IMPACTO DO TEMPO ENTRE QUEIMADURA E REALIZAÇÃO DO PRIMEIRO PROCEDIMENTO CIRÚRGICO NO DESFECHO DE PACIENTES ATENDIDOS EM HOSPITAL UNIVERSITÁRIO Thalita Bento Talizin (Bolsista IC/UEL), Cintia Magalhães Carvalho Grion, Lucienne Tibery Queiroz Cardoso, e-mail: [email protected] Universidade Estadual de Londrina, Centro de Ciências da Saúde, Departamento de Clínica Médica. Área e sub-área do conhecimento: Medicina/Clínica Médica. Palavras-chave: unidade de queimados; análise de sobrevida; queimaduras. Resumo O paciente queimado necessita de medidas clínicas de suporte e de tratamento na área queimada para que haja recuperação da pele. O presente estudo tem caráter longitudinal retrospectivo. A população é composta por 178 pacientes internados em unidade específica de hospital universitário no período 2011 a 2013. O objetivo é a análise do tempo entre o acidente que ocasionou a queimadura e o primeiro procedimento cirúrgico para estabelecer relação com o desfecho do quadro. Os dados clínicos coletados e os escores Abbreviated Burn Severity Index (ABSI) e Acute Physiology and Chronic Health Evaluation (APACHE II) foram analisados com os programas EpiInfo 3.3.2 e MedCalc 15.8. Observou-se que 129 (72,5%) eram do sexo masculino, e que a maior parte (n=129) foi classificada na faixa etária de 18 a 50 anos (77,1%). O primeiro desbridamento cirúrgico foi realizado em 48 pacientes até o 3º dia de internação (29,3%). O enxerto foi realizado pela primeira vez depois do 15º de internação em 57 pacientes (49,3%). A área sob a curva ROC do APACHE II foi calculada em 0,838 e do ABSI em 0,821. A alta hospitalar foi o desfecho de 111 pacientes (62,4%). Não houve significância estatística na análise do tempo entre o primeiro procedimento cirúrgico e o desfecho hospitalar. Considera-se a gravidade do paciente fator determinante para a evolução e desfecho do paciente grande queimado. Introdução e objetivo De acordo com Alharbi et al. (2012), o manejo do paciente queimado nas primeiras horas após o acidente é crucial para estabilização do quadro, bem como para obter melhor prognóstico e menor mortalidade. É fundamental que a 1 área da queimadura seja avaliada por métodos quantitativos, como a tabela de Lund-Browder (LUND; BROWDER, 1944), que dimensiona o acometimento físico do paciente. Após os cuidados iniciais e encaminhamento a centro especializado em atendimento a queimados, a indicação de procedimentos específicos deve ser considerada. De acordo com Rossi et al. (2010), o cuidado com a ferida deve objetivar a remoção de tecido necrótico para que haja restabelecimento gradual da funcionalidade da pele, proporcionando consequente cicatrização. Para isso são realizados o desbridamento e o enxerto. O objetivo do presente estudo é avaliar o impacto do tempo decorrido entre a queimadura e a realização do primeiro procedimento cirúrgico em pacientes atendidos em centro de tratamento especializado de hospital universitário. Procedimentos metodológicos Este trabalho é vinculado ao projeto de pesquisa “Análise de custos de pacientes internados em centro de referência de tratamento de queimaduras”, cadastrado sob o nº 07989, com aprovação pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Universidade Estadual de Londrina. Estudo longitudinal retrospectivo, com amostragem de pacientes acima de 18 anos internados no período de 2011 a 2013 em leitos da Unidade de Terapia Intensiva do Centro de Tratamento de Queimados (UTQ) do Hospital Universitário da Universidade Estadual de Londrina (HU/UEL). Foram coletados dados clínicos e demográficos na admissão e dados diários da internação até o desfecho. Foram calculados os escores Abbreviated Burn Severity Index (ABSI), de Tobiasen, Hiebert e Edlich (1982), e Acute Physiology and Chronic Health Evaluation (APACHE II), de Knaus et al. (1985). Os resultados das variáveis contínuas foram descritos pela média e desvio padrão. Os dados categóricos foram apresentados como frequência. As variáveis categóricas foram analisadas com o teste exato de Fisher. Foi realizada regressão logística para verificar impacto de fatores de risco no desfecho, empregando o método stepwise forward de seleção de variáveis, usando como critério valor de p < 0,20 para entrar no modelo e valor de p < 0,05 para permanecer no modelo. A mortalidade hospitalar foi descrita como frequência. Foi calculada a área sob a curva (AUC) receiver operating characteristic (ROC) para discriminar o desfecho do paciente (sobrevivente e não sobrevivente) e verificar a acurácia dos escores utilizados. O nível de significância utilizado foi de 5% e as análises foram realizadas utilizando-se os programas EpiInfo 3.3.2., fevereiro de 2005 (CDC, USA) e MedCalc para Windows, versão 15.8 (MedCalc Software, Mariakerke, Belgium). Resultados e discussão 2 Durante o período estudado, foram admitidos 178 pacientes na UTQ do HU/UEL. Destes, 129 (72,5%) são do sexo masculino. A maior parte dos pacientes (n=129) está enquadrada na faixa etária de 18 a 50 anos (77,1%), sendo a média de idade 41,8 anos (±15,3). Os acidentes domésticos prevalecem em 91 casos (51,1%) e a etiologia mais frequente foi o fogo em 131 internações (73,6%). Nos Estados Unidos da América, independentemente da gravidade, a maioria dos pacientes queimados atendidos de 2002 a 2012 era do sexo masculino, com média de idade de 32 anos. A prevalência de ocorrências foi doméstica. A mortalidade total no período foi de 3,4% e a pneumonia foi a complicação mais frequente (ABA, 2013). Em relação a procedimentos, 48 pacientes realizaram o primeiro desbridamento até o 3º dia de internação (29,3%), sendo o tempo médio de 7,0 dias (±5,8). O enxerto, por sua vez, foi realizado pela primeira vez depois do 15º de internação em 57 pacientes (49,3%), com média de dias de 15,8 (±7,4). O escore APACHE II teve média de 16,5 (±8,5), com AUC calculada em 0,838 (ponto de corte do escore calculado em 14, com sensibilidade de 83,6% e especificidade de 72,7%). O ABSI teve média de 7,9 (±2,3), com AUC de 0,821 (ponto de corte do escore calculado em 8, com sensibilidade de 68,7% e especificidade de 84,7%). A média do escore APACHE II para pacientes sobreviventes foi 12,7 (±6,1) e de 22,6 (±8,3) para pacientes não sobreviventes. O ABSI, por sua vez, teve média de 6,9 (±1,6) em pacientes sobreviventes e 9,5 (±2,3) em pacientes não sobreviventes. A análise por regressão logística evidenciou que não existe relação entre o tempo para desbridamento e tempo para enxerto quando é estudado o desfecho de morte hospitalar. As variáveis associadas de maneira independente à mortalidade hospitalar foram os escores APACHE II e ABSI. O ABSI apresentou melhor resultado na identificação de não sobreviventes em estudo de Queiroz et al. (in press). O tratamento considerado crucial para a evolução do paciente queimado é o procedimento realizado na pele, seja desbridamento ou enxerto, uma vez que o tecido morto é removido e a pele tem a possibilidade de restaurar progressivamente sua função protetora. Tal conceito é tido como referência para o tratamento do queimado desde o século passado. Preconiza-se que o atendimento específico de pele aconteça precocemente (ORGILL, 2009). Schiozer (2011) ressalta que a queimadura provoca morte da flora bacteriana que coloniza a pele naturalmente. Portanto, é reiterada a importância do procedimento cirúrgico precoce no sentido de evitar infecção. Conclusão 3 A epidemiologia do paciente queimado atendido em unidade específica de terapia intensiva mostra em sua maioria paciente adulto do sexo masculino e os acidentes são predominantemente domésticos. O primeiro procedimento cirúrgico foi realizado tardiamente na amostra estudada, o que, juntamente com escores de gravidade, sugere que o paciente admitido no serviço em questão é clinicamente muito grave, demandando maior tempo de estabilização clínica. Não houve significância estatística no tempo de realização do primeiro procedimento cirúrgico e no desfecho, sendo este último influenciado principalmente pela gravidade da queimadura. Referências ABA (American Burn Association). National Burn Repository. Report of data from 2003-2012. Chicago: American Burn Association, National Burn Repository, 2013. ALHARBI, Z. et al. 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