Recomendações da Câmara Técnica Nacional de Medicina Baseada em Evidências do Sistema Unimed Sumário das Evidências e Recomendações para Uso de Endopróteses no Tratamento do Aneurisma da Aorta Abdominal Atualização versão 2005 Unimed Central-RS 1 Recomendações da Câmara Técnica Nacional de Medicina Baseada em Evidências do Sistema Unimed I – Elaboração Final: 27/03/2010 II – Autores: Dra Mariana Vargas Furtado, Dra Michelle Lavinsky, Dr. Fernando Wolff , Dr Jonathas Stifft, Dr. Luis Eduardo Rohde, Dra. Carisi Anne Polanczyk, Dr. Marco Aurélio Grudtner, Dr Alexandre Pagnoncelli, Dr Carlos Augusto Cardim de Oliveira, Dra Claudia Regina de O. Cantanheda, Dr Jurimar Alonso, Dr Luiz Henrique P. Furlan, Dra Silvana M Bruschi Kelles. III – Previsão de Revisão: ___ / ___ / _____ IV – Tema: Uso de endopróteses no tratamento do aneurisma da aorta abdominal V – Especialidade Envolvida: Cirurgia vascular, Radiologia intervencionista VI – Questão Clínica: Há evidências de benefício clínico associado ao emprego de endopróteses no tratamento do aneurisma da aorta abdominal quando comparado ao reparo por cirurgia aberta? VII – Enfoque: Tratamento VIII – Introdução: Aneurismas da aorta abdominal (AAA) são definidos como dilatações focais e permanentes maiores do que 3 cm ou 1,5 vezes o diâmetro normal da artéria. A etiologia mais frequente é a doença degenerativa, tendo, portanto, prevalência crescente com a idade. Os fatores de risco como sexo masculino, tabagismo, hipertensão, diabetes e hiperlipidemia estão associados à doença.1-3 A exata prevalência é desconhecida, na medida em que grande parte dos casos de AAA é assintomática. Estudos de rastreamento, incluindo um estudo realizado em Porto Alegre, estimam que 1,7 à 6% dos homens com mais de 60 anos podem ser afetados 4-6 . O segmento da aorta mais acometido por aneurismas é o infra-renal, 2 Recomendações da Câmara Técnica Nacional de Medicina Baseada em Evidências do Sistema Unimed totalizando entre 90-95% dos casos. Aneurismas localizados na aorta abdominal supra-renal são por definição considerados tóraco-abdominais, de grande complexidade e elevada morbi-mortalidade cirúrgica associada 7. A história natural do AAA é a sua progressiva deterioração estrutural e consequente aumento de tamanho. A maior complicação relacionada ao AAA é a ruptura, com mortalidade entre 75 e 90% 1,3 , sendo o risco de ruptura proporcional ao diâmetro máximo do aneurisma. São observadas taxas anuais de ruptura de 12% para lesões de até 4-4,9cm, 11% para lesões de 5-5,9 cm e 25-50% para maiores de 6cm 3,8. Aneurismas menores de 4cm tem risco de ruptura próximo de zero. Complicações menos frequentes, mas igualmente graves, incluem embolização periférica por trombos aneurismáticos, trombose aórtica e infecção 3. As recomendações atuais indicam a correção do AAA com diâmetro maior ou igual a 5,5cm, ou maiores ou iguais a 4,5cm e que tenham aumentado mais de 0,5cm nos últimos 6 meses 2,9 . Aneurismas sintomáticos, aneurismas em pacientes jovens e mulheres, ambos sem co-morbidades, podem ser considerados cirúrgicos mais precocemente.9 Aneurisma com suspeita de ruptura deve ser encaminhado para tratamento emergencial. A correção endovascular do aneurisma da aorta abdominal consiste no implante de uma endoprótese no interior do vaso com o objetivo de excluir o aneurisma do fluxo sanguíneo, impedindo sua expansão progressiva e ruptura. As vias de acesso vascular incluem as artérias femorais ou ilíacas, através de exposição cirúrgica ou punção, uni ou bilateral. O acesso braquial percutâneo muitas vezes é necessário, tanto para controles angiográficos como alternativa técnica para cateterizaçóes seletivas durante o procedimento endovascular. As endopróteses podem ser auto expansíveis ou expansíveis com uso de balão (balão de acomodação), podendo ter forma tubular, aorto uni-ilíaca ou, mais comumente, aorto bi-ilíaca. Portanto, as endopróteses podem ser retas ou bifurcadas. As endopróteses bifurcadas mais freqüentemente são modulares, ou seja, compostas de duas partes: o chamado módulo ou corpo principal, contendo o corpo e uma “perna” longa e o encaixe para o módulo da segunda ”perna” contra-lateral. As endopróteses retas (aorto uni-iliacas) são associadas ao uso de 3 Recomendações da Câmara Técnica Nacional de Medicina Baseada em Evidências do Sistema Unimed stent oclusor no eixo ilíaco contra-lateral, além do bypass ilíaco-femoral ou femoro-femoro cruzado, para manutenção da perfusão do membro contra-lateral. Independentemente do tipo da endoprótese utilizada, podem ser necessários extensões ou “cuffs” proximais. Dependendo da extensão e curvatura do aneurisma e das ilíacas, bem como do nível de fixação distal desejado, a utilização de extensões adicionais para a artéria ilíaca externa ou mesmo a embolização da artéria hipogátrica uni ou bilateral pode ser uma medida adjunta necessária no trans-operatório10,11. Marcações radiopacas na endoprótese e no introdutor da endoprótese permitem seu posicionamento por orientação fluoroscópica, geralmente com uso associado de contraste endovenoso. A técnica vem sendo usada como alternativa ao tratamento cirúrgico tradicional (laparotomia), especialmente em pacientes com risco cirúrgico elevado. Seu principal uso vem sendo em correções eletivas do AAA, porém o uso em aneurismas sintomáticos e rotos também já foi descrito. Previamente a realização do procedimento endovascular é necessário o estudo detalhado da anatomia vascular do segmento aorto-ilíaco através de tomografia, angiotomografia ou arteriografia, para decisão quanto a possibilidade de tratamento, tipo e tamanho da endoprótese que será utilizada. 1,2 É fundamental para o planejamento terapêutico a avaliação das zonas de fixação proximal e distal e os vasos de acesso. Obviamente que o calibre do segmento ilio-femoral deve ser adequado para a navegação do sistema introdutor da endoprótese, que varia dependendo do calibre da endoprótese e da marca utilizada. Da mesma forma, se o paciente apresenta doença estenótica associada no segmento ilíaco pode ser necessário o uso de cateter-balão de angioplastia para permitir a introdução posterior da endoprótese. O colo do aneurisma infrarenal é o segmento da aorta abaixo das artérias renais e acima da região mais proximal do aneurisma. A anatomia desfavorável nesta região é a principal causa de contra-indicação ao tratamento endovascular 12. Os critérios anatômicos atuais de elegibilidade para o tratamento endovascular do AAA incluem: colo proximal com extensão maior de 10-15mm, colo proximal com diâmetro menor de 33 mm e angulação menor de 65° em 4 Recomendações da Câmara Técnica Nacional de Medicina Baseada em Evidências do Sistema Unimed relação à aorta, diâmetro da artéria ilíaca entre 7 e 22 mm, ausência de tortuosidade ou de calcificação significativa da artéria ilíaca e ausência de trombo circunferencial no colo proximal do aneurisma. A presença de colo com formato cônico (diferença entre o diâmetro superior e o inferior maior de 3mm) e calcificação do colo maior que 2/3 da circunferência estão associados a maior chance de falha do tratamento endovascular. Apesar disso, ainda não existe um sistema de classificação universalmente aceito para definir características anatômicas preditivas de pior desfecho após o tratamento endovascular12. A insuficiência renal pré-existente exige os cuidados rotineiros em relação ao uso de contrastes endovenosos.2,3 O melhor método de auxílio diagnóstico para definir as condições anatômicas do aneurisma é a angiotomografia da aorta. Este exame deve fornecer diversas medidas padrão que serão usadas para avaliar a adequação ou não do aneurisma ao tratamento endovascular. Rotineiramente esse exame é realizado no préoperatório, no 1º mês e 3º mês pós operatório, e, após, a cada 6 meses, por prazo não bem estabelecido. A mortalidade nas cirurgias abertas de AAA é estimada em 2-6%. As principais complicações são infecção da ferida operatória abdominal ou torácica, hemorragia e eventos cardiovasculares. Complicações menos comuns são insuficiência renal, isquemia de membros inferiores, colite isquêmica, infecção da prótese e ruptura. 1-3 As principais complicações especificamente relacionadas aos procedimentos endovasculares são os vazamentos (ou endoleaks). Nessa situação segue havendo fluxo de sangue para dentro do aneurisma, permanecendo em alguns casos o risco de crescimento do aneurisma e ruptura. Os vazamentos podem ser classificados em diferentes tipos: Tipo I: Inadequado selamento junto as zonas de fixação nos colos proximal e distal do aneurisma. Tipo II: Persistência de fluxo colateral retrógrado através de artérias viscerais (artéria mesentérica inferior, artérias lombares, hipogástricas, renais polares ou sacral-média). 5 Recomendações da Câmara Técnica Nacional de Medicina Baseada em Evidências do Sistema Unimed Tipo III: Vazamento por desconexão entre os elementos tubulares ou deterioração dos componentes da endoprótese. Este tipo de vazamento está relacionado à fadiga do material. Tipo IV: Depende da porosidade do tecido utilizado na confecção da endoprótese, sendo autolimitado. Tipo V: Vazamento de origem desconhecida. Também chamado de endotensão, sendo o diagnóstico por exclusão, ou seja, nos casos onde não existe evidência por algum método de imagem, porém o aneurisma não diminui ou aumenta de tamanho, o que sugere a manutenção da pressão dentro do saco aneurismático. Dependendo do tipo de endoleak pode ser necessária reintervenção por via endovascular, conversão para cirurgia aberta ou mesmo tratamento expectante13. Outras complicações, que também exigem frequentemente reintervenção são: a migração da endoprótese ou ruptura da mesma por “fadiga” do metal, embolização periférica, expansão do coto do aneurisma, infecção e oclusão da prótese.1-3 O objetivo dessa recomendação é revisar as evidências que comparam o reparo endovascular para o tratamento do AAA com o reparo tradicional por cirurgia aberta. IX – Metodologia: Fonte de dados: PUBMED, Biblioteca do Cochrane, National Institute for Clinical Excellence (NICE), Canadian Agency for Drugs and Technologies in Health (CADTH), Health Technology Assessment (HTA - NHS). Palavras-chaves: abdominal aortic aneurysm; Desenhos dos estudos buscados: Revisões sistemáticas e metanálises. Ensaios clínicos randomizados que não estejam contemplados nas avaliações ou metanálises identificadas anteriormente. Na ausência de 6 Recomendações da Câmara Técnica Nacional de Medicina Baseada em Evidências do Sistema Unimed ensaios clínicos randomizados, será buscada a melhor evidência disponível: estudos não-randomizados ou não-controlados. Período pesquisado: 2005 a fevereiro de 2010. Esta é uma atualização do documento aprovado em 2005 pela Unimed Central –RS. População incluída: Adultos com aneurisma da aorta abdominal com indicação de tratamento submetidos a reparo cirúrgico aberto ou endovascular. Resultados da busca bibliográfica: -Avaliações em tecnologias: localizadas atualizações de avaliações de outras instituições internacionais (NICE, NGC, HTA e de associações de especialidades médicas) -Revisões Sistemáticas: 3 novos estudos localizados. -Ensaios clínicos randomizados (ECR): 1 novo estudo localizado. 7 Recomendações da Câmara Técnica Nacional de Medicina Baseada em Evidências do Sistema Unimed O grau de recomendação tem como objetivo dar transparência às informações, estimular a busca de evidência científica de maior força e auxiliar a avaliação crítica do leitor, o responsável na tomada de decisão junto ao paciente. Nível de Evidência Científica por Tipo de Estudo - “Oxford Centre for Evidence-based Medicine” - última atualização maio de 2001 Grau de Nível de Tratamento/ Recomendação Evidência Prevenção – Etiologia 3 Diagnóstico Revisão Sistemática (com Revisão Sistemática (com homogeneidade) 1A de Ensaios Clínicos Controlados e Randomizados homogeneidade) de Estudos Diagnósticos nível 1 Critério Diagnóstico de estudos nível 1B, em diferentes centros clínicos A 1B 1C 2A Ensaio Clínico Controlado e Randomizado com Intervalo de Confiança Estreito Coorte validada, com bom padrão de referência Critério Diagnóstico testado em um único centro clínico Resultados Terapêuticos do tipo “tudo ou Sensibilidade e Especificidade nada” próximas de 100% Revisão Sistemática (com homogeneidade) de Estudos de Coorte Revisão Sistemática (com homogeneidade) de estudos diagnósticos de nível > 2 Coorte Exploratória com bom padrão de 2B Estudo de Coorte (incluindo Ensaio Clínico Randomizado de Menor Qualidade) Referência Critério Diagnóstico derivado ou validado em amostras fragmentadas ou banco de dados B Observação de Resultados Terapêuticos 2C (outcomes research) Estudo Ecológico 3A Revisão Sistemática (com homogeneidade) de Estudos Caso-Controle Revisão Sistemática (com homogeneidade) de estudos diagnósticos de nível > 3B Seleção não consecutiva de casos, ou 3B Estudo Caso-Controle padrão de referência aplicado de forma pouco consistente C 4 D 5 Relato de Casos (incluindo Coorte ou Estudo caso-controle; ou padrão de Caso-Controle de menor qualidade) referência pobre ou não independente Opinião desprovida de avaliação crítica ou baseada em matérias básicas (estudo fisiológico ou estudo com animais) 8 Recomendações da Câmara Técnica Nacional de Medicina Baseada em Evidências do Sistema Unimed X – Principais estudos encontrados: Sínteses das revisões e recomendações encontradas: ▪ NICE (NHS - Inglaterra): diretriz publicada em fevereiro de 2009 sobre uso de endopróteses para o tratamento de aneurisma da aorta abdominal. A revisão sistemática realizada pelo NICE incluiu 4 ensaios clínicos randomizados (ECRs) que compararam tratamento endovascular com cirurgia aberta em pacientes com AAA não rotos: estudo EVAR1 (n=1082), DREAM (n=351), Cuypers et al. (n=76) e Soulez et al (n=40). A maioria dos pacientes incluído nos ECRs era do sexo masculino e com idade entre 60 e 70 anos. Quando avaliado os resultados dos 4 ECRs em conjunto, a estimativa de efeito sugeriu uma redução significativa de mortalidade em 30 dias quando realizado tratamento endovascular quando comparado à cirurgia aberta: OR 0,35 (IC95% 0,19-0,63). Entretanto, quando avaliado todas as causas de mortalidade em 2 a 4 anos (estudo DREAM e EVAR1), a análise agrupada dos estudos não mostrou diferença estatística significante entre o tratamento endovascular e a cirurgia aberta. Em relação às taxas de complicações e re-intervenções, os dados dos ensaios clínicos não são avaliados em conjunto, mas a diretriz conclui que há maiores taxas em pacientes tratados com procedimento endovascular. Foi realizada análise econômica na perspectiva do governo britânico e concluído que o tratamento endovascular em um paciente padrão (idade de 75 anos, com estado de saúde moderado e aneurisma de 6,5 cm de diâmetro) seria custo efetivo, com gasto de £ 12.000 por QALY ganho (anos de vida ganho ajustado pela qualidade). Em análise de sensibilidade, concluiu-se que o estado de saúde do paciente influencia no modelo (estimativa de mortalidade cirúrgica), considerando custo de £9.000 e £71.000 por 0,070 e 0,008 QALY ganho respectivamente para paciente com saúde muito ruim e boa saúde. Assim, em pacientes com boa saúde (poucas comorbidades e taxa de mortalidade cirúrgica baixa) o tratamento endovascular não seria considerado custo-efetivo para os recursos ingleses. A diretriz preconiza, então, que a escolha do tipo de tratamento leve em consideração a taxa de mortalidade estimada para cada paciente, identificando aqueles em que seria mais custo-efetivo realizar 9 Recomendações da Câmara Técnica Nacional de Medicina Baseada em Evidências do Sistema Unimed tratamento endovascular, considerando o tamanho e morfologia do aneurisma, a idade do paciente e sua expectativa de vida. 2 ▪ CADTH (Canadá – Governo Federal): avaliação publicada em dezembro de 20023 revisando o uso das endopróteses nos AAA, versus cirurgia aberta, versus conduta expectante e MOHLTC (Toronto – Canadá – Governo Distrital): revisão sistemática de março de 20021. As revisões do CADTH3 e do MOHLTC1 são anteriores a do NICE e não contemplam alguns importantes estudos publicados após sua divulgação. As conclusões dessas revisões não apresentam divergências significativas entre si ou em relação a do NICE. Ambas destacam a necessidade de estudos com maior tempo de acompanhamento por não estar estabelecida a eficácia e segurança do tratamento endovascular em longo prazo. ▪ NGC (Dept of Health - Estados Unidos): diretriz sobre o uso de prótese endovascular no tratamento de aneurisma de aorta abdominal, finalizado em novembro de 2009. A Diretriz é baseada na revisão sistemática publicada pelo NICE, concluindo que o procedimento endovascular está recomendado como opção terapêutica para pacientes com aneurisma de aorta abdominal infra-renal, cuja intervenção cirúrgica aberta é considerada apropriada. A decisão em realizar procedimento endovascular, preferencialmente em relação à cirurgia aberta, deve ser tomada em conjunto com o clínico e paciente, após análise de uma série de fatores: tamanho do aneurisma e morfologia, idade do paciente, expectativa de vida e estado de saúde atual do paciente, riscos e benefícios de cada procedimento. O tratamento endovascular não é recomendado para pacientes com aneurismas rotos, exceto em contexto de pesquisa. 14 ▪ HTA (Inglaterra - Universidade de Southampton): revisão sistemática e modelo econômico do uso de stent endovascular para aneurismas de aorta abdominal, publicado em outubro de 2009. A revisão foi realizada até fevereiro de 2008 e incluiu 6 ECRs: 4 comparando reparo endovascular com cirurgia aberta,1 estudo comparando tratamento endovascular com manejo clínico apenas e 1 pequeno estudo comparando tratamento endovascular com cirurgia aberta em pacientes com ruptura de aneurisma. Além disso, 34 estudos de coorte foram considerados para análise econômica, principalmente os dados do registro 10 Recomendações da Câmara Técnica Nacional de Medicina Baseada em Evidências do Sistema Unimed europeu EUROSTAR. Por incluir os mesmos estudos da revisão do NICE, a metaanálise comparando cirurgia aberta com procedimento endovascular para aneurismas não rotos apresenta os mesmos resultados já descritos previamente. Entretanto, em sua conclusão, considera o procedimento endovascular não custoefetivo comparado à cirurgia aberta. Assim como o NICE, enfatizam que a sensibilidade do modelo econômico é muito dependente das taxas de reintervenção utilizadas, da expectativa de vida média e das comorbidades do paciente. O documento descreve ainda o ECR que incluiu 32 pacientes com aneurismas rotos (15 pacientes randomizados para tratamento endovascular e 17 para cirurgia aberta), com taxas de mortalidade em 30 dias iguais entre os grupos (53%), afirmando não ser possível chegar a conclusões devido às limitações metodológicas do estudo.15 ▪ Diretrizes internacionais: Sociedade e Associação Americana de Cirurgia Vascular e Colégio e Sociedade de Cardiologia Americana, em conjunto com outras associações americanas, publicada em 2006. Recomendação Classe I: o reparo com cirurgia aberta de AAA infra-renal está indicado para pacientes que são bons a moderados candidatos cirúrgicos (Nível de Evidência B). Recomendação Classe IIa: o reparo endovascular de AAA infra-renal é aceitável em pacientes com alto risco de complicações em cirurgia aberta por presença concomitante de doenças cardiopulmonares ou outras (Nível de Evidência B). Recomendação Classe IIb: o reparo endovascular de AAA infra-renal pode ser considerado em pacientes de moderado a baixo risco cirúrgico (Nível de vidência B).9 Meta-análises Duas meta-análises já haviam sido apontadas no documento de 2005 uma nova (publicada em 2007) foi localizada nesta revisão 16,17 e 18 . Os resultados destes estudos foram contemplados nas recomendações/revisão do NICE e HTA2,15, por isso não serão descritos. Outra revisão sistemática de Franks et al., publicada em 2007, contemplou estudos de coorte publicados até 2003 com objetivo de avaliar as taxas de mortalidade e complicações relacionadas 11 Recomendações da Câmara Técnica Nacional de Medicina Baseada em Evidências do Sistema Unimed ao procedimento endovascular. Foi observada queda nas taxas de complicações ao longo de 12 anos, entretanto, como foi relatado grande heterogeneidade dos estudos e por se tratar de revisão sistemática que incluiu estudos com menor poder epidemiológico, também não será descrita.19 Meta-análise avaliando tratamento endovascular para AAA roto ▪ Revisão sistemática realizada pela Cochrane: foi finalizada em outubro de 2006, não identificando ECRs comparando tratamento endovascular com cirurgia aberta para AAA rotos. O documento foi baseado em 7 relatos de casos e 31 série de casos (21 retrospectivas e 10 prospectivas). Concluem que o benefício do reparo endovascular para ruptura e AAA não está estabelecido. As menores taxas de mortalidade, tempo de permanência em unidade de tratamento intensivo e menores perdas sangúineas, relatadas em séries de casos em pacientes com reparo endovascular, parecem ser promissoras, mas não devem ser interpretadas como positivas devido às limitações metodológicas dos estudos. 20 Ensaios clínicos randomizados Três grandes ensaios clínicos randomizados (ECR) comparando tratamento endovascular com cirurgia aberta foram publicados em junho de 2005 e já haviam sido relatados na versão do documento de 2005 21-23. Em outubro de 2009 foi publicado o ECR OVER24 que motivou a revisão desta recomendação. Os outros ECR encontrados foram incluídos nas avaliações realizadas por grupos internacionais e não foram citados individualmente. Sínteses dos principais ECRs: O ensaio clínico multicêntrico OVER, publicado em outubro de 2009, incluiu 881 pacientes com AAA (idade ≥ 49 anos) com indicação de tratamento tanto com cirurgia aberta quanto com procedimento endovascular. Foram randomizados 444 pacientes para tratamento endovascular e 437 para cirurgia aberta, possuindo acompanhamento médio de 1,8 anos. A mortalidade perioperatória (hospitalar e em até 30 dias) foi menor nos pacientes submetidos a reparo endovascular (0,5% x 3%; P=0,004). 12 Recomendações da Câmara Técnica Nacional de Medicina Baseada em Evidências do Sistema Unimed Entretanto, não houve diferença significativa de mortalidade em 2 anos (endovascular = 7% e cirurgia aberta = 9,8%; P=0,13). Pacientes submetidos a procedimento endovascular permaneceram menor tempo em ventilação mecânica (3,6 x 5 horas), menor tempo em unidade de cuidados intensivos (1 x 4 dias), necessitaram menor volume de transfusão sanguínea em 24 horas (0 x 1 unidade) e tiveram menor tempo de internação hospitalar (3 x 7 dias). Não houve diferença entre os grupos em relação à falha do procedimento (endovascular = 13,1% e cirurgia aberta = 11,7%; P=0,53). No grupo de tratamento endovascular houve necessidade de 61 novos procedimentos, que incluíram, entre outros, 42 procedimentos endovasculares e 3 conversões para cirurgia aberta. No grupo de cirurgia aberta foram necessários 55 novos procedimentos, que incluíram, entre outros, 24 reparos de hérnia incisional, 7 procedimentos relacionados à prótese aórtica, 4 amputações e 4 laparotomias por obstrução intestinal. No grupo endovascular foram observados 134 endoleaks, resultando em 21 novos procedimentos terapêuticos.24 O ensaio clínico DREAM, realizado na Holanda e Bélgica e publicado em junho de 200510, estudou a evolução em 2 anos de 351 pacientes com AAA maiores de 5cm e potenciais candidatos à cirurgia aberta ou tratamento endovascular. Na análise dos principais desfechos foi observado que a vantagem em diminuição de mortalidade obtida pelo procedimento endovascular no período perioperatório (1,2 x 4,6%) diminui progressivamente com o acompanhamento, tornando-se equivalente ao final de um ano, e permanecendo assim até o final do seguimento de 2 anos (11,2 x 10,1%). A sobrevida livre de eventos graves foi de 80,6% nos pacientes submetidos à cirurgia aberta e 83,1% nos submetidos ao tratamento endovascular (p=0,39). A frequencia com que pacientes submetidos ao método endovascular necessitaram de reintervenção foi significativamente maior do que nos tratados por cirurgia aberta, especialmente nos primeiros nove meses, tornando-se semelhante após 13 Recomendações da Câmara Técnica Nacional de Medicina Baseada em Evidências do Sistema Unimed esse período. Os autores concluem que as vantagens do tratamento endovascular para AAA restringem-se ao primeiro ano pós procedimento. 23 O ensaio clínico EVAR 1 (Endovascular Aneurysm Repair 1) 21 conduzido no Reino Unido randomizou 1082 pacientes maiores de 60 anos, portadores de aneurismas maiores de 5,5cm, para tratamento endovascular ou cirurgia aberta. Pacientes considerados sem condições para cirurgia aberta não foram incluídos nesse estudo. Após seguimento de 4 anos não houve diferença na mortalidade total entre os grupos (26 x 29%; p=0,46), apesar da diminuição de mortalidade relacionada a aneurisma (4 x 7%; p=0,04), e diminuição de mortalidade em até 30 dias (1,7 x 4,7%; p<0,05) favorável à técnica endovascular. A incidência de complicações (35 x 8%; p<0,05) e de necessidade de reintervenção (15 x 7%; p<0,05) foi significativamente maior no grupo submetido ao tratamento endovascular. Não houve diferença nos escores de qualidade de vida obtidos por dois instrumentos distintos. O custo médio após até 4 anos de seguimento foi de UK£ 13.258 x UK£ 9.945, favorecendo a cirurgia aberta. Essa diferença de custos é predominantemente atribuível a gastos com tomografias e ecografias de follow-up, e reintervenções no grupo de tratamento endovascular. Comentários: em dezembro de 2004, quando foi encerrada a coleta de dados para este artigo, menos de 50% dos pacientes havia completado 3 anos de seguimento, e somente 24% haviam completado 4 anos. 25 O ensaio clínico EVAR 2 (Endovascular Aneurysm Repair 2) 26 foi conduzido no Reino Unido utilizando os pacientes excluídos do EVAR 1 por serem considerados sem condições clínicas para serem submetidos à cirurgia aberta. 338 pacientes maiores de 60 anos, portadores de aneurismas maiores de 5,5cm, foram randomizados para tratamento endovascular ou nenhuma intervenção. Após 4 anos de seguimento, a mortalidade por qualquer causa (66 x 62%) e a mortalidade relacionada ao aneurisma (14 x 19%) não foi significativamente diferente entre os grupos submetidos à intervenção endovascular ou nenhuma intervenção. As taxas de 14 Recomendações da Câmara Técnica Nacional de Medicina Baseada em Evidências do Sistema Unimed complicações (43 x 18%) e necessidade de reintervenção (26 x 4%) foram favoráveis ao manejo conservador. Comentários: houve demora entre a decisão de intervir (randomização) e a realização do procedimento (média de 57 dias), tendo ocorrido 6 rupturas de aneurisma nesse período no grupo randomizado para intervenção. Essas rupturas foram uma parcela dos desfechos negativos do grupo intervenção. Deve-se ressaltar também, que 27% dos pacientes randomizados para o grupo nenhuma intervenção foram posteriormente submetidos à correção do aneurisma, 12 por cirurgia aberta e 35 pela técnica endovascular. Estudos de análise econômica Inúmeras análises comparativas de custos e estudos de custo-efetividade comparam o tratamento endovascular e a cirurgia aberta para manejo de AAA. Os resultados dos estudos são divergentes. De maneira geral, os estudos que fazem somente comparação direta entre os custos hospitalares mostram que o tratamento endovascular é mais caro que a cirurgia aberta, mesmo considerando a redução no tempo de sala cirúrgica, no tempo de CTI e no tempo de hospitalização. Já os estudos de custo-efetividade e os estudos que avaliam os custos sob ponto de vista da sociedade ou do sistema de saúde como um todo, consideram o tratamento endovascular como viável sob ponto de vista de custoefetividade (custo incremental de US$ 9.905/QALY 15 e razão de custo-efetividade US$22.826).27-37 Não foram encontrados estudos de análise econômica brasileiros. XI – Discussão: A publicação de um novo ensaios clínico e a revisão de recomendações de agências e sociedades internacionais motivaram a atualização da recomendação realizada em 2005 pela Câmara Técnica da Unimed Central-RS. As novas evidências reforçaram a menor taxa de mortalidade peri-operatória (30 dias) e a semelhança entre as taxas de mortalidade em médio prazo (até 4 anos) da técnica 15 Recomendações da Câmara Técnica Nacional de Medicina Baseada em Evidências do Sistema Unimed endovascular em relação à cirurgia convencional aberta, no tratamento de aneurismas de aorta abdominal não rotos, em pacientes com indicação cirúrgica. Permanece a necessidade de estudos com seguimento mais longo; entretanto, a melhora das taxas de complicações mostrada no último estudo, aponta para um aprimoramento da técnica ao longo dos anos, permitindo a ampliação da indicação do procedimento endovascular. XIII – Conclusões da Revisão: Ensaios clínicos recentes comparando a técnica endovascular com a cirurgia aberta para tratamento de AAA não rotos mostraram taxas de mortalidade semelhantes entre as duas técnicas a partir de um ano após o procedimento. Não há estudos que avaliem mortalidade em seguimento maior do que 4 anos. Ensaios clínicos e revisões sistemáticas mostram benefício significativo do tratamento endovascular em AAA não rotos na redução de mortalidade perioperatória (30 dias), tempo de internação em CTI, tempo de internação e necessidade de transfusão de sangue. As taxas de complicações e re-intervenções diferem entre os estudos mais antigos, sendo semelhantes no ECR mais recente. Não há evidências que suportem o uso do tratamento endovascular de rotina para pacientes com AAA rotos. Não foram encontrados estudos de custo-efetividade na realidade brasileira. A expectativa de vida e comorbidades do paciente parecem influenciar na razão de custo-efetividade da técnica endovascular. 16 Recomendações da Câmara Técnica Nacional de Medicina Baseada em Evidências do Sistema Unimed XIV – Recomendação final: 1) Meta análises e ensaio clínico recente sugerem que o tratamento endovascular possua taxas de mortalidade semelhante à cirurgia aberta, em até 4 anos de seguimento, no tratamento de aneurisma de aorta abdominal não roto em pacientes com indicação de intervenção e anatomia favorável (Grau de Recomendação A; Nível de Evidência 1A) 2) A escolha do tipo de tratamento deve ser realizada em conjunto com médico clínico e paciente, estando baseada na expectativa de vida e comorbidades do paciente. 3) Pacientes não candidatos a cirurgia aberta, por apresentarem alto risco cirúrgico, não parecem beneficiar-se de intervenção endovascular quando comparados à não intervenção. (Grau de Recomendação A; Nivel de Evidência: 1B) 4) A técnica endovascular não deve ser indicada para o tratamento de aneurismas de aorta abdominal rotos, permanecendo como tratamento padrão a cirurgia aberta. (Grau de Recomendação B; Nível de Evidência 2A) Nota: O emprego da técnica endovascular não é estratégia isenta de riscos, sendo relatadas complicações como endoleaks e necessidade de reintervenção. 17 Recomendações da Câmara Técnica Nacional de Medicina Baseada em Evidências do Sistema Unimed Anexo I: Classificações de Risco Cirúrgico Classificação da American Society of Anesthesiologists (ASA) ASA I: Paciente normal e saudável ASA II: Paciente com patologia sistêmica tratada e compensada ( HAS, DM II, Doença Isquêmica, etc.). ASA III: Paciente ASA II descompensado ou doença avançada.( ex.: HAS com VE grande e algum grau de ICC) ASA IV: Paciente moribundo. Não se espera que sobreviva sem a cirurgia. ASA V: Paciente com morte cerebral. Doador. Revised Cardiac Risk Index (RCRI)38 Fatores de risco utilizados: 1) cirurgia de alto risco (inclui AAA) 2) doença cardícaca isquêmica 3) insuficiência cardíaca congestiva 4) história de doença cerebrovascular 5) diabetes em tratamento com insulina 6) creatinina pré-operatória >2.0 mg/dL Número de Classe de Taxa de complicações fatores de risco Risco cardíacas maiores (%) 0 I 0,04 1 II 0,11 2 III 4 3 IV 9 18 Recomendações da Câmara Técnica Nacional de Medicina Baseada em Evidências do Sistema Unimed XV – Bibliografia: 1. Ministry of Health and Long-Term Care of Toronto. Health Technology Scientific Literature Review. Policy Review: Endovascular Repair of AAA. March 2002. www.health.gov.on.ca 2. National Institute For Clinical Excellence (NICE) NICE technology appraisal guidance 167. Endovascular stent-grafts for the treatment of abdominal aortic aneurysms. February 2009. www.nice.org.uk/TA167 3. 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