Condicionantes do crescimento econômico Quando dizemos que o Brasil deve seguir um caminho de crescimento sustentado, o que estamos querendo dizer? Um dos temas mais interessantes e estudados em economia é o crescimento econômico e suas formulações, que marcam, sem dúvida, o início da economia, já que desde Adam Smith e Ricardo essa pergunta ainda persiste... O que faz um país ser mais rico que outro? Durante todos esses anos, vários avanços foram feitos neste sentido, em termos teóricos e empíricos. O objetivo desse artigo é esboçar as principais conclusões empíricas sobre os determinantes do crescimento econômico, tentando contrastar com a realidade brasileira. As conclusões foram retiradas, em sua grande maioria, do trabalho de Robert Barro (1996), no qual o autor, a partir de um banco de dados, contemplando cem países, testa a validade de variáveis relevantes, extraídas das conclusões teóricas. A grande maioria dos trabalhos sobre crescimento econômico tem como pilar básico o modelo neoclássico padrão, desenvolvido por Ramsey, Solow e outros. Os desdobramentos posteriores, como o crescimento endógeno, tentam sanar algumas das dificuldades inerentes a essa primeira linhagem, mas como todo modelo, não passam de uma grande simplificação da realidade. No entanto, em termos empíricos, esses modelos são bastante utilizados para testar as hipóteses de convergência e os determinantes do crescimento. Fica fora do escopo do artigo esmiuçar as teorias de crescimento, mas vale a pena gastar algumas linhas sobre a questão da convergência, para se entender os resultados dos diversos trabalhos. Com base nesses modelos, a taxa de crescimento do produto per capita da economia pode ser escrita da forma Dy = f (y,y*), onde y é o nível corrente de produto per capita e y* é o nível de produto per capita de longo prazo ou produto de equilíbrio. O produto de longo prazo de uma economia, a grosso modo, depende de um conjunto de escolhas e do ambiente vivido pela economia. As escolhas do setor privado, por exemplo, são referentes a sua taxa de poupança, à oferta de trabalho, às taxas de fertilidade, cada uma dependendo das preferências e custos. As escolhas do governo envolvem os seus gastos nas diversas categorias, os impostos cobrados, as distorções de mercado – criadas ou combatidas –, a manutenção da lei e dos direitos de propriedades, o grau de liberdade política e os termos de troca no comércio internacional. Dado um nível inicial de produto per capita, y, um incremento para y* aumenta a taxa de crescimento através do intervalo de transição. Por exemplo, se o governo melhora o ambiente para os negócios, digamos que com uma redução dos impostos ou aperfeiçoamento dos direitos de propriedades, a taxa de crescimento da economia é amplificada na trajetória para y* – objetivo –. Como y aumenta, os rendimentos, devido aos novos incrementos, começam a diminuir – hipótese dos rendimentos decrescentes de escala –, até que a taxa de crescimento Dy atinge o crescimento de longo prazo, que é definido como a taxa de progresso tecnológico. Desde que esses caminhos de transição são longos, os efeitos do aumento do crescimento das mudanças feitas pelo setor privado ou governo persistem por um longo tempo. Com essa pequena explanação, podemos definir a convergência absoluta e a condicional ou relativa. A definição de convergência absoluta pode ser explicada da seguinte forma: se dois países têm as mesmas características, mas o nível de produto per capita corrente (y) é diferente, o país mais pobre tenderá a ter um crescimento maior que o país mais rico para que, no final do percurso, o pobre alcance o rico. O problema é que os países não são iguais, cada um tem um 1 conjunto de dotações naturais e escolhas diferentes e, por isso, a convergência absoluta dificilmente será verificada. No entanto, a convergência condicional tem um apelo maior, já que nela cada país, a partir de suas peculiaridades, terá y* diferentes. Quanto menor a renda per capita (y), maior será o crescimento, embora os países pobres possam não crescer tão rapidamente – acima da média dos demais – se eles também tiverem um baixo y* de equilíbrio. Quando falamos então de crescimento sustentado, estamos falando em condições de atingir um produto de equilíbrio maior e em maneiras mais eficientes de chegar neste objetivo. Nesse sentido, devemos especificar quais são as variáveis relevantes para criarmos políticas econômicas nesta direção. O trabalho de Barro – um dos mais respeitados economistas nesta área – aponta que, estabelecido um valor inicial de renda per capita, o crescimento é amplificado devido ... a maior escolaridade de seus habitantes, ou seja, capital humano; a maior expectativa de vida – medida de qualidade de vida; a menor fertilidade; o menor gasto do governo; melhor ambiente institucional e respeito à propriedade privada – qualidade da burocracia, menor corrupção, respeito dos contratos pelo governo, menor risco de expropriação pelo governo e manutenção da lei e ordem; melhoria nos termos de troca no comércio internacional. Além disso, foi identificada uma não-linearidade entre liberdade política e democracia no crescimento. Nos países com baixos níveis de liberdade política, uma expansão desses direitos aumenta as taxas de crescimento, mas países com moderado nível de liberdade política ou experiência democrática, uma expansão pode não ter efeito ou até reduzir as taxas de crescimento. Uma possível explicação para a possibilidade de redução no crescimento reside no fato de que em um país com certo nível alto de democratização e direitos políticos, um aumento desses direitos pode retardar o crescimento, devido a um aumento mais que proporcional nas preocupações com programas sociais e redistribuição de renda. Por último, foi feita a ligação entre inflação e política monetária sobre as taxas de crescimento. Os resultados também são interessantes e seguem a linha de raciocínio de trabalhos sobre este tema – Bruno e Easterly (1995), Khan e Senhadji (2000) e Fisher (2002) –. Também neste caso é encontrada certa não-linearidade, ou seja, inflações altas têm efeito negativo sobre o crescimento, devido a todos os problemas de distorção de preços e decisões sobre investimentos futuros. No entanto, existe certo intervalo de inflação em que reduções adicionais não trazem nenhum efeito sobre o crescimento, ou seja, não podemos ordenar preferências do tipo: uma inflação de 3% é melhor que 4%. Esse é um terreno fértil e pouco explorado e as conclusões ainda são dúbias sobre em qual patamar a inflação pode ser considerada alta e qual o intervalo de não sensibilidade entre inflação e crescimento. Tirando a média destes trabalhos, podemos dizer que inflações abaixo de 6% não têm efeitos sobre o crescimento, muito embora fique claro que baixa inflação é condição necessária para não se retardar o crescimento. Olhando esta gama de condicionantes para o crescimento econômico, vemos que o Brasil tem se desenvolvido em alguns aspectos, mas ainda existem certas lacunas que devem ser preenchidas. Nosso capital humano ainda é relativamente baixo na comparação com outros países emergentes, a inflação mantém-se controlada, mas temos problemas estruturais graves com relação à participação do Estado na economia, e à melhoria de seus gastos. Exportações dinâmicas, embora aquém das reais potencialidades. A qualidade dos arranjos institucionais, para o clima de negócios, também deixa a desejar, o índice geral feito pelo ICRG – International Country Risk Guide –, que é uma média de diversas variáveis políticas e institucionais, indica que o Brasil, em 2003, de 0 a 100, tinha nota 65.5, do maior 2 risco para o menor. Enquanto isso, a América Latina, como um todo, tinha nota 65, os de renda média – classificação do Banco Mundial – nota 70.4, a União Européia, 81.8 e os EUA, 75.8. No entanto, o crescimento econômico não pode ser atribuído totalmente à falta de um leque de condicionantes. Como bem mostrou Hirschman, na década de 50, em suas pesquisas sobre o desenvolvimento e vários outros economistas modernos como Dani Rodrik, o caminho para uma trajetória consistente de crescimento é feito endógenamente. Os sucessos de um país, no alcance deste objetivo, não é derivado pelas vantagens em todos ou alguns desses condicionantes, mas em sua capacidade de explorá-los, ou seja, deve-se ter uma linha de atuação clara, dos empresários e do governo, de qual é o real objetivo a ser atingido. Não adianta ter uma população com um capital humano gigantesco, se esse não for alocado de maneira correta, 90% do sucesso de um país é puramente atribuível as suas próprias escolhas. Deve-se ter em mente que crescimento é variável necessária para o desenvolvimento econômico, mas não suficiente. Em toda a análise precedente estamos falando apenas de crescimento e não necessariamente desenvolvimento. Com a moderna teoria econômica, houve essa quebra de conceitos e existe muita divergência sobre o assunto. No entanto, parece razoável acreditar que o desenvolvimento econômico e a melhor distribuição de renda possam ser conseguidos em um ambiente de crescimento do que crer o contrário e, por isso, tentar direcionar as políticas econômicas para alcançar tais condicionantes é fundamental para o caminho do crescimento sustentável. Fonte TAOUIL, Gustavo. Condicionantes do crescimento econômico. O economista, São Paulo, p. 8-9, ago. 2005. 3