universidade federal do rio de janeiro centro de ciências da saúde

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
FACULDADE DE MEDICINA
DEPARTAMENTO DE RADIOLOGIA
TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA DE ALTA RESOLUÇÃO
NA AVALIAÇÃO DE PACIENTES COM SARCOMA DE
KAPOSI PULMONAR E SÍNDROME DA
IMUNODEFICIÊNCIA ADQUIRIDA
Fernando Antônio Palma da Silva Filho
Dissertação submetida ao Corpo Docente da
Faculdade de Medicina da Universidade
Federal do Rio de Janeiro, como parte dos
requisitos necessários à obtenção do Grau de
Mestre em Medicina (Radiologia). Área de
Concentração:Radiodiagnóstico.
Orientador: Edson Marchiori
Rio de Janeiro
2006
FICHA CATALOGRÁFICA
Silva Filho, Fernando Antônio Palma
Tomografia Computadorizada de Alta Resolução na avaliação de pacientes
com sarcoma de Kaposi pulmonar e síndrome da imunodeficiência adquirida /
Fernando Antônio Palma da Silva Filho. -- Rio de Janeiro: UFRJ /Faculdade de
Medicina, 2006.
ix,55 f.:il.;31cm.
Orientador:Edson Marchiori
Dissertação (mestrado) – UFRJ/ Faculdade de Medicina/ Departamento
de Radiologia, 2006.
Referências bibliográficas:f. 52 - 55
1.sarcoma de Kaposi pulmonar . 2.Síndrome da Imunodeficiência Adquirida.
3. Tomografia Computadorizada por Raios X. 4. Diagnóstico por Imagem.
5.Radiologia – Tese. I. Marchiori, Edson. II.Universidade Federal do Rio de
Janeiro, Faculdade de Medicina, Radiologia. III. Título.
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
FACULDADE DE MEDICINA
DEPARTAMENTO DE RADIOLOGIA
TOMOGRAFIA COMPUTADORIZADA DE ALTA RESOLUÇÃO
NA AVALIAÇÃO DE PACIENTES COM SARCOMA DE
KAPOSI PULMONAR E SÍNDROME DA
IMUNODEFICIÊNCIA ADQUIRIDA
Fernando Antônio Palma da Silva Filho
Orientador: Edson Marchiori
Banca Examinadora:
Prof.Dr. Antonio Carlos Pires Carvalho
Prof.Dr. Domenico Capone
Profa.Dra. Maria Lúcia de Oliveira Santos
Rio de Janeiro
2006
AGRADECIMENTOS
Ao meu orientador e Professor Edson Marchiori, mais que um professor, um
amigo, agradeço pela imensa paciência, dedicação, sinceridade, incentivo e pela
amizade, acima de tudo. Pela simplicidade com que abriu os caminhos para que
este trabalho pudesse ser concretizado, sempre indicando a direção a ser tomada
nos momentos de maior dificuldade e principalmente pela honestidade,
transparência e ensinamentos, que vão muito além das sessões e conhecimentos
teóricos, ficarão para a vida... Muito obrigado!!!
Aos coordenadores do Programa de Pós Graduação em Radiologia, que
pela dedicação a este projeto permitem que tenhamos grande orgulho da nossa
formação.
A todos os médicos e professores do Serviço de Radiodiagnóstico do
HUCFF, por estarem, apesar de todas as dificuldades, sempre disponíveis para
nos ajudar, ensinar e aconselhar da melhor maneira possível. Agradeço a todos!
Aos meus amigos de residência, Guigui, Miguelito, Tati, Dani e Carol,
pessoas que agradeço a sorte de ter convivido, por todo apoio nos momentos
mais difíceis e por tornarem o dia-a-dia mais descontraído, e o mais importante,
pela grande amizade.
Aos demais residentes do Serviço de Radiodiagnóstico do HUCFF.
A todos os funcionários do Departamento de Radiologia da UFRJ,
especialmente a Dalila, Bia, Enith, Regina e Nézia, por todo apoio e convívio.
DEDICATÓRIA
Aos meus pais, que com amor, confiança e incentivo, tornaram tudo isso
possível.
Aos meus amigos, por toda ajuda.
À minha família, que mesmo à distância, torceu intensamente.
À Carol, por tudo que representa...
A Deus,...
RESUMO
O sarcoma de Kaposi é a neoplasia mais freqüente nos pacientes com a síndrome
da imunodeficiência adquirida (SIDA), evoluindo na maioria dos casos de forma
agressiva, inclusive com disseminação pulmonar. Neste trabalho, foram estudadas
9 tomografias computadorizadas de alta resolução do tórax de pacientes com
diagnóstico de sarcoma de Kaposi pulmonar e SIDA. As principais alterações
tomográficas foram o espessamento do interstício axial, ao longo das bainhas
peribroncovasculares, os nódulos de margens irregulares e o espessamento dos
septos interlobulares, evidenciados respectivamente em 100%, 55,5% e 55,5%
dos casos. A presença de derrame pleural foi detectada em 55,5% dos pacientes,
e em todos os casos estava acompanhado de doença parenquimatosa, sendo
geralmente bilateral e de pequeno volume. Outros achados menos freqüentes
foram a presença de áreas de atenuação em vidro fosco, consolidações, nódulos
centrolobulares e do espaço aéreo, e estreitamento irregular da luz de brônquios.
A presença de cissuras nodulares, observadas em quatro (44,4%) pacientes, foi
descrita somente por dois autores. Foi encontrado em um paciente (11,1%), o
padrão de “pavimentação em mosaico”, caracterizado por áreas de atenuação em
vidro
fosco
intralobulares.
superpostas
a
espessamento
dos
septos
interlobulares
e
ABSTRACT
Kaposi´s sarcoma is the commonest neoplasm in patients with acquired
immunodeficiency syndrome (AIDS), usually having an aggressive course,
including pulmonary involvement. In this study, 9 chest computed tomographies of
patients with diagnosed pulmonary Kaposi´s sarcoma were evaluated. The
predominant tomographic findings were axial intersticial thickening, along
bronchovascular bundle, poorly defined nodules, interlobular septal thickening,
observed in 100%, 55,5% and 55,5% respectively. Pleural effusion was detected in
55,5% of patients, being associated with parenchymal involvement in all and
usually bilateral and small. Least common findings were areas of ground-glass
attenuation, consolidation, central lobular and air space nodules, and irregular
luminal bronquial narrowing. . The presence of fissural nodularity were seen in
four (44%) patients, was only described by two authors. We found in one patient
(11,1%), a “crazy-paving” pattern caractherized by areas of groung glass
attenuation superimposed with interlobular and intralobular septal thickening.
LISTA DE ABREVIATURAS, SIGLAS E SÍMBOLOS
FCEV: fator de crescimento endotelial vascular
HHV-8:herpes vírus humano do tipo 8
HIV: vírus da imunodeficiência humana
HUAP: Hospital Universitário Antônio Pedro
HC: Hospital das Clínicas
HUCFF: Hospital Universitário Clementino Fraga Filho
HUPE: Hospital Universitário Pedro Ernesto
LDH: lactato desidrogenase
PCP: pneumonia por Pneumocystis carinii
SIDA: síndrome da imunodeficiência adquirida
SK: sarcoma de Kaposi
TCAR: tomografia computadorizada de alta resolução
UERJ: Universidade do Estado do Rio de Janeiro
UFPR: Universidade Federal do Paraná
UFRJ: Universidade Federal do Rio de Janeiro
UFF: Universidade Federal Fluminense
UH: unidades Hounsfield
SUMÁRIO
FICHA CATALOGRÁFICA
ii
FOLHA DE APROVAÇÃO
iii
AGRADECIMENTOS
iv
DEDICATÓRIA
v
RESUMO
vi
ABSTRACT
vii
LISTA DE ABREVIATURAS, SÍMBOLOS E SIGLAS
viii
SUMÁRIO
ix
1.
INTRODUÇÃO E OBJETIVO
1
2.
REVISÃO DE LITERATURA
4
2.1. Considerações gerais
4
2.2. Quadro clínico
13
2.2.1 Lesões cutâneas
2.2.2 Lesões orais
2.2.3 Trato gastrintestinal
2.2.4 Trato respiratório
2.2.5 Linfonodos
2.2.6 Linfedema
2.2.7 Outros locais
2.3. Diagnóstico
13
14
15
15
16
16
17
17
2.3.1 Achados laboratoriais
2.3.2 Diagnóstico por imagem
2.3.3 Achados broncoscópicos
2.3.4 Achados histopatológicos
17
18
24
25
3.
PACIENTES, MATERIAL E MÉTODO
27
4.
RESULTADOS
31
5.
DISCUSSÃO
44
6.
CONCLUSÕES
50
7.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
52
1
1- INTRODUÇÃO E OBJETIVO
O sarcoma de Kaposi (SK) é uma neoplasia conhecida desde 1872,
quando Moritz Kaposi descreveu a forma clássica (européia) da doença. Desde
então foram identificadas ao todo, até hoje, cinco formas da neoplasia, todas com
os mesmos achados histopatológicos, porém com apresentação clínica e evolução
distintas, acometendo populações específicas(1,2,32) .
A forma associada à síndrome da imunodeficiência adquirida (SIDA)
é a de maior notoriedade e repercussão mundial, devido ao seu caráter epidêmico
no início da década de 80 e por sua evolução agressiva, muitas vezes fatal.
Dentre as neoplasias associadas à SIDA, o SK permanece sendo a mais
freqüente, apesar do declínio ocorrido no inicio da década de 90, quando
constataram-se percentuais inferiores a 20%, após a introdução da terapia
antiretroviral efetiva (7,19,32) .
Apesar da pele ser o local mais afetado, nesses pacientes a
apresentação tende a ser multicêntrica, inclusive disseminando para os pulmões
em cerca de 18 a 47% dos casos, existindo contudo trabalhos que relatam
incidências de até 50 a 65%(10,26).
2
A etiopatogenia do SK está intrinsecamente ligada a alterações do
sistema imunológico que promovam imunodepressão. Além disso, a partir de
observações realizadas quanto aos grupos populacionais acometidos e a
distribuição geográfica da neoplasia, aventou-se a possibilidade de que um fator
transmitido sexualmente participasse também do desenvolvimento do SK. Nesse
contexto, em 1994, um vírus até então desconhecido foi encontrado em lesões
cutâneas de pacientes com todas as formas do SK, sendo chamado de herpes
vírus humano do tipo 8 (HHV-8), considerado de importância primária na
etiopatogenia da doença(2,3,31,32) .
O diagnóstico precoce do envolvimento pulmonar é difícil. O quadro
clínico, assim como os exames laboratoriais são inespecíficos
(7)
. O principal
achado na radiografia do tórax é a infiltração perihilar bilateral, que também não é
de grande valia, visto que outras comorbidades que acometem os pacientes com
SIDA podem manifestar-se desta forma. A tomografia computadorizada de alta
resolução (TCAR) do tórax, em contrapartida, pode fornecer subsídios capazes de
estreitar o diagnóstico e, em algumas situações, sugerir o SK como principal
possibilidade. De uma maneira geral os achados mais comuns na TCAR são o
espessamento do interstício axial, ao longo das bainhas peribroncovasculares, os
nódulos de margens irregulares, a nodularidade das cissuras, o espessamento
dos septos interlobulares e os nódulos centrolobulares(13,26,29).
3
O objetivo deste trabalho é descrever os principais achados na TCAR
do tórax do envolvimento pulmonar pelo sarcoma de Kaposi em pacientes com
SIDA.
4
2- REVISÃO DE LITERATURA
2.1- CONSIDERAÇÕES GERAIS
A síndrome da imunodeficiência adquirida foi inicialmente descrita em
1981 nos Estados Unidos, a partir de relatos de casos inexplicáveis de pneumonia
por Pneumocystis carinii e candidíase mucosa em cinco pacientes jovens,
homossexuais do sexo masculino*, e de sarcoma de Kaposi em vinte e seis
homossexuais masculinos, com defeitos da imunidade humoral e celular**(1,19).
A SIDA é causada por um retrovírus, o vírus da imunodeficiência
humana, com tropismo pelos linfócitos T, sendo caracterizada por imunossupressão
intensa associada a infecções oportunistas, manifestações neurológicas e
neoplasias secundárias, dentre elas o sarcoma de Kaposi(1).
A SIDA foi identificada no Brasil, pela primeira vez, em 1980 e
apresentou um crescimento na incidência até 1998, quando foram registrados
25.732 casos novos, com um coeficiente de incidência de 15,9 casos/100.000
habitantes. A partir de então verificou-se uma desaceleração nas taxas de
incidência no País.
*Center for Disease Control: Pneumocystis pneumonia - Los Angeles. MMWR,30:250-252,1981.
**Center for Disease Control: Kaposi´s sarcoma and Pneumocystis pneumonia among homosexual men – New York and
California. MMWR,30:306-308,1981.
5
Atualmente, verifica-se uma tendência de heterossexualização,
feminização, envelhecimento e pauperização da epidemia, aproximando-a cada
vez mais do perfil socioeconômico do brasileiro médio. Desde o início da década
de 80 até setembro de 2003, foram notificados 277.154 casos de SIDA no Brasil.
Desse total, 197.340 foram verificados em homens e 79.814 em mulheres(39).
Estima-se que mais de 15000 pessoas sejam infectadas por dia em
todo o mundo (dados de 1999); 40 milhões estão atualmente infectadas, e 3
milhões morreram somente em 2003. A esmagadora maioria dos casos ocorre na
África, onde a principal forma de transmissão é o sexo heterossexual e o uso de
prostitutas. Regiões em risco com alto crescimento de novas infecções são o leste
da Europa, a Índia e o Sudeste Asiático(39).
2.1.1- Formas do sarcoma de Kaposi
Em 1872, Moritz Kaposi, dermatologista húngaro, descreveu a forma
clássica ou européia do SK, que é caracterizada pela presença de nódulos ou
placas cutâneas de coloração azulada e crescimento lento, que acometem
principalmente os membros inferiores de homens idosos, originários do Leste
Europeu (freqüentemente os Judeus)(1,10,18,30,37). Hoje são identificadas cinco formas
6
de sarcoma de Kaposi, que apesar de possuírem achados histopatológicos
essencialmente iguais, manifestam-se clinicamente e evoluem de maneiras
distintas(1,31).
A forma clássica (européia) é considerada rara, ocorrendo na maioria
das vezes em homens, com uma razão de 10 a 15 homens para cada mulher. Essa
forma usualmente atinge pessoas entre 50 e 70 anos. A doença geralmente é
limitada a uma ou múltiplas lesões, na maioria das vezes distribuídas nos membros
inferiores, especialmente em torno dos tornozelos e na planta do pé. Podem ser
assimétricas, acometendo um só membro. As lesões caracteristicamente são
assintomáticas, definidas como pápulas ou nódulos, de coloração vermelha, azul,
violácea ou marron. A cor varia de acordo com a pigmentação da pele normal. Na
imensa maioria dos casos essa forma tem uma evolução arrastada, por 10 a 15
anos, com crescimento lento e surgimento de novas lesões. Estase venosa e
linfedema dos membros inferiores são complicações freqüentes. Quanto maior o
tempo de doença maior a chance de envolvimento sistêmico, com acometimento do
trato gastrintestinal, linfonodos e outros órgãos. As lesões viscerais geralmente são
assintomáticas e descobertas na autópsia, entretanto existem relatos de hemorragia
gastrintestinal franca. Mais de um terço dos pacientes desenvolvem neoplasia
secundária, com freqüência o linfoma não Hodgkin(1,2,31).
7
A forma Africana do SK, descrita pela primeira vez na década de 50, é
considerada endêmica nas populações nativas da África equatorial, sendo
responsável por aproximadamente 9% das neoplasias malignas que acometem os
homens dessa região. Essa forma pode manifestar-se como uma neoplasia
indolente, idêntica à forma européia, ou como uma doença localmente agressiva,
com lesões vegetantes, invasão do tecido subcutâneo e até dos ossos. Ambas as
apresentações são muito mais freqüentes no sexo masculino, com proporções
semelhantes à forma européia clássica, no entanto na forma Africana os pacientes
são significativamente mais jovens. Existem relatos de uma terceira forma, que
acomete mais
crianças
pré-púberes,
com
linfonodomegalias
generalizadas
associadas muitas vezes com doença visceral. O prognóstico é péssimo, com 100%
de mortalidade em 3 anos(1,2,31).
A forma associada a pacientes transplantados que recebem altas
doses de imunossupressores, foi relatada pela primeira vez no ano de 1969 em um
paciente pós-transplante renal(31). Estima-se que os pacientes transplantados
possuam 150 a 200 vezes mais chance de desenvolver a neoplasia que a
população
geral.
Desde
então,
diversos
casos
foram
identificados
em
transplantados renais e de outros órgãos que recebem azatioprina e prednisona,
desenvolvendo SK geralmente um ano e meio em média após o inicio da terapia
imunossupressora. Manifesta-se comumente entre 2 a 5 anos após o transplante,
com lesões predominantemente na pele, porém, podem originar metástases. As
lesões regridem com o controle da imunossupressão(1,2,31,37).
8
A forma não epidêmica do sarcoma de Kaposi relacionada a
homossexuais, foi descrita mais recentemente em pacientes com exames
laboratoriais negativos para o HIV. Manifesta-se por lesões cutâneas de evolução
indolente, principalmente nos membros inferiores e genitália, podendo contudo
ocorrer em qualquer local(9).
A forma do sarcoma de Kaposi associada à SIDA (forma epidêmica),
ocorre em 20 a 30% dos homossexuais e homens bissexuais infectados pelo HIV,
3% dos heterossexuais usuários de drogas injetáveis e em somente 1% das
mulheres infectadas pelo vírus(19,31).
Apesar do SK associado à SIDA acometer a pele na maioria das
vezes, nestes pacientes a neoplasia tem uma apresentação multicêntrica e
agressiva, com envolvimento de órgãos viscerais em até 50% dos casos, podendo
também disseminar-se para os linfonodos, trato gastrintestinal, árvore respiratória e
mucosas(11,16,17,18,33,37). A capacidade de disseminação do SK pode causar
morbidade e mortalidades significantes(19,30).
A maioria dos pacientes com SK pulmonar apresenta lesões cutâneas
prévias, porém a ausência de lesões cutâneas aparentes não exclui a possibilidade
9
do acometimento pulmonar isolado(13,32). Alguns estudos relatam a ocorrência
isolada do acometimento pulmonar, que varia de 0 a 11%(13). Estudo realizado por
Huang e cols(13), com 168 pacientes com diagnóstico de SK pulmonar, relatou a
ausência de lesões cutâneas em 26% dos pacientes. Nos pacientes que
apresentam SK cutâneo prévio, o tempo médio entre o diagnóstico de SK cutâneo e
do pulmonar é de 268 dias. O primeiro caso descrito de SK pulmonar em pacientes
com SIDA foi de um homem homossexual com febre, perda de peso, diarréia,
nenhuma lesão cutânea e radiografia do tórax com infiltração intersticial nodular
bilateral(13,32).
A incidência de comprometimento do pulmão varia muito na literatura,
não existindo um consenso em torno de uma porcentagem especifica. O pulmão é
mais freqüentemente acometido na forma associada à SIDA. Alguns autores
encontraram 18 a 47% de acometimento do pulmão(11); no entanto, séries de
autópsias relataram até 50 a 65%(22). Na realidade acredita-se que a incidência seja
maior do que a conhecida até hoje, pois na maioria dos casos o diagnóstico correto
é muito difícil, devido a inespecificidade dos sinais e sintomas clínicos, a freqüente
associação de diversas enfermidades que acometem simultaneamente os pacientes
com SIDA, e a necessidade de métodos invasivos para o diagnóstico, como a
broncoscopia e até a biópsia pulmonar(11,13,26,32,33).
10
2.1.2- Etiopatogenia e Transmissão do sarcoma de Kaposi
O sarcoma de Kaposi representa uma alteração proliferativa de células
mesenquimais, em resposta à infecção pelo vírus HIV e a desregulação do sistema
imune mediada pelo HIV, em conjunto com um agente infeccioso, o herpes vírus
humano tipo 8 (HHV-8), desconhecido até o início dos anos 90 (2,3,30).
Em 1994 foram identificados fragmentos de DNA do HHV-8, nas
lesões cutâneas do SK em pacientes com SIDA, SK clássico, SK africano e em
pacientes transplantados, não sendo encontrados os mesmos fragmentos na pele
normal desses pacientes
(2,11,12,30,31)
. Os herpesvírus são divididos em três famílias,
sendo que o HHV-8 pertence à subfamilia dos Gamaherpesvírus. Os vírus membros
dessa subfamília são associados a tumores, principalmente ao linfoma. Sabe-se
que o HHV-8 está diretamente associado, além do SK, ao linfoma de células B
primário das cavidades corporais e à doença de Castleman (2,3,6,31).
Mais de 95% das lesões do SK são infectadas pelo HHV-8,
independentemente da forma clínica ou do local das lesões. Os resultados de vários
estudos sorológicos comprovaram que a infecção pelo HHV-8 é praticamente
onipresente nos pacientes com SK. Anticorpos específicos foram detectados em 70
11
a 90% de todos os pacientes com SK e em 100% dos pacientes com SK
imunocompetentes(3,6,30,31).
A transmissão do HHV-8 não é completamente conhecida. Evidências
epidemiológicas indicam que a via sexual é, talvez, a principal forma nos países
desenvolvidos, principalmente em homens homossexuais. A prevalência do vírus
aumenta de acordo com o número de parceiros sexuais e com o sexo anal
receptivo. Outros modos foram observados em países africanos. A transmissão
materna nas áreas
endêmicas parece exercer um papel importante na
disseminação da infecção, visto que a mesma pode ocorrer durante o trabalho de
parto e até mesmo pela via transplacentária. Pelo fato de a infecção pelo HHV-8 ter
sido encontrada em crianças em idade escolar e adolescentes, e pela detecção do
DNA viral na saliva, outras formas de transmissão estão sendo propostas; no
entanto, ainda não foram comprovadas(1,2,6,30).
A infecção pelo HHV-8 é um fator primário e essencial para o
desenvolvimento de todas as formas do SK. No entanto, outros fatores parecem
atuar em conjunto o vírus. Dentre esses fatores pode-se citar a alteração da
expressão e da resposta aos fatores de crescimento celular e citocinas, e a
modulação do crescimento tumoral pelos produtos do gen do HIV(1,2,30).
12
O vírus HIV atua em conjunto com o HHV-8 na patogênese do SK. A
interação entre esses dois vírus é identificada a partir da ação sinérgica entre a
proteína tat, uma transativadora da transcrição do genoma viral para a replicação do
HIV, ligada ao RNA e secretada pelas células infectadas pelo vírus, e o fator básico
de crescimento dos fibroblastos no crescimento tumoral. Outras células que
promovem o crescimento do tumor são a interleucina-1 e o fator de necrose
tumoral(1,2,30).
A angiogênese é um achado característico do SK. Estudos
experimentais recentes têm demonstrado a importância do fator de crescimento
endotelial vascular (FCEV) e dos seus receptores na patogênese da neoplasia. As
células em forma de fuso características do SK contém e secretam grandes
quantidades de FCEV. O FCEV é o principal regulador tanto da neovascularização
fisiológica como da patológica, e também é responsável pela hiperpermeabilidade
vascular independente da histamina, que leva ao extravasamento do líquido
intravascular e, por fim, edema. Foi visto que o uso de inibidores dos receptores do
FCEV pode promover redução do crescimento tumoral e do edema associado ao
SK(2,3).
O risco dos pacientes com SIDA de desenvolverem SK varia de
acordo com os diferentes modos de infecção pelo vírus HIV. Comprovadamente os
pacientes homens homossexuais possuem maior chance de apresentarem SK
durante a evolução da SIDA do que os pacientes infectados através de relações
13
heterossexuais ou do uso de drogas injetáveis(27). Fatores genéticos, tempo de
infecção pelo HIV, baixas contagens de linfócito T CD4, infecção pelo HHV-8, assim
como a carga viral deste vírus, também são fatores atribuídos ao maior risco de
desenvolvimento do SK(3,30) .
2.2- QUADRO CLÍNICO
O SK tem progressão variável, desde um curso indolente, podendo ter
remissão espontânea, até formas agressivas com comprometimento visceral. Como
já mencionado anteriormente, o SK na SIDA é uma neoplasia que acomete
múltiplos sistemas orgânicos. Sendo assim, a avaliação clinica inicial deve ser
ampla e minuciosa, com atenção especial para a pele e mucosas(1,2,3,30,31).
2.2.1-Lesões cutâneas
As lesões cutâneas podem ocorrer em toda a superfície da pele.
Usualmente são máculas, pápulas, nódulos ou placas pigmentadas, porém nódulos
subcutâneos podem surgir sem pigmentação cutânea. Podem variar desde alguns
milímetros até lesões confluentes com vários centímetros. Quanto à coloração as
lesões variam muito. As lesões mais recentes são de coloração rosa, avermelhada
14
ou violácea, as quais, com o passar do tempo, escurecem. Nos negros e pardos as
lesões tendem a ser marrom escuras ou pretas. Em alguns pacientes as lesões
podem apresentar um halo de coloração esverdeada, provavelmente representando
extravasamento de pigmentos eritrocitários(1,30).
Após o tratamento as lesões tornam-se acinzentadas, castanhas ou
amarronzadas e, em alguns casos, a pigmentação pode persistir mesmo na
ausência de tumor demonstrável à biópsia. As pápulas e nódulos mais exuberantes
tendem a diminuir e as lesões maiores, confluentes, podem apresentar uma área de
hipopigmentação central(1,31).
2.2.2- Lesões Orais
Lesões orais podem ser encontradas em até um terço dos pacientes
com SK associado à SIDA. O acometimento do palato duro é visto com maior
freqüência. As lesões podem ser focais ou difusas e apresentarem-se como placas
ou máculas de coloração vermelha ou violácea, na maioria das vezes
assintomáticas.
Podem
também
assumir
uma
forma
vegetante,
exofítica,
distribuindo-se difusamente pelo palato duro e palato mole e apresentarem
sangramento. Outros locais de acometimento da cavidade oral são as gengivas,
língua, úvula, tonsilas e orofaringe. Essas lesões podem comprometer a fala,
alimentação, respiração e até os dentes(31).
15
2.2.3- Trato Gastrintestinal
Autores relataram o envolvimento do trato gastrintestinal em até 40%
dos pacientes com SK associado a SIDA no momento do diagnóstico, e em até 80%
dos casos na autópsia. Não é infreqüente a ausência de lesões cutâneas. A maioria
desses pacientes é assintomática, não necessitando de investigação formal, pois o
prognóstico não é alterado pela presença ou não das lesões gastrintestinais, e os
achados são inespecíficos, incluindo hepatoesplenomegalia, linfonodomegalias e
ascite. Somente em casos sintomáticos, por exemplo hemorragias, a investigação
formal é pertinente(20,31).
Algumas vezes o exame digital do reto pode detectar lesões maiores.
A maior parte das lesões encontra-se na submucosa, necessitando de avaliação
endoscópica, sendo o clister com duplo contraste freqüentemente normal(2,31).
2.2.4- Trato Respiratório
No trato respiratório o SK pode envolver os pulmões, a árvore
traqueobrônquica e as superfícies pleurais. Os sinais e sintomas são inespecíficos,
podendo os pacientes apresentar dispnéia, tosse, roncos, hemoptise e, nos casos
16
graves, insuficiência respiratória. Os sintomas manifestados pelos pacientes com
envolvimento pulmonar são indistinguíveis daqueles com infecções pulmonares.
Num estudo publicado por Huang e cols.(13) os principais sintomas foram tosse,
dispnéia e febre. Os pacientes que cursam com derrame pleural podem apresentar
alterações ao exame físico e o derrame sempre vai estar associado à doença do
parênquima(2,13,31).
2.2.5- Linfonodos
É comum ocorrer aumento de linfonodos em pacientes com SK
associado à SIDA. Esse achado não guarda qualquer relação com a evolução
clínica, somente sendo indicada a biópsia com estudo anatomopatológico devido às
demais possibilidades de aumento linfonodal no cenário da SIDA, como o linfoma e
algumas infecções(27).
2.2.6- Linfedema
É uma complicação freqüente nos pacientes com SK associado à
SIDA, e sua gravidade pode ser desproporcional à extensão do acometimento
cutâneo. Os locais mais comuns são os pés e as pernas, mas a região inguinal,
genitália externa e região periorbitária são também sítios freqüentes(31).
17
2.2.7- Outros Locais
O envolvimento de locais como baço, fígado, coração, pericárdio e
medula óssea não é habitual. Os casos relatados na literatura são, na sua maioria,
em séries de autópsia(2,27).
2. 3- DIAGNÓSTICO
2.3.1- Achados Laboratoriais
Dentre os exames laboratoriais, a contagem de linfócitos T CD4 é o de
maior valor no contexto dos pacientes com SIDA, visto que o sarcoma de Kaposi
predominantemente ocorre naqueles com baixa imunidade. Num estudo realizado
por Huang e cols.(13), 68% dos pacientes que desenvolveram sarcoma de Kaposi
apresentavam contagem de linfócitos T CD4 menor que 50 células/ml.
A concentração sérica da enzima desidrogenase lática (LDH) pode
ajudar a diferenciar pacientes com SK pulmonar isolado ou associado a outras
infecções oportunistas, sendo expressivamente mais elevada nos pacientes com
18
infecções associadas. Porém, existe muita sobreposição dos valores de LDH
nesses dois grupos de pacientes, o que limita seu uso como exame de
rastreamento dos pacientes com SK pulmonar(13).
A sorologia para o HHV-8 é importante para identificar os pacientes
infectados, visto que esse vírus está fortemente associado ao desenvolvimento de
todas as formas clínicas do SK(1,2,3,30,31).
2.3.2- Diagnóstico por Imagem
O diagnóstico do comprometimento pulmonar pelo SK é, na grande
maioria dos casos, difícil, devido ao quadro clínico pouco específico, à baixa
suspeição diagnóstica e à freqüente associação de comorbidades nos pacientes
com SIDA. Sendo assim, a Radiologia, principalmente através da tomografia
computadorizada de alta resolução do pulmão, atua de forma fundamental como
mais uma ferramenta no diagnóstico do SK pulmonar. Alguns achados são bastante
característicos, podendo estreitar ou muitas vezes realizar o diagnóstico correto. A
TCAR é superior à radiografia convencional na identificação de pacientes com ou
sem doença torácica, e no diagnóstico diferencial das complicações pulmonares na
SIDA(14,21,26).
19
A radiografia convencional do tórax não oferece achados específicos
para o diagnóstico do SK pulmonar, porém alguns achados podem auxiliar na
diferenciação entre os pacientes que apresentam SK pulmonar isolado daqueles
com SK pulmonar associado a pneumonia por Pneumocystis carinii (PCP), a qual é
uma das principais infecções pulmonares nos pacientes com SIDA. Pacientes com
SK pulmonar isolado geralmente não apresentam anormalidades radiográficas que
predominem nos campos pulmonares superiores, áreas císticas e opacidades
nodulares. Esses três achados sugerem PCP isolado ou associado(13). Estudo
realizado por Naidich e cols.(28) demonstrou que a principal alteração radiográfica do
SK foi a presença de infiltração perihilar bilateral, encontrada em 22 dos 24
pacientes (92%). Nesse mesmo estudo, nódulos espiculados foram descritos em
40% dos pacientes.(28)
Num estudo de Gruden e cols.(11) foi realizado estadiamento quanto a
extensão da doença na radiografia convencional. No estágio 0 a radiografia é
normal. A doença no estágio 1 é caracterizada por espessamento isolado das
paredes brônquicas com opacidades em “trilho de trem”. No estágio 2 encontram-se
pequenos nódulos com ou sem os achados do estágio 1. E no estágio 3, estão
presentes grandes nódulos ou consolidação com ou sem broncograma aéreo,
associados ou não aos achados do estágio 1 ou 2(11).
20
Os principais achados na TCAR são nódulos de limites mal definidos,
espessamento do interstício peribroncovascular, espessamento dos septos
interlobulares, nodulação das cissuras, nódulos subpleurais, derrame pleural,
linfonodomegalias,
opacidades
em
“vidro-fosco”
e
também
nódulos
centrolobulares(8,14,16,19,21,23,24,25,26,33,35,37).
Os nódulos são irregulares, com contornos mal definidos e aspecto
espiculado, e representam proliferação tumoral no interstício com invasão
progressiva dos espaços alveolares adjacentes(26). O achado de nódulos irregulares
varia de 79% a 100%(16,26,35,37). Nos pacientes com SIDA a principal característica
dos nódulos, e que mais auxilia na diferenciação entre infeccções oportunistas, SK
e linfoma, é a distribuição. Segundo Edinburgh e cols.(8), 88% dos pacientes com
SIDA e nódulos de distribuição peribroncovascular apresentam SK pulmonar.
Apesar do tamanho do nódulo maior que 1 centímetro favorecer o diagnóstico de
condições malignas, não foi significativo o auxílio na diferenciação entre as diversas
complicações pulmonares da SIDA(8).
O espessamento do interstício peribroncovascular ocorre em direção à
periferia dos pulmões. Durante a evolução da doença o espessamento torna-se
progressivamente nodular e o acometimento é mais acentuado nos terços inferiores
e médios. Esse espessamento do interstício ao longo do feixe peribroncovascular
representa a rota linfática do tumor. O espessamento septal também pode resultar
21
desse mecanismo ou do edema secundário à obstrução linfática central(23,24,25,26,32).
O espessamento do feixe peribroncovascular é encontrado numa freqüência que
varia de 66% a 93,3%(16,26,35,37).
Num estudo realizado por Sivit e cols.(33) a doença parenquimatosa foi
dividida em localizada e difusa. A forma localizada é definida pela presença de um
foco único em um lobo ou menos, e a difusa por um envolvimento maior que a
localizada(33).
Os achados de derrame pleural e linfonodomegalias, que são
encontrados numa freqüência que varia de 28% a 76% e 15% a 50%,
respectivamente, podem auxiliar no diagnóstico do SK pulmonar quando associados
aos achados descritos acima(16,23,24,25,26,28,35,37). O mecanismo de formação do
derrame pleural não está claro. A presença de doença subpleural pode influenciar.
A forma do sarcoma de “Kaposi-linfangioma-like” pode ocasionar derrame pleural
por linfedema(26). Gruden e cols.(11) sugerem que o envolvimento pleural só ocorre
associado a lesões do parênquima.
A presença de áreas de atenuação em vidro fosco envolvendo um ou
mais nódulos e de áreas em vidro fosco afastadas dos nódulos também têm sido
descritas e não indicam, obrigatoriamente, doença associada(26).
22
O encontro dos achados acima na TCAR de pacientes com SIDA
sugere
fortemente
o
diagnóstico
do
sarcoma
de
Kaposi
pulmonar(8,14,16,19,23,24,25,26,28,35,37).
Recentemente, Bautista e cols.(5) descreveram um caso de um
paciente portador da SIDA que apresentou a síndrome do lobo médio como
manifestação do sarcoma de Kaposi pulmonar. Essa síndrome é uma alteração
pulmonar que envolve o lobo médio, sendo caracterizada por colapso, obstrutivo ou
não. Nos pacientes HIV positivos já havia sido descrita no linfoma e nas infecções
por micobactérias(5).
Poucos estudos foram realizados para avaliar a eficácia da
ressonância magnética no diagnóstico das manifestações pulmonares da SIDA,
inclusive o sarcoma de Kaposi(15).
Os principais achados na ressonância magnética do pulmão nos
pacientes acometidos pelo sarcoma de Kaposi são: aumento irregular da
intensidade do sinal nas seqüências ponderadas em T1; importante diminuição da
intensidade do sinal nas seqüências ponderadas em T2 no segundo eco
(TE=100ms), e realce significativo das lesões após administração do gadolínio
endovenoso. O percentual de redução da intensidade do sinal nas seqüências
ponderadas em T2 no segundo eco variou entre 30 e 70%(15,16).
23
A explicação para a diminuição da intensidade do sinal nas seqüências
ponderadas em T2 provavelmente depende da presença de hemorragia alveolar ou
da magnitude do componente fibrótico do tumor(15).
Esse padrão de comportamento das lesões, particularmente quando
distribuem-se ao longo da bainha peribroncovascular, é sugestivo de sarcoma de
Kaposi(15).
Outro método pouco estudado para avaliação do sarcoma de Kaposi
pulmonar é a cintilografia seqüencial com Tálio e Gálio. Alguns estudos
demonstraram a captação do Tálio e a não captação do Gálio pelas lesões
pulmonares do sarcoma de Kaposi. No contexto da SIDA, deve-se ressaltar que
áreas do pulmão acometidas por processo infeccioso caracteristicamente não
apresentam captação do tálio, e sim captação do gálio. O linfoma, que também é
uma neoplasia freqüente na SIDA, apresenta tanto captação do Gálio como do
Tálio(17,18).
Sendo assim, a cintilografia seqüencial com Tálio e Gálio é um método
complementar que pode ser de grande benefício para o diagnóstico do sarcoma de
Kaposi pulmonar, e sua diferenciação das outras complicações pulmonares da
SIDA, como o linfoma e as infecções(17).
24
2.3.3- Achados Broncoscópicos
Apesar
das
lesões
endobrônquicas
precederem
a
doença
parenquimatosa, a incidência das mesmas é incerta. A presença de lesões na
árvore brônquica abaixo da carina é sempre acompanhada por doença
parenquimatosa. A TCAR é um método com baixa sensibilidade para essas
lesões(19,23,26,27).
O diagnóstico do sarcoma de Kaposi traqueobrônquico é realizado
através da visualização de placas planas ou elevadas, de coloração vermelha ou
violácea, nas áreas de bifurcação da árvore traqueobrônquica. Quanto ao
acometimento, este pode ser localizado ou difuso. O acometimento localizado é
caracterizado pelo envolvimento de um brônquio segmentar de um único lobo ou da
parede da traquéia. O difuso é determinado quando encontram-se lesões
simultâneas da traquéia e de um lobo, ou de um brônquio segmentar de dois ou
mais lobos(11,13,19,35,38). O achado broncoscópico de lesões características na árvore
traqueobrônquica é suficiente para presumir o diagnóstico do sarcoma de Kaposi,
visto que muitas vezes, mesmo através da biópsia brônquica, a confirmação é
difícil(19,23).
Gruden
e
cols.(11)
classificaram
a
extensão
das
lesões
traqueobrônquicas em três graus. Grau 1 representa as lesões restritas à traquéia,
25
epiglote ou laringe, sem lesões na carina ou abaixo; grau 2 refere-se a lesões
brônquicas, limitadas a três ou menos lobos pulmonares (a língula foi considerada
um lobo isolado); grau 3 considera o acometimento difuso, extenso ou doença
confluente em quatro ou mais lobos(11).
2.3.4- Achados Histopatológicos
Os achados histológicos do sarcoma de Kaposi incluem dois
componentes: um componente angiomatoso, resultante da neoangiogênese, e
proliferação das células fusiformes que têm origem no endotélio e nos macrófagos,
sendo consideradas as células tumorais. As células fusiformes são infectadas pelos
HHV-8. O outro componente é formado por infiltrado celular de macrófagos,
linfócitos, mastócitos e neutrófilos(3,15, 21).
O padrão histopatológico é caracterizado por espaços vasculares
dilatados com paredes finas, entremeados por agregados de células fusiformes,
contendo núcleos atípicos e mitoses ocasionais. Essas células fusiformes,
presentes no estroma, contêm espaços irregulares, em forma de fenda, cheios de
hemácias com depósitos de hemossiderina e revestidos por endotélio, interligados
com canais vasculares normais(3,16,26,28,31,32).
26
O infiltrado de células neoplásicas dissemina-se pelo interstício,
seguindo uma rota linfática ao longo das bainhas peribrincovasculares, veias
pulmonares e superfícies pleurais. A partir dessas regiões as células se estendem
como “tentáculos” para os septos alveolares adjacentes e enchem os alvéolos,
formando nódulos ou massas sólidos que podem medir até 4 a 5cm(23,26,32).
27
3- PACIENTES, MATERIAL E MÉTODO
3.1- Pacientes
Neste trabalho foi realizado um estudo observacional descritivo
retrospectivo das tomografias computadorizadas de alta resolução do tórax de 9
pacientes com diagnóstico confirmado de sarcoma de Kaposi pulmonar. O estudo
foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UFRJ sob o número 089/06CEP. Estes exames foram provenientes dos arquivos nosológicos de 4 instituições
médicas diferentes, localizadas no estado do Rio de Janeiro e do Paraná (quadro
1). O diagnóstico foi confirmado através da associação dos dados clínicos com
achados da broncoscopia, anátomo-patológicos e radiológicos. Dentre os nove
pacientes, todos eram portadores da SIDA, sendo oito homossexuais do sexo
masculino e uma mulher heterossexual.
Quadro 1: Listagem dos pacientes
Casos
1
2
3
4
5
6
7
8
9
Procedência
HUPE-UERJ
HUAP-UFF
HUPE-UERJ
HUAP-UFF
HUCFF-UFRJ
HUCFF-UFRJ
HC-UFPR
HC-UFPR
HUCFF-UFRJ
Sexo
masculino
masculino
masculino
masculino
masculino
masculino
masculino
masculino
feminino
Idade
34
34
36
33
35
43
26
52
40
HUPE-UERJ: Hospital Universitário Pedro Ernesto, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro; HUAP-UFF: Hospital
Universitário Antônio Pedro, da Universidade Federal Fluminense, Niterói; HUCFF-UFRJ: Hospital Universitário Clementino
Fraga Filho, da Universidade Federal do Rio de Janeiro; HC-UFPR: Hospital das Clínicas da Universidade Federal do Paraná,
Curitiba.
28
Os pacientes foram incluídos no estudo após exaustiva avaliação
clínica, laboratorial e radiológica, com o intuito de afastar outras doenças
associadas.
3.2- Método
As tomografias foram realizadas em tomógrafos diferentes, mas em
todos os pacientes foi feita a técnica de alta resolução, utilizando-se algoritmo de
reconstrução de alta resolução espacial. As imagens foram obtidas com cortes
axiais de 1 a 2mm de espessura e 10mm de incremento, feitos em inspiração
profunda, com filtro de alta resolução espacial para reconstrução das imagens (filtro
de osso), utilizando 120 kV e 200mA, desde os ápices até as bases pulmonares.
Os exames foram registrados em janela de parênquima, com largura entre 1000 e
1500 Unidades Hounsfield (UH) e centro entre –650 e –750 UH. Foram registrados
também em janela para o mediastino, com largura entre 350-400 UH e centro entre
40 e 60 UH.
Os exames foram analisados por dois observadores, de forma
independente, e os casos discordantes foram resolvidos por consenso. O estudo
incluiu a avaliação do parênquima pulmonar quanto à presença de espessamento
do interstício axial, ao longo das bainhas peribroncovasculares, nódulos com
margens mal definidas, espessamento dos septos interlobulares, cissura nodular,
nódulos centrolobulares, consolidações e áreas de atenuação em vidro fosco. Os
critérios de definição destes achados são aqueles definidos no Glossário de Termos
29
da Sociedade Fleischner(4) e a terminologia utilizada é aquela apresentada no
consenso de terminologia do Colégio Brasileiro de Radiologia(34) , adotado também
pela Sociedade Brasileira de Tisiologia e Pneumologia(29) .
Em relação ao padrão das alterações, consolidação foi definida como
aumento da densidade do parênquima pulmonar, mais freqüentemente homogêneo,
podendo manifestar-se de forma heterogênea, que determina a perda da superfície
de contraste natural entre o ar dos espaços aéreos e o tecido dos vasos ou das
paredes brônquicas, tornando os vasos imperceptíveis no interior da zona de
consolidação; opacidade em vidro fosco como aumento discreto da atenuação do
parênquima pulmonar não associado a obscurecimento dos vasos e paredes das
vias aéreas, seja por comprometimento dos interstícios ou por preenchimento
parcial dos espaços aéreos; ou, alternativamente, por colapso parcial dos espaços
aéreos, por inspiração insatisfatória ou por mecanismos diversos(4,29,34) .
O espessamento dos septos interlobulares é caracterizado por
opacidade linear fina correspondente ao septo interlobular, podendo ser lisa,
irregular ou nodular; o espessamento do interstício axial como sendo uma
opacidade linear correspondente ao interstício peribroncovascular que reveste os
brônquios e as artérias pulmonares, podendo ser liso, irregular ou nodular; nódulo
como uma opacidade arredondada, moderadamente bem marginada e não maior
do que 3cm no diâmetro maior(4,29,34). A presença de nódulos com margens
30
irregulares ou mal definidas foi pesquisada, avaliando inclusive sua distribuição em
relação ao interstício peribroncovascular.
Os nódulos centrolobulares são caracterizados por sua distribuição
central em relação às estruturas do lóbulo pulmonar secundário. Nódulos do espaço
aéreo são definidos como a presença de nódulos ocupando o espaço interno dos
alvéolos, ductos e sacos alveolares(29,34).
Na análise das pleuras, foi avaliada a presença de derrame pleural,
assim como o achado de nodularidade do interstício subpleural adjacente às
fissuras. As fissuras são definidas como sendo uma opacidade linear com 1mm ou
menos de espessura, que corresponde, em posição e extensão, à separação
anatômica dos lobos pulmonares ou porções dos lobos. Quando acometida por
determinados processos patológicos, ela pode apresentar-se de aspecto nodular,
perdendo parcial ou totalmente sua linearidade(4,29,34).
31
4- RESULTADOS
4.1- Aspectos epidemiológicos
Foram estudados os casos de nove pacientes, oito homens e uma
mulher, com diagnóstico de sarcoma de Kaposi pulmonar e SIDA. A faixa etária
variou entre 26 e 52 anos, com média de 37 anos (gráfico 1).
Gráfico 1: Distribuição por faixa etária
Distribuição por faixa etária
0 a 9 anos
Número de pacientes
6
5
10 a 19 anos
5
4
20 a 29 anos
3
2
2
1
1
30 a 39 anos
1
0
0
40 a 49 anos
0
Faixa etária
50 a 59 anos
32
4.2- Aspectos Tomográficos
Na TCAR do tórax o achado mais encontrado foi o espessamento do
interstício axial, comprometendo as
bainhas peribroncovasculares
(Figuras
1,2,3,4,5,6,7 e 8). Este aspecto foi observado em todos os pacientes (100%).
O espessamento dos septos interlobulares (Figuras 1,3,4,6 e 8) e
nódulos de margens irregulares (Figuras 1,4,5,6 e 7) foram constatados em cinco
pacientes (55,5%).
A associação de espessamento do interstício axial, comprometendo as
bainhas peribroncovasculares com nódulos de margens irregulares e com
espessamento dos septos interlobulares (Figuras 1,4 e 6), foi encontrada em três
(33,3%) pacientes.
O derrame pleural (Figuras 4,6,7 e 8) foi evidenciado em cinco
pacientes (55,5%), sendo bilateral em todos eles, de pequeno volume e sempre
acompanhado de doença parenquimatosa.
Nodulações ao longo das cissuras (cissuras nodulares) (Figuras 1,4,5
e 6) foram observadas em 4 pacientes (44,4%).
33
Nódulos centrolobulares (Figuras 1 e 6), áreas de consolidação
(Figuras 5 e 7) e áreas de atenuação em vidro fosco esparsas (Figura 5) foram
observados em dois casos cada (22,2%).
Estreitamento irregular da luz de brônquios (Figura 2) e nódulos do
espaço aéreo (Figura 5) foram vistos em um paciente cada (11,1%).
Foi encontrado, em um paciente (11,1%), o padrão de “pavimentação
em mosaico”, caracterizado por áreas de atenuação em vidro fosco superpostas a
espessamento dos septos interlobulares e intralobulares (Figura 9).
Quanto à distribuição das lesões pelo parênquima pulmonar, elas
predominaram nos terços médio e inferior, distribuição esta constatada em seis
pacientes (66, 6%).
Os achados tomográficos estão representados no gráfico 2, sendo que
no quadro 2 estão eles individualizados por paciente.
34
Gráfico 2: Distribuição por achados tomográficos
10
9
8
espessamento do interstício
axial
espessamento dos septos
interlobulares
nódulos de margens
irregulares
derrame pleural
7
cissuras nodulares
6
nódulos centrolobulares
5
consolidação
4
3
estreitamento irregular da luz
de brônquios
atenuação em vidro fosco
2
nódulos do espaço aéreo
1
pavimentação em mosaico
0
35
Quadro 2: Achados tomográficos individualizados por paciente
Caso
Achados Tomográficos
1
Espessamento do interstício axial e dos septos interlobulares. Nódulos
com margens irregulares. Nódulos centrolobulares. Cissura nodular.
Pequeno derrame pleural bilateral, maior à direita.
2
Espessamento do interstício axial, ao longo da bainha
peribroncovascular. Estreitamento irregular da luz de brônquios.
3
Espessamento do interstício axial e de septos interlobulares no lobo
inferior direito.
4
Espessamento do interstício axial e de septos interlobulares. Nódulos
com margens irregulares. Cissura nodular. Derrame pleural bilateral
pequeno.
5
Espessamento do interstício axial. Nódulos com margens irregulares.
Consolidação, nódulos do espaço aéreo e áreas de vidro-fosco
póstero-inferiores. Cissura nodular.
6
Espessamento do interstício axial e dos septos interlobulares. Nódulos
com margens irregulares. Nódulos centrolobulares. Cissura nodular.
Derrame pleural bilateral, maior à direita.
7
Espessamento do interstício axial. Nódulos com margens irregulares.
Derrame pleural bilateral. Consolidações, por confluência de nódulos.
Áreas de atenuação em vidro fosco esparsas.
8
Espessamento do interstício axial e dos septos interlobulares.
Derrame
pleural bilateral.
9
Áreas de atenuação em vidro fosco com espessamento de septos
interlobulares e intralobulares bilaterais, configurando padrão em
“pavimentação em mosaico”. Espessamento do interstício axial
peribroncovascular. Derrame pleural bilateral pequeno.
44
5- DISCUSSÃO
O sarcoma de Kaposi nos pacientes com SIDA manifesta-se de
forma agressiva e sistêmica, envolvendo órgãos viscerais em até 50% dos
casos(16). De acordo com a literatura analisada, a incidência do acometimento
pulmonar é variável, visto que alguns autores relataram freqüência entre 18 a
47%(11), chegando, em alguns trabalhos, até a 65%, usualmente precedido pelo
envolvimento cutâneo e visceral(26,33) .
A partir da introdução da terapia antiretroviral efetiva, na década de
90, o SK associado a SIDA apresentou considerável declínio, sendo constatados
percentuais inferiores a 20%(2,7), em comparação com os dados do início da
década de 80, quando deflagrou-se a epidemia, que chegou a freqüências de até
40%(2,31). Contudo, o SK permanece sendo a neoplasia mais freqüente nesse
grupo
de
pacientes,
acometendo
notadamente
homossexuais
do
sexo
masculino(2,7,31) .
As diversas comorbidades associadas com a SIDA, a baixa suspeição
diagnóstica e o quadro clínico inespecífico limitam o diagnóstico precoce do SK
pulmonar. Portanto, a TCAR do tórax é um método complementar eficaz, à medida
45
em que fornece subsídios para a distinção entre as variadas complicações
pulmonares, caracterizando de forma bastante direta os processos patológicos(26,28).
A eficácia da TCAR foi bem demonstrada em estudo realizado com 34 pacientes
portadores da SIDA, onde a confiança dos examinadores em optar pelo SK como
primeira hipótese diagnóstica chegou a 91% (31 dos 34 pacientes)(14) .
Dentre os nove pacientes estudados neste trabalho, todos tinham diagnóstico
de sarcoma de Kaposi pulmonar e SIDA, sendo oito homossexuais do sexo
masculino e uma mulher heterossexual. A idade variou de 26 a 52 anos, com média
de 37 anos.
Ao comparar nossa casuística com a encontrada na literatura,
observa-se concordância em relação a incidência do acometimento quanto ao
sexo e ao comportamento sexual dos pacientes, bem como a média de idade.
Portanto os homossexuais do sexo masculino possuem maior chance de
desenvolverem o SK durante a evolução da SIDA, quando comparados a
pacientes infectados pelo HIV através do uso de drogas injetáveis ou mediante
relações heterossexuais(11,13,17,18,26,28,35,37). Esse fato é corroborado por dados
epidemiológicos, que evidenciaram o papel primordial da infecção pelo HHV-8 na
patogênese do SK e da constatação do mesmo ser transmitido principalmente por
via sexual. Além disso, a prevalência da infecção pelo HHV-8 nos homens
homossexuais está diretamente relacionada ao número de parceiros, à prática do
46
sexo anal receptivo, do sexo oro-anal, bem como com associação com outras
doenças sexualmente transmissíveis(2,6,31). Por último, somente 10% dos usuários
de drogas injetáveis e 4% dos hemofílicos com SIDA desenvolveram a
neoplasia(2,6,31) .
As manifestações tomográficas dos pacientes com SK pulmonar são
variáveis
e
freqüentemente
encontra-se
associação
de
achados(11,13,15,16,24,25,26,28,35,37). Esse aspecto também foi evidenciado em nosso
trabalho, sendo o mais freqüente o espessamento do interstício axial
peribroncovascular, juntamente com o espessamento septal e os nódulos com
margens irregulares, encontrados em três (33,3%) pacientes.
Dentre os padrões encontrados, o mais comum foi o espessamento
do interstício axial peribroncovascular, presente em todos os pacientes (100%),
bastante
característico
do
SK
e
descrito
anteriormente
por
vários
autores(16,23,24,25,26,35,37). Este percentual foi mais elevado do que o encontrado na
maior parte dos trabalhos na literatura. O espessamento resulta da expansão do
infiltrado celular ao longo das bainhas peribroncovasculares, das veias
pulmonares e das superfícies pleurais(16,23,35,37).
A incidência do espessamento dos septos interlobulares, assim
como dos nódulos com margens irregulares, ambos identificados em cinco
47
pacientes (55,5%), é muito variável na literatura analisada, visto que encontramos
relatos de espessamento septal que variam entre 28 a 86%, e de nódulos com
margens irregulares variando de 79 a 100%(16,26,35,37).
Trabalhos na literatura sugerem que em pacientes com SIDA, na
presença de nódulos com margens irregulares, sejam estes múltiplos ou únicos, o
SK é a principal causa(8,15,35) . A caracterização de uma distribuição dos nódulos
ao longo das bainhas peribroncovasculares aumenta ainda mais a especificidade
para
o
diagnóstico
desta
neoplasia,
em
lugar
das
outras
possíveis
comorbidades(15,35) . Os nódulos com margens irregulares correspondem a áreas
de proliferação do tumor no interstício com invasão dos espaços alveolares
adjacentes. Já o espessamento dos septos interlobulares provavelmente resulta
da disseminação do tumor pelos vasos linfáticos pulmonares ou do edema
secundário à obstrução linfática central(23,26,35) .
Outro aspecto observado em nossa casuística foi o derrame pleural,
evidenciado em cinco (55,5%) pacientes. Os dados referentes à freqüência deste
achado, na literatura, variam entre 28 e 76%. Os cinco (55,5%) pacientes
apresentaram
derrame pleural
acompanhado
de
doença
de
pequeno
parenquimatosa,
volume,
estando
bilateral
esses
e
sempre
aspectos
em
concordância com a literatura(16,24,25,26,28,35,37) . A presença de doença subpleural
pode fazer parte do processo fisiopatológico do derrame pleural, porém o
48
mecanismo ainda não está claro(14). No estudo de Khalil e cols.(16) 29 pacientes
(55%) apresentaram derrame pleural, e em dois deles foi constatado quilotórax
após a realização da toracocentese, sugerindo-se a hipótese de linfedema como
causa.
Quanto à presença de nodulação ao longo das cissuras, observada em
quatro (44,4%) pacientes, somente dois autores descreveram este achado,
encontrado em 50% dos pacientes no estudo de Marchiori e cols.(26) e em 100% no
de Traill e cols.(35). Estes últimos autores sugeriram que este achado representa a
disseminação perilinfática da neoplasia(26,35).
Áreas de atenuação em vidro fosco foram evidenciadas em dois
pacientes (22,2%) do nosso estudo. Existem poucos trabalhos que mencionam a
presença deste aspecto, e os mesmos são divergentes com relação à freqüência.
O estudo realizado por Khalil e cols.(16) constatou áreas de atenuação em vidro
fosco em apenas 3 (5,6%) dos 53 pacientes, sendo que em dois destes foi
encontrada hemorragia alveolar associada; no entanto, Traill e cols.(37) relataram a
presença deste padrão em 6 (40%) dos seus 15 pacientes.
Outros achados pouco freqüentes incluem os nódulos do espaço
aéreo, a presença de estreitamento irregular da luz de brônquios, nódulos
49
centrolobulares e áreas de consolidação,
encontrados respectivamente em
11,1%, 11,1%, 22,2%, e 22,2% dos pacientes da nossa casuística, sendo a
literatura escassa com relação a dados sobre a freqüência destas alterações(35) .
Foi evidenciado, em um paciente do nosso estudo (11,1%), o padrão de
“pavimentação em mosaico”, caracterizado por áreas de atenuação em vidro fosco
superpostas a espessamento de septos interlobulares e intralobulares. Este aspecto
tomográfico resulta da expansão do infiltrado celular ao longo do interstício
interlobular, peribroncovascular e subpleural, associado a áreas de edema e
hemorragia alveolares. Não encontramos trabalhos na literatura que mencionem
este achado em pacientes com sarcoma de Kaposi pulmonar(22,36).
Nenhum
dos
pacientes
do
nosso
trabalho
apresentou
linfonodomegalias, porém alguns autores relatam a presença deste achado em
percentuais variando de 15 a 50%(16,26,37). Segundo a literatura, a maior parte das
linfonodomegalias possui diâmetro no menor eixo inferior a 1cm, representando,
provavelmente, apenas um processo reacional, e não infiltração neoplásica(16,35).
50
6- CONCLUSÕES
Baseados na análise das tomografias computadorizadas de alta resolução
de 9 pacientes com SIDA e sarcoma de Kaposi pulmonar, podemos concluir que:
1) As alterações mais freqüentes foram o espessamento do interstício
axial ao longo das bainhas peribroncovasculares (100%), os nódulos com margens
irregulares (55,5%) e o espessamento dos septos interlobulares (55,5%). A
associação desses achados em pacientes com SIDA é muito sugestiva do
diagnóstico de sarcoma de Kaposi.
2) Derrame pleural foi observado em 5 pacientes (55,5%). A
presença
de
derrame
pleural
foi
sempre
acompanhada
de
doença
parenquimatosa, sendo geralmente de pequeno volume e bilateral.
3) A presença de nodulação ao longo das cissuras, observadas em
quatro (44,4%) pacientes, foi descrita somente por dois autores.
4) Outros achados menos freqüentes foram as consolidações
(22,2%), a presença de áreas de atenuação em vidro fosco (11,1%), nódulos
51
centrolobulares e do espaço aéreo (11,1%) e estreitamento irregular da luz de
brônquios (11,1%).
5) O padrão de “pavimentação em mosaico” foi encontrado em um
paciente do nosso estudo (11,1%). Não existem relatos na literatura da descrição
deste aspecto em pacientes com sarcoma de Kaposi pulmonar.
52
7- REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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