Os dilemas e as barreiras à entrada de novos produto no mercado

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IV Congr. Bras. Gestão e Desenv. de Produtos - Gramado, RS, Brasil, 6 a 8 de out de 2003
Os dilemas e as barreiras à entrada de novos produto no mercado:
estudo de caso numa fabricante de eletrodomésticos
José Luiz Moreira de Carvalho (UFSCar) [email protected]
José Carlos de Toledo (UFSCar) [email protected]
Resumo
No novo ambiente competitivo cada vez mais dinâmico em que muitas indústrias estão
inseridas, o lançamento de novos produtos passou a ser muito importante para um bom
desempenho no mercado. Mesmo com todo o esforço das empresas para lançar produtos de
forma rápida e eficiente, não é pequena a possibilidade de fracasso no lançamento de um
novo produto. Por mais eficientes que sejam os processos de desenvolvimento conduzidos
pelas empresas, é limitada a capacidade destas influírem sobre os comportamentos do
mercado consumidor e da concorrência. Há uma série de dificuldades no lançamento de um
novo produto, envolvendo alguns dilemas e barreiras à entrada no mercado. Este trabalho
discute esses dilemas e barreiras ao lançamento de novos produtos, e analisa, com base
nessa discussão, um estudo de caso conduzido numa empresa fabricante de eletrodomésticos.
Os resultados obtidos revelam as principais barreiras à entrada no mercado de
eletrodomésticos e ilustram o caráter dinâmico dessa indústria quanto ao lançamento de
novos produtos.
Palavras chave: Desenvolvimento de Produto, Barreiras à Entrada, Eletrodomésticos
1. Introdução
No novo ambiente competitivo cada vez mais dinâmico em que muitas indústrias estão
inseridas, o lançamento de novos produtos, sejam estes completamente novos ou evoluções de
produtos já existentes, passou a ser muito importante para um bom desempenho no mercado.
Kotler (1996) identifica o desenvolvimento contínuo de produtos novos e aprimorados como
a chave para a sobrevivência e crescimento das empresas. Segundo Utterback (1996), a
inovação é um determinante central do sucesso ou fracasso a longo prazo para as empresas de
manufatura.
Para Clark & Wheelwright (1993), num mundo de competição internacional, onde os
consumidores são sofisticados e as tecnologias são diversas e dramáticas nos seus efeitos, os
que estacionam no desenvolvimento de produtos não devem prosperar nem sobreviver.
Segundo Doll & Vonderembse (1991), o rápido desenvolvimento em tecnologias de produto e
processo, avanços na tecnologia de informação e crescente competição global são
características desse ambiente, no qual o sucesso depende da capacidade de se antecipar aos
mercados e responder rápida e eficientemente com produtos que proporcionem alto valor aos
consumidores.
Diante desse contexto, muitas empresas vêm procurando encurtar o tempo e aumentar a
produtividade dos seus processos de desenvolvimento de produto. Entretanto, mesmo com
todos esses esforços, não é pequena a possibilidade de fracasso no lançamento de um novo
produto. São cada vez mais comuns os casos de produtos, em indústrias como a de alimentos,
a de bebidas ou até mesmo a automobilística, que são retirados de linha pouco tempo após o
seu lançamento no mercado.
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Muitos desses lançamentos mal sucedidos podem ser decorrentes de falhas na concepção
dosprodutos, a partir de uma visão equivocada do mercado ou mesmo por ignorar o que este
deseja. Entretanto, por mais eficientes que sejam os processos de desenvolvimento
conduzidos pelas empresas, é limitada a capacidade destas influírem sobre os
comportamentos do mercado consumidor e da concorrência. E muitas vezes o investimento
feito no novo produto não traz o retorno esperado. Além disso, como afirma Kotler (1996),
ocorre uma redução do período de sucesso dos produtos pela rapidez com que os concorrentes
passam a imitá-los.
Com o aumento da concorrência, lançar produtos novos e aprimorados pode ser um fator de
sobrevivência para grande parte das empresas. Por outro lado, a substituição de um produto
tradicional por um novo envolve riscos e nem sempre pode ser bem sucedida. Há uma série de
dificuldades no lançamento de um novo produto, envolvendo alguns dilemas e barreiras à
entrada no mercado, que precisam ser consideradas na gestão do Processo de
Desenvolvimento de Produto (PDP).
O objetivo deste trabalho é discutir esses dilemas e barreiras, analisando um estudo de caso
sobre o assunto feito numa empresa fabricante de eletrodomésticos. Os resultados obtidos
revelam as principais barreiras à entrada no mercado de eletrodomésticos e ilustram o caráter
dinâmico dessa indústria quanto ao lançamento de novos produtos.
2. A concorrência baseada nos novos produtos
Segundo Clark & Wheelwright (1993), novos produtos e processos vêm ao mercado através
de um processo que primeiro transforma idéias e conceitos em protótipos, por meio de projeto
detalhado e engenharia, depois as testa e refina, e finalmente prepara o projeto do produto e as
fábricas para a operação comercial.
Vindo de uma idéia original, de uma descoberta científica, de uma nova tecnologia ou de uma
demanda/necessidade de mercado, o lançamento de um novo produto representa o início do
seu ciclo de vida. Em relação às vendas, este ciclo possui quatro fases distintas (introdução,
crescimento, maturidade e declínio). Considerando um novo produto para o mercado, de
acordo com Slack et al. (1997), na fase de introdução é baixo o volume de vendas, há poucos
concorrentes (ou nenhum) e são freqüentes as mudanças no projeto. Na etapa de crescimento,
elevam-se rapidamente as vendas, cresce o número de concorrentes e o produto vai se
tornando mais padronizado. Na fase de maturidade as vendas se mantêm num volume alto e
estável, mantendo-se estável o número de concorrentes, e surgem os tipos dominantes de
projetos. Por fim, na fase de declínio caem as vendas e o número de concorrentes e o projeto
tende a “commoditizar-se”.
A chegada ao mercado (fase de introdução) representa o início do ciclo de vida do produto,
mas este ciclo decorre de um processo anterior de desenvolvimento de produto, que não se
encerra necessariamente quando o produto é lançado no mercado, podendo abranger também
o acompanhamento pós-venda e até mesmo o gerenciamento do descarte do produto após o
seu uso.
Ao longo de toda a vida útil do produto, novos processos de desenvolvimento ocorrerão,
modificando as características originais do projeto, incorporando inovações e/ou mudanças
incrementais. À medida que vão sendo selecionadas ao longo do tempo as características mais
adequadas ao produto, vão sendo eliminados as formas ou padrões alternativos, tendo-se com
isso um projeto dominante. O surgimento deste, de acordo com Utterback (1996), não é
necessariamente pré-determinado, sendo resultado da interação entre opções técnicas e de
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mercado num determinado instante de tempo. Outros fatores como regulamentos setoriais,
intervenção governamental, estratégias de empresas individuais e a comunicação entre
produtores e usuários também modificam a idéia do produto dominante.
Em condições de concorrência cada vez mais acirradas em muitas indústrias, o tempo de
lançamento de novos produtos também se tornou uma variável crítica. Além de significar uma
vantagem frente a concorrência, a primazia no lançamento pode dar à empresa pioneira
melhores condições para influenciar os desenvolvimentos futuros que vão resultar no projeto
dominante.
Outra visão do processo de desenvolvimento de produto, baseada numa concepção de
Marketing, enfoca a criação de valor. De acordo com Kotler (1998, p. 94), “a tarefa de
qualquer negócio é entregar valor ao mercado e obter lucro”. Lanning & Michaels, citados
por Kotler, identificam duas visões do processo de entrega de valor: a visão tradicional (a
empresa fabrica algo para, depois, vender) e a nova visão (que coloca o Marketing no início
do processo de planejamento). Na visão tradicional, o marketing entra em ação na segunda
fase do processo, após o produto ser fabricado, e se supõe que o mercado comprará unidades
suficientes para dar lucro à empresa. Como menciona Kotler, essa visão tradicional não
funciona em economias mais competitivas, onde há mais opções de escolha, devendo o
“concorrente inteligente” desenhar a oferta para os mercados-alvo bem definidos.
Na nova visão do processo, ao invés de enfatizarem a fabricação e a venda, as empresas se
vêem como parte de uma seqüência de criação e entrega de valor. Como visto na figura 1,
esse processo envolve as fases de escolha do valor, entrega do valor ao mercado-alvo e
comunicação do valor, e requer, no seu início, ações estratégicas de Marketing e, no seu meio
e no seu final, ações táticas de Marketing.
Escolhadovalor
Segmentação
dos
consumidores
Foco/
seleçãode
mercado
Entregadovalor aomercado-alvo
Posicio- Desenvolvinamentodo mentodo
valor
produto
Desenvolvimentode
serviços
Fixação
no
preço
Comunicar ovalor
Fontes de
matériasprimas
Fabricação
Distribuição
Forçade
vendas
serviços
Promoção
devendas
Propaganda
Serviços
Marketing tático
Marketing estratégico
Fonte: Lanning & Michaels, citados por Kotler (1998, p. 94)
FIGURA 1 – Seqüência da criação e entrega de valor
Numa analogia às teorias explicativas para o desenvolvimento tecnológico de Dosi (1982), na
visão tradicional da entrega de valor (que poderia ser chamada “production-push”), as
empresas “empurram” seus produtos ao mercado, enquanto na nova visão as forças do
mercado (“demand-pull”) seriam os principais determinantes para o lançamento de novos
produtos, exceto no caso dos produtos revolucionários vindos de inovações radicais.
Dentro da nova visão do processo de entrega de valor, o desenvolvimento de produto é a
primeira etapa da fase de entrega de valor ao mercado-alvo. A depender do tipo de produto ou
serviço desenvolvido, os processos de desenvolvimento de produto podem variar
significativamente na sua forma de organização. Cada produto e cada mercado têm
características particulares e não há uma única maneira ideal de conduzir todos os processos
de desenvolvimento.
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Uma questão que não está explícita no processo de criação e entrega de valor, mas que nem
por isso deixa de fazer parte do mesmo e de qualquer processo de desenvolvimento de um
novo produto, é a de se criar ou se satisfazer uma necessidade de mercado. A partir do
aumento da concorrência na maioria dos mercados, os produtores passaram a se orientar mais
pelos desejos e necessidades dos seus respectivos mercados. A orientação para a satisfação
dos clientes passou a ser parte importante do discurso institucional das empresas, e esses
princípios foram também incorporados não só na prática das empresas mas também na
formação da mão-de-obra para as mesmas. Como visto em Carvalho (2000), mesmo em
mercados dominados por oligopólios, como o caso das resinas e compostos de polipropileno,
onde predomina o poder dos fornecedores sobre os compradores, houve uma melhoria na
satisfação das necessidades dos clientes e uma preocupação maior das empresas em atingir
esse objetivo.
Apesar dessas transformações positivas no sentido de procurar satisfazer os consumidores,
desapareceu da retórica das empresas, mas não da sua prática, o poder de criar necessidades
de mercado. Indústrias como a têxtil e a calçadista são exemplos clássicos de criação de
necessidades, via modas que se renovam periodicamente, mas não são casos isolados. O
constante lançamento de novas versões na indústria de softwares, geralmente incompatíveis
com as versões anteriores, também implicam na necessidade de uma atualização constante.
De um lado, esse poder pode ser exercido de forma legítima no caso de um produto
completamente novo, utilizando as ferramentas de Marketing para informar e promover as
características inovadoras deste e torná-lo acessível aos consumidores. Por outro lado,
condenável num regime de mercado desregulamentado mas perfeitamente possível dentro do
sistema capitalista, as empresas podem impor ao mercado produtos não desejáveis (por não
satisfazer completamente as necessidades dos usuários ou por exceder os atributos necessários
à satisfação dos mesmos cobrando a mais por isso), forçar a substituição dos produtos
encurtando a sua vida útil (obsolescência planejada) ou mesmo lesar o consumidor, como no
caso da “maquiagem de produtos” relatado por Mattos (2001).
Por conta disso, apesar da orientação para o mercado predominar em grande parte das
indústrias, ao se pensar em novos produtos não se pode desprezar o poder das empresas de
criar necessidades. Considerando que os mercados e as empresas funcionam como sistemas
abertos, pode ocorrer uma situação como a descrita por Chiavenato (1983, p. 538), numa
referência à Teoria dos Sistemas:
“Um sistema aberto (...) precisa garantir a absorção dos seus produtos pelo
ambiente. (...) precisa, às vezes, ‘anestesiar’ certas necessidades ‘inadequadas’ do
ambiente e ‘educá-lo’, criando nele necessidades ‘adequadas’, isto é, de produtos
que o sistema crê sejam ‘melhores’ para o ambiente. (...) Para garantir sua
viabilidade, a organização deve oferecer ao ambiente produtos por ele
necessitados ou, se for o caso, criar nele a necessidade de tais produtos”.
Seja por iniciativa das empresas fabricantes, pela necessidade do mercado, pela ação dos
concorrentes ou por inovações em produtos e/ou processos, o lançamento de novos produtos
vem efetivamente sendo base para a concorrência em muitas indústrias. Essa questão,
contudo, é complexa, pois requer uma concepção de produto que pode apresentar falhas,
requer investimentos que nem sempre têm o retorno esperado, exige a mobilização de
recursos humanos e materiais, e envolve a superação ou não de algumas barreiras à entrada no
mercado e também de alguns dilemas.
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3. Os dilemas e as barreiras no desenvolvimento de novos produtos
Dilema, de acordo com Ferreira (1988, p. 222), é, dentre outros significados, uma “situação
embaraçosa com duas saídas difíceis ou penosas”. Kotler (1996) identifica um dilema na
questão do desenvolvimento de novos produtos: ao mesmo tempo em que fica cada vez mais
arriscado não inovar (sendo, segundo o mesmo, a inovação contínua a única maneira de evitar
a obsolescência da linha de produtos), está cada vez mais difícil o desenvolvimento bem
sucedido (pelos riscos e altos custos envolvidos, dentre outros fatores).
Além do dilema identificado por Kotler, duas outras situações representam dilemas na
questão do lançamento de novos produtos. A primeira delas envolve cultuar o novo ou se
apegar aos produtos tradicionais. Numa referência a hábitos culturais, para Daniel Bell, citado
por Eccles et al. (1994, p.16), “a sociedade fez mais do que aceitar passivamente a inovação:
ela proporcionou um mercado que engole ansiosamente o novo, por que acredita que ele é
superior em valor a todas as formas mais antigas”. Desse modo, um produto novo seria
sempre visto como superior aos já existentes, o que ampliaria as suas possibilidades de
sucesso. Os produtos tradicionais bem sucedidos, por outro lado, requerem, por conta de uma
reputação já formada no mercado, menos esforços e investimentos de Marketing e menos
riscos.
A outra situação envolve a grande oferta de novos produtos e a “limpeza” nas gôndolas. Se,
por um lado, existe a necessidade e a iniciativa de lançar uma variedade cada vez maior de
produtos no mercado, por outro lado, como relata Mattos (2002), no varejo as redes de
supermercados vêm fazendo uma “limpeza” nas suas prateleiras, reduzindo o número de itens
disponíveis e dando espaço aos produtos mais rentáveis. Com isso, ao mesmo tempo em que
se procura segmentar mais os produtos e atender a gostos e necessidades de mercado diversas,
uma força do próprio mercado (a distribuição) pode agir contrariamente a essa iniciativa,
diminuindo o espaço para a variedade de produtos e aumentando a incerteza em relação a
lançar ou não novos produtos, especialmente no caso de bens de consumo. Com essa
dinâmica, produtos tradicionais, mais conhecidos e com um volume de vendas maior,
tenderiam, com isso, a ocupar um espaço maior nos pontos de venda.
Esse último dilema aponta para um outro problema nos processos de desenvolvimento de
novos produtos que pode ser previsto pelas empresas mas, em grande parte dos casos,
dificilmente pode ser controlado: as barreiras à entrada de novos concorrentes e novos
produtos no mercado. No seu modelo de análise da concorrência, Porter (1991) identifica
como principais barreiras de entrada as economias de escala, a diferenciação de produto, as
necessidades de capital, os custos de mudança de fornecedor, o acesso aos canais de
distribuição, as políticas governamentais e as desvantagens de custo independentes da escala.
Com a abertura de mercado no início da década de 90, a redução das barreiras comerciais
possibilitou, via importações, a entrada de um número maior de concorrentes em mercados
antes fechados. Políticas industriais, geralmente baseadas em atrativos como incentivos
fiscais, também colaboraram para atrair novas empresas em muitas indústrias. Por outro lado,
as mega-corporações globais, formadas a partir de fusões e aquisições de empresas menores
em todo o mundo, concentraram os mercados globalmente, aumentando a escala necessária
para ser competitivo e, desse modo, as barreiras à entrada. Tanto as barreiras de economias de
escala (ligadas aos custos unitários de um produto) quanto às de necessidades de capital (para
investimentos em publicidade ou pesquisa e desenvolvimento (P&D)) aumentam
significativamente com essa concentração. Estando o mercado concentrado globalmente, as
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possibilidades de lançamentos bem sucedidos de novos produtos ficam praticamente restritas
a essas mega-corporações, exceto em casos de segmentos de mercado não atendidos por estas
ou novas tecnologias que proporcionam o surgimento de produtos substitutos.
Empresas que têm uma marca já consagrada e que desenvolvem um sentimento de lealdade
nos seus clientes têm, de acordo com Porter (1991), uma barreira à entrada de concorrentes
ligada à diferenciação de produto. Outra barreira importante envolve os custos de mudança de
fornecedor, que podem implicar na necessidade de treinamento de pessoal e aquisição de
novos equipamentos, dentre outros. As políticas governamentais podem, como já
mencionado, facilitar a entrada de novos concorrentes, mas também pode impor barreiras à
entrada via licenças de funcionamento e índices de eficiência e segurança do produto, dentre
outros meios legais.
As desvantagens de custo independentes da escala, relacionadas por Porter (1991), podem ser
o acesso desfavorável às matérias-primas, uma localização desfavorável, os subsídios a
empresas já estabelecidas e as tecnologias patenteadas. Uma questão importante nesse caso
envolve o papel das patentes como barreiras à entrada e/ou meios de acesso a novos produtos
e novas tecnologias. Ao mesmo tempo em que resguardam a propriedade intelectual,
permitindo às empresas que desenvolveram novas tecnologias o direito exclusivo do uso das
mesmas por um determinado tempo (sendo, com isso, uma forte barreira à entrada), as
patentes podem ser também fontes para um novo produto na medida em que, através de um
licenciamento, pode-se obter a tecnologia necessária para um desenvolvimento bem sucedido.
As condições do ambiente competitivo e o valor estratégico da nova tecnologia é que podem
determinar se esta funcionará como meio ou como barreira a um novo produto.
Em relação ao acesso aos canais de distribuição, este pode ser uma grande barreira ao
lançamento de novos produtos, não apenas pela questão do acesso dos produtos aos pontos de
venda, como na “limpeza” das gôndolas relatada por Mattos (2002), mas também pela
dificuldade de entrega do produto aos pontos de venda e/ou diretamente ao consumidor.
Como relata Porter (1991), a empresa novata pode precisar persuadir os canais a aceitar seu
produto por meio de descontos e campanhas publicitárias, o que reduz a sua lucratividade. A
internet e os “mercados virtuais” podem diminuir as barreiras comerciais por conta da
facilidade de acesso, de qualquer lugar do mundo, dos clientes às “lojas virtuais”, mas não
solucionam plenamente a dificuldade de entrega e nem se mostraram, até então, meios
alternativos eficientes para a comercialização em larga escala da maioria dos produtos.
4. Estudo de caso: empresa fabricante de eletrodomésticos
Para aprofundar a discussão sobre as barreiras discutidas por Porter (1991) e os dilemas no
lançamento de novos produtos, e verificar como estes vêm, ou não, ocorrendo, foi realizado
um estudo de caso numa empresa fabricante de eletrodomésticos, visitando a fábrica e
entrevistando um engenheiro da área de Desenvolvimento e Qualidade.
A empresa pesquisada foi escolhida por ser uma fabricante de bens de consumo. Fundada na
década de 90, é uma empresa nacional de médio porte, possui duas fábricas no país e fabrica
lavadoras de roupas, centrífugas, bebedouros e purificadores de água. Realiza a operação de
montagem dos eletrodomésticos, adquirindo todos os componentes de outras empresas. Atua
em todo o mercado nacional e também exporta.
Considerando o ciclo de vida dos produtos, a empresa tem produtos em todas as fases do
ciclo: na fase de introdução (um novo tipo de bebedouro), de crescimento (purificadores de
água), maturidade (lavadoras e centrífugas) e declínio (uma determinada linha de lavadoras).
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Seus produtos se destinam ao consumidor final, segmentado por classes sociais. Para os
bebedouros e purificadores, o mercado-alvo são as classes A e B e para as lavadoras e
centrífugas, as classes C e D. Os canais de distribuição dos produtos são as lojas varejistas de
eletrodomésticos, não ocorrendo a venda direta ao consumidor.
Pelo tipo de produto que fabrica e pelos seus mercados-alvo, a empresa não concorre
diretamente com as grandes empresas do mercado brasileiro de eletrodomésticos, bastante
concentrado e dominado por mega-corporações globais. A maioria das suas concorrentes
diretas também é de médio porte.
No mercado de eletrodomésticos, segundo as informações obtidas, podem ocorrer restrições
ao lançamento de novos produtos. O custo de produção pode ser um fator impeditivo,
dependendo do mercado-alvo e da concorrência. Empresas que não têm uma marca forte têm
mais dificuldades, pois também no varejo de eletrodomésticos há um espaço reduzido nos
pontos de venda, o que limita a variedade de produtos que podem ser expostos.
A entrada de uma nova empresa concorrente nesses mercados é difícil para quem não tem
baixo custo de produção ou uma marca forte. As importações também não se mostram uma
forma viável de entrada de novos concorrentes, pela baixa receptividade do consumidor de
eletrodomésticos a marcas desconhecidas. Em relação à lealdade do consumidor, há
comportamentos diferentes de acordo com a classe social. O consumidor das classes A e B é
leal à marca e à qualidade, enquanto o consumidor das classes C e D é leal ao custo.
Uma importante barreira à entrada de novas empresas no setor de eletrodomésticos é a
preocupação do consumidor com a assistência técnica do produto. Para superar essa barreira,
a empresa estudada desenvolveu uma rede própria, que surgiu do departamento de assistência
técnica da empresa e atualmente se constitui numa outra empresa da mesma holding,
prestadora de serviços de assistência técnica inclusive para outras marcas.
Outros fatores, como custos de mudança de fornecedor, políticas governamentais, acesso às
matérias-primas, localização desfavorável ou subsídios a empresas já estabelecidas não se
mostraram barreiras significativas à entrada nesses mercados. O acesso à tecnologia e as
patentes, no caso desses produtos, não restringem o lançamento de novos produtos nem se
constituem diferenciais significativos de competitividade. As tecnologias de fabricação são
vistas como commodities, acessíveis a quem quer adquirir. O posicionamento da empresa em
patentear seus produtos tem mais um objetivo de salvaguardar seus produtos e processos do
que de licenciar as patentes a outras firmas.
Apesar da sua estratégia competitiva baseada em custo, o crescimento da empresa, de acordo
com o entrevistado, é baseado no lançamento de novos produtos. A preocupação com a
qualidade e a diferenciação pelo design também são ressaltadas. O lançamento de novos
produtos é visto como condição de crescimento e também de sobrevivência da empresa, pois
o ciclo de vida dos eletrodomésticos é cada vez menor. Além dos produtos novos que
ampliam o seu mix, a empresa também muda anualmente o aspecto visual dos seus produtos.
Também na questão da preferência do consumidor por produtos novos ou tradicionais há
diferenças entre as classes de consumidores. Enquanto o consumidor das classes A e B
prefere novos produtos com inovações, a preferência do consumidor das classes C e D
depende de como o produto lhe é oferecido (no ponto de venda ou pela publicidade das
empresas fabricantes). O desejo do consumidor é monitorado por pesquisas de mercado.
Por fim, em relação à questão de se criar ou se satisfazer necessidades do mercado, as duas
situações podem ocorrer. No caso da criação de necessidades, a ação da empresa é no sentido
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de oferecer facilidades ao consumidor. Nesse processo, por sua capacidade de investir em
publicidade e também pela força da marca, as grandes empresas podem ter o papel de
pioneiras, sendo seguidas pelas empresas menores. Essas facilidades, à medida em que se
tornam hábitos de consumo, acabam se transformando em necessidades.
Um caso recente de criação de necessidades na indústria de eletrodomésticos é o dos
bebedouros domésticos. Com a oferta desses aparelhos e a expansão da oferta e do consumo
de água mineral, através dos garrafões plásticos, essa facilidade acaba se transformando num
novo padrão de consumo, e os bebedouros domésticos acabam tornando-se, dessa forma,
necessidades.
5. Conclusão
Na gestão do Processo de Desenvolvimento de Produto, a escolha entre buscar o novo ou
manter o tradicional depende do modo de concorrência da indústria, mas ambas opções
podem se constituir em situações de risco. Se, por um lado, há uma série de motivos para
lançar continuamente novos produtos, por outro lado os dilemas e barreiras mencionados
neste trabalho impõem restrições a esses lançamentos contínuos. São também limitados os
recursos (humanos, financeiros, materiais) disponíveis para conceber e desenvolver novos
produtos, o que requer uma gestão eficiente dos projetos em curso e do portfolio de produtos.
Cooper et al. (1998) definem a gestão de portfolio como um processo dinâmico de decisão
pelo qual uma relação de novos projetos de novos produtos (e de P&D) é constantemente
atualizada e revisada. Nesse processo, segundo os mesmos, novos projetos são avaliados,
selecionados e priorizados; projetos existentes podem ser acelerados, extintos ou
despriorizados; e recursos são alocados e realocados a projetos ativos.
De acordo com Clausing (1993), para serem bem sucedidas, a empresa e as atividades de
desenvolvimento de produto devem se adequar ao status estático/dinâmico da indústria.
Culturas e práticas boas para uma indústria estática não funcionarão bem em indústrias
dinâmicas e vice-versa. Se o status conceitual do produto é estático (também conhecido como
projeto dominante), então o conceito é conhecido através dos produtos existentes.
No caso da empresa de eletrodomésticos estudada, o lançamento contínuo de novos produtos
vem se constituindo uma estratégia de concorrência, dentro dos seus mercados de atuação.
Evidencia-se com esses resultados o caráter dinâmico da indústria de eletrodomésticos,
inclusive na formação de hábitos de consumo. Ao oferecer novas facilidades ao consumidor,
as empresas vão, à medida em que essas facilidades se tornam hábitos de consumo, criando
novas necessidades no mercado. O poder de influenciar os hábitos de consumo, nesse caso, é
exercido de forma legítima pelas empresas, pois o consumidor é quem opta por ter ou não a
facilidade oferecida.
Uma das principais barreiras à entrada no mercado de eletrodomésticos está relacionada ao
tamanho da empresa, pois nos segmentos mais rentáveis há uma grande concentração de
mercado entre mega-corporações globais. A empresa estudada atua em segmentos específicos,
não concorrendo diretamente com estas. O custo de produção também pode ser um fator
impeditivo, dependendo do mercado-alvo e da concorrência.
Evidenciou-se também as diferenças entre hábitos de consumo das diferentes classes sociais,
o que se expressa em questões como lealdade à marca, custo ou preferência por produtos
novos.
Além da importância da marca nesse mercado, caracterizou-se como grande barreira à entrada
de novas empresas no setor de eletrodomésticos a preocupação do consumidor com a
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assistência técnica do produto.
Outros fatores, como custos de mudança de fornecedor, políticas governamentais, acesso às
matérias-primas, localização desfavorável ou subsídios a empresas já estabelecidas não se
mostraram barreiras significativas à entrada nesses mercados.
Como visto, apesar do lançamento de novos produtos ser um fator decisivo na concorrência,
algumas características do ambiente podem influenciar, tanto positiva quanto negativamente,
esse processo, devendo ser levadas em conta nas análises de viabilidade dos novos produtos.
Outras forças do modelo de análise de concorrência de Porter (1991), como a rivalidade entre
os concorrentes e a ameaça dos produtos substitutos, devem também ser consideradas nessas
análises.
Por tudo isso, é cada vez mais importante uma visão ampla do processo de desenvolvimento
de produto, que enfoque não apenas as atividades diretamente ligadas à fabricação do mesmo,
começando pelo planejamento estratégico da empresa e pela gestão do seu portfolio de
produtos. Para uma performance bem sucedida, uma condição fundamental é o alinhamento
dos projetos de desenvolvimento à estratégia competitiva da empresa. A depender do produto,
da fase do seu ciclo de vida ou do segmento de mercado em que se quer atuar, vão haver
estratégias mais adequadas e objetivos de projeto mais adequados a estas.
OBS: Os autores agradecem ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e
Tecnológico (CNPq) pelo apoio.
Referências
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