Páginas 255-259 - Sociedade Brasileira de Cirurgia de Cabeça e

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Artigo Original
OSTEOSSARCOMA DA CABEÇA E PESCOÇO
OSTEOSARCOMA OF THE HEAD AND NECK
PAOLA ANDREA GALBIATTI PEDRUZZI
2
PATRÍCIA BURDA COSTA
3
BENEDITO VALDECIR DE OLIVEIRA
GYL HENRIQUE ALBRECH RAMOS1
LAURINDO MOACIR SASSI4
DINARTE ORLANDI5
RESUMO
Introdução: O osteossarcoma é um tumor raro e de
alta agressividade, acometendo a região cabeça e pescoço
em aproximadamente 7% dos casos. A maioria das lesões da
cabeça e pescoço está localizada na mandíbula e, menos
freqüentemente, na maxila, em pacientes na terceira e quarta
décadas de vida. A ressecção cirúrgica adequada é o
tratamento principal e alguns pacientes com osteossarcoma
da cabeça e pescoço têm sido submetidos a tratamento
adjuvante. Objetivo: Apresentar 13 casos de osteossarcoma
da cabeça e pescoço, tratados no Hospital Erasto Gaertner,
de 1973 a 2000. Pacientes e método: As variáveis
analisadas foram a idade, gênero, local do tumor,
manifestação clínica, irradiação prévia, tratamento e
seguimento. Resultados: A idade média ao diagnóstico foi de
32 anos, variando de 13 a 66. Dos 13 pacientes, oito (62%)
apresentavam tumores localizados na mandíbula, enquanto
cinco (38%) apresentavam tumores na maxila. A
manifestação clínica mais comum foi a presença de massa,
dor e alterações dentárias. A cirurgia foi realizada em dez
pacientes. O tratamento adjuvante incluiu a quimioterapia pré1- Especialista em Cirurgia de Cabeça e Pescoço, do Serviço de Cirurgia de Cabeça e
Pescoço do Hospital Erasto Gaertner.
2- Oncologista do Hospital Erasto Gaertner.
3- Especialista em Cirurgia de Cabeça e Pescoço. Chefe do Serviço de Cirurgia de
Cabeça e Pescoço do Hospital Erasto Gaertner.
4- Chefe do Serviço de Bucomaxilofacial do Hospital Erasto Gaertner. Professor do Curso
de Pós-graduação de Cirurgia Bucomaxilofacial da Universidade Federal do Paraná.
5- Estatístico do Hospital Erasto Gaertner.
instituição: Hospital Erasto Gaertner
Correspondência: Paola Andrea Galbiatti Pedruzzi, Rua Dr. Ovande do Amaral, 201 –
81520-060 Curitiba, PR. E-mail: [email protected]
1
operatória (quatro pacientes), radioterapia pós-operatória
(um paciente), quimioterapia pós-operatória (seis pacientes)
e quimioterapia e radioterapia pós-operatória (quatro
pacientes). O tempo médio de seguimento foi de 34,6 meses e
houve recidiva em quatro (31%) pacientes. Cinco (38%) dos
13 pacientes foram a óbito devido à doença e um paciente foi a
óbito, estando livre de doença. Dois pacientes (15%)
perderam o seguimento e os outros cinco pacientes (38%)
estavam vivos e livres de doença na data do último contato.
Descritores: osteossarcoma; mandíbula; tumores ósseos.
ABSTRACT
Introduction: Osteosarcoma is a highly aggressive
and rare tumor located in head and neck region in
approximately 7% of the cases. Adequate surgical resection is
the mainstay of treatment and some patients with head and
neck osteosarcoma have been treated with adjuvant therapy.
Most lesions in the head and neck arise from the mandible and
less frequently the maxilla in patients in the third and fourth
decades of life. Objective: To present 13 cases of
osteosarcoma of the head and neck treated in Hospital Erasto
Gaertner from 1973 to 2000. Patients and methods: The
variables examined were age, gender, site of tumor,
presentation, prior radiation exposure, treatment and followup. Results: The mean age at diagnosis was 32, with a range
from 13 to 66. From the 13 patients, 8 (62%) had tumors in the
mandible and 5 (38%) had tumors in the maxilla. The most
frequent manifesting symptom was a mass, pain and dental
complaints. Ten patients underwent surgical resection.
Recebido em: 29/08/2006; aceito para publicação em: 05/10/2006.
Rev. Bras. Cir. Cabeça Pescoço, v. 35, nº 4, p. 255 - 259, outubro / novembro / dezembro 2006
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Adjuvant therapy included preoperative chemotherapy (4
patients), postoperative radiation (1 patient), postoperative
chemotherapy (6 patients), postoperative chemoradiotherapy
(4 patients). The median follow-up was 34.6 months and there
was recurrence in 4 patients (31%). Five out of 13 patients
(38%) died of their disease, and 1 patient died free of disease.
Two patients were lost to follow-up and the remaining 5
patients (38%) were free of disease at the time of last followup.
Tabela 1 – Dados dos 13 pacientes com osteossarcoma.
Key words: osteosarcoma; mandible; bone tumors.
* cirurgia de reconstrução
INTRODUÇÃO
O osteossarcoma de mandíbula é uma doença rara,
agressiva e que compreende de 5 a 13% de todos os
osteossarcomas do esqueleto, constituindo menos de 0,5%
dos tumores de cabeça e pescoço1,2. Os locais mais
acometidos são a mandíbula e a maxila e, raramente, ocorre
nos demais ossos da face e do crânio. A etiologia desses
tumores é pouco conhecida, podendo estar associada à
irradiação prévia e outros fatores predisponentes.
Devido à raridade da doença, o tratamento dos
osteossarcomas é pouco conhecido, podendo ser utilizadas
formas isoladas ou combinadas de tratamento.
O objetivo do presente estudo é apresentar os casos
de osteossarcoma de mandíbula e maxila tratados no Hospital
Erasto Gaertner, no período de 1973 a 2000.
PACIENTES E MÉTODO
Foram analisados retrospectivamente os
prontuários dos pacientes portadores de osteossarcoma da
mandíbula e maxila, atendidos pelo Serviço de Cabeça e
Pescoço do Hospital Erasto Gaertner, de janeiro de 1973 a
dezembro de 2000.
As variáveis analisadas foram idade, gênero,
localização, presença de fatores predisponentes, como
doença de Paget óssea, displasia fibrosa ou irradiação prévia,
sintomas, tamanho do tumor, tratamento, recidiva, estado da
doença ao final do tratamento.
Gráfico 1 – Sintomas associados aos osteossarcomas
Em nenhum paciente foi identificada a presença dos
fatores predisponentes, como doença de Paget óssea,
retinoblastoma, displasia fibrosa ou irradiação prévia sobre o
sítio primário. O tamanho médio do tumor lesão foi de 70 mm,
variando de 30 a 130 mm, considerando o maior diâmetro
(tabela 1).
A cirurgia foi realizada em dez pacientes (76,9%) e
os outros três (23,1%) não aceitaram o procedimento. A
cirurgia foi a maxilectomia parcial em três pacientes (23,1%) e
a hemimandibulectomia em sete (53,8%). Em três pacientes
(23,1%), foi realizada cirurgia de reconstrução (tabela 2).
Tabela 2 – Tratamento e estado da doença ao final do
tratamento.
RESULTADOS
O estudo incluiu 13 pacientes portadores de
osteossarcoma de cabeça e pescoço, sendo sete (53,8%)
homens e seis (46,2%) mulheres. A idade média foi de 31,5
anos e variou de 13 a 66 anos. O local do tumor foi a
mandíbula em oito casos (61,5%) e a maxila em cinco (38,5%)
– tabela 1.
O sintoma mais comum foi a presença de massa que
esteve presente em todos os pacientes, provocando
deformidade facial em um paciente. Outras formas de
manifestação clínica incluíram: dor em nove pacientes
(69,2%); alteração da mobilidade ou perda dos dentes, três
(23,1%); trismo, três (23,1%); sangramento, dois (15,4%);
parestesia, dois (15,4%); e exoftalmia, um (7,7%) – tabela 1 e
gráfico 1.
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SED = sem evidências de doença, REC = recorrência; RT =
radioterapia; QT neo = quimioterapia neoadjuvante; QT adj =
quimioterapia adjuvante; óbito* = óbito por outra causa; Ign =
Ignorado.
O tratamento neoadjuvante com quimioterapia préoperatória foi realizado em quatro pacientes (30,8%),
utilizando cisplatina, doxorrubicina, ifosfamida e etoposide.
Em 11 pacientes (84,6%), foi realizado tratamento adjuvante,
que incluiu a radioterapia exclusiva em um (7,7%),
quimioterapia isolada em seis (46,2%) e quimioterapia
associada à radioterapia em quatro (30,8%) – tabela 2.
O tempo médio de seguimento foi de 34,6 meses,
variando de 4 a 120 meses. Na data do último contato, cinco
pacientes (38,5%) estavam sem evidências de doença, cinco
(38,5%) haviam evoluído a óbito pela doença, dois (15,4%)
tiveram perda de seguimento e um (7,7%) foi a óbito por
insuficiência renal aguda e sepse, estando sem evidência de
doença – tabela 2 e gráfico 2.
Gráfico 2 – Situação da doença ao último contato.
Dos quatro pacientes (30,8%) que apresentaram
recidiva, três (23,1%) apresentaram recidivas locais, que
ocorreram 5, 24 e 48 meses após o término do tratamento
inicial. A ressecção cirúrgica foi realizada em dois casos e um
paciente foi submetido a quimioterapia e radioterapia. A
recidiva à distância ocorreu em um paciente, com doença
identificada na calota craniana, bacia e pulmão, seis meses
após o término do tratamento inicial, tendo sido tratado com
quimioterapia.
As figuras 1 e 2 ilustram exemplos de casos de
osteossarcomas incluídos na casuística aqui apresentada.
Figura 1 – Osteossarcomas da maxila (setas) (tomografia
axial computadorizada).
Figura 2 – Osteossarcomas da mandíbula (setas) (tomografia
axial computadorizada).
DISCUSSÃO
Os sarcomas osteogênicos ou osteossarcomas da
cabeça e pescoço são relativamente raros, correspondendo a
6 a 13% do total dos osteossarcomas3. Mark et al.4, estudando
2.500 pacientes portadores de osteossarcomas, encontraram
18 casos de tumores localizados na cabeça e pescoço.
Os tumores da mandíbula podem ser primários ou
metástaticos. Entre os tumores malignos da mandíbula,
encontramos os linfomas, relativamente freqüentes na África,
os sarcomas de Ewing e os osteossarcomas5. Na avaliação de
21 casos de tumores malignos da mandíbula e maxila,
Antunes et al.5 encontraram 12 casos (57%) de tumores
primários (condrossarcomas em 33% dos casos e
osteossarcomas em 17%) e nove casos (43%) de doença
metastática (tireóide 15%, mama 15%, partes moles 10% e
próstata 5%). Os ossos da face são locais incomuns de
metástases ósseas, sendo que mais de 80% das metástases
ocorrem na mandíbula e, raramente, na maxila. Os principais
sítios primários de metástases ósseas são mama, tireóide,
pulmão e, menos freqüentemente, próstata e rim5.
Tradicionalmente, a localização preferencial dos
osteossarcomas da cabeça e pescoço é a mandíbula, que
esteve acometida em 62% dos casos nesse estudo. Alguns
relatos mostram incidência maior na maxila. Mardinger et al.1,
analisando 14 casos de osteossarcomas, encontraram seis
casos (42%) de tumores na maxila e oito (58%) na mandíbula.
Ha et al.6 encontraram 30% dos osteossarcomas na
mandíbula, 33% na maxila e seios paranasais e 37% em
outros locais (osso temporal, occipital e órbita). Menos de 2%
dos osteossarcomas ocorrem nos ossos do crânio, além da
mandíbula e maxila5.
A média de idade de apresentação dos
osteossarcomas da mandíbula é de 30 anos (com idade
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média variando de 26 a 40 anos), o que coincide com os
achados desse estudo. A idade estimada, nos tumores da
cabeça e pescoço, é 10 a 15 anos a mais em comparação à
idade de acometimento dos osteossarcoma em outros
ossos1,5,7-9. A incidência é maior nos homens, em comparação
às mulheres7,8. Borba et al.10, no relato de 28 casos,
identificaram uma incidência maior no gênero feminino (61%).
Kassir et al. 9 encontraram incidência pouco maior no gênero
masculino (56%), coincidindo com os achados do presente
estudo.
A etiologia do osteossarcoma de mandíbula é
desconhecida, entretanto, a história de irradiação prévia,
doença de Paget óssea, retinoblastoma, displasia fibrosa e
predisposição genética são considerados fatores
predisponentes2,9,11,12. Em nosso estudo, não evidenciamos a
presença de fatores predisponentes em nenhum dos casos.
Ha et al.6, no relato de 27 pacientes com osteossarcomas da
cabeça e pescoço, encontraram dois pacientes (7,4%) com
história de retinoblastoma e cinco (18,5%) com história de
irradiação prévia na região, sendo que a presença desses
fatores predisponentes não alterou a sobrevida dos
pacientes.
A apresentação clínica depende do local do tumor e
inclui edema, dor, deformidade facial, perda ou mobilidade
dos dentes, parestesia ou anestesia da área afetada,
obstrução nasal e epistaxe2,7. A parestesia unilateral,
hipoestesia ou anestesia unilateral do lábio inferior,
acompanhada ou não de dor, pode ser a manifestação clínica
inicial5. Em nosso estudo, a manifestação clínica com
presença de massa esteve presente em todos os casos.
Outros sintomas incluíram a dor, alteração da mobilidade ou
perda dos dentes e trismo.
Kassir et al.9, em meta-análise de 23 estudos,
incluindo 173 casos, encontrou como fator prognóstico a
localização do tumor, com sobrevida melhor nos tumores da
mandíbula (45%) e maxila (38%) em comparação aos demais
ossos (<10%). Ha et al. 6 não encontraram diferenças na
sobrevida, ao analisar a localização dos osteossarcomas.
A experiência do Johns Hopkins, na análise de 27
casos, mostrou o grau histológico do tumor e as condições da
margem cirúrgica como fatores prognósticos nos
osteossarcomas da cabeça e pescoço, não tendo encontrado
correlação entre as diferentes formas de tratamento
adjuvante e a sobrevida6. Outros estudos demonstraram a
importância prognóstica do grau do tumor e das margens de
ressecção9,10.
Borba et al.10 identificaram, como fator prognóstico, a
margem cirúrgica e ressaltaram as dificuldades, no intraoperatório, de avaliação das margens cirúrgicas. Sugerem a
ressecção alargada desses tumores, avaliação sistemática
de partes moles adjacentes e curetagem da medula óssea
dos cotos da mandíbula, com avaliação por exame
histopatológico de congelação.
O osteossarcoma de mandíbula e maxila apresenta
comportamento biológico diferente dos osteossarcoma dos
ossos longos, embora com características histológicas
semelhantes1,13. Os tumores de cabeça e pescoço tendem a
recidivar localmente, sendo a recidiva à distância menos
freqüente9.
O tratamento do osteossarcoma tem sido
determinado para ossos longos, mas não está definido nos
tumores da cabeça e pescoço. A quimioterapia é o tratamento
adjuvante que trouxe uma importante mudança nas taxas de
sobrevida dos osteossarcomas dos ossos longos, de 20% na
década de 60, para 60 a 70% na década de 801,6. Entretanto,
essa melhora na sobrevida não inclui casos de
osteossarcoma da cabeça e pescoço.
Apesar de o tratamento ideal do osteossarcomas da
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cabeça e pescoço ser pouco conhecido, a ressecção cirúrgica
adequada é a sua principal forma de abordagem3. As
dificuldades de obtenção de margens livres nos
osteossarcomas da cabeça e pescoço ocorrem porque a
anatomia desta região é mais complexa em comparação à
anatomia das extremidades4.
A sobrevida relatada em longo prazo é menor que
35%, principalmente devido à recorrência local. Ha et al.6
relataram sobrevida em dois anos de 66% e de 55% em cinco
anos. Em nosso estudo, a sobrevida foi de 38%, com
seguimento médio de 34,6 meses, sendo que 38% dos
pacientes foram a óbito pela doença.
A utilização de poliquimioterápicos promove uma
sobrevida em longo prazo de aproximadamente 45%,
podendo ser recomendada após cirurgia radical nos
osteossarcoma da mandíbula13. Alguns autores sugerem a
utilização da quimioterapia pré-operatória, tendo como
finalidade facilitar a ressecção cirúrgica14,15.
Kassir et al. 9 não encontraram diferenças na
sobrevida em pacientes tratados com cirurgia isolada ou
associada à quimioterapia e radioterapia pós-operatória.
Nesse mesmo estudo, os autores não observaram impacto na
sobrevida, ao utilizar a quimioterapia adjuvante. Vale ressaltar
a possibilidade de viés de seleção nesse estudo, onde os
pacientes com tumores mais avançados teriam recebido
tratamento adjuvante. Os autores enfatizam ainda a
importância da obtenção de margens cirúrgicas negativas,
pois o tratamento adjuvante na presença de margens
positivas não parece ser benéfico.
O papel do tratamento adjuvante permanece incerto
no tratamento dos osteosarcomas da cabeça e pescoço e a
raridade da doença inviabiliza a realização de estudos
randomizados6,9.
Em nossa casuística, os osteossarcomas da cabeça
e pescoço tiveram prevalência semelhante nos gênero
masculino e feminino, acometendo principalmente a
mandíbula. A maioria dos pacientes do estudo foi submetida a
cirurgia, seguida de tratamento adjuvante, com sobrevida de
38% e mortalidade de 38%, no período analisado.
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