135 Moreira, M.I.C. Faces da violência sexual contra crianças e adolescentes Faces da violência Sexual contra Crianças e Adolescentes Faces of the Sexual Violence against Children and Adolescents Maria Ignez Costa Moreira1 RESENHA DO LIVRO: OLIVEIRA, Maria Luiza Moura & SOUSA. Sônia M. Gomes (orgs.). (Re) Descobrindo faces da violência sexual contra crianças e adolescentes. Brasília: Secretaria Especial dos Direitos Humanos; Goiânia: Cânone Editorial, 2007. Esta coletânea (Re) Descobrindo faces da violência sexual contra crianças e adolescentes oi organizada em duas partes. Na primeira parte um conjunto de três artigos apresenta e discute as práticas de enfrentamento da violência sexual, cometida contra crianças e adolescentes, desenvolvidas em Goiânia (GO) e, destacam a articulação das mesmas com movimento nacional de combate à exploração sexual contra crianças e adolescentes. Na segunda parte outro conjunto de três artigos enfoca a condição dos sujeitos que foram condenados por violência sexual cometida contra crianças e adolescentes. Parte I No primeiro artigo Carvalho; Luz e Assis tratam dos sentidos de rede, uma metáfora, que indica os pontos de articulação dos movimento sociais com a política pública. Os autores destacam que a meta da transformação social possibilita que entre as instituições de modo amplo, as empresas, os governos e os movimentos sociais possam compartilhar o discurso do funcionamento em rede. Partindo desta concepção global de rede buscam compreender as especificidades regionais do Estado de Goiás, especialmente da capital Goiânia em relação aos ideais e aos desafios da Rede de atenção a mulheres, crianças e adolescentes em situação de violência. Silva, no segundo artigo trata da importância política do registro dos casos de violência sexual e, neste sentido apresenta a experiência de sensibilização dos trabalhadores do Sistema Único de Saúde (SUS) para a notificação compulsória dos casos atendidos. A autora destaca o processo de transformar o relato oral dos trabalhadores que participaram do processo de construção do instrumento de notificação dos casos de violência em Goiânia em memória escrita, uma vez que este material é de extrema importância na capacitação destes agentes. Oliveira encerra a primeira parte desta coletânea apresentando a experiência de mobilização social realizada em Goiânia, como parte do Projeto de Trabalho pelo fim exploração sexual de crianças e adolescentes através de uma campanha educativa. O público desta campanha foram os taxistas, mototaxistas, caminhoneiros, motoristas e cobradores de transporte coletivo urbano, proprietários de hotéis, motéis, bares e similares, e de postos de gasolina e frentistas. Estes 1 Psicóloga, Mestre e Doutora em Psicologia Social, Professora do Mestrado em Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC-MG). Contato: [email protected] Pesquisas e Práticas Psicossociais 3(1), São João del-Rei, Ag. 2008 136 Moreira, M.I.C. Faces da violência sexual contra crianças e adolescentes profissionais foram considerados como alvo prioritário da campanha uma vez que desenvolvem suas atividades em locais ou nas proximidades onde ocorrem cenas de violência sexual. A campanha educativa também tem outro sentido, destacado pela autora, que é o de chamar a atenção da sociedade como um todo de que violência sexual contra crianças e adolescentes é um crime, uma violação de direitos e, que o enfrentamento deste problema é de responsabilidade coletiva. O enfrentamento da violência sexual contra crianças e adolescentes é o fio condutor da primeira parte desta coletânea: a rede, compreendida como forma de articulação que viabiliza o combate, o registro pelo SUS dos casos de violência como instrumento de visibilidade social do problema e, finalmente a campanha educativa, que ao mesmo tempo é estratégia de denúncia e de prevenção de novos casos. Parte II Inicia-se com um artigo de Carvalho e Sousa sobre a população carcerária condenada por crimes sexuais contra mulheres, crianças e adolescentes em Goiás. A escassez de estudos sobre as pessoas condenadas por violência sexual motiva os autores a compreender este outro personagem da cena. Buscam compreender quem são e como são descritos estes sujeitos. Para alcançar os seus objetivos realizaram um levantamento dos prontuários da Penitenciária Odenir Guimarães em Goiás. Encontraram 125 registros condenados por estupro e atentado violento ao pudor. Tratam estes registros a partir das seguintes categorias: a procedência geográfica do condenado no interior do estado de Goiás; estado civil, idade, escolaridade, filhos, tempo da pena; quantas pessoas foram violentadas pelo condenado, idade e sexo das vítimas e, finalmente o grau de vínculo social entre o detento e a pessoa alvo da violência. No segundo artigo, Esber toma como figura central da análise os condenados por crimes sexuais. Guiada pelos pressupostos teórico-metodológicos de Vygotsky, a autora procura compreender os sentidos atribuídos, pelos condenados para violência sexual, a infância, a adolescência, a família e a sexualidade. Jesus, no último artigo da coletânea discute o processo terapêutico vivenciado por 4 sentenciados. A autora conduz seu trabalho na abordagem da Gestalt-terapia e considera que a partir desta opção teóricometodológica é possível compreender o autor da violência sexual como capaz de ressignificar e reconstruir sua percepção de si mesmo e do outro, bem como, suas vivências e atitudes. A autora considera que a responsabilização do autor em relação a violência cometida é possível de ser alcançada no processo de gestaltterapia, e que esta mudança é facilitada pela postura desta abordagem que busca compreender as pessoas em sua totalidade e, não apenas como um sintoma. Na segunda parte desta coletânea, o autor da violência sexual contra crianças e adolescentes é o ponto de contato entre os artigos que buscam, cada um com seu enfoque particular, compreender quais são os significados cristalizados sobre o condenado por crimes sexuais no interior do sistema penitenciário, e os sentidos construídos pelos condenados para a sua experiência, sentidos que puderam ser escutados tanto no enquadre da pesquisa quanto no enquadre psicoterápico. A duas partes se articulam ao mostrar que a questão da violência sexual contra crianças e adolescentes é complexa e exige a compreensão da rede institucional envolvida bem como, da própria cena da violência que compreende a interação entre agressores e vítimas e, como os sentidos Pesquisas e Práticas Psicossociais 3(1), São João del-Rei, Ag. 2008 137 Moreira, M.I.C. Faces da violência sexual contra crianças e adolescentes deste ato que são construídos compartilhados socialmente. e Categoria de contribuição: Resenha Recebido: 27/04/08 Aceito: 15/05/08 Pesquisas e Práticas Psicossociais 3(1), São João del-Rei, Ag. 2008