Respostas Bioquímicas Durante a Indução de Estresse Salino em Plantas de Pimentão Cultivadas em Sistema Fertirrigado. Fernando Broetto1; Marcelo Leonardo2; Roberto Lyra Villas Bôas3; Rafael Simões Almeida1; José Abramo Marchese4; Magali Regina1; Fábio Bechelli Tonin1 1 UNESP-IB, Depto de Química e Bioquímica, 18618-000, Botucatu-SP; 2UNESP-FCA, Depto. de Engenharia Rural, C. P. 237, 18603-970, Botucatu-SP; 3UNESP-FCA, Depto. de Recursos Naturais/Ciência do Solo, C.P. 237, 18603-970; CEFET-PR, Lab. Bioquímica e Fisiologia Vegetal, 85503-390 Pato Branco PR. RESUMO O cultivo protegido aliado a fertirrigação, tem se estabelecido no Brasil como alternativa econômica para várias espécies hortícolas. Ultilizando-se esta estratégia, conduziu-se um experimento com planta de pimentão (Capsicum annuum L.) híbrido Elisa, com o objetivo de estudar possíveis impactos na produção de frutos, decorrentes do aumento da concentração salina no solo. Desta forma as concentrações de sais foram alteradas, visando obter valores elevados de condutividade elétrica no solo (CE), adotando os valores observados na fertirrigação tradicional, como controle. Além desta prática, verificou-se também a possibilidade de atenuação do estresse salino com a aplicação de matéria orgânica no solo. O aumento da CE do solo induziu ao aumento da concentração de L-prolina e da atividade da enzima superoxido dismutases (SOD). Por outro lado, verificou-se que o estresse salino inibiu a atividade da enzima Catalase. Concluiu-se ainda que o monitoramento da CE do solo é uma ferramenta indispensável para se alcançar êxito no cultivo fertirrigado, sendo viável a utilização da atividade das enzimas do sistema de resposta antioxidativo, assim como concentração de L-prolina como marcadores bioquímicos de tolerância ao estresse salino. Palavras- chave: Capsicum annuum L., fertirrigação, condutividade elétrica do solo, enzimas. ABSTRACT Biochemical responses during the salt stress induction in bell pepper plants cultivated under fertigation system. The protected cultivation allied to a fertigation system has been established in Brazil as an economic alternative to a variety of horticultural species. Utilizing this strategy, an Elisa hybrid bell pepper (Capscum annuum L.) culture was conducted with the purpose to evaluate possible production impacts due to an increase of saline soil concentration. Therefore, saline concentration was altered aiming to obtain elevated values of soil electric conductivity (EC), 4 utilizing as control, values observed on the traditional fertigation system. Beyond this, it was also verified the possibility of saline stress attenuation by the application of organic material on the soil. Due to increasing of the soil EC, we verified that the content of L-proline and superoxide dismutases (SOD) activity was higher when compared with the control set plants. Intriguingly, the stressed plants presented a decrease in the catalase activity. In conclusion, our experiments indicate that the EC monitoring procedures are an effective toll in order to achieve success on the fertigation production, making possible the enzyme activity of the antioxidative response system and proline contents as a biochemical marker to the stress tolerance. Keywords: Capsicum annuum L., fertigation, soil electrical conductivity, enzymes INTRODUÇÃO Um dos grandes riscos do uso da fertirrigação, dada a natureza intensiva da atividade, é o processo de salinização principalmente se o solo já contém elevado teor de sais solúveis. Aplicações excessivas de fertilizantes, utilização de água salina e o formato do bulbo molhado em gotejamento, fazem com que ocorra acúmulo de sais na superfície do solo e na periferia do bulbo. Em condições salinas, ocorre redução na disponibilidade de água para as plantas, em função da redução do potencial total de água no solo, ocasionado pela contribuição da salinidade havendo um maior gasto de energia para a absorção da mesma. A possibilidade do aumento do potencial salino do solo é maior em cultivo protegido, sendo que com a fertirrigação evita-se grandes flutuações na concentração de nutrientes na solução do solo. Este fator pode significar um aspecto favorável na produtividade, principalmente para o pimentão que é considerado uma cultura moderadamente sensível a salinidade (1,5 dS m-1 de condutividade elétrica, segundo Mass & Holfman, 1977). Sob condições ambientais adversas, os vegetais podem apresentar capacidade de resposta através de alteração de seu metabolismo, principalmente quando o fator estressante induz a formação de espécies reativas de oxigênio. Dentre as formas de resposta antioxidativa, destaca-se a atividade da enzima superoxido dismutases (SOD) e catalases, que atuam na dismutação de agentes oxidantes e nocivos, principalmente em nível de membrana. A SOD catalisa a dismutação de um radical superoxido até peróxido de hidrogênio. Juntamente com a enzima ascorbato peroxidase (APX), as catalases terminam a dismutação dos peróxidos a’te água, eliminando o risco de oxidação dos lipídeos de membrana. O presente experimento teve como objetivos o estudo da elevação da EC no solo e suas conseqüências estressantes para as plantas de pimentão. Como marcadores bioquímicos, estudou-se a atividade da enzima SOD, catalases e acúmulo de prolina no estrato bruto. MATERIAL E MÉTODOS O experimento foi conduzido em túnel plástico utilizando-se vasos de amianto com 30 L contendo um Latossolo Vermelho Escuro Distrófico textura média com as seguintes características químicas: pH(CaCl2) de 4,2; 14 g dm-3 de M.O.; 2 mg dm-3 de P (resina), 0,2; 4 e 1 mmolc dm-3 de K, Ca e Mg, respectivamente, e V de 6%. Foi aplicado calcário dolomítico (PRNT = 91%) para elevar a V a 80%, e 150 mg L-1 de P no solo, sendo 75 mg P aplicado como superfosfato simples e 75 mg P na forma de termofosfato contendo enxofre e micronutrientes. Nos tratamentos onde se utilizou matéria orgânica foram aplicados 260 g de esterco de curral seco por vaso equivalente a 20 t ha-1. O delineamento experimental foi inteiramente casualizado, em esquema fatorial 4 x 2, com 4 repetições sendo 4 doses de adubo com presença e ausência de matéria orgânica. Nos vasos do tratamento controle foi aplicado 0,24 g planta-1 de N, na forma de nitrato de cálcio e 0,2 g planta-1 de K na forma de KCl, de forma parcelada a cada 3 dias Segundo Villas Bôas (2000), mantendo-se a CE do solo em torno de 1,5 dS m-1(limite para a cultura do pimentão). De acordo com as equações de salinização do solo obtidas por Leonardo (2003), (CE=0,053g Ca(NO3)2+0,4029 e CE=0,0967g KCl+0,38) foram aplicados as quantidades de nitrato de cálcio e cloreto de potássio para elevar a CE para valores 2X (3,0 dS/m), 3X (4,5 dS/m) e 4X (6,0 dS/m) os valores considerados controle (1,5 dS/m). Os adubos citados foram aplicados em solução, através de sistema de gotejamento por gravidade adaptado (garrafas do tipo Pet de 2 L). O extrator de solução do solo e o tensiômetro de punção, foram instalados a uma distância de 15 cm da planta e a uma profundidade de 20 cm do centro da cápsula porosa. Dependendo do comportamento da CE do solo, medida quinzenalmente a dose dos adubos foi aumentada ou diminuída, de acordo com a equação de salinização do solo. Conforme planejado para o conjunto dos experimentos, procedeu-se as coletas de folhas para as análises de parâmetros bioquímicos como a atividade de enzimas SOD e Catalase do sistema de resposta antioxidativa, e a concentração de prolina . As folhas expandidas foram coletadas da região mediana das plantas, acondicionadas em frascos do tipo falcon e imediatamente imersas em N líquido para congelamento rápido. Após a coleta, as amostras foram armazenadas em Freezer a – 80 C. metodologia descrita por Broetto et al. (2002). RESULTADOS E DISCUSSÃO As análises foram efetuadas conforme Analisando-se os resultados apresentados na Tabela 1, observou-se que houve influência significativa para os níveis de CE e a suplementação de MO em relação a atividade da enzima SOD e do teor de prolina sendo que a atividade da enzima catalase em relação aos níveis de CE não foi significativo e significativo à suplementação de MO. Por outro lado, a interação entre a (MO X CE) não apresentaram diferenças significativas, exceto para o teor de prolina. Tabela 1: : Análise de variância da atividade das enzimas superóxido dismutase (SOD) e catalase (CAT), e o teor de prolina em folhas de plantas pimentão Elisa em função de diferentes níveis de CE e na presença ou não de matéria orgânica. Causa de variação GL Níveis de condutividade 3 Matéria Orgânica 1 Interação (CE x MO) 3 CV * significativo ao nível de 1% SOD 0,0001* 0,0157* 0,6844ns 15,09 CAT 0,0679ns 0,0412** 0,2398ns 114,83 Prolina 0,0001* 0,0007* 0,0001* 3,16 ** significativo ao nível de 5% ns não significativo Analisando-se os resultados da análise de variância apresentada na Tabela 1, verificou-se que houve variação significativa (teste F a 5 %) para todos os tratamentos com diferentes níveis de CE e/ou matéria orgânica exceto para a análise da atividade da enzima catalase que não 55 45 35 y = -1,275x2 + 13,597x + 17,94 (MO) R2 = 0,9649 25 y = -1,4575x + 13,901x + 16,133 (SMO) R2 = 0,9673 2 15 UI . µg prot -1 U SOD . µg prot -1 houve significância a 5% para diferentes níveis de CE e para interação CE x MO. 5 1,5 3 4,5 6 CE (dS/m) 55 50 45 40 35 30 25 1,5 dS/m 3,0 dS/m 4,5 dS/m 6,0 dS/m 36 51 78 108 146 DAT Figura 1A: Média da atividade da enzima SOD e Figura 1B: Valores da atividade da enzima SOD em folhas durante o ciclo de plantas de pimentão Elisa em função de diferentes CE do solo. Observa-se na Figura 1A, que a atividade da enzima SOD, apresentou correlação com o aumento da CE do solo. Para o tratamento controle a atividade da enzima foi menor em cerca de 33, 56 e 71 %, comparada à atividade devido aos tratamentos com 3,0, 4,5 e 6,0 dS/m de CE. A enzima SOD correspondeu às expectativas como marcador bioquímico do estabelecimento de reações antioxidativas típicas, agindo na dismutação de espécies reativas de oxigênio, comuns em situação de estresse ambiental. A aplicação de matéria orgânica foi significativa, como observado na Tabela 1, apresentando algum fator que estimulou a atividade da enzima, porém sem relação direta com atenuação devido ao aumento da CE. Os mecanismos que estariam fomentando esta interação não foram objeto de estudo dos experimentos. A Figura 1B apresenta o comportamento da atividade da SOD, durante o desenvolvimento da cultura. Observa-se que para todos os tratamentos a enzima não houve grandes oscilações para as diferentes coletas realizadas. Como exceção, verificou-se que aos 78 DAT quando a planta entra em um período de transição entre o estádio vegetativo para o reprodutivo, a atividade da enzima diminuiu. Esta diminuição de atividade voltou a ocorrer no final do ciclo. A enzima SOD apresenta aumento de atividade, sempre que as plantas são submetidas a um ambiente estressante, como salinidade, altas temperaturas, estresse hídrico, alta intensidade luminosa, ataque fitopatogênico e ou insetos, entre outros (Broetto et al, 2002). -1 y = 12,88x2 - 84,216x + 239,84 (MO) R2 = 0,8312 150 120 90 60 30 y = -10,778x2 + 27,22x + 98,573 (SMO) R2 = 0,7208 0 1,5 3 CE (dS/m) 4,5 6 mKat . mg prot mKat . m g prot.-1 180 360 315 270 225 180 135 90 45 0 1,5 dS/m 3,0 dS/m 4,5 dS/m 6,0 dS/m 36 51 78 DAT 108 146 Figura 2A: Média da atividade da enzima CAT e Figura 2B: Valores da atividade da enzima CAT em folhas durante o ciclo de plantas de pimentão Elisa em função de diferentes CE do solo. Conforme pode ser observado na Figura 2B, a atividade da catalase variou pouco, considerando-se os diferentes valores de CE, até os 78 DAT. Após este período e até o final do ciclo da cultura, registrou-se aumento drástico na atividade da enzima. Este evento pode ter relação com um aumento das taxas de respiração celular, em função da alteração das rotas metabólicas (catabolismo) relacionadas com o florescimento, com maior ênfase para o controle. Como estas reações elementares, ocorrem em nível de mitocôndrias e peroxissomos, postula-se que a atividade da catalase tenha acompanhado os eventos de dismutação de peróxido de hidrogênio, em cooperação com a enzima ascorbato peroxidase. y = -0,265x2 + 2,483x + 0,685 (MO) R2 = 0,9737 y = 0,055x2 + 0,679x + 2,455 (SMO) R2 = 0,8367 1,5 3 4,5 CE (dS/m) 6 µM . g -1 MF µM / g MF+f 13 7 6 5 4 3 2 1 0 11 1,5 dS/m 9 3,0 dS/m 7 4,5 dS/m 5 6,0 dS/m 3 1 36 51 Figura 3A: Média do teor de prolina e Figura 3B: Valores do teor 78 108 deDAT prolina 146 em folhas durante o ciclo de plantas de pimentão Elisa em função de diferentes CE do solo. Baseado na Figura 3A, pode-se afirmar que o teor de prolina encontrado nas folhas aumentou em resposta a CE do solo. Nessa correlação o controle apresentou teores de 40, 81 e 92 % menor que os observados nos tratamentos conduzidos a 3,0, 4,5 e 6,0 dS/m. A suplementação do solo com matéria orgânica, também apresentou significância em relação a este parâmetro. Os valores apresentados na Figura 3B demonstram que houve grande acúmulo de prolina no início dos experimentos. Estes teores elevados foram gradativamente diminuindo, a medida em que a cultura se desenvolvia. No entanto, o acúmulo do aminoácido foi sempre maior para aqueles tratamentos com maior CE. Isto pode evidenciar que o transplantio das mudas e a sua adaptação ao sistema de plantio adotado, representou um fator estressante, que provavelmente induziu a degradação de proteína, com acúmulo de prolina. CONCLUSÕES O aumento da CE do solo foi proporcional ao aumento da concentração de prolina e da atividade da enzima SOD e inversamente proporcional ao aumento da atividade da enzima catalase. O monitoramento da atividade das enzimas SOD e catalase do sistema de resposta antioxidativo e da concentração de prolina podem ser utilizados como indicadores dos níveis de estresse da planta. LITERATURA CITADA MASS, E. V., HOLFMAN, G. J. Crop salt tolerance - Current assessment. Journal Irrigation and Drenage Division, v.103, p. 115-34, 1977. VILLAS BÔAS et al, “Efeitos de doses de nitrogênio aplicado de forma convencional através da fertirrigação da cultura do pimentão”, Congresso Brasileiro de Hortaliça, 2000. BROETTO, F.; LUTTGE, U.; RATAJCZAK, R.; Influence of light intensity and salt treatment on mode of photosynthesis and enzymes of the antioxidative response system of mesembryanthemum crystallinum, Functional Plant Biology, Victoria, v.29, , p. 13-23, 2002. AGRADECIMENTOS : À FUNDUNESP, pelo apoio financeiro, proc. 00464/04-DFP