42 C APÍTULO 5 C INEMÁTICA DO M OVIMENTO P LANO DE C ORPOS R ÍGIDOS O estudo da dinâmica do corpo rígido pode ser feito inicialmente tomando aplicações de engenharia onde o movimento é plano. Neste capítulo vamos analisar as equações da cinemática do movimento plano. Este estudo é feito a fim de encontrar a relação entre as posições, velocidades e acelerações de dois pontos de um mesmo corpo rígido. 5.1 M OVIMENTO DE UM C ORPO R ÍGIDO O movimento plano de um corpo rígido é definido como o movimento no qual as trajetórias de todos os seus pontos são paralelas a um plano fixo. Veja como exemplo a trajetória de um ponto P na figura 5.1 paralela ao plano xy. z C P(t) r y x Figura 5.1 - Trajetória plana de um ponto P de um corpo rígido C. 43 Há dois casos particulares de movimentos planos: a translação e a rotação em torno de um eixo fixo. O movimento geral plano pode ser decomposto numa translação mais uma rotação. Na translação uma linha qualquer do corpo rígido se mantém paralela em relação à sua posição inicial, em qualquer instante. Neste caso se as trajetórias de todos os pontos são retilíneas, o movimento é de translação retilínea. Se as trajetórias de todos os pontos são curvilíneas e equidistantes, o movimento é de translação curvilínea. Na rotação em torno de um eixo fixo, as trajetórias de todos os pontos são circulares, concêntricas, com centros no eixo fixo. É claro que pontos sobre o eixo fixo não se movem. A figura 5.2 ilustra o mecanismo biela-manivela, no qual a manivela realiza movimento de rotação, o pistão tem movimento de translação e o elemento de ligação denominado biela realiza um movimento plano geral. biela manivela pistão Figura 5.2 - Mecanismo biela-manivela. 5.2 M OVIMENTO PLANO DE T RANSLAÇÃO Considere um corpo rígido se movendo em translação plana e seja xy o plano de referência do movimento. Vamos tomar dos pontos A e B deste corpo rígido e um referencial móvel x´y´ fixo em A durante todo o movimento, mas mantendo-se paralelo ao referencial xy, considerado absoluto. Podemos relacionar as posições r A e r B destes dois pontos através de rB rA rB / A (5.1) 44 onde rB / A rB rA é o vetor posição de B em relação a A. Esta é uma forma simplificada ou compacta de indicar este vetor. De fato, este vetor é a posição de B em relação a um referencial móvel x´y´ fixo no ponto A. y´ y B rB/A C x´ rB A rA x Figura 5.3 - Vetores velocidade de uma partícula P. Derivando a (5.1) podemos relacionar as velocidades entre os pontos A e B vB onde v B / A (5.2) v A vB / A v B v A corresponde velocidade relativa de B em relação a A. Aqui vale também a observação feita acima, uma vez que a velocidade v B/A é de fato a velocidade de B em relação ao referencial móvel x´y´. Vamos analisar a derivada do vetor posição relativa. Seja rB / A xi (5.3) yj Tomando a derivada de (5.3), obtemos vB / A drB / A dt dx i dt dy j dt x di dt y dj dt (5.4) Sendo o corpo rígido, na translação o vetor r B/A é constante e portanto x´ e y´ também são constantes e suas derivadas no tempo são nulas. Como o referencial móvel foi escolhido tal que i´=i e j´=j, então 45 vB / A drB / A dt (5.5) 0 e vB (5.6) vA Derivando (5.6) obtemos a relação entre as acelerações dos pontos A e B aB (5.7) aA Pode-se concluir a partir de (5.6) e (5.7) que todos os pontos de um corpo rígido em translação possuem velocidades iguais e acelerações iguais em cada instante. Este resultado permite utilizar todas as equações desenvolvidas na cinemática e dinâmica da partícula para corpos rígidos em translação. Podemos afirmar que as equações da mecânica da partícula e do corpo rígido em translação são as mesmas. 5.3 M OVIMENTO PLANO DE R OTAÇÃO EM T ORNO DE UM E IXO FIXO Vamos considerar o eixo fixo do movimento de rotação plana aqui estudado paralelo ao eixo z do sistema de referência utilizado, passando por um ponto A. Inicialmente vamos definir grandezas angulares deste movimento. Pontos não têm movimento de rotação, mas para linhas este movimento pode ser definido. y B(t´) B(t) A x Figura 5.4 - Movimento angular do segmento AB. Assim, chama-se velocidade angular média de uma linha AB, num intervalo de tempo t=t´-t ao quociente 46 m (5.8) t Passando ao limite (5.8), obtém a velocidade angular instantânea dada por d dt (5.9) Derivando (5.9), obtemos a aceleração angular dada por d dt d2 dt 2 (5.10) No movimento plano de rotação de corpos rígidos todos os segmentos de reta, paralelos ao plano de referência, desenvolvem movimentos angulares iguais. Assim, as velocidades angulares de todos os segmentos do corpo rígido são iguais. Portanto, a velocidade angular é uma característica do corpo rígido ou parâmetro do movimento do corpo rígido. O mesmo vale para a aceleração angular. A velocidade angular no movimento plano de rotação pode ser definida vetorialmente, usando a regra da mão direita, da seguinte forma: ω (5.11) k onde o plano xy é o plano do movimento. Vamos calcular a velocidade de um ponto B qualquer do corpo rígido. Tomando a equação (5.2) e considerando A no eixo de rotação, temos que vB v A vB / A vB / A (5.12) No movimento plano de rotação o ponto B realiza uma trajetória circular em torno do eixo fixo z’, paralelo a z, que passa por A no plano do movimento de xy. Portanto, da cinemática da partícula, obtemos: 47 vB / A onde r ds dt d ( r) dt d r dt (5.13) r rB / A é raio da trajetória circular de B. Vetorialmente, o mesmo resultado poderia ser obtido através do produto vetorial: ω rB / A vB vB / A ω k rB / A r uB / A (5.14) onde e portanto vB vB / A ω rB / A r ut z’ A ut rB/A B x’ y’ ur rB/P P Figura 5.5 - Movimento circular do ponto B de um corpo rígido. Observe, a partir da figura 5.5, que para qualquer ponto P pertencente ao eixo de rotação do movimento, tem-se vB ω rB / A ω rB / P (5.15) Sendo o movimento de B circular os módulos de sua aceleração tangencial e da normal são dados, respectivamente, por 48 aBt d 2s dt 2 aBn v2 r d 2 ( r) dt 2 d r dt (5.16) r e 2 2 r r 2 (5.17) r Vetorialmente, obtemos a aceleração derivando no tempo a equação (5.14) aB aB / A drB / A dω rB / A ω dt dt aB aB / A α rB / A ω vB / A ω k α k rB / A r uB / A (5.18) ou α rB / A ω ( rB / A ) (5.19) Sendo r un obtêm-se as acelerações tangencial e normal de B, respectivamente, a Bt α rB / A aB n ω (ω rB / A ) r ut (5.20) e 5.4 2 r uB / A 2 r un (5.21) M OVIMENTO PLANO DE UM C ORPO R ÍGIDO O movimento plano geral pode ser decomposto em dois movimentos, sendo um de translação e outro de rotação. Vamos tomar o ponto A como referência e seja B outro ponto qualquer do corpo rígido. A relação entre as posições r A e r B desses dois pontos do corpo rígido é dada por rB rA rB / A (5.22) A figura 5.6 mostra estes vetores, o referencial fixo xy e o móvel x’y’, preso em A mantendo-se em qualquer instante paralelo ao referencial fixo. 49 y´ y B rB/A C x´ rB A rA x Figura 5.6 - Vetores posição dos pontos A e B. Derivando a (5.22) podemos relacionar as velocidades entre os pontos A e B vB onde v B / A (5.23) v A vB / A v B v A corresponde velocidade relativa de B em relação a A. Aqui vale também a observação feita anteriormente, uma vez que a velocidade v B/A é de fato a velocidade de B em relação ao referencial móvel x´y´. Vamos analisar a derivada do vetor posição relativa. Seja vB / A drB / A dt (5.24) O movimento de B neste referencial x´y´ é circular. Conforme mostrado no item anterior, (5.24) resulta igual a vB / A drB / A dt ω rB / A (5.25) Portanto, a relação entre as velocidades de A e B dada por (5.23) é igual a vB v A ω rB / A (5.26) 50 Lembrando que os eixos dos referenciais são sempre paralelos, todos os vetores podem ser escritos no referencial fixo xy. Para se obter a relação entre as acelerações dos pontos A e B, derivamos a equação (5.26), ou seja, dv B dt dv A dt drB / A dω rB / A ω dt dt (5.27) A partir dos resultados obtidos no item anterior, podemos escrever aB aA α rB / A ω (ω rB / A ) (5.28) onde a B/ A t α rB / A a B/ A n ω (ω rB / A ) r vB / A vB / A é a aceleração tangencial relativa 2 r uB / A é a aceleração normal relativa Assim, é possível obter a posição, a velocidade e a aceleração de um ponto B qualquer de um corpo rígido a partir dos correspondentes vetores de um ponto A, cujo movimento seja dado. As equações (5.22), (5.26) e (5.28) expressam estas relações para um movimento plano qualquer. Podem ser aplicadas, é óbvio, para os casos particulares de translação, onde os vetores velocidade angular e aceleração angular são nulos, e de rotação em torno de um eixo fixo que passe por A, onde os vetores velocidade e aceleração deste ponto são nulos. 5.5 M OVIMENTO R ELATIVO ENTRE D OIS C ORPOS D ISTINTOS Seja um corpo rígido C que contenha um ponto A. Seja B um ponto qualquer de outro corpo rígido. A relação entre as posições r A e r B desses dois pontos dos corpos rígidos distintos é dada por rB rA rB / A (5.29) 51 A figura 5.7 mostra estes vetores e um referencial fixo XYZ e outro móvel xyz, preso ao corpo C com origem em A. Seja a velocidade angular do referencial móvel e, portanto, do corpo rígido C. Y y B x rB/A rB A rA C X Figura 5.7 - Vetores posição dos pontos A e B. Derivando a (5.29) podemos relacionar as velocidades entre os pontos A e B drB dt drA dt drB / A dt (5.30) Nesta igualdade nós temos que: drB dt v B é a velocidade do ponto B drA dt v A é a velocidade do ponto A que pertence ao corpo C rB / A xi y j é o vetor da posição de B no referencial xyz Portanto, podemos escrever a equação (5.30) como vB vA d (x i dt y j) (5.31) 52 Como B se move em relação ao corpo C e, portanto, em relação ao referencial móvel xyz, a equação (5.31) é igual a vB vA x di dt y dj dt dx i dt dy j dt (5.32) Vamos analisar as derivadas dos vetores unitários i e j. Estes vetores possuem módulo unitário, mas tem a mesma velocidade angular do corpo rígido C. Assim podemos escrever: di dt lim t 0 i t (5.33) A figura 5.8 ilustra a obtenção do vetor i para um intervalo de tempo t. Consideremos que neste intervalo de tempo a variação angular em torno do eixo x seja dada por . Então di dt lim t 0 i lim t t 0 lim t i Ω lim 0 i 0 (5.34) Y i i(t+ t) i(t) X Figura 5.8 - Vetor unitário i nos instantes t e t+ t. Da figura 5.8, temos que lim i 0 2 sin lim 0 2 i i j (5.35) 53 Logo di dt Ω i j (5.36) De forma análoga pode-se obter dj dt i Ω j (5.37) Aplicando os resultados obtidos em (5.36) e (5.37) na equação (5.32) obtém-se vB vA x (Ω i) vB vA Ω ( xi y (Ω j) dx i dt dy j dt (5.38) ou yj ) dx i dt dy j dt (5.39) Finalmente, observando que as duas últimas parcelas de (5.39) representam a velocidade do ponto B em relação ao referencial preso ao corpo rígido C, podemos escrever vB vA Ω rB / A v B / xyz (5.40) onde se definem vA Ω rB / A v B / xyz velocidade de arraste velocidade de B relativa ao referencial móvel xyz A relação entre as acelerações pos pontos A e B pode ser obtida derivando a equação (5.40), resultando aB aA dΩ rB / A dt Ω drB / A dt dv B / xyz dt (5.41) 54 Conforme mostrado anteriormente drB / A dt Ω rB / A v B / xyz (5.42) e dv B / xyz Ω v B / xyz dt (5.43) a B / xyz Substituindo (5.42) e (5.43) em (5.41), obtemos aB dΩ rB / A dt aA Ω ( Ω rB / A ) 2 Ω vB / xyz aB / xyz (5.44) onde se definem aA dΩ rB / A dt 2 Ω v B / xyz a B / xyz Ω ( Ω rB / A ) aceleração de arraste aceleração de Coriolis ou complementar aceleração de B relativa ao referencial móvel a xyz Portanto, as equações (5.40) e (5.44) relacionam as velocidades e as acelerações de dois pontos A e B, pertencentes a corpos rígidos distintos. Embora tenham sido deduzidas para o movimento plano, se aplicam igualment e para movimentos espaciais.