Metabolismo e Endocrinologia Obesidade

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Metabolismo e Endocrinologia
Teórica: Seminário
Tema: Obesidade
Data: 13.04.2011
Obesidade
Avaliação da Obesidade
A classificação atual para a obesidade vem da
Organização Mundial de Saúde (OMS) e baseia-se no
Índice de Massa Corporal (IMC).
Esta classificação é extremamente objetiva e simples de
efetuar, e há uma correlação relativamente forte entre
obesidade e problemas, nomeadamente do foro
cardiovascular. Contudo, indivíduos com um elevado IMC
não são necessariamente obesos, como aqueles que
possuem uma grande massa muscular.
Ilustração 1 - Classificação, segundo o
IMC, pela OMS.
Existem outras formas de “medir” a obesidade:
Medir o perímetro abdominal, que avalia a gordura visceral;
Bio impedância – a gordura é mais isolante que o músculo, pelo que aparelhos que
façam uma medição da impedância interpretam as medições de impedância e do peso
e inferem acerca da obesidade. A percentagem normal de gordura no corpo é de
cerca de 30%, embora as mulheres apresentem um valor ligeiramente superior ao dos
homens;
Medição da hemoglobina glicosilada – o eritrócito tem um período de vida de cerca
de 3 meses. Se, nesses 3 meses, existir muita glicose em circulação, a glicose reage
com os resíduos de lisina e arginina da hemoglobina, glicosilando-os.
Teorias sobre o controlo da massa corporal
Existem 3 formas para o organismo lidar com uma componente calórica excessiva na dieta:
Conversão do excesso calórico em lípidos e, consequente, armazenamento nos
adipócitos;
Gasto do excesso através de exercício físico adicional;
Gasto do excesso por termogénese, através do desacoplamento mitocondrial.
1
Ilustração 2 - Efeito do excesso de peso ou défice de peso no metabolismo.
Nos anos 40 a 50 surgiram 3 teorias que procuravam explicar como ocorria a manutenção da
massa corporal:
Teoria
Ano em que
surgiu
Autor da Teoria
Em que consiste
a teoria
Teoria Termoestática
Teoria Glicoestática
Teoria Lipoestática
1948
1953
1953
Brobeck
Os animais comem de
modo a manter uma
temperatura corporal
constante. Sempre que
é necessário produzir
mais calor, o animal
come mais, sendo o
contrário igualmente
válido.
Mayer
Kennedy
As
reservas
energéticas sob a
forma de gorduras
A glicémia regula a
armazenadas regulam
alimentação por um
de algum modo o SNC
mecanismo
de
de forma a controlar a
retroação.
homeostase
energética de longa
duração.
Leptina
Os efeitos da leptina foram estudados através de experiências de parabiose. Nestas
experiências foram utilizados modelos com dois ratos, ligados cirurgicamente de modo a que
houvesse uma circulação conjunta de ambos, ou seja, que o sangue que circulasse num
também circulasse no outro.
Uma das experiências que estabeleceram os efeitos da leptina envolvia dois ratos em que a
produção de leptina estava ausente. A um dos ratos foi posteriormente administrada leptina
e ao outro não. O rato administrado com leptina estabelece as propriedades normais
fisiológicas, enquanto o rato em que não foi administrada leptina tem um apetite
descontrolado, que leva à obesidade, uma incapacidade de manter a temperatura corporal e
incapacidade de se reproduzir (Ilustração 3).
2
Foi explicado o surgimento e a relação destes
acontecimentos com a leptina. A leptina é produzida
no adipócito. Um aumento no tamanho do adipócito e
no número de adipócitos está associado a um
aumento de peso, o que vai levar a um aumento da
produção de leptina. Esta vai atuar no hipotálamo,
diminuindo o consumo alimentar e aumentando o
Ilustração 3 - Efeitos da leptina administrada
a animais sem produção dessa substância.
Ao rato da direita foi administrada leptina,
enquanto ao rato da esquerda nada foi
administrado.
gasto de energia (mensagem de comer menos e
metabolizar mais). Uma diminuição do tamanho dos
adipócitos leva a uma diminuição da produção de
leptina e trará a mensagem contrária.
Ilustração 4 - Efeito da massa corporal na produção de leptina e consequente mensagem produzida pelo
hipotálamo.
Para além da mensagem contrária em termos de consumo alimentar, controlo da temperatura
e gasto de energia, há também uma diminuição das funções reprodutivas. Isto porque
evolutivamente um animal com as reservas lipídicas baixas está associado a períodos de
fome. Estando num período de fome, numa altura do ano ou num ecossistema em que não há
comida suficiente, não fará sentido ou não será evolutivamente vantajoso haver reprodução
nesta situação. O adipócito acaba por, com a produção de leptina, causar uma ação ao nível
do próprio adipócito, mas mediada pelo hipotálamo, ação esta em que a hormona envolvida é
a norepinefrina, que vai aumentar a produção de termogenina e doutras UCP (Proteínas
Desacopladoras), de modo a desacoplar a cadeia transportadora de electrões da produção de
ATP e levar à dissipação/gasto das reservas lipídicas sobre a forma de calor. Este gasto lipídico
não está associado a uma necessidade de produção de calor, mas sim a uma necessidade de
diminuir a massa corporal.
3
Ilustração 5 - Efeito conjunto da leptina e norepinefrina.
Ilustração 6 - Cascata de sinalização da leptina.
4
Numa experiência de parabiose, recorreu-se a dois ratos com genótipos associados a alguma
deficiência na leptina ou no seu mecanismo de ação. O rato ob, que é obeso, foi ligado
cirurgicamente a um rato normal. Observou-se, ao fim de algum tempo, que o rato ob tinha
uma diminuição de massa corporal que continuava até ter a mesma dimensão e massa
corporal que o rato saudável. Em contrapartida, quando se fez a mesma experiência com um
rato com outra mutação que se chama db, não havia a diminuição da massa corporal do rato
obeso, mas sim do rato normal, levando mesmo à sua morte (Ilustração.6).
Ilustração 7 - Experiência de parabiose.
Com base nestes resultados concluiu-se que:
O genótipo ob é responsável pela ausência de produção de leptina. Um rato sem
leptina tem um aumento da massa corporal e torna-se obeso pela falta dessa
substância. Ao ligar-se ao rato normal, este fornece-lhe leptina, o que faz diminuir a
sua própria massa corporal, sem alterar a massa do rato normal.
O genótipo db apresenta uma deficiência do recetor da leptina, o que provoca
obesidade no respetivo rato. Os níveis de leptina em circulação são elevados devido à
produção pelos adipócitos e incapacidade da ligação da leptina ao respetivo recetor,
originando uma resposta nula à substância em circulação. O rato normal passa então a
ter níveis excessivos de leptina e, ao contrário do rato com a deficiência, consegue
responder a esses níveis e acaba por perder massa corporal em demasia, o que pode
levar à sua morte.
Ligando o rato ob e o rato db verifica-se que o rato db não sofre qualquer alteração
mas o rato ob diminui de massa corporal pois o db produz elevados níveis de leptina
que conseguem atuar no rato ob.
Estas experiências esclareceram o funcionamento da leptina e dos processos orexigénicos
(que despertam o apetite), anorexigénicos (que induzem a perda de apetite), adipogénicos
(que estimulam a acumulação de lípidos nos adipócitos) e adipostáticos (que diminuem a
quantidade de lípidos acumulados nos adipócitos).
5
Outras Hormonas Envolvidas no Mecanismo Fisiológico de Regulação da
Massa Corporal
Posteriormente à leptina foram descobertas outras substâncias importantes na regulação da
massa corporal:
Hormona
Ano da
Descoberta
Origem da
palavra
Processo de
Formação
Local de
Formação
Estímulo de
Formação/
Libertação
Estímulo de
Inibição da
Produção
Efeitos
Classificação
Observações
Grelina
Obestetina
1999
2005
“Ghre” – palavra de origem europeia;
“Ghr” – Growth Hormone Release
A grelina é sintetizada como uma pré-pró-hormona e a parte que é clivada
(terminal carboxilo) para a libertação da grelina ativa (é ativa após acilação)
origina a obestatina.
Estômago, células épsilon do pâncreas e
Estômago, células do intestino
hipotálamo
Esvaziamento gástrico;
Há picos de libertação associados às horas
normais das refeições (quando o estômago
está vazio, imediatamente antes das
refeições), que vão conduzir à sensação de
fome e preparar o processo digestivo.
Estômago cheio (induz também a sensação
de saciedade)
Aumenta a produção da hormona do
crescimento;
Provoca sensação de fome;
Estimula a produção de ácido pelo
estômago;
Estimula o crescimento celular normal da
mucosa do estômago, intestino e cólon;
Induz a produção de pepsina.
Orexigénica e Adipogénica
Existe complementaridade de ações entre a
grelina e a leptina, e ainda entre a insulina.
O péptido Y3-36 produzido no cólon vai
atuar ao nível dos neurónios orexigénicos,
mas inibindo a produção de neuropéptido Y,
em vez de ativar, como acontece com a
grelina.
-
Potencial redução do apetite;
Anorexigénica
Os
direitos
comerciais
pertencem
à
Johnson&Johnson que tem
ensaios clínicos com vista à
potencial utilização para o
tratamento da obesidade.
6
Ilustração 8 - Picos de libertação da grelina.
Ilustração 9 - Mecanismo de atuação da grelina.
Hormona
Ano da
Descoberta
Processo de
Formação
Local de
Formação
Processo de
Atuação
Adiponectina
Nesfatina-1
1996
2006
-
Produz-se via
PPAR
Adipócito
Hipotálamo
A adiponectina liga-se a um recetor de membrana que vai
aumentar o AMP intracelular e é ele que vai ativar esta
AMPK. Esta cinase será a responsável pelas diferentes
funções metabólicas.
-
7
Efeitos
Condiciona o metabolismo lipídico, através da ação da
AMPK na Acetil-CoA carboxilase. A AMPK vai, ao ser
ativada pela adiponectina através do aumento da
concentração de AMP, fosforilar e, consequentemente,
inativar a Acetil-CoA carboxilase, que promove a formação
de um malonil-CoA a partir da carboxilação da acetil-CoA,
sendo o malonil-CoA o precursor da síntese de ácidos
gordos que fica assim diminuída;
Aumento da β-oxidação;
Outros efeitos descritos na tabela seguinte.
Classificação
Adipogénica
Anorexigénica e
Adipostática
Observações
É uma proteína de 200 aminoácidos (maior que a maioria
das hormonas).
Outra particularidade reside no seu complexo processo de
oligomerização, relacionado com o seu mecanismo de
ação, embora não se saiba ao certo a forma que contribui
mais para a atividade biológica e se é só uma das várias
formas que pode assumir. Poderá ser um monómero da
adiponectina; os monómeros podem associar-se em
trímeros por ligações não covalentes, e cada um destes
trímeros pode associar-se em hexameros por pontes
dissulfito; pode ainda formar oligómeros de maior número
por associação destes hexameros.
-
Diminui
o
apetite;
Diminui
a
produção
de
tecido adiposo.
Os principais efeitos da adiponectina são:
Ao nível do músculo
Ao nível do fígado
Ao nível do coração
Aumento do uptake de glicose (por ativação
da GLUT-4);
Aumento da β-oxidação (conforme descrito
anteriormente);
Diminuição da síntese de glicogénio;
Aumento da entrada de ácidos gordos.
Diminuição da expressão fosfoenol piruvato
carboxicinase e da glicose-6-fosfatase. Estas
são enzimas-chave na gliconeogénese. São
duas das enzimas que são reguladas e a
diminuição da sua expressão resulta na
diminuição da produção de glicose através da
gliconeogénese;
Diminuição da entrada de ácidos gordos e
do conteúdo em triacilgliceróis.
Os efeitos são naturalmente semelhantes aos
do músculo (aumento da entrada de glicose,
aumento da entrada de ácidos gordos e
aumento da β-oxidação).
8
Ilustração 10 - Formas da adiponectina.
O catabolismo e o anabolismo lipídicos estão compartimentalizados celularmente. A
degradação pela β-oxidação ocorre na matriz mitocondrial, enquanto a síntese de ácidos
gordos ocorre no citosol. A entrada (ou não) de ácidos gordos para a matriz mitocondrial vai
ser dependente dos níveis de malonil-coA. Com o seu aumento, haverá uma promoção da
síntese de ácidos gordos e uma inibição da entrada de ácidos gordos para a mitocôndria com
consequente diminuição da β-oxidação. Esta entrada é mediada pela carnitina aciltransferase I.
Ao haver a inibição da acetil-CoA carboxilase pela adiponectina há uma inibição da produção
de malonil-coA, com o consequente levantamento da inibição da entrada dos ácidos gordos
para a matriz mitocôndrial ocorrendo assim um aumento da β-oxidação e diminuição da
síntese de ácidos gordos.
Ilustração 11 - Inibição da Acetil-CoA Carboxilase (ACC) pela adiponectina.
9
Adiponectina, Obesidade e Diabetes Tipo II
Muitos estudos têm relacionado a adiponectina com a obesidade e a diabetes tipo 2. A ligação
frequente entre estas duas últimas situações pode em grande parte resultar do envolvimento
da adiponectina nos dois processos. Alguns dos estudos que apontam neste sentido
demonstram que os indivíduos obesos ou com diabetes tipo 2 têm níveis menores de
adiponectina. Portanto, na obesidade há um aumento da produção de leptina, devido ao
aumento dos adipócitos, e uma diminuição simultânea da produção de adiponectina. Estas
duas hormonas adipocitárias têm controlos de produção diferentes.
Demonstrou-se também que:
Ratos com alteração no gene da adiponectina têm uma menor resposta à insulina;
Medicamentos para o tratamento da diabetes tipo 2 aumentam a expressão de
adiponectina;
O exercício físico ajuda na prevenção da obesidade e da diabetes tipo 2, ativando
também a AMPK e a resposta à insulina.
Peroxisome Proliferator-Activated Receptors (PPAR)
Os PPAR são recetores nucleares que respondem a alterações da ingestão de lípidos. Os seus
ligandos fisiológicos são lípidos ou derivados de ácidos gordos, como os leucotrienos,
prostaglandinas, etc. Vão resultar na expressão de genes-chave para os metabolismos lipídico
e glicídico. Existem vários tipos deste recetor:
PPARα – primeiro a ser conhecido; ativa a β-oxidação e cetogénese nos hepatócitos;
PPARγ – o mais estudado até à atualidade; é expresso no fígado e tecido adiposo e
ativa a diferenciação de fibroblastos em adipócitos; leva à formação de novos
adipócitos; aumenta a síntese de lípidos e o seu armazenamento em adipócitos.
PPARδ/ PPARβ – no qual se deposita a maior esperança para o tratamento da
obesidade; atua no fígado e no músculo e ativa a transcrição de proteínas da βoxidação e a expressão de proteínas desacopladoras. Induz a termogénese, de modo
que ratos com uma ativação permanente deste PPAR não se tornam obesos ou
diabéticos, mesmo com deficiências no recetor da leptina ou com uma dieta
excessivamente lipídica. Se essa deficiência se associar a uma ativação permanente do
PPAR, esses ratos não ficam diabéticos uma vez que a ativação deste PPAR é suficiente
para contrabalançar essa deficiência na leptina. A PPARβ era conhecida em xenopus,
uma espécie de sapos utilizado em experimentação animal. Mais tarde comprovou-se
que PPARβ e δ eram o mesmo. Em artigos δ e β surgem um pouco indefinidos, sendo
que nos EUA não se usa a designação β, enquanto que na Europa aparecem as duas.
10
O mecanismo de transdução de sinal destes recetores envolve uma molécula denominada RXR
(Retinoid X Receptor) (Ilustração 12). Os PPAR são recetores existentes no citosol, sendo que a
ligação de um ligando,
fisiológico ou exógeno
(como um medicamento
para o tratamento da
obesidade),
leva
à
formação
de
um
heterodímero com um
RXR,
exatamente
da
mesma
forma
como
acontece para T3 e para a
vitamina D, o que resulta
na sua entrada para o
núcleo,
ligação
a
elementos de resposta
culminando na expressão
de diferentes genes.
Ilustração 12 - Mecanismo de transdução de sinal do PPARγ.
A ativação da PPARγ levará a um aumento da resposta à insulina. Tem-se uma diminuição da
gordura (adiposidade visceral) e um aumento da libertação de fatores que sensibilizam o
tecido para a resposta à insulina – contrariam a diabetes tipo 2 – e a diminuição da expressão,
ou da ação, de elementos de resistência à insulina.
Obesidade Visceral
As células adiposas produzem mediadores que regulam aspetos associados tanto à diabetes,
como à resistência à ação da insulina nos órgãos metabólicos, como ainda aos efeitos
cardiovasculares e inflamatórios. Esta regulação é especialmente importante no contexto de
obesidade visceral, cujo padrão é mais típico de patologia cardiovascular, essencialmente
quando a nível dos epíploons. Por obesidade visceral entende-se intra-abdominal e em
grande quantidade; obesidade em forma de pera com dilatação do abdómen muito marcada.
É o facto de haver essa
obesidade visceral que induz
todo este tipo de respostas,
destacando-se o facto de haver
diabetes
(começa
essencialmente
com
intolerância à glicose) mesmo
que a pessoa não tenha a
doença à partida, patologia
cardiovascular,
doença
inflamatória, fenótipo prótrombótico
e
disfunção
Ilustração 13 - Respostas induzidas pela obesidade visceral.
endotelial (Ilustração 13).
11
A razão pela qual a obesidade visceral induz todas estas respostas deve-se à localização das
células endoteliais. A vascularização dos epíploons é feita a partir das artérias mesentéricas e
a drenagem venosa a partir das veias mesentéricas e sistema porta. Isto significa que,
enquanto todas as outras células adiposas do organismo produzem mediadores (destaque
para a leptina e para a adiponectina) que se diluem na circulação sistémica, todos os produtos
produzidos a nível da célula adiposa na circulação mesentérica vão ser concentrados a nível
da circulação porta hepática e vão atuar sobre o fígado a uma concentração muito superior
ou muito inferior daquela que estará subjacente à circulação sistémica, com destaque para os
mediadores metabólicos, os mediadores pró-inflamatórios, hormonais e também a leptina.
Tudo isto vai induzir uma situação de alteração dos padrões metabólicos da célula hepática,
conjuntamente com os efeitos sistémicos que também ocorrem, ocorrendo resistência à ação
da insulina, diabetes tipo 2, um padrão pró-inflamatório (marcado pelas proteína de fase
aguda produzidas a nível no fígado, como a PCR) e patologia cardiovascular associada à
hipertensão, à alteração/disfunção endotelial e à disfunção pró-trombótica.
Em termos práticos representa risco de doença cardiovascular, com administração de aspirina,
controlo da pressão arterial, monitorização e controlo dos níveis de colesterol, tal como da
diabetes, com dieta e exercício físico. Isto representa também as linhas gerais de um
tratamento da obesidade, que incluem um conjunto de vias terapêuticas farmacológicas ou
não, sendo as de maior importância as não farmacológicas, que vão ser modeladas pelo IMC.
A terapia seguida depende da gravidade da obesidade:
No excesso de peso normalmente não se realiza uma grande terapêutica em termos
de intensidade, exceto se houver comorbilidades (outra doença; fatores de risco que
existam simultaneamente e que possam agravar o prognóstico desta doença). Assim,
em termos da obesidade, se uma pessoa já tiver à partida uma patologia
cardiovascular, por exemplo, insuficiência cardíaca, e se tiver diabetes, patologia prótrombótica, ou hipertensão, são fatores de risco que podem agravar o prognóstico da
obesidade e vice-versa.
A partir de um certo excesso de peso começa-se a atuar se houver comorbilidades,
mas normalmente atua-se só com dieta, exercício e psicoterapias.
A partir de obesidade pode começar a intervir-se em termos farmacológicos.
Em casos de obesidade excessiva e mórbida, pode avançar-se para terapêuticas
cirúrgicas. A obesidade agrava as cormobilidades o que representa um fator de
grande importância. Além destas existem também as complicações metabólicas da
obesidade.
Tratamento da Obesidade
Ao aparecer um doente com obesidade deve ser seguido um determinado algoritmo. Tentar
inicialmente pensar “o que será esta obesidade?”, uma vez que esta não é apenas resultante
de um excesso de ingestão de alimentos. A obesidade tem outras causas:
Em termos endócrinos pode haver uma alteração da função tiroideia, como
hipotiroidismo, e ser algo muito simples de tratar;
No hipercortisolismo, ou doença de Cushing, a obesidade tem determinados padrões
específicos;
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Um obeso que está constantemente a alimentar-se por necessidade, caso contrário faz
hipoglicémias, pode ter um insulinoma, ou seja, um tumor das células β dos ilhéus de
Langerhans, que o leva a produzir excessivas quantidades de insulina, pelo que está
constantemente em hipoglicémia. Tem, portanto de haver uma constante ingestão de
glícidos para fazer a compensação.
Importa também fazer a diferenciação com outras patologias não endócrinas. Por exemplo,
um indivíduo com insuficiência cardíaca, com edema generalizado, tem um aumento do
volume, mas não é obeso. Um indivíduo com cirrose hepática pode aparecer com ascite, com
um aumento de volume abdominal, mas também não é obeso.
Na árvore de decisão, importa salientar as medições do IMC e das circunferências. A avaliação
destas medições objetivas conjugada com os já referidos fatores de risco permite uma tomada
de decisão em relação a se é suficiente uma abordagem baseada em psicoterapia, dieta e
exercício ou se serão necessárias medidas farmacológicas.
Abordagens para o tratamento da obesidade:
Dieta
Exercício
Físico
Cirurgia
Evitar lípidos como ácidos gordos. O fígado sintetiza ácidos gordos e
colesterol, exportados sob a forma de lipoproteínas VLDL, a partir de acetilCoA, proveniente da glicose absorvida. Estas lipoproteínas, em conjunto com a
própria glicose que pode originar ácidos gordos e TAG, são fornecidas ao
tecido adiposo periférico, aumentando-o.
A ingestão de proteínas deve ser também controlada para que não ocorra a
intoxicação do organismo com compostos azotados.
O pequeno-almoço deve ser composto por uma boa qualidade nutricional,
rica em nutrientes de consumo longo, que seja cerca de 20 a 35% do aporte
calórico diário. Devem evitar-se refeições demasiado abundantes, visto que
estas induzem uma maior deposição de lípidos. O ideal é fazer 7 refeições por
dia, com um controlo de quantidade por cada refeição, para evitar a
deposição de reservas lipídicas e menos picos de glicémia.
O indicado é um exercício aeróbio, de baixa intensidade e de longa duração,
que dê tempo ao organismo para começar a mobilizar ácidos gordos de forma
a consumir as reservas lipídicas em vez de consumir glicose via anaeróbia. Por
outro lado, não se pretende uma grande intensidade, porque são pessoas com
excesso de peso e pode ser induzido o aparecimento de problemas
cardiovasculares agudos nestas situações.
Se não for possível mudar os hábitos, a manutenção do exercício funcionando
de forma preventiva relativamente à obesidade.
A colocação de uma banda gástrica altera os padrões de produção de
péptidos como a grelina e o péptido Y e é feita via laporoscópica. São
realizados dois ou três orifícios e depois o controlo é feito por fibra óptica. O
antro é suturado ao esfíncter esofágico superior, para aumentar a capacidade
de retenção, e coloca-se uma banda em que se aumenta gradualmente o nível
de constrição, para diminuir a capacidade de retenção de alimentos no
estômago.
A técnica Y de Roux consiste em fazer um bypass que liga diretamente a saída
13
Farmacologia
do esófago ao jejuno. Os alimentos entram pelo estômago, mas vão
diretamente para o jejuno. Exige uma cirurgia mais invasiva que a banda
gástrica mas funciona porque evita absorções ao nível do duodeno.
Existem fármacos para diabetes como a acarbose (com efeitos adversos como
flatulências e diarreis osmóticas) que inibem a absorção de glicose a nível do
tubo digestivo. A glicose é metabolizada pelas bactérias do tubo digestivo e
depois excretada.
O xenical inibe a lípase pancreática e impede a metabolização dos
triacilgliceróis, não ocorrendo a sua absorção na mucosa intestinal. São
eliminados pelas fezes, originando uma esteatorreia (diarreia rica em lípidos).
As anfetaminas têm como efeito secundário a perda de apetite.
Existem fármacos que fazem o bloqueio dos recetores canabinóides do tipo 1
para diminuir o peso. A atuação nestes recetores é explicada mais
detalhadamente em seguida
Ilustração 14 - Abordagens cirúrgicas ao tratamento da obesidade.
Recetores Canabinóides
O organismo tem sistemas neuronais e não neuronais em que o transmissor são canabinóides
endógenos, e que um dos seus efeitos é a interferência significativa nos mecanismos de
saciedade e fome. A ativação dos recetores canabinóides, nomeadamente do recetor tipo 1,
vai induzir um conjunto de efeitos variados:
Aumento da fome e do aporte de comida a nível central (food motivation);
Aumento da entrada de alimentos a nível gastro-intestinal;
Aumento da lipogénese hepática;
Aumento da diferenciação e crescimento dos adipócitos;
Diminuição do consumo de energia para produção de calor e da β-oxidação;
Diminuição da produção de adiponectina;
Aumento da resistência à ação da insulina no pâncreas endócrino;
Diminuição do consumo de energia a nível muscular.
14
O estímulo endógeno ou exógeno dos recetores canabinóides vai induzir um aumento de
peso, sendo a sua inibição um alvo de ação farmacológica. O bloqueio dos recetores
canabinóides do tipo 1 levaria à melhoria do peso, nomeadamente no que diz respeito às
células adiposas viscerais, à melhoria dos padrões de dislipidémias, à melhoria do padrão de
resistência à insulina assim como à melhoria do metabolismo glicídico. Um dos efeitos
adversos desta terapia é a depressão.
Terapêuticas Erradas
Se há um aumento do peso, há também um aumento do consumo de energia, um aumento
das hormonas tiroideias e do tónus simpático. Se há peso baixo, diminui o consumo basal de
energia, não esquecendo os efeitos da leptina no controlo do peso: o controlo excessivo pode
alterar os padrões de produção de leptina, contrabalançando esse mesmo controlo.
Algumas cápsulas receitadas que realmente fazem emagrecer, podem ser verdadeiros cocktails
de:
Hormonas tiroideias – consomem energia;
Extratos de Hipófise – contribuem para a síntese de mais hormonas tiroideias a partir
da TSH;
Anfetaminas – diminuem o apetite;
Diuréticos – ajudam a perder água.
Uma dieta excessiva vai também levar à perda de 2/3 kg nos primeiros dias. O efeito dá-se
essencialmente no músculo, sendo o peso perdido em água. Como a proteína muscular é
hidrofílica e acumula muita água, ao contrário dos lípidos que são hidrofóbicos, a sua
degradação para a produção de substratos gliconeogénicos para o fígado leva à perda de água
pela urina e à ilusão de perda de muitos quilos. Voltando a comer, a pessoa recupera-os
facilmente e até mais, já que nos dias de baixo aporte calórico as células tornaram-se
hipersensíveis à insulina, pelo que nas primeiras refeições toda a glicose tem como destino as
células adiposas que são as mais sensibilizadas à insulina.
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