CEFAC Centro de Especialização em Fonoaudiologia Clínica Motricidade Oral A INTERDISCIPLINARIDADE ENTRE AS ORTODONTIA E ORTOPEDIA FUNCIONAL DOS MAXILARES E A FONOAUDIOLOGIA: EXISTE ESTA RELAÇÃO NOS DIAS DE HOJE? Monografia de conclusão do Curso de Especialização em Motricidade Oral. Orientadora: Mirian Goldenberg Sibele Parpinelli Medeiros São Paulo 1996 - 1997 Dedico este trabalho à Eliane Barros Ajaj Piccoli, minha madrinha, ortodontista e ortopedista funcional dos maxilares, pela oportunidade de atuação na área de motricidade oral e incentivo dado na busca constante do aperfeiçoamento profissional. AGRADECIMENTOS Aos meus pais, por terem me ensinado o verdadeiro valor do estudo. A Paulo Sérgio Merino, pelo incentivo constante na realização de pesquisas e apoio dado em todos os momentos A Ronaldo Parpinelli Medeiros, pelo auxílio na resolução de dúvidas relacionadas à informática. A Marcelo Parpinelli Medeiros, pelas opiniões construtivas dadas na elaboração do texto. Às amigas Fga. Cristine F. Mascarenhas e Fga. Kátia Alonso Rodrigues, que compartilharam comigo os momentos vividos durante os anos de especialização. Ao Colégio Cor Jesu, pela compreensão e apoio dado durante a realização da pós-graduação. À orientadora Mirian Goldenberg, pelo incentivo dado à arte de pesquisar. Aos profissionais da odontologia que participaram desta pesquisa, permitindo um crescimento profissional de ambas as partes. Aos meus pacientes portadores com alterações de motricidade oral, que despertaram em mim a busca do conhecimento. SUMÁRIO Introdução .................................................................. 1 Revisão Bibliográfica..................................................3 Material e Método .................................................... 16 Análise e Discussão dos Resultados .................... 17 Conclusão ................................................................ 22 Referências Bibliográficas ..................................... 23 Anexo ....................................................................... 26 RESUMO Há casos de desordens oclusais nas quais apenas os tratamentos ortodônticos ou ortopédicos funcionais não são suficientes, pois uma alteração miofuncional associada necessita da participação do fonoaudiólogo no processo terapêutico. Dessa forma, o trabalho conjunto entre os profissionais da Odontologia e da Fonoaudiologia deve ser valorizado e mantido durante o tratamento de desordem oclusal, para que a eficácia do mesmo seja alcançada e o número de recidivas, diminuído. O presente trabalho teve como objetivo verificar se existe, nos dias de hoje, relação interdisciplinar entre a Ortodontia e Ortopedia Funcional dos Maxilares e a Fonoaudiologia. Para a execução da pesquisa foi elaborado um questionário, respondido por 30 profissionais da Odontologia, atuantes na cidade de São Paulo, com uma ou com ambas as especializações citadas. Através dos dados apurados, verificou-se que há interdisciplinaridade entre as áreas, porém necessita ser aprimorada, pois há falta de precisão a respeito de quais casos necessitam de intervenção fonoaudiológica e o momento adequado para que a mesma ocorra. Diante disso, constatou-se a importância da troca de informações entre os profissionais, o que favorece o crescimento profissional de todos. INTRODUÇÃO Durante a graduação é citada com ênfase a importância de um trabalho em conjunto entre os profissionais responsáveis por um caso clínico. Vários exemplos são dados e discutidos com os alunos. Alguns cursos proporcionam essa vivência durante o período de formação, visando, com isso, além de aprimorar o conhecimento do aluno, ressaltar a importância desse tipo de procedimento. Após a formatura, a realidade muitas vezes torna-se diferente. Antes o aluno participava de uma equipe já formada, constituída pelos professores da faculdade e outros profissionais que atuam no mesmo local ou em conjunto com os professores. Formados, os antigos alunos devem constituir a sua própria equipe de trabalho. Nesse momento, surge a angústia, ao se deparar com a realidade. Muitas vezes o contato entre os profissionais é superficial, em outras, o mesmo não é possível, enfim, nem sempre o ideal tão discutido anteriormente é alcançado. Um exemplo da necessidade de atendimento interdisciplinar é o do paciente com desordem oclusal. Nesse caso, o ideal é um atendimento conjunto entre o ortodontista ou o ortopedista funcional dos maxilares e o fonoaudiólogo, cada um responsável pela sua área e buscando um atendimento mais qualificado para o paciente. A minha experiência profissional é com pacientes portadores de alterações oclusais. Tive a oportunidade de atuar com um grupo de odontólogos com especialização em ortodontia por um ano. Nesse local, os pacientes eram avaliados tanto pelo ortodontista como pelo fonoaudiólogo e era elaborado um plano de tratamento de cada área. Ambos os profissionais atuavam no mesmo dia. As discussões e trocas de informações freqüentes entre cada área contribuíram para o crescimento de cada profissional e propiciaram um melhor atendimento ao paciente. Há três anos atuo num consultório odontológico, junto com ortodontista e ortopedista funcional dos maxilares, onde realizo avaliação dos pacientes em atendimento e, quando necessário, terapia. A interação entre os profissionais também é enriquecedora. A vivência em consultório particular, por outro lado, tem demonstrado uma realidade diferente. Os pacientes são encaminhados pelos profissionais da odontologia. É feito um contato inicial para discussão do caso e, muitas vezes, o planejamento do tratamento não é realizado em conjunto, como nas duas situações citadas acima ou existem poucos contatos entre os profissionais, não propiciando uma troca de conhecimento entre as áreas. Procuro compreender por que isso acontece e algumas hipóteses são constantemente levantadas, entre elas a falta de conhecimento dos odontólogos sobre o trabalho miofuncional com o paciente portador de desordem oclusal. Busco, com este trabalho, compreender como se encontra o relacionamento interdisciplinar entre os ortodontistas e ortopedistas funcionais dos maxilares e os fonoaudiólogos no atendimento ao paciente com alteração muscular e de oclusão dentária. O interesse na realização desse trabalho surgiu do atendimento a pacientes encaminhados por profissionais da odontologia. Os mesmos chegam ao consultório em etapas diferentes do tratamento ortodôntico ou ortopédico e, com isso, comecei a questionar qual o critério adotado por esses profissionais para a realização do encaminhamento ao fonoaudiólogo e a importância dada por eles ao trabalho realizado por este profissional. REVISÃO BIBLIOGRÁFICA O paciente portador de alteração na musculatura do sistema estomatognático geralmente necessita de um atendimento interdisciplinar, pois não existe um profissional específico com conhecimentos de odontologia, otorrinolaringologia, fisioterapia, fonoaudiologia, neurologia, entre outras áreas. Diante disso, vê-se a necessidade de um atendimento conjunto entre essas especialidades. Entre as áreas citadas acima, a fonoaudiologia é a mais recente. Nessa profissão existe a especialização em motricidade oral, que qualifica o profissional no atendimento a pacientes portadores de desordens no sistema estomatognático. O trabalho mioterápico realizado pelo fonoaudiólogo recebeu contribuições valiosas da odontologia. Segundo Barrett & Hanson (1978), o profissional da odontologia deteve durante muito tempo o conhecimento sobre anatomia e fisiologia da cavidade oral. Diante disto, teve uma importância fundamental no início do trabalho mioterápico realizado pelo fonoaudiólogo. Garliner (1971) também comenta que o trabalho mioterápico realizado pelo fonoaudiólogo surgiu a partir do conhecimento de médicos e odontólogos. A odontologia, assim como outras áreas, também é dividida em especialidades. Entre elas, podemos citar duas, que terão importância para este trabalho: a ortodontia e a ortopedia funcional dos maxilares. O ortodontista, segundo Moyers (1988), é o profissional que atua no crescimento craniofacial, no desenvolvimento da oclusão dentária e no tratamento das alterações dentofaciais. O ortopedista funcional dos maxilares atua no crescimento e na morfologia do esqueleto facial ( van der Linden, 1990). O trabalho ideal com o paciente portador de desordem oclusal e de alteração no sistema estomatognático é o tratamento interdisciplinar entre o fonoaudiólogo e o ortodontista ou ortopedista funcional dos maxilares. Garliner (1971) menciona a importância da comunicação entre os membros de uma equipe de trabalho, em que os profissionais devem ter respeito uns pelos outros e agir com profissionalismo, e reforça a importância da troca de conhecimentos entre os profissionais para o crescimento do trabalho realizado pelo fonoaudiólogo nas alterações de oclusão dentária. Segovia (1988) afirma que “uma equipe de trabalho deve atuar com coerência, comunicação, compreensão e coordenação”, definindo os 4 C do trabalho em equipe . O conhecimento específico, segundo a autora, deve ser compartilhado entre os colegas e as limitações de cada profissional devem ser respeitadas. Mussolino & Rodrigues (1994) realizam uma reflexão sobre o atendimento interdisciplinar entre profissionais de áreas afins. As autoras ressaltam que o trabalho em conjunto proporciona mais benefícios ao paciente, por receber um atendimento mais qualificado, e aos membros da equipe, pois propicia o crescimento profissional de cada integrante. Outra contribuição de um tratamento em equipe é a possibilidade de realização de um diagnóstico correto, porque a troca de informações entre os profissionais permite uma visão diferente do caso clínico Simões (1988) demonstra preocupação com o diagnóstico correto, enfatizando que o mesmo impede o encaminhamento, sem necessidade, a um profissional de outra especialidade. Diante dessa colocação da autora, podemos refletir ainda mais sobre a importância de um atendimento interdisciplinar. Devemos lembrar que o ser humano não é dividido em partes; esta divisão é feita apenas para fins de estudo. O indivíduo deve ser visto como um todo e , quando isto acontece, o diagnóstico torna-se mais criterioso, pois outros aspectos antes não percebidos, que cabem a outras especialidades, podem ser descobertos e influenciar no caso. Outro item que deve ser lembrado é a familiarização com as terminologias utilizadas pelos profissionais de outras áreas, como afirmam Barrett & Hanson (1978). Isso facilita a comunicação entre os membros da equipe. A importância do conhecimento de outras áreas afins a do profissional, possibilitando uma melhor compreensão do caso clínico, fornecendo bases para a discussão com outros profissionais e permitindo a elaboração de um planejamento de trabalho comum, também é enfatizada por Bianchini, em 1995. Marchesan (1993) questiona a atuação do fonoaudiólogo , ortopedista funcional dos maxilares e ortodontista com pacientes portadores de desordens oclusais no decorrer dos últimos anos. A autora refere que no início não existia trabalho em conjunto entre esses profissionais, depois o mesmo tornou-se uma rotina e atualmente os profissionais refletem mais sobre o momento adequado de iniciar um trabalho concomitante. Durante muito tempo o trabalho com a musculatura do sistema estomatognático não foi reconhecido pelos profissionais da odontologia. Garliner (1971) atribuiu o reconhecimento desse trabalho às recidivas ocorridas nos tratamentos de oclusão dentária. O autor enfatiza a influência das alterações musculares nas relações oclusais, comprovada através da clínica. Outros autores, como Lino (1980), Simões (1988), Marchesan (1994), Jabur (1994) e Bianchini (1995) também ressaltam a importância do equilíbrio muscular nas oclusões dentárias. Simões (1988) expõe que alguns casos de alteração de oclusão necessitam de tratamento fonoaudiológico. Jabur (1994) comenta que não devemos determinar se é a forma que interfere na função ou vice-versa, uma vez que ambas estão interligadas. Marchesan (1994), Krakauer (1995) e Bianchini (1995) comentam as principais alterações de função encontradas em cada alteração de forma, sempre relacionando-as. Por um lado, os autores concordam sobre a importância do tratamento fonoaudiológico nas alterações dentofacias, por outro, existem muitas controvérsias a respeito do momento adequado de início desse trabalho e quais casos devem ser tratados pelo fonoaudiólogo. Serão citadas agora algumas das maloclusões encontradas em consultórios fonoaudiológicos e os tratamentos realizados. Existem muitas controvérsias entre os autores em relação a qual paciente necessita de atendimento fonoaudiológico. Lino (1980) e Simões (1988) afirmam que todos os pacientes devem ser submetidos a tratamento fonoaudiológico, uma vez que, após a correção da forma, a musculatura deve estabelecer novos reflexos condicionados e se adaptar a essa nova forma. Jabur (1994) , Marchesan (1993), Krakauer (1995) e Bianchini (1995) são mais criteriosos quanto ao encaminhamento para terapia miofuncional. Para esses autores, nem todos os pacientes devem receber intervenção mioterápica. Barrett & Hanson (1978) concordam com os autores acima e citam alguns casos em que não deve ser iniciado tratamento miofuncional: discreta projeção de língua sem alteração notável de oclusão ou fala; necessidade de intervenção médica, como casos de alergias, hipertrofia de amígdalas e adenóides, desvio de septo e frenectomia lingual; alguns casos de alteração ortodôntica, como arco palatino estreito dificultando o repouso da língua, overject extremo e falta de oclusão dos molares; passagem da deglutição infantil para a adulta. Antes de expor os dados da literatura, será feita uma síntese das classificações das maloclusões e das etiologias das mesmas, visto que isso dará bases para as discussões levantadas posteriormente. Inicialmente devemos definir a oclusão normal, que é a relação harmônica dos dentes entre si, com os maxilares e com a musculatura orofacial, bem como o movimento adequado da mandíbula durante a fonação (Moyers, 1988). Qualquer desordem nessa relação acarreta alteração na oclusão. A classificação e terminologia mais utilizadas no que diz respeito às maloclusões é a de Angle (1907), que se baseia nas relações ântero-posterior entre a maxila e a mandíbula. Atualmente essa classificação importa-se também com a musculatura e crescimento faciais, e não apenas com a relação dos primeiros molares entre si, como antigamente ( Moyers, 1988). Classe I ou neutroclusão A relação ântero-posterior entre maxila e mandíbula encontra-se normal. A cúspide mésio-vestibular do primeiro molar permanente superior oclui no sulco mésio-vestibular do primeiro molar permanente inferior. Há uma harmonia entre as bases ósseas, podendo ocorrer apinhamentos dentários na região anterior devido à desarmonia entre volume ósseo e dentário. Classe II ou distoclusão A relação ântero-posterior entre maxila e mandíbula encontra-se alterada. A cúspide mésio-vestibular do primeiro molar permanente superior oclui anteriormente ao sulco mésio-vestibular do primeiro molar permanente inferior. Há uma desarmonia entre as bases ósseas. a - divisão 1ª : os incisivos inferiores estão inclinados para vestibular (vestibuloversão) b - divisão 2ª : os incisivos centrais superiores encontram-se em posição verticalizada e os laterais, inclinados para vestibular (vestibuloversão) c - subdivisão: quando a alteração encontra-se em apenas um lado da arcada dentária. Classe III ou mesioclusão A relação ântero-posterior entre maxila e mandíbula encontra-se alterada. A cúspide mésio-vestibular do primeiro molar permanente superior oclui posteriormente ao sulco mésio-vestibular do primeiro molar permanente inferior. Há uma desarmonia entre as bases ósseas. Lischer (1912) classifica as maloclusões considerando as posições dos dentes individualmente e entre si: a - sobremordida profunda: presença de excesso de transpasse vertical dos incisivos superiores; b - mordida aberta: ausência de oclusão de alguns dentes, enquanto outros encontram-se em oclusão. Pode ser anterior ou posterior e esqueletal ou dentária. C - mordida cruzada: a relação vestíbulo-lingual dos dentes encontra-se alterada. Pode ser lingual ou vestibular. É necessário que o profissional que trabalha com as desordens oclusais tenha conhecimento sobre o crescimento e desenvolvimento craniofacial. Para que esse processo ocorra de forma harmônica é necessário vedamento labial, deglutição sem alteração, músculos faciais, mastigatórios, supra e infra hioideos, do pescoço e da nuca funcionando em equilíbrio e as articulações temporomandibulares devem estar em posição e altura adequadas , com funcionamento equilibrado. A alteração de uma ou mais das funções citadas podem provocar desordens neste crescimento e desenvolvimento (Aragão, 1992). ARTICULÇÃO DOS SONS Nos consultórios fonoaudiológicos são freqüentes emissão dos sons da fala decorrentes de maloclusões. os casos de alteração na Moyers (1980) comenta que existe uma forte relação entre alteração de oclusão e distúrbio de fala e reforça que a função alterada da língua não indica necessariamente a existência de uma alteração na fala. Uma das alterações observadas é a projeção de língua durante a emissão dos fonemas / t, d, n, l, s, z /. Alguns autores consideram essa alteração da fala conseqüência de uma alteração ortodôntica e outros, causa. A projeção de língua pode ser conseqüência de uma falta de vedamento labial anterior. O contato entre os lábios permite o equilíbrio entre as pressões internas do espaço nasofaringeano e as externas do meio ambiente. A falta do vedamento pode acarretar em uma projeção de língua como forma de recompensa (Aragão, 1992). Os fonemas /t, d, n, l, s, z/ são emitidos com a ponta da língua no mesmo local da deglutição normal. Portanto, é comum encontrar essas alterações articulatórias em indivíduos com padrão de deglutição alterado (Machado & Braga,1992). van der Linden (1990) considera a projeção de língua no caso de mordida aberta anterior conseqüência da mesma e não causa. Machado & Braga (1992) consideram a projeção de língua em casos de mordida aberta anterior causa de agravamento da mesma. Lino (1990) comenta que a função alterada pode levar a uma alteração na emissão dos sons. Nesse caso, o paciente necessita de um tratamento especializado e o autor cita o fonoaudiólogo como o profissional especializado para o atendimento. O ortodontista deve ser apto para diagnosticar a alteração e realizar o encaminhamento, porém o autor recomenda o encaminhamento somente após o ortodontista ter dado condições morfológicas para que o fonoaudiólogo possa realizar o seu trabalho e cita como exemplo os casos de mordida cruzada, mordida aberta anterior e sobremordida. POSTURA São comuns também na prática fonoaudiológica casos de alteração postural, geralmente encontrados em pacientes respiradores bucais. Entre as modificações posturais encontradas no respirador bucal está a inclinação de cabeça para frente e posição mais baixa de mandíbula e língua, sendo que a última também encontra-se anteriorizada (Proffit, 1978). Aragão (1990) concorda com o autor anterior e justifica a postura alterada de cabeça como maneira de facilitar a passagem de ar (a cabeça num ângulo de 90º permite uma passagem de ar da boca para o sistema respiratório de maneira mais fácil). Marchesan & Junqueira (1997) possuem a mesma opinião dos autores e acrescentam ainda que a modificação postural da mandíbula e da língua também são compensações para permitir uma melhor respiração. Outras alterações posturais que podem ser observadas no respirador bucal são: pescoço e nuca anteriorizados, modificando a coluna cervical; ombros inclinados para frente; tórax deprimido; flacidez de músculos abdominais; músculo diafragma com sua ação alterada; pernas mais abertas e pés afastados para proporcionar equilíbrio ao corpo, que é ajudado pelos braços em posição mais posteriorizada (Aragão, 1990). CLASSE II Krakauer (1995) apresenta algumas características que podem ser encontradas em pacientes classe II. Nos casos de divisão 1a, é comum observar lábio superior flácido e inferior tocando os incisivos superiores, rigidez do m. mentalis, deglutição com interposição de lábio inferior nos incisivos superiores e movimentos anteriores de mandíbula durante a deglutição e fala como forma de aumentar o espaço intra-oral, e nos pacientes classe II divisão 2 a , a autora relata tônus labial normal ou lábio superior rígido. Nos dois casos a autora cita a terapia fonoaudiológica para melhorar o vedamento labial, permitindo, com isto, um posicionamento adequado da língua durante a deglutição e a fala. Simões (1988) relata que em sua experiência clínica com pacientes classe II, após o tratamento ortopédico funciona não há necessidade de intervenção fonoaudiológica. Jabur (1994) apresenta uma idéia diferente da autora anterior, pois acredita que é necessário corrigir primeiro a forma, mas depois o tratamento da função faz-se necessário. Marchesan (1994) expõe que o tratamento fonoaudiológico nesses casos é limitado devido à forma alterada. CLASSE III Quanto ao paciente classe III, Krakauer (1995) comenta algumas das características que são freqüentemente encontradas: língua flácida, tocando os rebordos linguais dos dentes inferiores, mastigação com padrão vertical, deglutição com participação da musculatura perioral e com pressão atípica de dorso de língua, anteriorização de língua e presença de movimentos associados de cabeça. Na opinião da autora, a terapia fonoaudiológica deve ser realizada em conjunto com o tratamento dentário devido aos limites impostos pela oclusão. Jabur (1994) e Marchesan (1994) concordam com a autora anterior ao afirmarem que o tratamento fonoaudiológico com o paciente classe III deve ser realizado em conjunto com o ortodôntico. DEGLUTIÇÃO ATÍPICA Um dos motivos mais freqüentes de encaminhamento de pacientes ao fonoaudiólogo é a presença de deglutição atípica. Muitos autores procuram definir o que é a deglutição atípica. Antes, porém, deve ser feita uma diferenciação entre a deglutição infantil e a madura, pois a mesma dará bases para um diagnóstico correto de deglutição atípica. Moyers (1988) considera deglutição infantil aquela observada antes da erupção da dentição decídua. Nessa época é comum a língua permanecer entre os rebordos gengivais, e a estabilização da mandíbula é obtida através da contração dos músculos faciais. O autor alerta que a persistência desse padrão após o início da erupção dos dentes permanentes acarretará em alterações na musculatura orofacial. Na deglutição madura não ocorre contração da musculatura de lábios e bochechas, apenas da elevadora da mandíbula, responsável pela oclusão dentária. van der Linden (1990) diferencia a deglutição infantil da adulta pela presença ou não de oclusão dentária e postura da língua. Na primeira há ausência de oclusão porque a língua mantém-se entre os arcos dentários, e na segunda ocorre oclusão dentária e a língua posiciona-se atrás dos incisivos superiores. Machado & Braga (1992) citam as seguintes características da deglutição infantil: língua apoiada nos rebordos gengivais e maxilares afastados, estabilização da mandíbula através da contração dos músculos do VII par craniano e controle da deglutição através da troca sensorial entre língua e lábios. Os autores determinam o início da deglutição madura com a erupção dos primeiros molares decíduos, por volta de 18 meses. Nesse período, os dentes já entram em oclusão durante a deglutição, a estabilização da mandíbula é realizada pela ação dos músculos inervados pelo V par craniano, a ponta da língua posiciona-se atrás dos incisivos superiores e há mínima contração dos lábios durante a deglutição. Diante dessas descrições, devemos estar sempre atentos se estamos diante de um caso de deglutição infantil, madura ou de uma deglutição infantil persistente (Moyers, 1988). Segovia (1977) considera deglutição atípica projeção anterior ou lateral de língua, ausência de oclusão dentária e interposição de língua durante a deglutição. Lino (1980) afirmou que o ortodontista deve diagnosticar uma alteração na deglutição, mas cabe ao profissional especializado nessta área tratar da desordem. O autor enfatiza a importância da atuação desse profissional devido aos casos de alteração dentofaciais advindos de um padrão alterado de deglutição e também devido à dificuldade de remoção dos reflexos condicionados da deglutição atípica. MORDIDA ABERTA A mordida aberta anterior é outro tipo de desordem oclusal freqüente em consultório fonoaudiológico. A mesma pode ser de origem esquelética ou dentária e o diagnóstico diferencial é realizado através do RX ou de análise cefalométrica. Krakauer (1995) cita algumas das características que podem ser encontradas em pacientes com esse tipo de mordida: postura inadequada de língua durante a deglutição e repouso, podendo ocorrer anteriorização durante estas funções; lábios e m. mentalis com contração excessiva e ponta de língua geralmente mais flácida. Nesses casos, a autora recomenda terapia fonoaudiológica para melhorar a resistência muscular e a postura e enfatiza a importância do trabalho em conjunto com o ortodontista, pois a mudança na função interfere na forma e vice-versa. Em relação à mordida aberta esquelética, Jabur (1994) acredita que a forma deve ser corrigida primeiro para depois adequar a função. Nos casos de mordidas abertas dentárias, o tratamento da função deve ser concomitante com o da forma para evitar recidiva. Moyers (1988) e Marchesan (1994) alertam que, em casos de mordidas abertas devido a maus hábitos, a retirada dos mesmos contribuem para o fechamento da mordida. Garliner (1971) comenta a relação entre mordida aberta anterior - deglutição atípica - sigmatismo anterior e mordida aberta lateral - deglutição atípica - sigmatismo lateral. MORDIDA CRUZADA Em consultório fonoaudiológico também são encontrados casos de mordida cruzada posterior. Krakauer (1995) lembra que o paciente com mordida cruzada posterior costuma mastigar preferencialmente deste lado, provocando uma assimetria facial. A musculatura do lado mastigatório apresenta-se geralmente mais rígida e encurtada e, do outro lado, mais flácida e alongada. A autora indica terapia fonoaudiológica nesses casos para que seja adequado o padrão mastigatório com a finalidade de equilibrar a musculatura. Salienta que o trabalho deve ser realizado em conjunto com o tratamento dentário ou após o descruze da mordida. Lino (1990) alerta que a mordida cruzada unilateral encontra-se freqüentemente associada à postura inadequada de apoio de mão sempre de um mesmo lado da cabeça, e a bilateral, à respiração bucal. A retirada de tais hábitos é importante para o tratamento ortodôntico e/ou ortopédico funcional. Um estudo realizado por Bresolin e col. (1983) também associou a respiração bucal a casos de mordida cruzada. Através da observação feita em 30 respiradores bucais e 15 respiradores nasais, de ambos os sexos, com idades entre 6 a 12 anos, constatou-se no primeiro grupo presença de 4 casos de mordida cruzada unilateral e 3 de bilateral. Não foi encontrado nenhum caso de mordida cruzada posterior em respiradores nasais. Os autores alertam sobre a importância de um tratamento precoce para a respiração bucal, evitando, com isto, o surgimento de alterações dentofaciais. Marchesan (1995) e Krakauer (1995) enfatizam o trabalho conjunto entre fonoaudiólogo e ortodontista no tratamento desse tipo de desordem oclusal, reforçando sempre a importância da correção da forma para a adequação da função. Jabur (1994) e Bianchini (1995) também valorizam a correção da mordida cruzada para o estabelecimento adequado da função. HÁBITOS VICIOSOS Autores como Seraphim (1973), Moyers (1988) e Black e col. (1990) reforçam a influência dos hábitos viciosos nas desordens oclusais. Para que um hábito seja considerado nocivo, devemos levar em consideração principalmente a tríade: freqüência, duração e intensidade (Black e col., 1990). Lino (1990) concorda com a autora acima e lembra a predisposição individual, faixa etária, condições de saúde e nutrição do indivíduo como variáveis que também interferem no estabelecimento de uma má oclusão quando há presença de mau hábito. Moresca & Feres (1992) acrescentam, ainda, causas e circunstâncias sob as quais o hábito foi desenvolvido e o estado emocional do indivíduo. Vários hábitos orais são considerados nocivos ao desenvolvimento da oclusão dentária, entre eles a sucção do polegar, relatada com mais freqüência pelos autores. Entre as desordens oclusais mais comuns decorrentes da sucção do polegar, Moyers (1988) cita a mordida aberta anterior, inclinação dos incisivos superiores para vestibular, retração postural da mandíbula e inclinação dos incisivos inferiores para lingual, estreitamento do arco maxilar, soalho nasal mais estreito e palato mais profundo, rigidez de lábio inferior e flacidez de lábio superior. Como foi mencionado anteriormente, a freqüência, duração e intensidade da sucção interferem no estabelecimento da oclusão dentária. Moyers (1988) acrescenta, para esses casos, o padrão de esqueleto facial e o processo alveolar como fatores que devem ser considerados. van der Linden (1990) ressalta também a importância da época do início da sucção: se o início é precoce, com intensidade, freqüência e duração consideráveis, acarreta conseqüências para os dentes e desenvolvimento do esqueleto facial. O hábito vicioso nocivo de sucção de chupeta também é lembrado por Moyers (1988) e Black e col. (1990). E ntre as características destacadas por Black e col. (1990) estão: flacidez de lábios e bochechas, anteriorização de língua e postura mais rebaixada, incisivos superiores em protrusão, mordida aberta anterior e palato ogival. Outro hábito nocivo citado pelos autores é a postura inadequada da língua durante o repouso. Alguns autores como Barret & Hanson (1978), Proffit (1978), van der Linden (1980) e Lino (1990) têm demonstrado mais importância à postura de língua durante o repouso do que à força exercida durante a deglutição na modificação do posicionamento dentário, uma vez que a pressão constante exercida pela língua sobre os dentes pode modificar a oclusão dentária. Moyers (1988) também considera a mordida de lábio um hábito prejudicial. Barret & Hanson (1978) mencionam que a mordida de lábios ou bochechas podem causar assimetria de arcos dentários e o hábito de lamber os lábios pode provocar uma vestíbulo-versão dos dentes. Outros hábitos viciosos também citados pelos autores são: onicofagia, pressão externa exercida sobre os maxilares (apoio de mão no queixo ou bochecha, forçar a mandíbula para trás com lápis ou qualquer outro objeto), projeção de língua na emissão dos fonemas / t, d, n, l, s, z / , bater ou repousar objetos entre os dentes anteriores, bruxismo, respiração bucal e postura inadequada de lábios e língua durante o repouso (Barret & Hanson, 1978). A remoção de tais hábitos é muito importante para o tratamento da oclusão dentária. Seraphim (1973) comenta que a retirada dos mesmos pode levar os dentes à posição normal ou evitar o agravamento do caso. Essa remoção, segundo van der Linden, 1990, deve ser feita o quanto antes, pois se o mesmo for retirado antes da erupção dos incisivos permanentes, as alterações podem não se estabelecerem . Black e col. (1990) criaram uma proposta de atendimento fonoaudiológico a pacientes com hábitos bucais nocivos que consiste na conscientização do hábito e tentativa de retirá-lo de forma consciente e participação ativa dos familiares. RESPIRAÇÃO BUCAL HIPERTROFIA DE ADENÓIDE E AMÍGDALAS Atenção especial também deve ser dada à respiração. Segundo Simões, 1988, a respiração influencia no desenvolvimento dos maxilares, especialmente do arco dentário superior; na postura da mandíbula e língua; interfere no espaço nasofaríngeo e é responsável pelas trocas gasosas. A respiração inadequada poderá prejudicar o desenvolvimento do sistema estomatognático do indivíduo. Bresolin & col. (1983) realizaram um estudo através de exame clínico e análise cefalométrica comparando o desenvolvimento dentofacial de crianças respiradoras bucais com alergia crônica e respiradoras nasais sem quadro alérgico, de ambos os sexos, com idades entre 6 a 12 anos. Alguns achados foram considerados importantes, entre eles, a maior prevalência de face longa, overject, palato alto, estreitamento do arco dentário superior com maior incidência de mordida cruzada posterior e maxila e mandíbula mais retrognatas em pacientes respiradores bucais. A respiração bucal ocorre com o não vedamento labial. A entrada de ar pela boca favorece a hipertrofia dos tecidos linfóides como forma de defesa, porque o ar que entra pelo nariz não é aquecido, umidificado e filtrado (Aragão, 1992). Algumas das prováveis causas da respiração bucal são: desvio de septo, inflamação crônica e congestão da mucosa nasafaríngea, hipertrofia de amígdalas e/ou adenóides, alguns hábitos de sucção e hipertrofia de cornetos (Moyers, 1988). Aragão (1992) comenta que muitos profissionais denominam de hipertrofia de cornetos a diminuição de entrada de ar nas fossas nasais devido à atresia de palato. Marchesan & Junqueira (1997) consideram a respiração bucal uma das alterações de função que mais interfere no posicionamento da língua. No caso de obstrução das vias aéreas superiores, as autoras indicam primeiro um tratamento otorrinolaringológico e depois, se o hábito da respiração bucal persistir, uma intervenção fonoaudiológica para reeducar a respiração do indivíduo. A causa mais freqüente de obstrução nasal, segundo Mocellin, 1992, é a hipertrofia de adenóide. É muito comum até a época da adolescência, quando acontece uma regressão fisiológica. Na criança, quando essa hipertrofia diminui muito a passagem do ar e, na adolescência, quando não ocorre a involução esperada, é indicada cirurgia. Weimert (1986) cita que, em 1360 indivíduos avaliados com obstrução nasal, 39% apresentaram como etiologia hipertrofia de adenóide. Quanto às amígdalas palatinas, devidido à localização na orofaringe, quando muito edemaciadas, podem comprimir a região da úvula, dificultando a passagem de ar (Mocellin, 1992). A hipertrofia das amígdalas palatinas pode causar além de dificuldade respiratória, também alimentar. Nos dois casos, a conduta é cirúrgica (Mocellin, 1992). Weimert (1986) comenta que, em sua experiência clínica, a hipertrofia das amígdalas palatinas raramente é causa de uma obstrução nasal e, portanto, de uma respiração bucal. O autor refere que menos de 1% de seus pacientes realizam cirurgia e que a causa mais comum da remoção das mesmas são as infecções recorrentes. Outra causa de obstrução nasal citada pelos autores é a rinite alérgica, que também pode provocar respiração bucal. A rinite alérgica é, segundo Mocellin (1992), a segunda causa mais freqüente de obstrução nasal. Weimert (1986) avaliou 1360 indivíduos com obstrução nasal, diagnosticando 34% de casos de rinite alérgica, considerando, após a hipertrofia de adenóides, a segunda causa mais comum de obstrução nasal. O indivíduo com rinite alérgica apresenta algumas destas características: obstrução nasal, rinorréia, conjuntivite irritativa, história familiar de alergia, coceira nos olhos e nariz, entre outras. O tratamento é medicamentoso. ( Weimert, 1986). Nos casos de pacientes com respiração bucal, deve ser feita uma avaliação otorrinolaringológica para verificar se há alguma obstrução das vias aéreas superiores impedindo a passagem de ar e, quando necessário, realizado o tratamento. Após a desobstrução, a função deve ser reeducada para não ocorrer recidiva do tratamento médico (Lino, 1990). O autor cita o fonoaudiólogo e o fisioterapeuta como os profissionais habilitados para essa reeducação. Mocellin, em 1992, salienta que o atendimento aos pacientes com respiração bucal deve ser interdisciplinar (fonoaudiólogo, otorrinolaringologista e ortodontista) para que o diagnóstico e o tratamento sejam corretos. Weimert (1986) acrescenta ainda que é importante que o ortodontista esteja atento à respiração do indivíduo, bem como o otorrinolaringologista à oclusão do paciente. A revisão literária realizada demonstra a importância dada pelos autores ao tratamento fonoaudiológico em casos de desordens oclusais. MATERIAL E MÉTODO O trabalho foi realizado através da aplicação de um questionário (em anexo) a profissionais da odontologia, de ambos os sexos, ortodontistas e/ou ortopedistas funcionais dos maxilares respondido pelos próprios profissionais, sem a interferência da pesquisadora. Foram distribuídos 40 questionários e houve retorno de 30. Participaram do presente trabalho 30 profissionais, sendo 14 ortodontistas e ortopedistas , 10 apenas ortodontistas e 6 somente ortopedistas, com média de 37 anos. Todos trabalham em São Paulo, sendo que 93% atuam em consultório particular, 26% em consultório de terceiros, 10% em posto de saúde e 16% em faculdade ou universidade. Vale ressaltar que alguns atuam em mais de um local. O questionário consta de perguntas relativas a: local de trabalho do profissional, hábito de encaminhamento à avaliação fonoaudiológica, critério na realização do encaminhamento e momento no qual o mesmo é realizado, existência de troca de informações entre os profissionais da odontologia e da fonoaudiologia ao longo do tratamento do paciente e conhecimento sobre o trabalho realizado pelo fonoaudiólogo com pacientes portadores de desordens no sistema estomatognático. ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Após a revisão da literatura, pode-se verificar que a avaliação da musculatura orofacial é importante em casos de alterações ortodônticas, conforme destacam Lino (1980), Simões (1988), Marchesan (1993), Jabur (1994) e Bianchini (1995). A realização dessa avaliação e o tratamento das desordens musculares encontradas são funções do fonoaudiólogo. A importância do atendimento conjunto entre o ortodontista e/ou ortopedista e o fonoaudiólogo é destacada por autores como Garliner (1971), Segovia (1988) e Mussolino & Rodrigues (1994). A troca de conhecimentos, permitindo um atendimento mais qualificado ao paciente e um crescimento profissional dos membros da equipe, justificam o atendimento interdisciplinar. A pesquisa realizada revela que 96% dos profissionais encaminham seus pacientes para avaliação fonoaudiológica e 80% dos profissionais mantêm contato ao longo do tratamento, sendo justificado principalmente pela necessidade de atendimento conjunto (79%). Isso demonstra a importância dada ao atendimento interdisciplinar, o que está de acordo com o recomendado pelos autores citados acima. Desses encaminhamentos, 73% são para fonoaudiólogos conhecidos, sendo justificados pela facilidade de contato e conhecimento do trabalho realizado. Apenas um profissional dos 30 pesquisados não realiza o encaminhamento para o fonoaudiólogo porque acredita que primeiro necessita saber mais sobre a atuação deste profissional com os portadores de desordens oclusais, o que também evidencia o valor dado à troca de conhecimentos. Quanto ao momento considerado ideal pelos ortodontistas e ortopedistas para realização do encaminhamento ao fonoaudiólogo, não há um critério único, sendo que a indicação de avaliação ocorre com mais freqüência durante o tratamento ortodôntico ou ortopédico (51%) ou no início do mesmo (41%). Autores como Barret & Hanson (1978), Jabur (1994), Marchesan (1994), Krakauer (1995) e Bianchini (1995) ressaltam que nem todos os casos necessitam de intervenção mioterápica e recomendam critério na realização do encaminhamento. Dos profissionais pesquisados, 70% já receberam informações sobre o trabalho realizado pelo fonoaudiólogo com pacientes portadores de desordens oclusais, demonstrando que há divulgação do atendimento mioterápico. Após verificar a importância dada à avaliação fonoaudiológica e ao atendimento interdisciplinar, será citado em quais casos esses encaminhamentos são considerados importantes ou não. Deglutição atípica foi o mais mencionado pelos (93%), demonstrando que os profissionais encontram-se atentos a essa desordem funcional e conscientes da importância do tratamento, que é destacada por Lino (1980). Em seguida, obteve-se 76% de encaminhamentos de casos de mordida aberta anterior dentária e a mesma porcentagem para hábitos viciosos. Nos casos de mordida aberta, a necessidade de intervenção mioterápica é citada por Krakauer (1995), que também enfatiza a importância do atendimento interdisciplinar. Quanto aos hábitos viciosos, a retirada dos mesmos para a correção ortodôntica é enfatizada por Seraphim (1973) e van der Linden (1990). O atendimento fonoaudiológico nesses casos é mencionado por Black e col. (1990). A pesquisa demonstra que o ideal acima citado pela literatura não é atingido, pois na prática nem todos os pacientes com essas alterações são enviados ao fonoaudiólogo. Com 73% de indicação para avaliação mioterápica encontram-se os casos de respiração bucal e alterações posturais. Nos casos de respiração bucal, Marchesan (1995) ressalta o trabalho integrado entre o fonoaudiólogo, o otorrinolaringologista e o ortodontista. Autores como Lino (1990) e Marchesan & Junqueira (1997) indicam a avaliação otorrinolaringológica prévia ao encaminhamento fonoaudiológico. Na pesquisa, apenas 2 dos 30 profissionais pesquisados mencionaram esse procedimento, que corresponde a 6% da amostra. Mocellin (1992) recomenda atendimento interdisciplinar (fonoaudiólogo, ortodontista e otorrinolaringologista) para que o diagnóstico e o tratamento sejam corretos. Nos casos de pacientes respiradores bucais é comum também observar alterações de postura, conforme destacam Proffit (1978), Aragão (1990) e Marchesan & Junqueira (1997). Essas modificações posturais, segundo Aragão (1990), facilitam a passagem de ar. A literatura cita as alterações posturais em casos de respiração bucal em que, como foi mencionado, é necessária intervenção fonoaudiológica. Os resultados obtidos estão abaixo do esperado, uma vez que são desordens que necessitam de intervenção fonoaudiológica, conforme a revisão de literatura realizada. Outro caso pesquisado foi o de alteração na articulação dos sons da fala. Constatouse que 70% dos profissionais indicam avaliação fonoaudiológica. Essa alteração pode ser devida a uma desordem muscular, conforme cita Lino em 1992, ou conseqüência de uma alteração ortodôntica, segundo van der Linden (1992). Em ambos os casos é necessária intervenção fonoaudiológica e, conforme o resultado obtido na pesquisa, nem sempre isto ocorre. A recomendação de avaliação fonoaudiológica é pouco freqüente em alguns casos, como os de mordida aberta anterior esquelética (53%), recidivas de tratamentos (53%), classe III (40%), classe II divisão 1ª (33%), mordida cruzada (33%) e classe II divisão 2ª (26%). Em relação à mordida aberta esquelética, Jabur (1994) menciona que a adequação da função deve ser posterior à da forma, mas necessita ser realizada. Na pesquisa, obteve-se apenas 53% de encaminhamentos, o que evidencia a necessidade de maior esclarecimento aos profissionais da odontologia. Quanto às recidivas de tratamento ortodôntico ou ortopédico, 53% dos profissionais acham necessária a avaliação fonoaudiológica. Deve-se ressaltar que alguns casos de recidivas poderiam ser evitados com o tratamento fonoaudiológico no momento adequado, conforme foi destacado na literatura pesquisada. Um exemplo que pode ser dado é o caso de uma mordida aberta anterior dentária com mau posicionamento de língua; após a correção ortodôntica, se a postura lingual não for adequada durante o tratamento da oclusão, a mordida pode abrir novamente devido à pressão exercida pela língua nos dentes durante o repouso ( Jabur, 1994). Outro caso em que deve ser realizado tratamento conjunto entre o ortodontista ou ortopedista e o fonoaudiólogo é o de classe III, segundo Marchesan (1994), Jabur (1994) e Krakauer (1995) . Na pesquisa constatou-se que isso não acontece, pois há 40% de casos de indicação de avaliação fonoaudiológica. A mordida cruzada é citada por alguns autores como conseqüência de hábitos viciosos (Lino, 1990), respiração bucal (Bresolin e col. , 1983) ou padrão mastigatório inadequado (Krakauer, 1995). A necessidade de atendimento fonoterápico nos casos de respiração bucal e hábitos viciosos já foi discutida anteriormente. Marchesan (1994) e Krakauer (1995) citam a alteração da mastigação como uma das causas responsáveis pelo cruzamento da mordida e recomendam um trabalho fonoaudiológico conjunto com o ortodôntico ou posterior ao descruze da mordida. Mesmo sendo aconselhada pelos autores, a orientação de um fonoaudiólogo é requisitada somente em 33% de casos de mordida cruzada. Entre os pacientes classe II divisão 1ª ocorrem 33% de indicação de avaliação fonoaudiológica e classe II divisão 2ª, 26%. As alterações musculares encontradas em pacientes portadores dessas desordens oclusais são citadas por Krakauer (1995). Entre os autores há controvérsias quanto à necessidade de tratamento fonoaudiológico, pois alguns, como Marchesan (1994) e Krakauer (1995), acreditam na melhora com intervenção fonoaudiológica, mas alertam que há limites no tratamento. Por outro lodo, Simões (1988) afirma que na sua prática clínica não houve necessidade de tratamento fonoaudiológico após a correção da forma. Na pesquisa constatou-se que ocorrem encaminhamentos de casos de hipertrofia de adenóide (33%) e de hipertrofia de amígdalas (30%) que, segundo Weimert (1986) e Mocellin (1992), respectivamente, necessitam de intervenção otorrinolaringológica prévia. Nos casos em que há obstrução da via aérea é indicado primeiro tratamento otorrionolaringológico e somente após a desobstrução, tratamento fonoaudiológico para reeducar a função (Lino, 1990). Na pesquisa, apenas 2 dos 30 profissionais pesquisados mencionaram a avaliação otorrinolaringológica prévia, que corresponde a 6%. INDICAÇÃO DE AVALIAÇÃO 100 93 90 76 Porcentagem 80 76 73 73 70 70 63 60 53 53 50 40 40 33 33 33 30 30 23 20 10 0 1 2 3 4 5 6 7 1- Deglutição Atípica 8 9 10 11 12 13 14 9- Recidiva 2- Mordida Aberta Dentária 10- Classe III 3- Hábitos Viciosos 11- Mordida Cruzada 4- Respiração Bucal 12- Hipertrofia de Adenóide 5- Alteração Postural 13- Classe II div.1ª 15 6- Alt. na Articulação dos Sons 14- Hipertrofia de Amígdalas 7- Mordida Aberta Lateral 15- Classe II div. 2ª 8- Mordida Aberta Anterior Esquelética CONCLUSÃO O trabalho realizado permite concluir que existe interdisciplinaridade entre ortodontistas, ortopedistas e fonoaudiólogos porque verifica-se que ocorrem encaminhamentos de pacientes para avaliação fonoaudiológica, troca de informações ao longo do tratamento e divulgação do trabalho mioterápico realizado. Porém, ela necessita ser aprimorada, pois em alguns casos, como o de mordida cruzada, cujo tratamento é tido como importante pelos autores pesquisados, o encaminhamento não ocorre com freqüência, e em outros, como o de hipertrofia de adenóide, cuja prioridade é o tratamento otorrinolaringológico, ocorre a indicação de avaliação fonoaudiológica. Não foi encontrado 100% de indicação de avaliação fonoaudiológica em nenhum caso pesquisado e que houvesse necessidade, conforme destacado na revisão de literatura realizada. Existe divulgação do trabalho fonoaudiológico aos ortodontistas e ortopedistas, mas não eficiente, pois ainda há falta de conhecimento de quais casos necessitam intervenção fonoterápica, qual o melhor momento para que a mesma ocorra e qual é a extensão do campo de atuação fonoaudiológico. A busca do aperfeiçoamento profissional deve ser constante e progressiva. Os fonoaudiólogos devem estar sempre preocupados com a atualização de seu conhecimento, que é um dos fatores que diferencia o bom profissional. Somente assim os profissionais das áreas afins receberão informações corretas, seguras e precisas sobre o trabalho realizado e assegura a importância da intergração profissional. Buscando aumentar o nível de integração entre os profissionais, sugiro que sejam desenvolvidas pesquisas elucidativas do tema; que sejam promovidos cursos, palestras e simpósios interdisciplinares buscando estreitar os laços profissionais entre as classes, otimizando, assim, o melhor atendimento ao paciente, reduzindo o tempo e o custo do mesmo, e evitando as recidivas de tratamentos. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANGLE, E.H. - “Malocclusion of the teeth.” In: Ortodontia. Rio de Janeiro: Ed. Guanabara Koogan, 1980. ARAGÃO, W. - Ortopedia dos Maxilares. São Paulo: Ed. Pancast , 1992. BARRET, R.H. & HANSON, M.L. - Oral Myofunctional Disorders. 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Sibele Parpinelli Medeiros Fonoaudióloga - CRFa. 7347 QUESTIONÁRIO Idade - _____ Sexo - _____ Há quanto tempo é formado(a) em Odontologia?_______________________ É Ortodontista? _____ Em caso afirmativo, há quanto tempo? _____________ É Ortopedista Funcional dos Maxilares? _____ Em caso afirmativo, há quanto tempo? _______________ Qual é a cidade que você trabalha? _________________________________ 1)Você trabalha em: consultório particular consultório de terceiros posto de saúde hospital faculdade / universidade outros: ______________ 2) Você encaminha seus pacientes para avaliação fonoaudiológica? Por quê? 3) Em caso afirmativo, em qual momento do tratamento ortodôntico ou ortopédico funcional este encaminhamento é realizado 4) Caso o encaminhamento ao fonoaudiólogo seja feito, quais casos abaixo você acha importante uma avaliação com este profissional? Alteração na articulação dos sons Alteração postural Classe II divisão 1ª Classe II divisão 2ª Classe III Deglutição atípica Hipertrofia de adenóide Hipertrofia de amígdalas Mordida aberta anterior dentária Mordida aberta anterior esquelética Mordida aberta lateral Mordida cruzada Presença de maus-hábitos Recidiva de tratamento Respiração bucal Outros:________________ 5) Quando o encaminhamento é realizado, os profissionais costumam manter contato ao longo do tratamento? Por quê? 6) No caso de encaminhamento, existe algum fonoaudiólogo de sua preferência? Por quê? 7) No local que você trabalha existe algum fonoaudiólogo que trabalhe em conjunto no atendimento ao paciente? Sim ___ Não ___ 8) Você já recebeu alguma informação sobre o trabalho realizado pelo fonoaudiólogo com pacientes portadores de desordens na musculatura orofacial? Em caso afirmativo, onde?