acessibilidade curricular para o aluno com deficiência intelectual

Propaganda
ACESSIBILIDADE
CURRICULAR
PARA
O
ALUNO
COM
DEFICIÊNCIA
INTELECTUAL1
Erenice Natália Soares de Carvalho
Universidade Católica de Brasília
Especialista em Educação Especial
Três aspectos da acessibilidade curricular são focalizados neste
trabalho. Primeiro, a conceituação. Segundo, o significado para a
aprendizagem
do
aluno
com
deficiência
intelectual,
seu
desenvolvimento e carreira acadêmica. Terceiro, a promoção da
acessibilidade na escola.
No
sentido
amplo,
acessibilidade
curricular
compreende
a
possibilidade de participação do aluno nas atividades pedagógicas e
apropriação dos conhecimentos e saberes escolares. Insere-se no
conceito, a vivência das relações interpessoais entre alunos e membros
da escola. O compartilhamento de valores, sentimentos, atitudes, ritos,
conhecimentos e ações, nos tempos e espaços educativos. Enfim,
inclusão
no
currículo,
a
desenvolvido com todos eles.
ser
construído
para
os
estudantes
e
Quanto ao significado para o aluno, acessibilidade curricular
representa a única forma efetiva de empreender seu itinerário escolar
com possibilidade de conduzi-lo ao alcance das metas e finalidades
educativas. Implica ingresso na escola. E permanência, com bons
resultados. Finalização da carreira acadêmica no nível pretendido, sem
impeditivos forjados na discriminação e no preconceito. Contribui para
a constituição da subjetividade do aluno, por meio da criação de
espaços sociais interativos favoráveis às relações de alteridade no
contexto escolar. Possibilita a emergência de sentimentos de autoestima e valorização pessoal, bem como a oportunidade do aluno levar
para casa experiências de êxito, conquistando reconhecimento e
estímulo familiar.
Promover acessibilidade, terceiro ponto de ênfase neste trabalho,
significa propor um paradigma curricular pautado no respeito à
diversidade dos alunos e responsivo às suas diferenças. Mittler (2003)
1
Fonte: MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. Coordenadoria para a Integração da pessoa com Deficiência. I
Conferência Nacional dos Direitos da Pessoa com Deficiência – Acessibilidade: você também tem
compromisso. Subsídios para o conferencista. Brasília: CORDE, 2006.
entende que o currículo acessível é inclusivo. Assim sendo, sua
organização cria condições para o estabelecimento de demandas de
aprendizagem compatíveis com as habilidades e condições dos alunos.
O ensino leva em conta suas necessidades escolares, por meio da
diferenciação do trabalho pedagógico e da remoção de barreiras que se
interponham
considerações,
ao
o
processo
aluno
de
com
aprendizagem.
deficiência
Com
base
intelectual
nessas
encontrará
ressonância pedagógica para sua escolarização e desenvolvimento.
O tratamento das diferenças na escola é uma arena na qual se
constroem
muitas
divergências.
Segundo
Perrenoud
(2001)
a
heterogeneidade entre alunos é uma realidade no cotidiano do
professor e um desafio à ação pedagógica. O significado atribuído às
diferenças direciona respostas e estratégias, sendo os dispositivos
estruturais da organização escolar, geralmente, de exclusão: rigidez dos
programas; uniformização metodológica; avaliação quantitativa, dentre
outros aspectos. Perrenoud (op. cit.) denuncia a “indiferença às
diferenças”. Pondera que a diversidade requer ações convergentes
quanto à organização dos espaços e tempos escolares; gestão de
recursos pedagógicos internos e externos; uso de situações variadas de
aprendizagem e redes de interação e cooperação entre crianças.
Para corresponder a esses requisitos, cabe à escola flexibilizar
suas estruturas, sistemas e processos, por meio de estratégias de
diferenciação educativa. Fernández (2005) considera como elementos de
diferenciação, os conteúdos curriculares, os processos de ensino e os
produtos
da
ação
pedagógica.
Também,
o
conhecimento
das
necessidades educacionais e a mediação regulada dos procedimentos de
ensino, intencionalmente e de modo contextual.
Porter (2002) relaciona apoios-chave para a inclusão escolar.
Alguns pontos abordados por ele aplicam-se ao currículo para alunos
com
deficiência
intelectual:
a)
o
foco
colocado
em
estratégias
instrucionais apropriadas, que considerem as metas e os métodos
selecionados e aplicados; b) a qualificação e o apoio em relação ao
pessoal docente; c) a orientação sustentada dos educadores para a
solução de problemas emergentes.
O conceito de deficiência intelectual diferencia-se entre teorias. O
Sistema 2002 da American Association on Mental Retardation-AAMR
considera cinco dimensões para sua identificação, sendo essas de
natureza cognitiva, física, contextual, adaptativa e social. Sistemas de
apoio contingentes e diversificados aplicam-se a demandas individuais,
indispensáveis à promoção humana e à qualidade de vida, inserindo-se
na perspectiva life span.
Vigotski (1983) defende a promoção do desenvolvimento cultural
da criança com deficiência intelectual, segundo ele afetado pela
condição psicofisiológica e sociopsicológica. Os avanços do potencial de
desenvolvimento dessas crianças estão em suas funções psicológicas
superiores, construídas no dinamismo das relações sociais mutuamente
compartilhadas, com a mediação dos instrumentos culturais. Segundo o
autor, o desenvolvimento cognitivo é impulsionado pelas oportunidades
de convivência social, particularmente com outros mais experientes.
Essas idéias têm uma repercussão pedagógica importante. O ensino,
não deve restringir-se às atividades e habilidades elementares, mas
abranger o exercício do pensamento abstrato. O estudante é capaz de
construir meios alternativos e instrumentos funcionais que lhe permite
alcançar metas inviabilizadas pelos itinerários comuns.
Com base nesses fundamentos, Tunes (2003) recomenda a
organização do trabalho pedagógico direcionado à valorização da
autonomia e da participação dos alunos em espaços coletivos. Defende
o foco da ação pedagógica no desenvolvimento de funções psicológicas
superiores e nos instrumentos psicológicos especiais que colocam o
sujeito em contato com suas possibilidades e oportunidades de sucesso.
O
currículo
tem
uma
função
educativa
e
social.
Se
for
compreendido ao modo de Sacristán (1998, p. 166) como “uma prática
desenvolvida através de múltiplos processos e na qual se entrecruzam
diversos subsistemas ou práticas diferentes [...]”, constitui um recurso
flexível a ser co-construído e aplicado pelos docentes. É a idéia do
“paradigma mediacional centrado no professor”, entendido como um
“mediador decisivo”, em benefício dos estudantes. Cabe à escola
apreender o poder mediador do currículo e promover sua modulação, de
modo a tornar-se realmente acessível aos alunos, indiscriminadamente.
REFERÊNCIAS
AMERICAN ASSOCIATION ON MENTAL RETARDATION. Mental
retardation:
definition,
classification,
Washington DC, USA: AAMR, 2002.
and
systems
of
supports.
Fernández, C. J..(Coord.). Pedagogia Diferencial: diversidad y
equidad. Madrid: Pearson Educación, S.A., 2005.
MITTLER, p Educação inclusiva: contextos sociais. Porto Alegre:
ARTMED, 2003.
PERRENOUD, P. A pedagogia na escola das diferenças: fragmentos
de uma sociologia do fracasso. Porto Alegre: ARTMED, 2001.
PORTER, G. Educação inclusiva na prática. APAE Ciência, Campo
Grande, MS, v. 1, n. 1, p. 41-54, jul./dez. 2002.
SACRISTÁN, J.G. O currículo: uma reflexão sobre a prática. Porto
Alegre: ARTMED, 2001.
TUNES, E. Por que falamos de inclusão? Linhas Críticas, Brasília,
DF, v. 7, n. 16, p.5-12, jan./jun. 2003.
VIGOTSKI, L. S. Fundamentos de defectologia. Habana, Cuba:
Editorial Pueblo y Educación, 1983.
Download