a interdisciplinaridade entre as ortodontia e ortopedia

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CEFAC
Centro de Especialização em Fonoaudiologia Clínica
Motricidade Oral
A INTERDISCIPLINARIDADE ENTRE AS
ORTODONTIA E ORTOPEDIA FUNCIONAL
DOS MAXILARES E A FONOAUDIOLOGIA:
EXISTE ESTA RELAÇÃO NOS DIAS DE
HOJE?
Monografia
de
conclusão do Curso de
Especialização
em
Motricidade Oral.
Orientadora: Mirian
Goldenberg
Sibele Parpinelli Medeiros
São Paulo
1996 - 1997
Dedico este trabalho à Eliane
Barros
Ajaj
Piccoli,
minha
madrinha,
ortodontista
e
ortopedista
funcional
dos
maxilares, pela oportunidade de
atuação na área de motricidade
oral e incentivo dado na busca
constante do aperfeiçoamento
profissional.
AGRADECIMENTOS
Aos meus pais, por terem me ensinado o verdadeiro valor do estudo.
A Paulo Sérgio Merino, pelo incentivo constante na realização de
pesquisas e apoio dado em todos os momentos
A Ronaldo Parpinelli Medeiros, pelo auxílio na resolução de dúvidas
relacionadas à informática.
A Marcelo Parpinelli Medeiros, pelas opiniões construtivas dadas na
elaboração do texto.
Às amigas Fga. Cristine F. Mascarenhas e Fga. Kátia Alonso
Rodrigues, que compartilharam comigo os momentos vividos durante os
anos de especialização.
Ao Colégio Cor Jesu, pela compreensão e apoio dado durante a
realização da pós-graduação.
À orientadora Mirian Goldenberg, pelo incentivo dado à arte de
pesquisar.
Aos profissionais da odontologia que participaram desta pesquisa,
permitindo um crescimento profissional de ambas as partes.
Aos meus pacientes portadores com alterações de motricidade oral,
que despertaram em mim a busca do conhecimento.
SUMÁRIO
Introdução .................................................................. 1
Revisão Bibliográfica..................................................3
Material e Método .................................................... 16
Análise e Discussão dos Resultados .................... 17
Conclusão ................................................................ 22
Referências Bibliográficas ..................................... 23
Anexo ....................................................................... 26
RESUMO
Há casos de desordens oclusais nas quais apenas os
tratamentos ortodônticos ou ortopédicos funcionais não são
suficientes, pois uma alteração miofuncional associada necessita da
participação do fonoaudiólogo no processo terapêutico.
Dessa forma, o trabalho conjunto entre os profissionais da
Odontologia e da Fonoaudiologia deve ser valorizado e mantido
durante o tratamento de desordem oclusal, para que a eficácia do
mesmo seja alcançada e o número de recidivas, diminuído.
O presente trabalho teve como objetivo verificar se existe, nos
dias de hoje, relação interdisciplinar entre a Ortodontia e Ortopedia
Funcional dos Maxilares e a Fonoaudiologia. Para a execução da
pesquisa foi elaborado um questionário, respondido por 30
profissionais da Odontologia, atuantes na cidade de São Paulo, com
uma ou com ambas as especializações citadas.
Através dos dados apurados, verificou-se que há
interdisciplinaridade entre as áreas, porém necessita ser
aprimorada, pois há falta de precisão a respeito de quais casos
necessitam de intervenção fonoaudiológica e o momento adequado
para que a mesma ocorra. Diante disso, constatou-se a importância
da troca de informações entre os profissionais, o que favorece o
crescimento profissional de todos.
INTRODUÇÃO
Durante a graduação é citada com ênfase a importância de um trabalho em conjunto
entre os profissionais responsáveis por um caso clínico. Vários exemplos são dados e
discutidos com os alunos. Alguns cursos proporcionam essa vivência durante o período de
formação, visando, com isso, além de aprimorar o conhecimento do aluno, ressaltar a
importância desse tipo de procedimento.
Após a formatura, a realidade muitas vezes torna-se diferente. Antes o aluno participava
de uma equipe já formada, constituída pelos professores da faculdade e outros profissionais
que atuam no mesmo local ou em conjunto com os professores. Formados, os antigos alunos
devem constituir a sua própria equipe de trabalho. Nesse momento, surge a angústia, ao se
deparar com a realidade. Muitas vezes o contato entre os profissionais é superficial, em outras,
o mesmo não é possível, enfim, nem sempre o ideal tão discutido anteriormente é alcançado.
Um exemplo da necessidade de atendimento interdisciplinar é o do paciente com
desordem oclusal. Nesse caso, o ideal é um atendimento conjunto entre o ortodontista ou o
ortopedista funcional dos maxilares e o fonoaudiólogo, cada um responsável pela sua área e
buscando um atendimento mais qualificado para o paciente.
A minha experiência profissional é com pacientes portadores de alterações oclusais.
Tive a oportunidade de atuar com um grupo de odontólogos com especialização em ortodontia
por um ano. Nesse local, os pacientes eram avaliados tanto pelo ortodontista como pelo
fonoaudiólogo e era elaborado um plano de tratamento de cada área. Ambos os profissionais
atuavam no mesmo dia. As discussões e trocas de informações freqüentes entre cada área
contribuíram para o crescimento de cada profissional e propiciaram um melhor atendimento ao
paciente.
Há três anos atuo num consultório odontológico, junto com ortodontista e ortopedista
funcional dos maxilares, onde realizo avaliação dos pacientes em atendimento e, quando
necessário, terapia. A interação entre os profissionais também é enriquecedora.
A vivência em consultório particular, por outro lado, tem demonstrado uma realidade
diferente. Os pacientes são encaminhados pelos profissionais da odontologia. É feito um
contato inicial para discussão do caso e, muitas vezes, o planejamento do tratamento não é
realizado em conjunto, como nas duas situações citadas acima ou existem poucos contatos
entre os profissionais, não propiciando uma troca de conhecimento entre as áreas. Procuro
compreender por que isso acontece e algumas hipóteses são constantemente levantadas,
entre elas a falta de conhecimento dos odontólogos sobre o trabalho miofuncional com o
paciente portador de desordem oclusal.
Busco, com este trabalho, compreender como se encontra o relacionamento
interdisciplinar entre os ortodontistas e ortopedistas funcionais dos maxilares e os
fonoaudiólogos no atendimento ao paciente com alteração muscular e de oclusão dentária.
O interesse na realização desse trabalho surgiu do atendimento a pacientes
encaminhados por profissionais da odontologia. Os mesmos chegam ao consultório em etapas
diferentes do tratamento ortodôntico ou ortopédico e, com isso, comecei a questionar qual o
critério adotado por esses profissionais para a realização do encaminhamento ao
fonoaudiólogo e a importância dada por eles ao trabalho realizado por este profissional.
REVISÃO BIBLIOGRÁFICA
O paciente portador de alteração na musculatura do sistema estomatognático
geralmente necessita de um atendimento interdisciplinar, pois não existe um profissional
específico com conhecimentos de odontologia, otorrinolaringologia, fisioterapia,
fonoaudiologia, neurologia, entre outras áreas. Diante disso, vê-se a necessidade de um
atendimento conjunto entre essas especialidades.
Entre as áreas citadas acima, a fonoaudiologia é a mais recente. Nessa profissão
existe a especialização em motricidade oral, que qualifica o profissional no atendimento a
pacientes portadores de desordens no sistema estomatognático.
O trabalho mioterápico realizado pelo fonoaudiólogo recebeu contribuições
valiosas da odontologia. Segundo Barrett & Hanson (1978), o profissional da odontologia
deteve durante muito tempo o conhecimento sobre anatomia e fisiologia da cavidade oral.
Diante disto, teve uma importância fundamental no início do trabalho mioterápico
realizado pelo fonoaudiólogo.
Garliner (1971) também comenta que o trabalho mioterápico realizado pelo
fonoaudiólogo surgiu a partir do conhecimento de médicos e odontólogos.
A odontologia, assim como outras áreas, também é dividida em especialidades.
Entre elas, podemos citar duas, que terão importância para este trabalho: a ortodontia e a
ortopedia funcional dos maxilares.
O ortodontista, segundo Moyers (1988), é o profissional que atua no crescimento
craniofacial, no desenvolvimento da oclusão dentária e no tratamento das alterações
dentofaciais.
O ortopedista funcional dos maxilares atua no crescimento e na morfologia do
esqueleto facial ( van der Linden, 1990).
O trabalho ideal com o paciente portador de desordem oclusal e de alteração no
sistema estomatognático é o tratamento interdisciplinar entre o fonoaudiólogo e o
ortodontista ou ortopedista funcional dos maxilares.
Garliner (1971) menciona a importância da comunicação entre os membros de
uma equipe de trabalho, em que os profissionais devem ter respeito uns pelos outros e
agir com profissionalismo, e reforça a importância da troca de conhecimentos entre os
profissionais para o crescimento do trabalho realizado pelo fonoaudiólogo nas alterações
de oclusão dentária.
Segovia (1988) afirma que “uma equipe de trabalho deve atuar com coerência,
comunicação, compreensão e coordenação”, definindo os 4 C do trabalho em equipe .
O conhecimento específico, segundo a autora, deve ser compartilhado entre os colegas e
as limitações de cada profissional devem ser respeitadas.
Mussolino & Rodrigues (1994) realizam uma reflexão sobre o atendimento
interdisciplinar entre profissionais de áreas afins. As autoras ressaltam que o trabalho em
conjunto proporciona mais benefícios ao paciente, por receber um atendimento mais
qualificado, e aos membros da equipe, pois propicia o crescimento profissional de cada
integrante.
Outra contribuição de um tratamento em equipe é a possibilidade de realização de
um diagnóstico correto, porque a troca de informações entre os profissionais permite uma
visão diferente do caso clínico
Simões (1988) demonstra preocupação com o diagnóstico correto, enfatizando
que o mesmo impede o encaminhamento, sem necessidade, a um profissional de outra
especialidade.
Diante dessa colocação da autora, podemos refletir ainda mais sobre a
importância de um atendimento interdisciplinar. Devemos lembrar que o ser humano não
é dividido em partes; esta divisão é feita apenas para fins de estudo. O indivíduo deve ser
visto como um todo e , quando isto acontece, o diagnóstico torna-se mais criterioso,
pois outros aspectos antes não percebidos, que cabem a outras especialidades, podem
ser descobertos e influenciar no caso.
Outro item que deve ser lembrado é a familiarização com as terminologias
utilizadas pelos profissionais de outras áreas, como afirmam Barrett & Hanson (1978).
Isso facilita a comunicação entre os membros da equipe.
A importância do conhecimento de outras áreas afins a do profissional,
possibilitando uma melhor compreensão do caso clínico, fornecendo bases para a
discussão com outros profissionais e permitindo a elaboração de um planejamento de
trabalho comum, também é enfatizada por Bianchini, em 1995.
Marchesan (1993) questiona a atuação do fonoaudiólogo , ortopedista funcional
dos maxilares e ortodontista com pacientes portadores de desordens oclusais no
decorrer dos últimos anos. A autora refere que no início não existia trabalho em conjunto
entre esses profissionais, depois o mesmo tornou-se uma rotina e atualmente os
profissionais refletem mais sobre o momento adequado de iniciar um trabalho
concomitante.
Durante muito tempo o trabalho com a musculatura do sistema estomatognático
não foi reconhecido pelos profissionais da odontologia. Garliner (1971) atribuiu o
reconhecimento desse trabalho às recidivas ocorridas nos tratamentos de oclusão
dentária. O autor enfatiza a influência das alterações musculares nas relações oclusais,
comprovada através da clínica. Outros autores, como Lino (1980), Simões (1988),
Marchesan (1994), Jabur (1994) e Bianchini (1995) também ressaltam a importância do
equilíbrio muscular nas oclusões dentárias.
Simões (1988) expõe que alguns casos de alteração de oclusão necessitam de
tratamento fonoaudiológico.
Jabur (1994) comenta que não devemos determinar se é a forma que interfere na
função ou vice-versa, uma vez que ambas estão interligadas.
Marchesan (1994), Krakauer (1995) e Bianchini (1995) comentam as principais
alterações de função encontradas em cada alteração de forma, sempre relacionando-as.
Por um lado, os autores concordam sobre a importância do tratamento
fonoaudiológico nas alterações dentofacias, por outro, existem muitas controvérsias a
respeito do momento adequado de início desse trabalho e quais casos devem ser
tratados pelo fonoaudiólogo.
Serão citadas agora algumas das maloclusões encontradas em consultórios
fonoaudiológicos e os tratamentos realizados. Existem muitas controvérsias entre os
autores em relação a qual paciente necessita de atendimento fonoaudiológico.
Lino (1980) e Simões (1988) afirmam que todos os pacientes devem ser
submetidos a tratamento fonoaudiológico, uma vez que, após a correção da forma, a
musculatura deve estabelecer novos reflexos condicionados e se adaptar a essa nova
forma.
Jabur (1994) , Marchesan (1993), Krakauer (1995) e Bianchini (1995) são mais
criteriosos quanto ao encaminhamento para terapia miofuncional. Para esses autores,
nem todos os pacientes devem receber intervenção mioterápica.
Barrett & Hanson (1978) concordam com os autores acima e citam alguns casos
em que não deve ser iniciado tratamento miofuncional: discreta projeção de língua sem
alteração notável de oclusão ou fala; necessidade de intervenção médica, como casos de
alergias, hipertrofia de amígdalas e adenóides, desvio de septo e frenectomia lingual;
alguns casos de alteração ortodôntica, como arco palatino estreito dificultando o repouso
da língua, overject extremo e falta de oclusão dos molares; passagem da deglutição
infantil para a adulta.
Antes de expor os dados da literatura, será feita uma síntese das classificações
das maloclusões e das etiologias das mesmas, visto que isso dará bases para as
discussões levantadas posteriormente.
Inicialmente devemos definir a oclusão normal, que é a relação harmônica dos
dentes entre si, com os maxilares e com a musculatura orofacial, bem como o movimento
adequado da mandíbula durante a fonação (Moyers, 1988). Qualquer desordem nessa
relação acarreta alteração na oclusão.
A classificação e terminologia mais utilizadas no que diz respeito às maloclusões é
a de Angle (1907), que se baseia nas relações ântero-posterior entre a maxila e a
mandíbula. Atualmente essa classificação importa-se também com a musculatura e
crescimento faciais, e não apenas com a relação dos primeiros molares entre si, como
antigamente ( Moyers, 1988).
Classe I ou neutroclusão
A relação ântero-posterior entre maxila e mandíbula encontra-se normal. A cúspide
mésio-vestibular do primeiro molar permanente superior oclui no sulco mésio-vestibular
do primeiro molar permanente inferior. Há uma harmonia entre as bases ósseas,
podendo ocorrer apinhamentos dentários na região anterior devido à desarmonia entre
volume ósseo e dentário.
Classe II ou distoclusão
A relação ântero-posterior entre maxila e mandíbula encontra-se alterada. A
cúspide mésio-vestibular do primeiro molar permanente superior oclui anteriormente ao
sulco mésio-vestibular do primeiro molar permanente inferior. Há uma desarmonia entre
as bases ósseas.
a - divisão 1ª : os incisivos inferiores estão inclinados para vestibular
(vestibuloversão)
b - divisão 2ª : os incisivos centrais superiores encontram-se em posição
verticalizada e os laterais, inclinados para vestibular (vestibuloversão)
c - subdivisão: quando a alteração encontra-se em apenas um lado da arcada
dentária.
Classe III ou mesioclusão
A relação ântero-posterior entre maxila e mandíbula encontra-se alterada. A
cúspide mésio-vestibular do primeiro molar permanente superior oclui posteriormente ao
sulco mésio-vestibular do primeiro molar permanente inferior. Há uma desarmonia entre
as bases ósseas.
Lischer (1912) classifica as maloclusões considerando as posições dos dentes
individualmente e entre si:
a - sobremordida profunda: presença de excesso de transpasse vertical dos
incisivos superiores;
b - mordida aberta: ausência de oclusão de alguns dentes, enquanto outros
encontram-se em oclusão. Pode ser anterior ou posterior e esqueletal ou dentária.
C - mordida cruzada: a relação vestíbulo-lingual dos dentes encontra-se alterada.
Pode ser lingual ou vestibular.
É necessário que o profissional que trabalha com as desordens oclusais tenha
conhecimento sobre o crescimento e desenvolvimento craniofacial. Para que esse
processo ocorra de forma harmônica é necessário vedamento labial, deglutição sem
alteração, músculos faciais, mastigatórios, supra e infra hioideos, do pescoço e da nuca
funcionando em equilíbrio e as articulações temporomandibulares devem estar em
posição e altura adequadas , com funcionamento equilibrado. A alteração de uma ou
mais das funções citadas podem provocar desordens neste crescimento e
desenvolvimento (Aragão, 1992).
ARTICULÇÃO DOS SONS
Nos consultórios fonoaudiológicos são freqüentes
emissão dos sons da fala decorrentes de maloclusões.
os casos de alteração na
Moyers (1980) comenta que existe uma forte relação entre alteração de oclusão e
distúrbio de fala e reforça que a função alterada da língua não indica necessariamente a
existência de uma alteração na fala.
Uma das alterações observadas é a projeção de língua durante a emissão dos
fonemas / t, d, n, l, s, z /. Alguns autores consideram essa alteração da fala conseqüência
de uma alteração ortodôntica e outros, causa.
A projeção de língua pode ser conseqüência de uma falta de vedamento labial
anterior. O contato entre os lábios permite o equilíbrio entre as pressões internas do
espaço nasofaringeano e as externas do meio ambiente. A falta do vedamento pode
acarretar em uma projeção de língua como forma de recompensa (Aragão, 1992).
Os fonemas /t, d, n, l, s, z/ são emitidos com a ponta da língua no mesmo local da
deglutição normal. Portanto, é comum encontrar essas alterações articulatórias em
indivíduos com padrão de deglutição alterado (Machado & Braga,1992).
van der Linden (1990) considera a projeção de língua no caso de mordida aberta
anterior conseqüência da mesma e não causa.
Machado & Braga (1992) consideram a projeção de língua em casos de mordida
aberta anterior causa de agravamento da mesma.
Lino (1990) comenta que a função alterada pode levar a uma alteração na emissão
dos sons. Nesse caso, o paciente necessita de um tratamento especializado e o autor
cita o fonoaudiólogo como o profissional especializado para o atendimento. O
ortodontista deve ser apto para diagnosticar a alteração e realizar o encaminhamento,
porém o autor recomenda o encaminhamento somente após o ortodontista ter dado
condições morfológicas para que o fonoaudiólogo possa realizar o seu trabalho e cita
como exemplo os casos de mordida cruzada, mordida aberta anterior e sobremordida.
POSTURA
São comuns também na prática fonoaudiológica casos de alteração postural,
geralmente encontrados em pacientes respiradores bucais.
Entre as modificações posturais encontradas no respirador bucal está a inclinação
de cabeça para frente e posição mais baixa de mandíbula e língua, sendo que a última
também encontra-se anteriorizada (Proffit, 1978).
Aragão (1990) concorda com o autor anterior e justifica a postura alterada de
cabeça como maneira de facilitar a passagem de ar (a cabeça num ângulo de 90º
permite uma passagem de ar da boca para o sistema respiratório de maneira mais fácil).
Marchesan & Junqueira (1997) possuem a mesma opinião dos autores e acrescentam
ainda que a modificação postural da mandíbula e da língua também são compensações
para permitir uma melhor respiração.
Outras alterações posturais que podem ser observadas no respirador bucal são:
pescoço e nuca anteriorizados, modificando a coluna cervical; ombros inclinados para
frente; tórax deprimido; flacidez de músculos abdominais; músculo diafragma com sua
ação alterada; pernas mais abertas e pés afastados para proporcionar equilíbrio ao
corpo, que é ajudado pelos braços em posição mais posteriorizada (Aragão, 1990).
CLASSE II
Krakauer (1995) apresenta algumas características que podem ser encontradas
em pacientes classe II. Nos casos de divisão 1a, é comum observar lábio superior flácido
e inferior tocando os incisivos superiores, rigidez do m. mentalis, deglutição com
interposição de lábio inferior nos incisivos superiores e movimentos anteriores de
mandíbula durante a deglutição e fala como forma de aumentar o espaço intra-oral, e nos
pacientes classe II divisão 2 a , a autora relata tônus labial normal ou lábio superior rígido.
Nos dois casos a autora cita a terapia fonoaudiológica para melhorar o vedamento labial,
permitindo, com isto, um posicionamento adequado da língua durante a deglutição e a
fala.
Simões (1988) relata que em sua experiência clínica com pacientes classe II,
após o tratamento ortopédico funciona não há necessidade de intervenção
fonoaudiológica. Jabur (1994) apresenta uma idéia diferente da autora anterior, pois
acredita que é necessário corrigir primeiro a forma, mas depois o tratamento da função
faz-se necessário.
Marchesan (1994) expõe que o tratamento fonoaudiológico nesses casos é
limitado devido à forma alterada.
CLASSE III
Quanto ao paciente classe III, Krakauer (1995) comenta algumas das
características que são freqüentemente encontradas: língua flácida, tocando os rebordos
linguais dos dentes inferiores, mastigação com padrão vertical, deglutição com
participação da musculatura perioral e com pressão atípica de dorso de língua,
anteriorização de língua e presença de movimentos associados de cabeça. Na opinião
da autora, a terapia fonoaudiológica deve ser realizada em conjunto com o tratamento
dentário devido aos limites impostos pela oclusão. Jabur (1994) e Marchesan (1994)
concordam com a autora anterior ao afirmarem que o tratamento fonoaudiológico com o
paciente classe III deve ser realizado em conjunto com o ortodôntico.
DEGLUTIÇÃO ATÍPICA
Um dos motivos mais freqüentes de encaminhamento de pacientes ao
fonoaudiólogo é a presença de deglutição atípica.
Muitos autores procuram definir o que é a deglutição atípica. Antes, porém, deve
ser feita uma diferenciação entre a deglutição infantil e a madura, pois a mesma dará
bases para um diagnóstico correto de deglutição atípica.
Moyers (1988) considera deglutição infantil aquela observada antes da erupção da
dentição decídua. Nessa época é comum a língua permanecer entre os rebordos
gengivais, e a estabilização da mandíbula é obtida através da contração dos músculos
faciais. O autor alerta que a persistência desse padrão após o início da erupção dos
dentes permanentes acarretará em alterações na musculatura orofacial. Na deglutição
madura não ocorre contração da musculatura de lábios e bochechas, apenas da
elevadora da mandíbula, responsável pela oclusão dentária.
van der Linden (1990) diferencia a deglutição infantil da adulta pela presença ou
não de oclusão dentária e postura da língua. Na primeira há ausência de oclusão porque
a língua mantém-se entre os arcos dentários, e na segunda ocorre oclusão dentária e a
língua posiciona-se atrás dos incisivos superiores.
Machado & Braga (1992) citam as seguintes características da deglutição infantil:
língua apoiada nos rebordos gengivais e maxilares afastados, estabilização da
mandíbula através da contração dos músculos do VII par craniano e controle da
deglutição através da troca sensorial entre língua e lábios. Os autores determinam o início
da deglutição madura com a erupção dos primeiros molares decíduos, por volta de 18
meses. Nesse período, os dentes já entram em oclusão durante a deglutição, a
estabilização da mandíbula é realizada pela ação dos músculos inervados pelo V par
craniano, a ponta da língua posiciona-se atrás dos incisivos superiores e há mínima
contração dos lábios durante a deglutição.
Diante dessas descrições, devemos estar sempre atentos se estamos diante de
um caso de deglutição infantil, madura ou de uma deglutição infantil persistente (Moyers,
1988).
Segovia (1977) considera deglutição atípica projeção anterior ou lateral de língua,
ausência de oclusão dentária e interposição de língua durante a deglutição.
Lino (1980) afirmou que o ortodontista deve diagnosticar uma alteração na
deglutição, mas cabe ao profissional especializado nessta área tratar da desordem. O
autor enfatiza a importância da atuação desse profissional devido aos casos de alteração
dentofaciais advindos de um padrão alterado de deglutição e também devido à
dificuldade de remoção dos reflexos condicionados da deglutição atípica.
MORDIDA ABERTA
A mordida aberta anterior é outro tipo de desordem oclusal freqüente em
consultório fonoaudiológico. A mesma pode ser de origem esquelética ou dentária e o
diagnóstico diferencial é realizado através do RX ou de análise cefalométrica.
Krakauer (1995) cita algumas das características que podem ser encontradas em
pacientes com esse tipo de mordida: postura inadequada de língua durante a deglutição
e repouso, podendo ocorrer anteriorização durante estas funções; lábios e m. mentalis
com contração excessiva e ponta de língua geralmente mais flácida. Nesses casos, a
autora recomenda terapia fonoaudiológica para melhorar a resistência muscular e a
postura e enfatiza a importância do trabalho em conjunto com o ortodontista, pois a
mudança na função interfere na forma e vice-versa.
Em relação à mordida aberta esquelética, Jabur (1994) acredita que a forma deve
ser corrigida primeiro para depois adequar a função. Nos casos de mordidas abertas
dentárias, o tratamento da função deve ser concomitante com o da forma para evitar
recidiva.
Moyers (1988) e Marchesan (1994) alertam que, em casos de mordidas abertas
devido a maus hábitos, a retirada dos mesmos contribuem para o fechamento da
mordida.
Garliner (1971) comenta a relação entre mordida aberta anterior - deglutição
atípica - sigmatismo anterior e mordida aberta lateral - deglutição atípica - sigmatismo
lateral.
MORDIDA CRUZADA
Em consultório fonoaudiológico também são encontrados casos de mordida
cruzada posterior.
Krakauer (1995) lembra que o paciente com mordida cruzada posterior costuma
mastigar preferencialmente deste lado, provocando uma assimetria facial. A musculatura
do lado mastigatório apresenta-se geralmente mais rígida e encurtada e, do outro lado,
mais flácida e alongada. A autora indica terapia fonoaudiológica nesses casos para que
seja adequado o padrão mastigatório com a finalidade de equilibrar a musculatura.
Salienta que o trabalho deve ser realizado em conjunto com o tratamento dentário ou
após o descruze da mordida.
Lino (1990) alerta que a mordida cruzada unilateral encontra-se freqüentemente
associada à postura inadequada de apoio de mão sempre de um mesmo lado da
cabeça, e a bilateral, à respiração bucal. A retirada de tais hábitos é importante para o
tratamento ortodôntico e/ou ortopédico funcional.
Um estudo realizado por Bresolin e col. (1983) também associou a respiração
bucal a casos de mordida cruzada. Através da observação feita em 30 respiradores
bucais e 15 respiradores nasais, de ambos os sexos, com idades entre 6 a 12 anos,
constatou-se no primeiro grupo presença de 4 casos de mordida cruzada unilateral e 3 de
bilateral. Não foi encontrado nenhum caso de mordida cruzada posterior em respiradores
nasais. Os autores alertam sobre a importância de um tratamento precoce para a
respiração bucal, evitando, com isto, o surgimento de alterações dentofaciais.
Marchesan (1995) e Krakauer (1995) enfatizam o trabalho conjunto entre
fonoaudiólogo e ortodontista no tratamento desse tipo de desordem oclusal, reforçando
sempre a importância da correção da forma para a adequação da função. Jabur (1994) e
Bianchini (1995) também valorizam a correção da mordida cruzada para o
estabelecimento adequado da função.
HÁBITOS VICIOSOS
Autores como Seraphim (1973), Moyers (1988) e Black e col. (1990) reforçam a
influência dos hábitos viciosos nas desordens oclusais.
Para que um hábito seja considerado nocivo, devemos levar em consideração
principalmente a tríade: freqüência, duração e intensidade (Black e col., 1990).
Lino (1990) concorda com a autora acima e lembra a predisposição individual,
faixa etária, condições de saúde e nutrição do indivíduo como variáveis que também
interferem no estabelecimento de uma má oclusão quando há presença de mau hábito.
Moresca & Feres (1992) acrescentam, ainda, causas e circunstâncias sob as quais o
hábito foi desenvolvido e o estado emocional do indivíduo.
Vários hábitos orais são considerados nocivos ao desenvolvimento da oclusão
dentária, entre eles a sucção do polegar, relatada com mais freqüência pelos autores.
Entre as desordens oclusais mais comuns decorrentes da sucção do polegar,
Moyers (1988) cita a mordida aberta anterior, inclinação dos incisivos superiores para
vestibular, retração postural da mandíbula e inclinação dos incisivos inferiores para
lingual, estreitamento do arco maxilar, soalho nasal mais estreito e palato mais profundo,
rigidez de lábio inferior e flacidez de lábio superior.
Como foi mencionado anteriormente, a freqüência, duração e intensidade da
sucção interferem no estabelecimento da oclusão dentária. Moyers (1988) acrescenta,
para esses casos, o padrão de esqueleto facial e o processo alveolar como fatores que
devem ser considerados. van der Linden (1990) ressalta também a importância da época
do início da sucção: se o início é precoce, com intensidade, freqüência e duração
consideráveis, acarreta conseqüências para os dentes e desenvolvimento do esqueleto
facial.
O hábito vicioso nocivo de sucção de chupeta também é lembrado por Moyers
(1988) e Black e col. (1990). E ntre as características destacadas por Black e col. (1990)
estão: flacidez de lábios e bochechas, anteriorização de língua e postura mais rebaixada,
incisivos superiores em protrusão, mordida aberta anterior e palato ogival.
Outro hábito nocivo citado pelos autores é a postura inadequada da língua durante
o repouso. Alguns autores como Barret & Hanson (1978), Proffit (1978), van der Linden
(1980) e Lino (1990) têm demonstrado mais importância à postura de língua durante o
repouso do que à força exercida durante a deglutição na modificação do posicionamento
dentário, uma vez que a pressão constante exercida pela língua sobre os dentes pode
modificar a oclusão dentária.
Moyers (1988) também considera a mordida de lábio um hábito prejudicial. Barret
& Hanson (1978) mencionam que a mordida de lábios ou bochechas podem causar
assimetria de arcos dentários e o hábito de lamber os lábios pode provocar uma
vestíbulo-versão dos dentes.
Outros hábitos viciosos também citados pelos autores são: onicofagia, pressão
externa exercida sobre os maxilares (apoio de mão no queixo ou bochecha, forçar a
mandíbula para trás com lápis ou qualquer outro objeto), projeção de língua na emissão
dos fonemas / t, d, n, l, s, z / , bater ou repousar objetos entre os dentes anteriores,
bruxismo, respiração bucal e postura inadequada de lábios e língua durante o repouso
(Barret & Hanson, 1978).
A remoção de tais hábitos é muito importante para o tratamento da oclusão
dentária. Seraphim (1973) comenta que a retirada dos mesmos pode levar os dentes à
posição normal ou evitar o agravamento do caso. Essa remoção, segundo van der
Linden, 1990, deve ser feita o quanto antes, pois se o mesmo for retirado antes da
erupção dos incisivos permanentes, as alterações podem não se estabelecerem .
Black e col. (1990) criaram uma proposta de atendimento fonoaudiológico a
pacientes com hábitos bucais nocivos que consiste na conscientização do hábito e
tentativa de retirá-lo de forma consciente e participação ativa dos familiares.
RESPIRAÇÃO BUCAL
HIPERTROFIA DE ADENÓIDE E AMÍGDALAS
Atenção especial também deve ser dada à respiração. Segundo Simões, 1988, a
respiração influencia no desenvolvimento dos maxilares, especialmente do arco dentário
superior; na postura da mandíbula e língua; interfere no espaço nasofaríngeo e é
responsável pelas trocas gasosas.
A respiração inadequada poderá prejudicar o desenvolvimento do sistema
estomatognático do indivíduo.
Bresolin & col. (1983) realizaram um estudo através de exame clínico e análise
cefalométrica comparando o desenvolvimento dentofacial de crianças respiradoras
bucais com alergia crônica e respiradoras nasais sem quadro alérgico, de ambos os
sexos, com idades entre 6 a 12 anos. Alguns achados foram considerados importantes,
entre eles, a maior prevalência de face longa, overject, palato alto, estreitamento do arco
dentário superior com maior incidência de mordida cruzada posterior e maxila e
mandíbula mais retrognatas em pacientes respiradores bucais.
A respiração bucal ocorre com o não vedamento labial. A entrada de ar pela boca
favorece a hipertrofia dos tecidos linfóides como forma de defesa, porque o ar que entra
pelo nariz não é aquecido, umidificado e filtrado (Aragão, 1992).
Algumas das prováveis causas da respiração bucal são: desvio de septo,
inflamação crônica e congestão da mucosa nasafaríngea, hipertrofia de amígdalas e/ou
adenóides, alguns hábitos de sucção e hipertrofia de cornetos (Moyers, 1988). Aragão
(1992) comenta que muitos profissionais denominam de hipertrofia de cornetos a
diminuição de entrada de ar nas fossas nasais devido à atresia de palato.
Marchesan & Junqueira (1997) consideram a respiração bucal uma das alterações
de função que mais interfere no posicionamento da língua. No caso de obstrução das vias
aéreas superiores, as autoras indicam primeiro um tratamento otorrinolaringológico e
depois, se o hábito da respiração bucal persistir, uma intervenção fonoaudiológica para
reeducar a respiração do indivíduo.
A causa mais freqüente de obstrução nasal, segundo Mocellin, 1992, é a
hipertrofia de adenóide. É muito comum até a época da adolescência, quando acontece
uma regressão fisiológica. Na criança, quando essa hipertrofia diminui muito a passagem
do ar e, na adolescência, quando não ocorre a involução esperada, é indicada cirurgia.
Weimert (1986) cita que, em 1360 indivíduos avaliados com obstrução nasal, 39%
apresentaram como etiologia hipertrofia de adenóide.
Quanto às amígdalas palatinas, devidido à localização na orofaringe, quando
muito edemaciadas, podem comprimir a região da úvula, dificultando a passagem de ar
(Mocellin, 1992).
A hipertrofia das amígdalas palatinas pode causar além de dificuldade
respiratória, também alimentar. Nos dois casos, a conduta é cirúrgica (Mocellin, 1992).
Weimert (1986) comenta que, em sua experiência clínica, a hipertrofia das
amígdalas palatinas raramente é causa de uma obstrução nasal e, portanto, de uma
respiração bucal. O autor refere que menos de 1% de seus pacientes realizam cirurgia e
que a causa mais comum da remoção das mesmas são as infecções recorrentes.
Outra causa de obstrução nasal citada pelos autores é a rinite alérgica, que
também pode provocar respiração bucal.
A rinite alérgica é, segundo Mocellin (1992), a segunda causa mais freqüente de
obstrução nasal. Weimert (1986) avaliou 1360 indivíduos com obstrução nasal,
diagnosticando 34% de casos de rinite alérgica, considerando, após a hipertrofia de
adenóides, a segunda causa mais comum de obstrução nasal.
O indivíduo com rinite alérgica apresenta algumas destas características:
obstrução nasal, rinorréia, conjuntivite irritativa, história familiar de alergia, coceira nos
olhos e nariz, entre outras. O tratamento é medicamentoso. ( Weimert, 1986).
Nos casos de pacientes com respiração bucal, deve ser feita uma avaliação
otorrinolaringológica para verificar se há alguma obstrução das vias aéreas superiores
impedindo a passagem de ar e, quando necessário, realizado o tratamento. Após a
desobstrução, a função deve ser reeducada para não ocorrer recidiva do tratamento
médico (Lino, 1990). O autor cita o fonoaudiólogo e o fisioterapeuta como os
profissionais habilitados para essa reeducação. Mocellin, em 1992, salienta que o
atendimento aos pacientes com respiração bucal deve ser interdisciplinar (fonoaudiólogo,
otorrinolaringologista e ortodontista) para que o diagnóstico e o tratamento sejam
corretos. Weimert (1986) acrescenta ainda que é importante que o ortodontista esteja
atento à respiração do indivíduo, bem como o otorrinolaringologista à oclusão do
paciente.
A revisão literária realizada demonstra a importância dada pelos autores ao
tratamento fonoaudiológico em casos de desordens oclusais.
MATERIAL E MÉTODO
O trabalho foi realizado através da aplicação de um questionário (em anexo) a
profissionais da odontologia, de ambos os sexos, ortodontistas e/ou ortopedistas
funcionais dos maxilares respondido pelos próprios profissionais, sem a interferência da
pesquisadora. Foram distribuídos 40 questionários e houve retorno de 30.
Participaram do presente trabalho 30 profissionais, sendo 14 ortodontistas e
ortopedistas , 10 apenas ortodontistas e 6 somente ortopedistas, com média de 37 anos.
Todos trabalham em São Paulo, sendo que 93% atuam em consultório particular, 26% em
consultório de terceiros, 10% em posto de saúde e 16% em faculdade ou universidade.
Vale ressaltar que alguns atuam em mais de um local.
O questionário consta de perguntas relativas a: local de trabalho do profissional,
hábito de encaminhamento à avaliação fonoaudiológica, critério na realização do
encaminhamento e momento no qual o mesmo é realizado, existência de troca de
informações entre os profissionais da odontologia e da fonoaudiologia ao longo do
tratamento do paciente e conhecimento sobre o trabalho realizado pelo fonoaudiólogo
com pacientes portadores de desordens no sistema estomatognático.
ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS
Após a revisão da literatura, pode-se verificar que a avaliação da musculatura
orofacial é importante em casos de alterações ortodônticas, conforme destacam Lino
(1980), Simões (1988), Marchesan (1993), Jabur (1994) e Bianchini (1995). A realização
dessa avaliação e o tratamento das desordens musculares encontradas são funções do
fonoaudiólogo.
A importância do atendimento conjunto entre o ortodontista e/ou ortopedista e o
fonoaudiólogo é destacada por autores como Garliner (1971), Segovia (1988) e
Mussolino & Rodrigues (1994). A troca de conhecimentos, permitindo um atendimento
mais qualificado ao paciente e um crescimento profissional dos membros da equipe,
justificam o atendimento interdisciplinar.
A pesquisa realizada revela que 96% dos profissionais encaminham seus
pacientes para avaliação fonoaudiológica e 80% dos profissionais mantêm contato ao
longo do tratamento, sendo justificado principalmente pela necessidade de atendimento
conjunto (79%). Isso demonstra a importância dada ao atendimento interdisciplinar, o que
está de acordo com o recomendado pelos autores citados acima. Desses
encaminhamentos, 73% são para fonoaudiólogos conhecidos, sendo justificados pela
facilidade de contato e conhecimento do trabalho realizado.
Apenas um profissional dos 30 pesquisados não realiza o encaminhamento para o
fonoaudiólogo porque acredita que primeiro necessita saber mais sobre a atuação deste
profissional com os portadores de desordens oclusais, o que também evidencia o valor
dado à troca de conhecimentos.
Quanto ao momento considerado ideal pelos ortodontistas e ortopedistas para
realização do encaminhamento ao fonoaudiólogo, não há um critério único, sendo que a
indicação de avaliação ocorre com mais freqüência durante o tratamento ortodôntico ou
ortopédico (51%) ou no início do mesmo (41%). Autores como Barret & Hanson (1978),
Jabur (1994), Marchesan (1994), Krakauer (1995) e Bianchini (1995) ressaltam que nem
todos os casos necessitam de intervenção mioterápica e recomendam critério na
realização do encaminhamento.
Dos profissionais pesquisados, 70% já receberam informações sobre o trabalho
realizado pelo fonoaudiólogo com pacientes portadores de desordens oclusais,
demonstrando que há divulgação do atendimento mioterápico.
Após verificar a importância dada à avaliação fonoaudiológica e ao atendimento
interdisciplinar, será citado em quais casos esses encaminhamentos são considerados
importantes ou não.
Deglutição atípica foi o mais mencionado pelos (93%), demonstrando que os
profissionais encontram-se atentos a essa desordem funcional e conscientes da
importância do tratamento, que é destacada por Lino (1980).
Em seguida, obteve-se 76% de encaminhamentos de casos de mordida aberta
anterior dentária e a mesma porcentagem para hábitos viciosos.
Nos casos de mordida aberta, a necessidade de intervenção mioterápica é citada
por Krakauer (1995), que também enfatiza a importância do atendimento interdisciplinar.
Quanto aos hábitos viciosos, a retirada dos mesmos para a correção ortodôntica é
enfatizada por Seraphim (1973) e van der Linden (1990). O atendimento fonoaudiológico
nesses casos é mencionado por Black e col. (1990).
A pesquisa demonstra que o ideal acima citado pela literatura não é atingido, pois
na prática nem todos os pacientes com essas alterações são enviados ao fonoaudiólogo.
Com 73% de indicação para avaliação mioterápica encontram-se os casos de
respiração bucal e alterações posturais.
Nos casos de respiração bucal, Marchesan (1995) ressalta o trabalho integrado
entre o fonoaudiólogo, o otorrinolaringologista e o ortodontista.
Autores como Lino (1990) e Marchesan & Junqueira (1997) indicam a avaliação
otorrinolaringológica prévia ao encaminhamento fonoaudiológico. Na pesquisa, apenas 2
dos 30 profissionais pesquisados mencionaram esse procedimento, que corresponde a
6% da amostra. Mocellin (1992) recomenda atendimento interdisciplinar (fonoaudiólogo,
ortodontista e otorrinolaringologista) para que o diagnóstico e o tratamento sejam
corretos.
Nos casos de pacientes respiradores bucais é comum também observar
alterações de postura, conforme destacam Proffit (1978), Aragão (1990) e Marchesan &
Junqueira (1997). Essas modificações posturais, segundo Aragão (1990), facilitam a
passagem de ar.
A literatura cita as alterações posturais em casos de respiração bucal em que,
como foi mencionado, é necessária intervenção fonoaudiológica.
Os resultados obtidos estão abaixo do esperado, uma vez que são desordens que
necessitam de intervenção fonoaudiológica, conforme a revisão de literatura realizada.
Outro caso pesquisado foi o de alteração na articulação dos sons da fala. Constatouse que 70% dos profissionais indicam avaliação fonoaudiológica. Essa alteração pode
ser devida a uma desordem muscular, conforme cita Lino em 1992, ou conseqüência de
uma alteração ortodôntica, segundo van der Linden (1992). Em ambos os casos é
necessária intervenção fonoaudiológica e, conforme o resultado obtido na pesquisa, nem
sempre isto ocorre.
A recomendação de avaliação fonoaudiológica é pouco freqüente em alguns
casos, como os de mordida aberta anterior esquelética (53%), recidivas de tratamentos
(53%), classe III (40%), classe II divisão 1ª (33%), mordida cruzada (33%) e classe II
divisão 2ª (26%).
Em relação à mordida aberta esquelética, Jabur (1994) menciona que a
adequação da função deve ser posterior à da forma, mas necessita ser realizada. Na
pesquisa, obteve-se apenas 53% de encaminhamentos, o que evidencia a necessidade
de maior esclarecimento aos profissionais da odontologia.
Quanto às recidivas de tratamento ortodôntico ou ortopédico, 53% dos
profissionais acham necessária a avaliação fonoaudiológica. Deve-se ressaltar que
alguns casos de recidivas poderiam ser evitados com o tratamento fonoaudiológico no
momento adequado, conforme foi destacado na literatura pesquisada. Um exemplo que
pode ser dado é o caso de uma mordida aberta anterior dentária com mau
posicionamento de língua; após a correção ortodôntica, se a postura lingual não for
adequada durante o tratamento da oclusão, a mordida pode abrir novamente devido à
pressão exercida pela língua nos dentes durante o repouso ( Jabur, 1994).
Outro caso em que deve ser realizado tratamento conjunto entre o ortodontista ou
ortopedista e o fonoaudiólogo é o de classe III, segundo Marchesan (1994), Jabur (1994)
e Krakauer (1995) . Na pesquisa constatou-se que isso não acontece, pois há 40% de
casos de indicação de avaliação fonoaudiológica.
A mordida cruzada é citada por alguns autores como conseqüência de hábitos
viciosos (Lino, 1990), respiração bucal (Bresolin e col. , 1983) ou padrão mastigatório
inadequado (Krakauer, 1995).
A necessidade de atendimento fonoterápico nos casos de respiração bucal e
hábitos viciosos já foi discutida anteriormente.
Marchesan (1994) e Krakauer (1995) citam a alteração da mastigação como uma
das causas responsáveis pelo cruzamento da mordida e recomendam um trabalho
fonoaudiológico conjunto com o ortodôntico ou posterior ao descruze da mordida.
Mesmo sendo aconselhada pelos autores, a orientação de um fonoaudiólogo é
requisitada somente em 33% de casos de mordida cruzada.
Entre os pacientes classe II divisão 1ª ocorrem 33% de indicação de avaliação
fonoaudiológica e classe II divisão 2ª, 26%. As alterações musculares encontradas em
pacientes portadores dessas desordens oclusais são citadas por Krakauer (1995).
Entre os autores há controvérsias quanto à necessidade de tratamento
fonoaudiológico, pois alguns, como Marchesan (1994) e Krakauer (1995), acreditam na
melhora com intervenção fonoaudiológica, mas alertam que há limites no tratamento. Por
outro lodo, Simões (1988) afirma que na sua prática clínica não houve necessidade de
tratamento fonoaudiológico após a correção da forma.
Na pesquisa constatou-se que ocorrem encaminhamentos de casos de hipertrofia
de adenóide (33%) e de hipertrofia de amígdalas (30%) que, segundo Weimert (1986) e
Mocellin (1992), respectivamente, necessitam de intervenção otorrinolaringológica prévia.
Nos casos em que há obstrução da via aérea é indicado primeiro tratamento
otorrionolaringológico e somente após a desobstrução, tratamento fonoaudiológico para
reeducar a função (Lino, 1990). Na pesquisa, apenas 2 dos 30 profissionais pesquisados
mencionaram a avaliação otorrinolaringológica prévia, que corresponde a 6%.
INDICAÇÃO DE AVALIAÇÃO
100
93
90
76
Porcentagem
80
76
73
73
70
70
63
60
53
53
50
40
40
33
33
33
30
30
23
20
10
0
1
2
3
4
5
6
7
1- Deglutição Atípica
8
9
10
11
12
13
14
9- Recidiva
2- Mordida Aberta Dentária
10- Classe III
3- Hábitos Viciosos
11- Mordida Cruzada
4- Respiração Bucal
12- Hipertrofia de Adenóide
5- Alteração Postural
13- Classe II div.1ª
15
6- Alt. na Articulação dos Sons
14- Hipertrofia de Amígdalas
7- Mordida Aberta Lateral
15- Classe II div. 2ª
8- Mordida Aberta Anterior Esquelética
CONCLUSÃO
O trabalho realizado permite concluir que existe interdisciplinaridade entre
ortodontistas, ortopedistas e fonoaudiólogos
porque verifica-se que ocorrem
encaminhamentos de pacientes para avaliação fonoaudiológica, troca de informações ao
longo do tratamento e divulgação do trabalho mioterápico realizado. Porém, ela necessita
ser aprimorada, pois em alguns casos, como o de mordida cruzada, cujo tratamento é
tido como importante pelos autores pesquisados, o encaminhamento não ocorre com
freqüência, e em outros, como o de hipertrofia de adenóide, cuja prioridade é o
tratamento otorrinolaringológico, ocorre a indicação de avaliação fonoaudiológica.
Não foi encontrado 100% de indicação de avaliação fonoaudiológica em nenhum
caso pesquisado e que houvesse necessidade, conforme destacado na revisão de
literatura realizada.
Existe divulgação do trabalho fonoaudiológico aos ortodontistas e ortopedistas,
mas não eficiente, pois ainda há falta de conhecimento de quais casos necessitam
intervenção fonoterápica, qual o melhor momento para que a mesma ocorra e qual é a
extensão do campo de atuação fonoaudiológico.
A busca do aperfeiçoamento profissional deve ser constante e progressiva. Os
fonoaudiólogos devem estar sempre preocupados com a atualização de seu
conhecimento, que é um dos fatores que diferencia o bom profissional. Somente assim os
profissionais das áreas afins receberão informações corretas, seguras e precisas sobre
o trabalho realizado e assegura a importância da intergração profissional.
Buscando aumentar o nível de integração entre os profissionais, sugiro que sejam
desenvolvidas pesquisas elucidativas do tema; que sejam promovidos cursos, palestras e
simpósios interdisciplinares buscando estreitar os laços profissionais entre as classes,
otimizando, assim, o melhor atendimento ao paciente, reduzindo o tempo e o custo do
mesmo, e evitando as recidivas de tratamentos.
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WEIMERT, T. - “On Airway Obstruction in Orthodontic Practice.” In: Journal of Clinical Orthodontics.
v.20 1-6 , jan, 1986.
ANEXO
Estou desenvolvendo uma pesquisa com a finalidade de conhecer melhor a
relação interdisciplinar entre o ortodontista e/ou ortopedista funcional dos maxilares e
o fonoaudiólogo. Sua colaboração ao responder as questões da forma mais completa
possível será muito importante. Desde já agradeço.
Sibele Parpinelli Medeiros
Fonoaudióloga - CRFa. 7347
QUESTIONÁRIO
Idade - _____
Sexo - _____
Há quanto tempo é formado(a) em Odontologia?_______________________
É Ortodontista? _____ Em caso afirmativo, há quanto tempo? _____________
É Ortopedista Funcional dos Maxilares? _____ Em caso afirmativo, há quanto
tempo? _______________
Qual é a cidade que você trabalha? _________________________________
1)Você trabalha em:
consultório particular
consultório de terceiros
posto de saúde
hospital
faculdade / universidade
outros: ______________
2) Você encaminha seus pacientes para avaliação fonoaudiológica? Por quê?
3) Em caso afirmativo, em qual momento do tratamento ortodôntico ou ortopédico
funcional este encaminhamento é realizado
4) Caso o encaminhamento ao fonoaudiólogo seja feito, quais casos abaixo você acha
importante uma avaliação com este profissional?
Alteração na articulação dos sons
Alteração postural
Classe II divisão 1ª
Classe II divisão 2ª
Classe III
Deglutição atípica
Hipertrofia de adenóide
Hipertrofia de amígdalas
Mordida aberta anterior dentária
Mordida aberta anterior esquelética
Mordida aberta lateral
Mordida cruzada
Presença de maus-hábitos
Recidiva de tratamento
Respiração bucal
Outros:________________
5) Quando o encaminhamento é realizado, os profissionais costumam manter contato ao
longo do tratamento? Por quê?
6) No caso de encaminhamento, existe algum fonoaudiólogo de sua preferência? Por
quê?
7) No local que você trabalha existe algum fonoaudiólogo que trabalhe em conjunto no
atendimento ao paciente?
Sim ___
Não ___
8) Você já recebeu alguma informação sobre o trabalho realizado pelo fonoaudiólogo
com pacientes portadores de desordens na musculatura orofacial? Em caso afirmativo, onde?
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