 4 72% 8% 5% 9% 5% Total 74 100% Trata-se, conforme vem sendo argumentado nesta pesquisa e demonstram os dados da tabela 13, de uma prática social realizada pela classe trabalhadora, empregada, em sua maioria no setor de serviços exercendo funções como empregadas domésticas (12%), pedreiro (6%), costureira (6%), diarista (6%), autônomos (6%), entre outras categorias profissionais que requer pouca qualificação ou nível de escolaridade. Tabela 13 Atuação profissional dos excursionistas. Atuação profissional Auxiliar de serviços gerais Agricultor Doméstica Manicure Comércio Gesseiro Diarista Costureira Educador Encarregado Vaqueiro Carpinteiro Secretária Operador Pedreiro Garçon Motorista Caseiro Marcineiro Cooperativa Mestre de obra Autônomo Militar Eletricista Operador de máquinas Vigilante Não informou Total Área da pesquisa 2 2 6 2 2 1 3 3 2 1 1 2 2 2 3 1 1 1 1 1 1 3 1 1 1 1 5 % 4% 4% 12% 4% 4% 2% 6% 6% 4% 2% 2% 4% 4% 4% 6% 2% 2% 2% 2% 2% 2% 6% 2% 2% 2% 2% 10% 52 100% ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 109 Diante dos dados sobre a atuação profissional dos excursionistas, compreende-se a baixa renda salarial dos entrevistados (tabela 14) Os números apontam que 52% dos entrevistados recebem apenas um salário mínimo 25 por mês, 28% chegam a ganhar até dois salários mínimos e apenas 6% recebem mais de 3 salários mínimos. Tabela 14- Renda média do excursionista e poder de consumo Renda média/individual Área da pesquisa % 33 18 4 4 5 74 52% 28% 6% 6% 8% 100% Até 1 salário Até 2 salários Até 3 salários Mais de 3 salários Não respondeu Total Com base na renda média dos entrevistados que não lhes restam muitas alternativas para ter direito a um dia de lazer que não seja de modo econômico logo, compreende-se o porquê de andarem acompanhados de churrasqueira, carvão, caixa de isopor com bebidas, panelas de feijão, arroz, macarrão, galinha e a famosa FAROFA, palavra que dá origem ao termo farofeiro. Diante da baixa renda dos excursionistas é indispensável utilizar-se de alternativas baratas e criativas de consumo, para ter direito a um dia de lazer. Os preparativos deste dia se iniciam com dias de antecedência, o que prescinde de uma organização do grupo normalmente composto por familiares e amigos. Podendo-se dizer que o rebatimento desta atividade não se restringe às unidades receptoras mas, também, incide nas unidades emissoras desta demanda, a economia é movimentada o que pode ser percebido de imediato, tanto pela compra de produtos alimentícios ou pelo fretamento dos ônibus. Com os resultados da pesquisa constatou-se, mesmo não sendo o enfoque dos objetivos, que o excursionismo não gera apenas incômodos como tratados no capítulo 3. Esta atividade turística interessa ao setor formal e informal da economia com incidências nas unidades emissoras, nas áreas de deslocamentos e nas unidades receptoras, como no caso de Boágua onde a clientela predominante é de excursionistas e o comércio local adaptou-se ao perfil econômico desta demanda 25 O valor do salário mínimo vigente no período da pesquisa equivale a R$ 510,00 (quinhentos e dez reais) ou, com base na moeda norte americana, cerca de U$ 290,00 (duzentos e noventa dólares). ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 110 turística; como também, verificou-se em Carcará, conforme demonstra a fala de um vendedor ambulante: “o pessoal da excursão são os meus melhores clientes”. A tabela 15 aponta que 36% dos entrevistados trazem tudo de casa, mas 61% afirmam que além da comida e da bebida trazem uma reserva em dinheiro para consumir nestas lagoas. Tabela 15- Avaliação do consumo nas lagoas O consumo nas lagoas Área da pesquisa % 27 2 45 74 36% 3% 61% 100% Trouxe tudo de casa Não trouxe e vai consumir Trouxe e vai consumir Total Questionando-se os excursionistas sobre os produtos que consomem neste dia, alguns responderam: “a gente gasta com coisa diferente”, “compra uma bagana”, “a bebida”, “um camarãozinho, né!”. 5.2 OS FLUXOS ESTABELECIDOS E AS MOTIVAÇÕES DOS EXCURSIONISTAS Para a realização de uma excursão entra no contexto a figura indispensável do organizador, na maioria das vezes, é também um excursionista que assume a responsabilidade da viagem, como fretamento do ônibus, estabelecimento de horários de chagada e de saída do ônibus, lista de passageiros, uma organização mínima indispensável para o dia de lazer. Com base nos relatos de alguns organizadores entrevistados, observou-se que a prática torna-se para alguns uma fonte de renda, estes chegam a organizar várias excursões durante o ano e variam os destinos a cada viagem. Segundo alguns organizadores as lagoas de Nísia Floresta estão entre as preferidas dos excursionistas. Alguns atuam há mais de uma década como organizador de excursão e chegam a obter um lucro no valor estimado de R$ 300,00. O fretamento do ônibus custa cerca de R$ 300,00, para excursões dentro do RN e cerca de R$ 900,00, para as que são oriundas de outros estados, como no caso da Paraíba. Valores que podem ser menores se o ônibus for “clandestino”, ou seja, veículos cuja documentação está irregular junto aos órgãos responsáveis e que ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 111 são comuns no contexto desta pesquisa conforme percebido em campo, o que além de sinalizar um risco à segurança dos excursionistas confirmam a presença do setor informal da economia. O custo da viagem por passageiro varia entre R$ 3,00 e R$ 15,00 para excursionistas oriundos de Natal e entre R$ 35,00 e R$ 45,00 para os que se deslocam da Paraíba, por exemplo. Identificou-se que existem facilidades no pagamento destas excursões, algumas começam a ser pagas com meses de antecedência, em parcelas “suaves”; bem como existe a isenção da passagem para as crianças, que são em grande número. Estratégias deste circuito inferior da economia que visa não perder o “cliente”. Esta atividade de lazer turístico é comum entre os entrevistados e representa para muitos uma prática “excelente”, corroborado pelo número médio de excursões que realizam em média por ano (tabela 16); 36% dos entrevistados afirmaram que chegam a participar de mais de três excursões; enquanto 23% informaram estar em numa primeira excursão demonstrando que esta é uma atividade crescente pois a cada domingo e feriado surgem novos adeptos desta prática social, conforme relato de um organizador de excursão. Tabela 16- Média anual de excursões. Média de excursões/ano 1ª vez 1 excursão Até 2 excursões Até 3 excursões Mais de 3 excursões Total Área da pesquisa 17 6 15 9 27 74 % 23% 8% 20% 12% 36% 100% Sobre a prática das excursões, foi perguntado aos excursionistas se conheciam outras lagoas de Nísia Floresta (tabela 17). Como resultado, 78% dos entrevistados responderam que já conheciam as lagoas por meio de outras excursões, já realizadas, dentre as quais foram destacadas as lagoas de Arituba, Boágua e Carcará, o que permite dizer que as lagoas estudadas compreendem um forte produto turístico para excursões. A respeito dos 22% que disseram não conhecer as lagoas do município, em parte, são pessoas que estão realizando a excursão pela primeira vez as quais, em sua maioria, afirmaram que irão voltar às lagoas “com certeza”. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 112 Tabela 17 - Avaliação sobre as excursões nas lagoas de Nísia Floresta. Conhece outras lagoas de Nísia Floresta? Área da pesquisa % Sim Não 58 16 78% 22% Total 74 100% Ao entender que estas lagoas estão no roteiro dos excursionistas, a partir de uma divulgação “boca a boca”, já que não foi identificado nenhum mecanismo de marketing divulgando esta prática, é válido observar sobre os fluxos de pessoas estabelecidos entre as unidades emissoras e receptoras desta demanda que ao longo das duas últimas décadas vem se apropriando das lagoas em estudo. Assim, com base nos lugares de origem das excursões, apontados pelos entrevistados ao longo da pesquisa de campo, foram elaborados mapas de localização das unidades emissoras de excursionistas no nível intermunicipal e interestadual (mapa 6); bem como, observou-se a origem das excursões oriundas da capital potiguar, por bairro (mapa 7). Os fluxos intermunicipais são estabelecidos entre distintos municípios potiguares, sobretudo com os que localizam na Região Metropolitana de Natal (como Macaíba, Parnamirim, São Gonçalo do Amarante e da própria capital, além de outros municípios do entorno de Nísia Floresta como, Canguaretama e Tibau do Sul (mapa 6). Contudo, os fluxos de excursionistas extrapolam os limites territoriais do estado do Rio Grande do Norte, uma vez que são oriundos também de o entorno de Nísia Floresta como, também, dos estados vizinhos: Paraíba e Pernambuco. Sobre os fluxos estabelecidos com Natal, (capital potiguar) se observou que as excursões são oriundas de bairros distribuídos nas quatro regiões administrativa da capital potiguar (Zonas Norte, Sul, Leste e Oeste), mais especificamente dos bairros periféricos onde se concentram parcelas da sociedade natalense com baixo poder aquisitivo e existem grandes deficiências quantos aos equipamentos de lazer, conforme aponta o estudo de Maia, Oliveira e Lima (2007). Dentre estes bairros destacam-se Felipe Camarão, Mãe Luíza, Potengi e Pajuçara (mapa 7). Estes fluxos movimentam anualmente centenas de excursionistas conforme constatado nesta pesquisa, predominantemente aos domingos e feriados, ao longo de todo o ano e em diversos feriados, cabendo destacar os feriados de 1º de janeiro, ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 113 dia da Confraternização universal, terça-feira de carnaval, Dia das mães (2º domingo de maio), Independência do Brasil (7 de setembro), Dia das crianças (12 de outubro), podendo-se dizer que existe um cronograma de excursões comemorativas, o que é viabilizado pelos organizadores de excursão e esperado por alguns segmentos do mercado local que já se preparam para estes dias. É válido relembrar a importância das rodovias BR-101 e RN-63 como fixos indispensáveis para realização destes fluxos de excursionistas (ver mapa 3, capítulo 1). ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 114 Mapa 6 – Mapa de localização das unidades emissoras de excursionistas: intermunicipais e interestaduais. Elaboração: Janny Lima, 2010. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 115 Mapa 7 – Mapa de fluxo turístico entre bairros de Natal (RN), emissores dos excursionistas, e as lagoas de Arituba, Boágua e Carcará. Elaboração: Janny Lima, 2010. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 116 Mas, quais as motivações que levam esta massa de trabalhadores a enfrentarem viagens de até três horas para passar um dia de lazer numa das lagoas de Arituba, Boágua e Carcará? A primeira questão foi conhecer sobre a preferência das excursões pelas lagoas cuja paisagem torna-se objeto de consumo a qual caracteriza-se pela água doce e calma, pelas árvores existentes nas margens que propiciam a sombra e o descanso em uma rede. Perguntados sobre que lugar prefere (tabela 18) 59% responderam que a lagoa é o lugar preferido para excursões e outros 34% disseram preferir a praia, mas não possuem restrições quanto a participar de excursões destinadas às lagoas, apesar de alguns entrevistados (jovens), as considerarem muito “tranqüila”. É válido ressaltar que o excursionismo é percebido no território do RN também em áreas de praia, rios e açudes26. Tabela 18- Lugar preferido para excursões. Lugar preferido para excursões Praia Lagoa Rio Outro lugar Todos estes Total Área da pesquisa 28 49 1 3 2 % 34% 59% 1% 4% 2% 8327 100% Perguntados sobre o que mais gostam nas lagoas (tabela 19), 58% disseram que os elementos preferidos da paisagem eram a água doce e as árvores existentes. As árvores tornam-se motivo de disputa entre excursionistas, significa o lugar de sombra, ventilado em que se pode pendurar as redes para o descanso das crianças e adultos. Outro número representativo foi que 24% disseram que gostam das lagoas por se mais reservado e então, “a gente pode ficar à vontade”, como disse um excursionista. Nesta análise, ficar à vontade, trazer todos os acessórios indispensáveis para passar o dia (caixa de isopor, cadeiras, guarda-sol, churrasqueira, panelas, etc.) significa ter liberdade, mesmo que este comportamento seja sinônimo de incômodo aos outros (já discutido no capítulo 3). 26 Os organizadores de excursão entrevistados apontaram outros lugares do RN que é comum a presença de excursões, dentre elas: Lagoa do Boqueirão, Lagoa da Cutia , Lagoa Salgada, Lagoa do Matheus e Pureza. 27 Neste questionamento alguns entrevistados emitiram mais de uma opinião. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 117 Tabela 19- Avaliação sobre o que os excursionistas gostam na paisagem das lagoas. O que gosta na lagoa Banho Árvores Mais barato Reservadas Outro motivo Total Área da pesquisa 62 61 33 51 4 21128 % 29% 29% 16% 24% 2% 100% Quanto ao motivo da viagem o desejo de conhecer outro lugar é a resposta de 42% dos excursionistas e 38% responderam que vem à lagoa porque é o lugar “ideal” para um dia de lazer (tabela 20). É curioso notar que este tipo de prática já sofre proibições em alguns lugares como no caso do litoral da Paraíba, conforme mencionado por um motorista de ônibus de excursão; e, também, no RN. Segundo alguns organizadores entrevistados existe a cobrança de taxas que variam entre R$ 5,00 e R$ 70,00, para permanência do ônibus, como na praia de Pipa, no Balneário de Pedro Velho e na lagoa do Bonfim, valores que acabam sendo repassados diretamente aos excursionistas através do aumento no valor da excursão. Nessa perspectiva, pode-se afirmar que são indícios de tendência a uma segregação mais declarada por parte dos comerciantes locais, à princípio; mas que pode tomar outras proporções e ser legitimada pelo poder público na ordenação do uso de territórios turísticos, como já ocorre no litoral paulista e carioca (RODRIGUES, 1997; ALCÂNTARA, 2005). Tabela 20- Motivo das excursões. Motivo da excursão Conhecer outro lugar Não tem como se divertir onde mora Proibições às excursões nas proximidades de onde mora Porque gosta muito da lagoa Total 28 29 Área da pesquisa % 39 18 1 35 42% 19% 1% 38% 9329 100% Neste questionamento alguns entrevistados emitiram mais de uma opinião. Neste questionamento alguns entrevistados emitiram mais de uma opinião. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 118 5.3 OS EXCURSIONISTAS E A ALCUNHA DE “FAROFEIRO” Entende-se que alcunha de “farofeiro” atribuída aos excursionistas é preconceituosa e depreciativa. Ao longo de toda a pesquisa o termo foi constantemente reproduzido como uma forma de estabelecer de modo enfático uma relação direta e clara com o leitor e demonstrar o teor de marginalização existente quanto aos que fazem à prática social do excursionismo. Nesta seção do trabalho analisa-se, portanto, dados sobre a opinião dos excursionistas a respeito do termo que lhes é dado pelo senso comum. O objetivo da questão foi poder analisar como estes cidadãos se percebem vivendo um dia de lazer num território turístico que não é planejado para eles. Pode-se afirmar que este questionamento representou um dos momentos mais delicados da pesquisa, pois algumas vezes foi entendido como um desacato por alguns excursionistas, como demonstra a fala irritada de uma entrevistada, na lagoa de Boágua, que estava numa excursão do Bairro de Planalto/Natal-RN: “Minha filha, eu não sou farofeira não, eu sou turista!”. Assim, conforme demonstram os dados da tabela 21, 45% dos excursionistas responderam que se consideram “farofeiros”, pois trazem consigo todos os apetrechos necessários que caracterizam a prática (comida, bebida, churrasqueira). Percebeu-se que estes entrevistados emitiam a resposta com muita satisfação e orgulho de sê-lo, como disse um excursionista: “eu sou farofeiro, mesmo, e daí?”. Os outros 55% referem-se aos que não aceitam o termo pois não se sentem farofeiros, para este grupo farofeiro “é aquele que não sabe se comportar”, é o “maleducado que não respeita ninguém, briga e faz barulho”. Alguns se percebem como cidadãos, pagadores de impostos e dizem que não merecem o termo pois, “não tem nada a ver, só porque traz comida de casa? Isso aqui né roubado não, é comprado, pago imposto no feijão, na farinha e no galeto [...]”. Tabela 21- Avaliação sobre a alcunha de “farofeiro”. Se considera um "farofeiro"? Sim Não Área da pesquisa 33 41 % 45% 55% Total 74 100% ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 119 Nesse mesmo sentido questionou-se se havia problema em andar com um grupo de “farofeiro e 92% responderam que não se incomoda em andar neste grupo (tabela 22). Tabela 22 – Avaliação sobre andar em grupo de “farofeiros”. Tem problemas em andar num grupo que chamado de "farofeiros"? Sim Não Total Área da pesquisa % 6 68 74 8% 92% 100% Estas perguntas geraram polêmica entre os grupos, o que apesar de não ser a intenção da pesquisa contribuiu para inquietar os excursionistas sobre o modo como se viam num território turístico. E por fim, sem nenhuma perspectiva romântica foi perguntado como estes excursionistas se sentiam após aproximadas oito horas de lazer, e as repostas, falam por si: “me sinto feliz”, “relaxada”, “realizada”, “revigorada”, “sossegada”, “em paz”, “radiante”, “aliviada”; palavras demonstrando a relevância social deste fenômeno o qual permite que estes cidadãos rompam com o seu cotidiano marcado de tantas outras escassez. A partir dos dados e das análises é possível ter uma idéia geral sobre esta outra face do turismo potiguar, a face não planejada e que interessa a poucos, mas que resiste num espaço produzido para o turismo de massa realizado pelas camadas mais favorecidas da sociedade. E, apesar da negligência, omissão, conflitos, segregação e falta de cidadania por parte de alguns agentes, os excursionistas têm o direito ao dia de lazer nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará mesmo que contrarie os anseios de outros agentes sociais presentes no espaço. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 120 6 NOTAS FINAIS DA PESQUISA Retomam-se, neste momento final da pesquisa, as reflexões que se deram em função de analisar a prática do excursionismo nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN), onde se observa desde a década de 1990 a chegada de centenas de excursionistas, em dias de domingos e feriados, ávidos por um dia de lazer. O excursionismo é compreendido neste estudo como uma modalidade de turismo realizado pelas massas que tem na viagem uma possibilidade de romper com a vida cotidiana, ao mesmo tempo que é uma prática que promove status social. É um fenômeno de essência urbana, que depende de um sistema de objetos e de ações para sua realização cujo objeto de consumo é o espaço. Esta modalidade de turismo é realizada predominantemente por trabalhadores que em seu tempo livre deslocam-se aos destinos turísticos visando o direito ao lazer. Este tipo de expressão de lazer é comum, verifica-se no mundo, no Brasil e dinamiza sobremaneira a área da pesquisa. Mas, seja no território que for acontece meio a práticas de segregação e marginalização por parte de outros agentes envolvidos. Os excursionistas, são denominados de “visitantes de um dia”, “desordeiros”, “farofeiros”, ou “demolidores” representam os turistas que compreendem o que por hora chamou-se “uma outra face do turismo potiguar”. São turistas desinibidos, despojados e que resistem e burlam as mais variadas formas de segregação, explícitas e implícitas no espaço. Uma face do turismo que, de um modo mais intenso, movimenta o setor informal da economia, mas, que rebate, também, no setor formal, quer nas unidades emissoras, nas áreas de deslocamentos ou nas unidades receptoras destes turistas. A pesquisa revelou que, apesar da prática ser realizada por pessoas com baixo poder aquisitivo o consumo e a geração de tributos são fatos, quer no consumo de bebidas alcoólicas, de farinha, na entrada do parque aquático ou na contratação de um ônibus clandestino para o deslocamento. Para atender os propósitos da pesquisa inicialmente realizou-se a compreensão do processo de produção do espaço que é apropriado pelos excursionistas e também por outros agentes sociais que representam o Estado e o ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 121 mercado local. Verificou-se que a realização do turismo nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará não se dá de forma aleatória, está relacionada com a inclusão destas na rota do turismo potiguar, nas quais se observa desde década de 1990 o turismo de massa, atraindo turistas de várias camadas sociais. A inserção destas lagoas na rota do turismo potiguar, do tipo sol e mar, resulta não apenas do potencial paisagístico mas, sobretudo da atuação do Estado que através de políticas públicas voltadas para consolidar o turismo potiguar, desde a década de 1980, vem viabilizando a implantação de uma infra-estrutura urbana indispensável ao desenvolvimento da atividade turística possibilitando a chegada de vários turistas a Arituba, Boágua e Carcará: seja os que se destinam às segundas residências, os que chegam através do turismo receptivo hospedados em Natal ou Pipa, ou, ainda, os “farofeiros em excursão”. Pode-se afirmar que este processo de turistificação foi intensificado na década de 1990, período em que o turismo potiguar se consolida na porção do litoral oriental do estado do Rio Grande do Norte, contexto em que estão inseridos importantes fixos como a Rota do Sol e BR-101 os quais viabilizam até os dias atuais o fluxo de pessoas e mercadorias transformando as formas e os conteúdos da área da pesquisa. A compreensão sobre o processo de produção do espaço permitiu observar que este espaço vem sendo apropriado por agentes de naturezas distintas que agem simultaneamente, algumas vezes, de modo convergente e outras divergentes. Um espaço formado por agentes hegemônicos e não-hegemônicos: Estado, mercado e turistas. Neste sentido, foi possível perceber a ação do Estado enquanto provedor de infra-estrutura urbana, no âmbito federal e estadual, através da formulação de políticas públicas de turismo, como o PRODETUR/RN, que rebatem na área das lagoas inserindo-as na rota do turismo potiguar; ao mesmo tempo que foi possível reconhecer a sua deficiência no âmbito local o que requer intervenções urgentes no sentido de ordenar o uso do territórios turísticos estudados. De modo relevante foi compreender a que os agentes de mercado simultaneamente se apropriam do espaço ao estabelecer relações lucrativas neste território o qual desde a década de 1980 passa a ter uma função turística, mesmo ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 122 que seja de um modo “espontâneo”, quer dizer, não planejado pelos organismos oficiais que pensam o turismo no município de Nísia Floresta. A pesquisa permitiu perceber a ação dos turistas a partir de uma caracterização da forma de apropriação; bem como a complexidade da atividade e as especificidades da prática que acaba por atrair uma gama variada de turistas às lagoas em estudo, demonstrando as desigualdades, principalmente, no poder de consumo o que repercute diretamente na prática do excursionismo, uma vez que, os turistas das classes sociais mais favorecidas despertam maior interesse ao poder público e, principalmente, ao mercado local. A partir da compreensão da intencionalidade dos distintos agentes sociais, alguns objetivando uma prática de lazer enquanto outros possuem a intenção implícita e explícita de reproduzir o capital, foi possível compreender os conflitos territoriais existentes entre excursionistas, comerciantes locais e poder público municipal. A compreensão destes conflitos apontou as relações de poder existentes, a disputa do território turístico das lagoas em estudo, principalmente pelos excursionistas e comerciantes locais (barraqueiros e outros empresários), os quais configuram explicitamente a formação de dois territórios efetivamente apropriados. A análise destes territórios turísticos possibilitou verificar as estratégias de segregação para inviabilizar a prática do excursionismo nas lagoas, uma vez que é entendida pelos agentes de mercado e pelo poder público local como uma prática que deprecia a imagem do destino turístico. A pesquisa revelou, ainda, que ações segregadoras e de preconceito para com os excursionistas fundamentam-se no discurso ambiental e no comportamento abusivo dos “farofeiros”, visos como “sujos e “mal-educados”; mas a essência deste tipo de discriminação ação está vinculada ao baixo poder de consumo destes turistas. Contudo o modo conflituoso das relações entre excursionistas e mercado local apresenta intensidades distintas nas três lagoas estudadas, uma vez que esta clientela já desperta interesse para a reprodução do capital quer no setor formal e informal da economia, seja através da instalação de parque aquático com valor acessível ao perfil econômico do excursionista ou através do comércio ambulante na venda de ginga com tapioca. De vários modos o consumo é visível. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 123 Conclui-se que o poder público local é negligente com a prática do excursionismo apesar da expressividade do fenômeno o qual a exemplo da lagoa de Boágua chega a receber 3000 visitantes em um dia de domingo. Esta negligência ficou evidenciada tanto através da precária infra-estrutura utilizada pelos excursionistas, quanto pelas estratégias de segregação utilizadas pelo poder público e pelos comerciantes locais. A pesquisa revelou que tal negligência atinge tanto excursionistas quanto turistas de classes mais abastadas, uma vez que compromete a qualidade do produto turístico. Assim, com base no exposto no primeiro e segundo capítulo deste trabalho, é possível afirmar que a negligência está relacionada às deficiências e a ineficiência da gestão pública municipal que nem sequer possui um planejamento turístico sobre o turismo que reconheça o papel das lagoas na rota do turismo potiguar; bem como, que a omissão do poder público local pode estar relacionada à tendência deste território ser apropriado por agentes imobiliários de capital externo, tornando-se uma alternativa mais lucrativa que desperta o interesse dos gestores municipais pelos tributos que serão gerados com a venda da terra do entorno das lagoas se este tipo de apropriação por agentes imobiliários se confirmar. As lagoas configuram-se, então, como territórios turísticos marcadas por fortes relações de poder e é neste contexto que se insere os excursionistas, agentes sociais reconhecidos pelo senso-comum como “farofeiros”, uma alcunha que desvaloriza a prática social realizada, na verdade, por cidadãos que buscam fazer valer um direito social: o direito ao lazer. Através da pesquisa pode-se observar o perfil, a origem, os fluxos e as motivações que levam centenas de excursionistas à área em estudo. De um modo geral, pode-se dizer esta prática caracteriza-se por homens e mulheres, trabalhadores e não, “vagabundos” como preconiza o senso comum. Cidadãos com baixo nível de escolaridade, de comportamento desinibido e despojado, que utilizam práticas alternativas de consumo como levar comida, bebida, churrasqueira e uma rede para este dia tão sonhado dia de lazer, mesmo que se dê ao preço da segregação e de conflitos territoriais. Com a pesquisa pode-se observar que esta prática turística estabelece fluxos de pessoas e de mercadorias entre unidades emissoras de vários municípios do entorno de Nísia Floresta, incluindo os da Região Metropolitana de Natal, e até de ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 124 estados vizinhos como Paraíba e Pernambuco. Tomando como foco as excursões oriundas de Natal, capital potiguar, percebeu-se a relevância social desta alternativa turística para uma massa de trabalhadores que comumente se desloca de bairros marcados por uma infra-estrutura de lazer precária, como nos bairros populares de Felipe Camarão, Planalto, Bairro Nordeste e Mãe Luiza. Uma realidade que demonstra a importância social desta prática turística para cidadãos que tem como maior motivação de deslocamento: o direito a um dia “diferente” de lazer. Como nota final desta pesquisa confirma-se a hipótese que sustentou a discussão, uma vez que a apropriação do espaço pelo excursionismo se dá entre relações conflituosas contrariando a intencionalidade dos agentes do mercado local e do poder público municipal os quais visam o desenvolvimento da face lucrativa da atividade turística. Ao mesmo tempo, que se verificou que a prática social do excursionismo se dá como uma espécie de contra-racionalidade, uma forma de resistência da sociedade num espaço que é social e fragmentado, desigual e contraditório. ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 125 REFERÊNCIAS ALCÂNTARA, Guilherme. Abaixo a farofa! Exclusão "legitimada" em territórios de praia. Dissertação (Mestrado em Planejamento Urbano e Regional)Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2005. Disponível em <http://teses.ufrj.br/IPPUR_M/GuilhermeDeAlcantara.pdf>. Acesso em: 02 jul. 2009. ______. “Abaixo a farofa!”: uso de identidades sociais, manipulação territorial e marginalização no município de Mangaratiba-RJ. In: VALENÇA. Marcio Moraes; CAVALCANTE, Gilene Moura (Org.). Transformações urbanas: globalização e marginalidade. Natal: EDUFRN, v.1, 2008. ANDRADE, Manoel Correia de Andrade. A produção do espaço Norte-RioGrandense, Natal: EDUFRN, 1981. ARAÚJO, Maria Cristina Cavalcanti. Uma viagem insólita: de um território pesqueiro a um “paraíso” turístico-Pipa/RN. 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ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 126 CRUZ, Rita de Cássia Ariza da. Turismo e impacto em ambientes costeiros: projeto Parque das Dunas Via Costeira, Natal(RN). Dissertação (Mestrado em Geografia Humana)-Universidade de São Paulo, São Paulo, 1995. ______. Políticas de turismo e (re) ordenamento de territórios no litoral do Nordeste do Brasil. Tese (Doutorado em Geografia)-Universidade de São Paulo, São Paulo, 1999. ______. Introdução à geografia do turismo. 2. ed. São Paulo: Roca, 2003 ______. Planejamento governamental do turismo: convergências e contradições na produção do espaço. In: LEMOS, Amália Inés Geraiges; ARROYO, Mónica; SILVEIRA, María Laura(Org.). América latina: cidade, campo e turismo. São Paulo: CLACSO, 2006, p. 337-350. 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Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 130 APÊNDICE A - QUESTIONÁRIO DA PESQUISA: Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar Entrevistado: COMERCIANTE LOCAL Objetivo da pesquisa: Instrumento metodológico: Grupo de Entrevistado: Nome do estabelecimento Data: Local/lagoa: OBS: Analisar o uso turístico e os conflitos territoriais, decorrentes da prática do excursionismo, nas lagoas de Arituba, Carcará e Boágua (Nísia Floresta/RN). Entrevista estruturada (perguntas abertas e fechadas) Comerciante local / / Autoriza a utilização dos dados? (___)sim (___)não Nome do entrevistado: Idade: Sexo: Escolaridade: a)(___)alfabetizado c)(___)ensino fundamental b)(___)ensino médio d)(___)ensino superior 1)Características do estabelecimento comercial: a)(___)bar b)(___)restaurante c)(___)pousada d)(___)outro:_________________________ 2)Há quanto tempo atua como comerciante do turismo? 3)Há quanto tempo atua nesta Lagoa? 4) É nativo(a) de Nísia Floresta/RN? a)(___)sim b)(___)não, de onde? 5)Qual o perfil da clientela que freqüenta este estabelecimento? ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ 7)Qual o perfil da clientela que freqüenta esta lagoa? _________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ 8)Qual o período de melhor movimento? Dias da semana:__________________________________________________________ Datas:___________________________________________________________________ Meses:__________________________________________________________________ 9)Como a clientela chega até aqui? Turistas locais ____________________________________________________________ Turistas nacionais:________________________________________________________________ Turistas internacionais: _____________________________________________________ (carros particulares, empresas de turismo, bugueiros, outros) 10)Quantas pessoas emprega?O que fazem? (___)cozinheira (___)garçom (___)outro: _______________________________________________________________ ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 131 11)Qual a situação deste estabelecimento, em relação à área que está instalado? (___)área pública (___)área privada (___)área de posse (___)outro: _________________________________________________________________________ 12)Efetua pagamento de impostos para funcionamento? (___)não (___)sim, quais? 13)Quais os incentivos e entraves existentes com o poder público municipal a)Incentivos?_____________________________________________________________ ________________________________________________________________________ b)Entraves?______________________________________________________________ ________________________________________________________________________ 14)Nesta lagoa existe alguma intervenção do poder público estadual (IDEMA, Ministério Público), federal(IBAMA),em relação a : ______________________________________ 15)Quanto à infra-estrutura existente, como avalia as condições de: a)Avalie: Acessibilidade: (___)ótima (___)boa (___)ruim (___)péssima Estacionamento: (___)ótima (___)boa (___)ruim (___)péssima Segurança: (___)ótima (___)boa (___)ruim (___)péssima Coleta de resíduos sólidos: (___)ótima (___)boa (___)ruim (___)péssima Tratamento de esgoto: (___)ótima (___)boa (___)ruim (___)péssima Água para consumo humano (___)ótima (___)boa (___)ruim (___)péssima Água da lagoa(balneabilidade) (___)ótima (___)boa (___)ruim (___)péssima b)Existe obra/ação, concluída ou em andamento, que contemple estas estruturas? (___)não (___)sim, quais?__________________________________________________ 16)O que sabe da prática do Excursionismo conhecido como “ônibus de farofeiros”? a)Desde quando? b)De onde vem?____________________________________________________ c)Quando vem?_____________________________________________________ d)Perfil dos excursionistas (“farofeiro”)?__________________________________ 17)Qual a relação do estabelecimento com as excursões, seus organizadores e excursionistas? _________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ 18)Como avalia a presença deles aqui?É bom ou ruim para o comércio? _________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ 19)Sabe informar como os clientes deste estabelecimento (turistas) avaliam a presença dos excursionistas, existe algum pré-conceito? _________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ 20)Os excursionistas são clientes do estabelecimento?O que consomem? ________________________________________________________________________ 21)Quanto ao local que utilizam, onde ficam? (___)dispersos na lagoa (___)em local específico, onde: ________________________ 22)O que trazem e o que deixam? _________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 132 23)Quanto ao comportamento dos excursionistas e numa visão geral, cite: Aspectos positivos (consumo,animação,freqüência): _________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ Aspectos negativos (poluição-sonora, ambiental, visual, insegurança, violência, uso de drogas): _________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ 24)Na sua opinião, o que o poder público poderia fazer para minimizar os efeitos negativos das excursões, quanto à: Acessibilidade: Estacionamento: Segurança: Limpeza: Poluição sonora: Outro aspecto negativo: 25)O que acha do título de “farofeiro” dado aos excursionistas? _________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ 26)Considerando-se que as excursões para a lagoa é uma forma acessível de lazer para uma classe com menor poder aquisitivo, dê a sua opinião sobre um comportamento que não geraria conflito. _________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________ Pode indicar outro comerciante para colaborar na pesquisa? _________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________ _________________________________________________________________________ Observações do pesquisador: Número de estabelecimentos comerciais:_______________________________ Número de questionários aplicados (amostragem):_______________________ ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 133 APÊNDICE B - QUESTIONÁRIOS DA PESQUISA: Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar Entrevistado: EXCURSIONISTA Instrumento metodológico: Questionário Agente social envolvido: Excursionista Nome/como é conhecido: Data: / / Local/Lagoa: Pesquisador colaborador: 1.Perfil do excursionista Sexo:____________Idade:______________ Qual o local de origem? Estado:_____________________Cidade:_______________Bairro:_______________ Quanto a sua renda: ( )empregado ( )desempregado ( )recebe benefício ( )aposentadoria Se estiver empregado, fale da sua atividade e renda média? Qual a atividade?_______________________ Qual a renda média? ( )até 1 salário* ( )até 2 salários ( )até 3 salários ( )mais de 3 salários *salário mínimo R$510,00 2.Quanto ao motivo da excursão: Por que saiu numa excursão? ( )para conhecer outro lugar ( )porque no lugar que mora não tem como se divertir ( )porque onde mora tem proibições para excursões ( )porque gosta mais daqui Se não estivesse aqui, o que estaria fazendo em casa? ( )trabalhando ( )descansando ( )bebendo ( )assistindo TV ( )outro:__________ Caso saísse de casa você iria para: ( )casa de algum parente ( )igreja ( )cinema ( )outro No lugar(bairro,comunidade) onde mora tem? ( )campo de futebol ( )quadra de esportes ( )praça ( )outro:____________ 3.Quanto ao custo da excursão? Você veio? ( )só ( )com familiares ( )com amigos, Total do grupo?_______adultos:______________crianças:__________ Quanto pagou pela excursão?R$_______________________________ Quanto ao pagamento da excursão: ( )à vista ( )parcelado ( )cortesia Gosta de participar de excursões?quantas faz por ano(média)? ( )é a 1ª vez ( )só faz 1 excursão ( )até 2 excursões( )até 3excursões ( )mais de 3 excursões Que lugar prefere: ( )praia ( )lagoa ( )rio ( )outro?__________ Já que veio à lagoa, diga o porquê: ( )porque a água do banho é doce e calma ( )porque tem sombra pra ficar embaixo e dar pra trazer a família ( )porque é mais barato do que ir a uma praia ( )porque as lagoas são mais reservadas(“escondidinha”) ( )não sabe responder 4.Quanto às excursões para uma lagoa: Já tinha visitado esta lagoa? ( )não ( )sim, quantas vezes?__________Lembra da 1ª vez (ano)?___________ Conhece outras lagoas de Nísia Floresta/RN? ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 134 ( )sim, quais?___________________________________________________________ ( )não conhece ( )não sabe responder (exemplo: Arituba, Boágua, Carcará, Bonfim, Ilhota, Boacica,) O que você gosta na lagoa? ( )a beleza do lugar (sol, lagoa, a sombra das árvores,etc.) ( )o banho doce 5.Quanto ao que precisa para este dia de lazer? ( )trouxe de casa, o quê? ( )alimentação ( )bebida ( )mesa, cadeira, guarda-sol ( )vai consumir aqui, o quê______________________________________________ 6.Quanto às condições existentes para o excursionista ter um dia de lazer, responda: Existe segurança no acesso (condições das estradas)? ( )sim ( )não ( )não sabe responder Existe estacionamento? ( )sim ( )não ( )não sabe responder Existe segurança (em relação à violência)? ( )sim ( )não ( )não sabe responder Existe segurança para os banhistas (salva-vidas)? ( )sim ( )não ( )não sabe responder Lugar para colocar lixo (garrafas, atas, etc) ( )sim ( )não ( )não sabe responder Se respondeu que não existe, o que faz com o seu lixo? ( )não se preocupa, pois não incomoda ( )não se preocupa, pois a prefeitura vai limpar ( )leva embora no final do dia, deixa no lugar, recicla?( )sim ou ( )não Banheiro público (cocô, xixi, banho)? ( )sim ( )não ( )não sabe responder Se respondeu que não existe banheiro, diga como faz para resolver o problema? ( )faz na lagoa ( )faz no mato ( )pede a alguém (morador, comerciante) ( )paga para utilizar o banheiro, ( )faz no ônibus Diante das coisas que disse que não existe, numa próxima excursão você volta a esta lagoa? ( )sim, porque dá “um jeitinho” ( )não, porque atrapalha seu dia de lazer 7.Durante um dia de excursão nesta ou outra lagoa de Nísia (vinda, o dia, a volta pra casa), já aconteceu algum incidente com você ou com algum amigo? ( )ônibus quebrou ( )afogamento com ou sem morte ( )roubo/assalto/Briga/Morte ( )adoeceu no caminho 8. Quanto ao espaço que vocês ficam aqui na lagoa, fale do: Tamanho: ( )apertado ( )espaçoso ( )dá pra todos ( )queria ficar em outro lugar Limpeza: ( )limpo ( )sujo Segurança: ( )é violento ( )é seguro O banho: ( )a água da lagoa é limpa ( )a água da lagoa é suja ( )é funda Temperatura: ( )é quente pois não tem árvores ( )é ventilado pois tem árvores 9.Quanto a sua vinda para a lagoa, em uma excursão, Como é a relação com: Em relação aos comerciantes das barracas: ( )sem problemas ( ) não existe problemas ( )não sabe responder Em relação aos comerciantes ambulantes: ( )sem problemas ( ) não existe problemas ( )não sabe responder Em relação aos bugueiros: ( )sem problemas ( ) não existe problemas ( )não sabe responder Em relação ao poder público: ( )sem problemas ( ) não existe problemas ( )não sabe responder Em relação com o morador local: ( )sem problemas ( ) não existe problemas ( )não sabe responder ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 135 10.Quanto ao título de “farofeiro”(popularmente conhecido): Se considera um “farofeiro”? ( )sim, por quê?______________________ ( )não, por quê?______________________ Tem problema em estar num grupo que é chamado de “farofeiro”? ( )sim, por quê?___________________________________________ ( )não, por quê?___________________________________________ Você se sente descriminado? ( )sim ( )não Por quem? _________________________________________________________________________ O que faz? _________________________________________________________________________ 11. Diga com uma palavra como você se sente depois que passar um dia como este? _________________________________________________________________________ ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 136 APÊNDICE C - QUESTIONÁRIOS DA PESQUISA: Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar. Entrevistado: ORGANIZADOR DA EXCURSÃO Instrumento metodológico: Questionário Entrevistado: Organizador da excursão Nome/como é conhecido: Sexo:( )M ( )F Data: / / Local: Lagoa: OBS: Autoriza a utilização dos dados? ( )sim ( )não Questões: 1.Quanto a esta excursão: Local de origem: Estado:_____________________Cidade:_______________Bairro:_______________ Quantas pessoas vieram nesta excursão? Qual o tempo da viagem?________________________________________ Que horas chegam e saem da lagoa?______________________________ Quanto tempo levou para chegar à lagoa?__________________________ Quanto cobrou por pessoa? Adulto, R$:______________ Criança R$:_____________ 2.Quanto ao papel de organizador de excursão: Há quanto tempo organiza excursão?Desde quando? Quantas excursões organiza por ano? Quais os motivos? ( )lazer ( )religioso ( )comercial ( )outro:____________________ Que tipo de grupo faz excursão? ( )familiares ( )trabalhadores de empresas ( )idosos ( )igreja ( )outros também? Qual o perfil dos excursionistas que vem nas excursões?Coloque por ordem conforme a sua experiência (1 a 5). ( )homem ( )mulher ( )crianças ( )idosos ( )jovens Estas pessoas vem, em sua maioria? ( )com a família ( )desacompanhados ( )outro:_____________________ Quais os meses em que se organizam as excursões? Que dias da semana? Existe um melhor dia no mês? Existe um melhor mês? Quais os principais feriados? Conhece algum lugar que proíbe a entrada de excursões? ( )não ( )sim, onde?_____________________________________________________ Já foi proibido de ficar em algum lugar que foram para o lazer? ( )não ( )sim, onde?_____________________________________________________ 3.Quanto ao organizador: Por que organiza excursão? ( )por diversão ( )como fonte de renda? Se for uma fonte de renda, quanto lucra por excursão? 4.Quanto às excursões para as lagoas de Nísia Floresta: ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010. 137 Desde quando organiza excursões (ano da 1ª)? Para quais lagoas já fez excursões neste município? ( )Boágua ( )Carcará ( )Bonfim ( )Arituba ( )outra:__________ Como ficou sabendo que existia? ( )visitou 1º ( )em uma excursão ( )propaganda em TV, jornal, etc ( )alguém comentou Já fez excursões para outras lagoas do RN? ( )não ( )sim, quais? 5.Quanto à contratação da empresa de transporte: Qual a situação da Empresa de hoje? ( )empresa regularizada na ANTT ( ) empresa clandestina Quanto custou o “frete”? R$: Com qual(is) empresas costuma contratar? 1:_______________________ 2:_______________________ 3:_______________________ Passou por alguma fiscalização no caminho? ( )não ( )sim, qual? 6.O que gostaria que melhorasse nesta lagoa? ( )acesso/estradas ( )local para estacionar ( )limpeza da lagoa ( )existência de banheiro ( )o espaço para os banhistas usufruírem da lagoa ( )segurança 7. Estas excursões são conhecidas como “ônibus de farofeiro”, alguma vez se sentiu discriminado por isso, nas lagoas de Nísia Floresta? ( )Não ( )Sim, em qual lagoa?_________________________ 8.A qual lugar prefere levar as excursões? ( )praia ( )lagoa ( )rio ( )outro?__________ Já que trouxe excursão para esta lagoa, qual o maior motivo? ( )porque a água do banho é doce e calma ( )porque tem sombra pra ficar embaixo e dar pra trazer a família ( )porque é mais barato do que ir a uma praia ( )porque as lagoas são mais reservadas (“escondidinha”) ( )não sabe responder 9. Quando é a sua próxima excursão para as lagoas de Nísia Floresta? ________________________________________________________________________ 10. Diga três coisas que precisa melhorar nesta lagoa? ________________________________________________________________________ ________________________________________________________________________ _______________________________________________________________________ Observações do pesquisador_______________________________________________ _______________________________________________________________________ ARRUDA, Alian Paiva de. Os “farofeiros” em excursão nas lagoas de Arituba, Boágua e Carcará (Nísia Floresta/RN): análise de uma outra face do turismo potiguar . Dissertação (Mestrado em Geografia)-Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Natal, 2010.