dislexia - CRDA - Centro de Referência em Distúrbios de

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CRDA - CENTRO DE REFERÊNCIA EM
DISTÚRBIOS DE APRENDIZAGEM
CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO
LATO SENSU
EM DISTÚRBIOS DE APRENDIZAGEM
KÁTIA DOS SANTOS FORCIONE
RODRIGUES LIMA
DISLEXIA: PRÁTICAS PARA O TRABALHO
DO EDUCADOR
São Paulo
2009
CRDA - CENTRO DE REFERÊNCIA EM
DISTÚRBIOS DE APRENDIZAGEM
CURSO DE PÓS-GRADUAÇÃO
LATO SENSU
EM DISTÚRBIOS DE APRENDIZAGEM
KÁTIA DOS SANTOS FORCIONE
RODRIGUES LIMA
DISLEXIA: PRÁTICAS PARA O TRABALHO DO
EDUCADOR
Monografia apresentada como
parte dos requisitos para
aprovação no Curso de
Especialização Lato Sensu em
Distúrbios de Aprendizagem e
submetida ao Centro de
Referência em Distúrbios de
Aprendizagem – CRDA, sob
orientação da Profª. Ms.
Lucilla da Silveira Leite
Pimentel.
DEDICATÓRIA
AO MEU MARIDO NEWTON, COMPANHEIRO E
INCENTIVADOR INCONDICIONAL NA MINHA BUSCA POR
CONHECIMENTO,
OBRIGADA PELO APOIO, SUPORTE E CONFIANÇA, SEM
OS QUAIS NÃO CONSEGUIRIA TRILHAR ESTE CAMINHO.
AO MEU FILHO VITOR, PELA COMPREENSÃO DA
MINHA AUSÊNCIA, MESMO QUANDO ESTAVA EM CASA
PESQUISANDO E ESTUDANDO.
AGRADECIMENTOS
Agradeço à Professora Maria Del Carmen Prada Holler, do CRDA,
que sempre partilhou seus conhecimentos sobre Distúrbios de
Aprendizagem, com intuito único de fazer com que mais pessoas
possam aprofundar-se neste assunto e proporcionar uma vida
melhor àqueles alunos e adultos portadores de um ou alguns
distúrbios de aprendizagem.
À minha orientadora Profª. Ms. Lucilla Pimentel, pela atenção,
carinho e incentivo durante o curso e na elaboração deste
trabalho.
“A PALAVRA PROGRESSO NÃO TERÁ QUALQUER
SENTIDO ENQUANTO HOUVER CRIANÇAS INFELIZES”
Albert Einstein
Disléxico
RESUMO
Este trabalho explana de maneira detalhada o Distúrbio de Leitura, conhecido como
Dislexia. Parte de um breve histórico deste distúrbio de aprendizagem numa linha do
tempo, mostrando as descobertas ao longo de mais de um século entre diversos
autores e de diferentes áreas do conhecimento. Especifica também, as
comorbidades que podem ou não estar associadas a este distúrbio e as Leis que
amparam o portador de Dislexia.
A partir do embasamento teórico de três autores - Sally Shaywitz, Antonio Manuel
Pamplona de Morais e Corine Roth Smith - assinalam-se alguns sinais da Dislexia,
qual o papel do educador junto ao aluno disléxico e práticas pedagógicas que
facilitem seu trabalho.
Complementa-se com uma análise interpretativa a partir de uma pesquisa
quantitativa sobre o educador e sua postura diante do aluno disléxico.
Por fim, enfatiza-se a importância do educador para o sucesso acadêmico do aluno
disléxico, assim como destaca a relevância de o educador entender o que é e
como agir frente à Dislexia.
Palavras-chave: aluno, educador, Dislexia, distúrbio de aprendizagem, prática
pedagógica.
ABSTRACT
This work explains in a detailed way the Disturbance of Reading, known as Dyslexia.
It begins with an abbreviated history of this learning disturbance in a time line,
showing the discoveries throughout more than a century transmitted between diverse
authors and of different areas of the knowledge. It also specifies the comorbidades
that may or may not be associated with this disturbance and the laws that protect the
person that suffers from Dyslexia.
Based on the three authors' theoretical support - Sally Shaywitz, Antonio Manuel
Pamplona de Morais and Corine Roth Smith - this work explains some signs of
Dyslexia, the educator's role along with the dyslexic student, and pedagogical
practices that facilitate his/her work.
Using quantitative research, this work is reinforced with an interpretative analysis of
the educator and his/her attitude in relation to the dyslexic student.
Finally, it emphasizes the educator's importance for the dyslexic student's academic
success, as well as highlighting the importance of the educator understanding what
Dyslexia is and how to deal with it.
Key-words: student, educator, Dyslexia, learning disturbance, pedagogical practice.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
9
CAPÍTULO I – DISLEXIA: MAPEANDO O DISTÚRBIO
1 Conceito
2 Histórico
3 Distúrbio sim, dificuldade não
4 Comorbidades
4.1
Discalculia
4.2
Disgrafia
4.3
Disortografia
4.4
TDAH
5 Sinais de Dislexia nas diferentes fases da infância e escolarização
11
11
13
19
20
21
24
25
27
29
CAPÍTULO II – LEI A FAVOR DO DISLÉXICO
1 Leis vigentes
2 Lei específica sobre Dislexia
34
34
37
CAPÍTULO III – A DISLEXIA E O EDUCADOR
1 Embasamento teórico
1.1
Sinais de Dislexia
1.2
Aspecto pedagógico
2 O papel do educador
39
39
41
42
44
CAPÍTULO IV – A PESQUISA
1 Percurso Metodológico
2 Cenário e atores
3 Análise Interpretativa
47
47
48
51
CONSIDERAÇÕES FINAIS
55
REFERÊNCIAS
57
APÊNDICE
APÊNDICE I – QUESTIONÁRIO
59
60
ANEXO
ANEXO I – LEI 12.524/07
62
63
INTRODUÇÃO
A inquietação ante a Dislexia foi o impulso motivador deste trabalho, pois
este tema gera insegurança ao educador em suas práticas pedagógicas. É
importante que este distúrbio de aprendizagem seja difundido em esferas distintas,
principalmente na área da Educação, para que o educador possa identificar sinais
da Dislexia, encaminhar a profissionais que possam diagnosticá-la e aprenda a
trabalhar de maneira efetiva, resultando no sucesso acadêmico do aluno disléxico.
No processo de formação acadêmica, na maioria das vezes, o assunto é
discutido de maneira genérica e simplista, mas para esta autora, despertou-a para
buscar suas próprias respostas, por meio de leitura em artigos e livros sobre
distúrbios de aprendizagem e, posteriormente, especificamente sobre Dislexia.
Nesta busca, ficou nítido que existe uma linha tênue entre problemas de
“ensinagem”, falta de conhecimentos específicos por parte dos educadores naquilo
que diz respeito a distúrbios de aprendizagem, e daqueles sujeitos que apresentam
uma disfunção cerebral, que os impede de produzir uma leitura esperada para sua
idade cronológica e escolaridade, podendo ser os disléxicos.
A Dislexia está relacionada ao distúrbio de leitura, única e exclusivamente,
porém, uma criança que não consegue ler, não pode ser considerada disléxica. É
importante saber que distúrbio de aprendizagem não é modismo, no qual a
educação se apóia quando não consegue atingir seus próprios objetivos, pois muitas
vezes é notório que, devido às falhas no atual sistema educacional, passou-se a
denominar crianças que apresentam dificuldades para ler como disléxicas.
OBJETIVO
O objetivo deste trabalho é de investigar como os professores se sentem
frente à sua prática pedagógica em relação ao aluno disléxico em sala de aula.
9
METODOLOGIA
Este trabalho evidencia primeiramente, sob a forma dissertativa e de maneira
detalhada, o conhecimento científico literário sobre a Dislexia, desde a origem da
palavra, as comorbidades que podem estar associadas, os sinais durante a
escolarização e as leis que favorecem o aluno disléxico.
Dando prosseguimento à pesquisa bibliográfica, que foi sustentada pela
fundamentação teórica de três autores - Sally Shaywitz, Antônio Manuel Pamplona
de Moraes e Corine Roth Smith - e visando elucidar a inquietação desta autora
frente ao papel do educador, pormenoriza-se o que o educador pode de fato fazer
em sala de aula, para promover o sucesso escolar do aluno disléxico. Para a
apresentação desta monografia foram expostos os seguintes temas, abordados em
4 capítulos: I – “Dislexia – mapeando o distúrbio”, discutindo-se conceitos e
comorbidades; II – “Lei a favor do disléxico”, momento do trabalho que trata das leis
educacionais que fazem referência ao distúrbio; III – “A Dislexia e o educador”,
analisando-se questões de ordem pedagógica no trato da Dislexia; IV – “A
pesquisa”, descrição e análise interpretativa dos dados nela obtidos.
Nas considerações finais, deu-se destaque ao que efetivamente o educador
pode fazer para promover o sucesso escolar do aluno disléxico.
RESULTADOS
Para complementar os dados teóricos foi feita uma pesquisa quantitativa, por
meio de uma amostragem, constituída de um questionário, sobre o conhecimento do
educador em relação à Dislexia e como se sentem ao trabalhar com o aluno
disléxico. O mesmo foi entregue a 15 professoras do Ensino Fundamental I, de uma
escola particular da zona Sul de São Paulo. O resultado permitiu apresentar uma
análise interpretativa quanto ao despreparo do educador em relação ao aluno
disléxico.
10
CAPÍTULO I – DISLEXIA: MAPEANDO O DISTÚRBIO
Para que seja possível compreender mais detalhadamente este assunto, o
mesmo será segmentado em tópicos que o explicitam desde a origem da palavra,
sua descoberta, outros distúrbios que podem estar associados e quais são os sinais
que podem colocar em alerta os educadores.
1 Conceito
A palavra Dislexia é derivada do grego dis (dificuldade) e lexia (linguagem),
sendo definida como uma falta de habilidade na linguagem que se reflete na leitura
(Associação Nacional de Dislexia, 2005; IANHEZ, 2001). Entretanto, o portador de
Dislexia não apresenta distúrbios a nível sensorial, físico, emocional e mental ou
desvantagens sócio-econômicas culturais ou instrucionais que possam ser causa de
sua dificuldade de aprender a ler. Caso exista alguma das variáveis acima como
causa desta dificuldade, então, provavelmente, não se trata de Dislexia. O que
ocorre é uma lacuna entre a habilidade de aprendizagem e o sucesso escolar. O
indivíduo disléxico possui um funcionamento peculiar do cérebro para o
processamento da linguagem.
Para a compreensão deste distúrbio é importante pontuar algumas
características relacionadas ao funcionamento e desenvolvimento do cérebro, região
do corpo cercada de muitos enigmas, mas que em relação à Dislexia já possui
muitos estudos científicos que permitem assegurar seu funcionamento específico.
A definição mais recente de Dislexia foi feita pelo grupo de BRADY et al, em
2003:
Dislexia é uma dificuldade de aprendizagem de origem neurológica. É
caracterizada pela dificuldade com a fluência correta na leitura e por
dificuldade na habilidade de decodificação e soletração. Essas dificuldades
resultam tipicamente do déficit no componente fonológico da linguagem que
é inesperado em relação a outras habilidades cognitivas consideradas na
faixa.
11
O DSM IV – Manual de Diagnóstico e Estatístico das Perturbações Mentais
(2002) publicado em 1994, pela Associação Psiquiátrica Americana (American
Psychiatric Association) em Washington - é a principal referência de diagnóstico para
os profissionais de saúde mental.
Neste manual a definição do distúrbio é assim descrita:
A característica essencial do Transtorno de Leitura consiste em um
rendimento de leitura (isto é, correção, velocidade, ou compreensão da
leitura, medidas por testes padronizados administrados individualmente)
substancialmente inferior ao esperado para idade cronológica, a inteligência
medida e a escolaridade do indivíduo. A perturbação da leitura interfere
significativamente no rendimento escolar ou em atividades da vida cotidiana
que exigem habilidades de leitura (DSM-IV, 2002).
O CID 10 – Classificação Internacional de Doenças da OMS (Organização
Mundial de Saúde) e da ONU (Organização das Nações Unidas) tem a seguinte
classificação para o distúrbio:
Transtornos específicos do desenvolvimento das habilidades escolares:
transtornos nos quais as modalidades habituais de aprendizado estão
alteradas desde as primeiras etapas do desenvolvimento. O
comprometimento não é somente a conseqüência da falta de oportunidade
de aprendizagem ou de um retardo mental, e ele não é devido a um
traumatismo ou doenças cerebrais.
Transtorno específico de leitura: a característica essencial é um
comprometimento específico e significativo do desenvolvimento das
habilidades da leitura, não atribuível exclusivamente à idade mental, a
transtornos de acuidade visual ou escolarização inadequada. A capacidade
de compreensão da leitura, o reconhecimento das palavras, a leitura oral e
o desempenho de tarefas que necessitem da leitura podem estar todas
comprometidas. Este transtorno se acompanha freqüentemente de
dificuldades de soletração, persistindo comumente na adolescência, mesmo
quando a criança haja feito alguns progressos na leitura. As crianças que
apresentam um transtorno específico da leitura têm freqüentemente
antecedentes de transtornos da fala ou linguagem. O transtorno se
acompanha comumente de transtorno emocional e de transtorno do
comportamento durante a escolarização (CID 10, 1993).
Em relação aos distúrbios específicos do aprendizado, e em especial na
Dislexia do desenvolvimento (déficit de leitura que ocorra por algum tipo de
disfunção cerebral, antes mesmo de o sujeito adquirir a leitura), a troca de
informações entre as áreas médica, neuropsicológica e pedagógica é fundamental
para promover a interdisciplinaridade e, conseqüentemente, ampliar nosso
12
conhecimento acerca dessa e das demais disfunções, prática habitual da ciência do
século XXI.
O órgão responsável pela aprendizagem é o cérebro. A aprendizagem,
capacidade de processar, armazenar e usar a informação é, portanto, uma função
cerebral. No caso da leitura, processo altamente complexo, estão envolvidos tanto
aspectos neurológicos como sensoriais, psicológicos, sócio-culturais, sócioeconômicos e educacionais, dentre outros. Portanto, um único profissional não basta
para analisar esses vários aspectos e fornecer diagnóstico preciso e seguro.
A Dislexia do desenvolvimento é uma disfunção do sistema nervoso central,
frequentemente de origem constitucional, caracterizada pela dificuldade na aquisição
ou no uso da leitura e/ou escrita, que acomete crianças com inteligência normal,
sem déficits sensoriais, com instrução supostamente adequada e na ausência de
problemas físicos ou emocionais significativos.
2 Histórico
Com o intuito de desmistificar que Dislexia está relacionada a modismo,
entende-se ser necessário elencar dados, datas e autores ligados à área médica,
desde a sua descoberta no final do século XIX até chegarmos a definições mais
recentes, de 2006.
Para a compreensão da Dislexia é essencial ressaltar a contribuição inicial da
descoberta do médico francês Pierre Broca (1861, apud SHAYWITZ, 2006, p. 60).
Ele definiu a região frontal esquerda do cérebro (especificamente o giro frontal
inferior – conhecida como área de Broca), sendo a responsável pela fluência da fala,
e que uma lesão (afasia) nesta região acarreta uma perda da fala, mas com a
capacidade de entender a linguagem.
13
Figura 1 – Localização da linguagem expressiva e receptiva
fonte: http://www.freewebs.com/osnossospeterpan/etw5t6w.bmp
O lado esquerdo do cérebro, com as duas áreas principais associadas à linguagem em destaque:
Área de Broca (linguagem expressiva) e Área de Wernick (linguagem receptiva)
Carl Wernick (apud SHAYWITZ, 2006, p. 61), neurologista alemão, usou uma
combinação de perspicazes observações clínicas e de raciocínio dedutivo para
indicar que os danos à área localizada ao longo da parte superior do lobo temporal
(a região cerebral atrás da parte superior da orelha - conhecida como área de
Wernick) produziam outra espécie de afasia. O paciente fala com facilidade, mas
não entende a linguagem e se exprime de maneira incoerente.
Estas descobertas abriram as portas para que pudéssemos aprender como o
cérebro lê. Para ler, devemos entrar no sistema de linguagem, em nível neural, isso
significa que a leitura depende dos circuitos cerebrais já preparados para linguagem
(SHAYWITZ, 2006).
Especialistas intrigados com a perda da capacidade de leitura por indivíduos
que sofreram lesões (Dislexia adquirida) passaram a pesquisar e a identificar as
áreas que se comprometeram, correspondendo-as com a perda da leitura. No
entanto, indivíduos que não sofreram nenhum dano cerebral, mas que também
apresentavam dificuldade na leitura, abriram possibilidades para estudos o qual
identificamos hoje como Dislexia (Dislexia do desenvolvimento).
14
Desde o final do século XIX médicos já percebiam crianças com esta
disfunção, e foram à busca do por que pessoas brilhantemente inteligentes e rápidas
nos jogos possuíam grande dificuldade, e até mesmo incapacidade, para ler.
A evolução dos estudos específicos sobre a Dislexia passa por diversas áreas,
em épocas diferentes como se pontuará a seguir:
•
Os neurologistas relatavam que seus pacientes com lesão adquirida não
conseguiam ler, ou seja, existia uma cegueira de texto, apesar da visão, do
intelecto e da fala estarem intactos. Denominou wortblindheit, literalmente
cegueira verbal (Kussmaul, 1889, apud SHAYWITZ, 2006, p. 26).
•
Hinshelwood
(1904,
oftalmologista
que
apud
SHAYWITZ,
trabalhou
2006,
incessantemente
p.
com
26-27)
a
foi
um
dificuldade
inesperada ao aprender a ler. De sua perspectiva prática, a dificuldade na
leitura é algo isolado e circunscrito, refletindo uma disfunção cerebral local
e não generalizada. Uma criança disléxica tem de ter pontos fortes no que
diz respeito à cognição (processo de adquirir conhecimentos) e não
apenas problema nas funções de leitura, denominado de cegueira verbal
congênita.
•
O neurologista Samuel Torrey Orton (1920, apud HOUT; ESTIENNE, 2001,
p. 18) usou o termo “strephosymbolia” que significa “símbolos torcidos”,
para designar crianças que invertiam letras e números durante a leitura.
Ele acreditava que esta inversão, durante a leitura, era resultado da
indefinição na dominância lateral, quando houvesse lateralidade cruzada
ou a inexistência de uma lateralidade definida e estas eram as causas do
espelhamento dos símbolos gráficos e dos atrasos da linguagem, inclusive
as gagueiras.
•
Halgreen (1950, apud CONDEMARIN; BLOMQUIST, 1988, p. 29) fez um
estudo com 276 crianças disléxicas e com um grupo de não disléxicas.
Chegou à conclusão que 80% dos casos de crianças disléxicas
15
apresentavam algum familiar que também tinha alguma dificuldade na
aprendizagem da leitura e da escrita, considerando a Dislexia como causa
genética, mas sua conclusão foi considerada um erro lógico.
•
Critchley (1950, apud HOUT; ESTIENNE, 2001, p.20) elaborou um
conjunto de premissas para diferenciar a Dislexia.
1. As dificuldades para ler e escrever persistem até a idade adulta.
2. Observa-se dificuldade de leitura nos demais membros da família, o
que leva a supor o caráter hereditário do distúrbio.
3. As trocas são: visuais, auditivas, omissões, inversões, etc.
4. As dificuldades que a criança tem na leitura e na escrita não aparecem
de forma isolada, mas juntas com outras dificuldades: interpretação de
símbolos musicais, código Morse, sinais estenográficos, etc.
•
Boder (1973, apud HOUT; ESTIENNE, 2001, p. 25) classifica em:
1. Dislexia Disfonética ou Fonológica (dislexia auditiva).
Caracterizada por uma dificuldade na leitura oral de palavras pouco
familiares. Os disléxicos lêem bem as palavras que conhecem, ou seja,
que memorizaram visualmente, mas não lêem nem escrevem palavras
que encontram pela primeira vez; as adivinham, a partir do contexto e
de indicações como a letra inicial ou a extensão da palavra, e cometem
muitos erros de substituição semântica.
2. Dislexia Diseidética (dislexia visual).
Os disléxicos diseidéticos caracterizam-se por apresentarem uma
leitura lenta, trabalhosa, mas correta, baseada na decodificação
fonética. A dificuldade na leitura é caracterizada por um problema de
ordem visual. O leitor lê através de um processo extremamente
elaborado de análise e de síntese fonética. Lêem palavras familiares
ou não, mas apresentam dificuldade em palavras irregulares.
3. Dislexia Mista: apresenta as características dos dois subtipos
anteriores.
16
•
Quirós (1975, apud MORAIS, 1996, p. 36) mostra em seus estudos que a
Dislexia específica em evolução, supõe um quadro com perturbações
perceptivo-cognitivas, que significa dificuldades na percepção simbólica
tanto em nível de palavras visualizadas como em nível de palavras
ouvidas, dificultando a aquisição da leitura e da escrita.
•
Johnson e Myklebust (1983, apud HOUT; ESTIENNE, 2001, p. 107)
diferenciam em dois tipos:
1. Dislexia auditiva: dificuldade em distinguir semelhanças e diferenças
entre sons; em perceber sons no meio de palavras; em análise–síntese,
memória e seqüência auditivas. Possuem acuidade auditiva normal.
2. Dislexia visual: dificuldade em memória e análise-síntese visual, em
discriminação visual de detalhes, em perceber as palavras escritas, em
respeitar as seqüências viso-espacial etc.
3. A aprendizagem não é unicamente auditiva ou visual, mas em alguns
momentos existe certa autonomia de um sistema em relação ao outro.
•
Lyon G. Reid (1995, apud SHAYWITZ, 2006, p. 40) define Dislexia como
"dificuldade de decodificar uma palavra”:
Dislexia é um dos muitos distúrbios de aprendizagem. É um distúrbio
específico de origem constitucional caracterizado por uma dificuldade na
decodificação de palavras simples que, como regra, mostra uma
insuficiência no processamento fonológico. Essas dificuldades não são
esperadas com relação à idade e a outras dificuldades acadêmicas
cognitivas; não são resultados de distúrbios de desenvolvimento geral nem
sensorial. A dislexia se manifesta por várias dificuldades em diferentes
formas de linguagem freqüentemente incluindo, além das dificuldades com
1
leitura, uma dificuldade de escrita e de soletração.[grifo da autora ]
A nova definição, citada anteriormente, amplia esta noção referindo-se
especificamente ao reconhecimento correto das palavras (identificando as
verdadeiras palavras) e as habilidades de decodificação (pronunciando logatomas –
1
De acordo com a definição do DSM, Dislexia é um transtorno de leitura, que pode estar associado
ou não a outros distúrbios.
17
unidades lógicas). Também reconhece a soletração pobre como uma característica
da Dislexia. A soletração está intimamente relacionada com a leitura não só porque
os sons estão ligados às letras, mas porque as palavras estão literalmente
colocadas em código ao invés de meramente decifradas (SHAYWITZ, 2006).
Com a ampla divulgação da Dislexia, oftalmologistas, neurologistas e
lingüistas intensificaram suas pesquisas a fim de identificar a dinâmica do processo
de leitura e escrita, fortalecendo a definição e, conseqüentemente, a forma de
atuação frente a esse distúrbio.
Pela facilidade e pela fluidez, a linguagem verbal tem tudo a ver com o porquê
de a leitura ser algo tão difícil para as crianças disléxicas. Embora tanto a fala
quanto a leitura dependam da mesma partícula (fonema) há uma diferença
fundamental: falar é natural e ler não é. Aqui reside o ponto crucial deste distúrbio.
Ler é algo que se adquire, uma invenção do homem que se deve aprender de forma
consciente. E é a própria naturalidade da fala que faz a leitura ser algo tão difícil.
18
LEITURA
Decodificação
Compreensão
Identificação de palavras
(a)
Significado
DISLEXIA
Sistema de linguagem
Leitura
Discurso
Compreensão
Sintaxe
Semântica
Fonologia
Decodificação
(b)
Figura 2 – O paradoxo da Dislexia
Fonte: SHAYWITZ, 2006, p. 51.
(a) Dois componentes importantes para a leitura: decodificação e compreensão.
(b) Uma deficiência fonológica interfere na decodificação, mas as capacidades superiores,
necessárias para a compreensão, permanecem intactas.
Atualmente diversas áreas do conhecimento (psicologia, psicopedagogia,
neurologia, pedagogia, fonoaudiologia, entre as de maior destaque) estão envolvidas
na busca por conhecimento específico frente à Dislexia. Elas trabalham de forma
multidisciplinar e interdisciplinar com objetivo único de alinharem conhecimentos e
práticas que sirvam de suporte para os educadores, assim como, garantam uma
melhora significativa na qualidade de vida do disléxico, por ser a leitura um processo
complexo (SHAYWITZ, 2006).
3 Distúrbio sim, dificuldade não
Como citado no início deste capítulo, dificuldade não tem a mesma conotação
que distúrbio, ainda que a utilização destes termos seja feita erroneamente como se
fossem sinônimos.
A dificuldade frente à aprendizagem tem tempo certo para surgir com
começo, meio e fim, podendo ser gerada a partir de fatores diversos, tais como:
19
mudança de escola, de professora, de casa, de cidade, perda de pessoas queridas,
situações familiares que não agradam a criança (separação dos pais, alcoolismo,
agressões diversas). Todas são causas exteriores que afetam a emoção da criança
e, consequentemente, seu rendimento escolar. Da mesma forma, algumas
desordens de caráter físico também contribuem para este quadro, como problemas
visuais, auditivos e alimentares, entre outros. Detectado o problema gerador do
baixo rendimento escolar e buscando-se estratégias para solucioná-lo, a dificuldade
desaparece, confirmando a tese de que dificuldade é diferente de distúrbio.
Já o distúrbio é um termo que se refere a um grupo heterogêneo de
alterações manifestas por dificuldades significativas na aquisição e uso de audição,
fala, leitura, escrita, raciocínio ou habilidades matemáticas. Estas alterações são
intrínsecas ao indivíduo e, presumivelmente, devidas à disfunção do sistema
nervoso central.
Apesar de um distúrbio de aprendizagem poder ocorrer concomitantemente
com outras condições desfavoráveis (por exemplo: alteração sensorial, dificuldade
mental, distúrbio social ou emocional) ou influências ambientais (por exemplo:
diferenças culturais, instrução insuficiente/inadequada, fatores psicogênicos), não é
resultado direto destas condições ou influências.
Ressalta-se mais uma vez que a Dislexia não tem cura, porém com práticas
educativas que visem à adequação às necessidades específicas de cada caso,
existe a melhora significativa na qualidade de vida do portador, na vida acadêmica e
fora dela.
4 Comorbidades
Ninguém ignora tudo. Ninguém sabe tudo. Todos nós sabemos alguma
coisa. Todos nós ignoramos alguma coisa. Por isso aprendemos sempre.
Paulo Freire
O termo comorbidade é formado pelo prefixo latino cum, que significa
contigüidade, correlação, companhia, e pela palavra “morbidade”, originada de
morbus, que designa estado patológico ou doença. Assim, deve ser utilizado apenas
20
para descrever a coexistência de transtornos ou doenças, e não de sintomas. Para
haver comorbidade, é importante a relação e a continuidade temporal entre dois
transtornos (ou mais), que podem surgir simultaneamente ou um preceder o outro.
A criança ou adulto disléxico pode apresentar somente este distúrbio de
aprendizagem ou alguns outros poderão estar associados também.
Os distúrbios que comumente podem aparecer em combinação com a
Dislexia são: discalculia, disgrafia, disortografia, déficit de atenção e hiperatividade.
Existem casos de crianças que além da Dislexia possuem todas as comorbidades
citadas. (DSM IV, 2002).
É importante destacar que não existe uma obrigatoriedade ou um padrão em
relação às comorbidades, pois cada caso é único. Os estudos apontam a presença
desta ou daquela comorbidade em crianças com diagnóstico de Dislexia, mas
pontuam que não é imperativa a presença dos mesmos.
Para maior clareza, seguem os aspectos gerais dos referidos distúrbios.
4.1
Discalculia
A Matemática recebe uma carga de amor e ódio por grande parte das
pessoas. O meio termo é difícil de ser encontrado. Na área da educação é comum
encontrarmos muitos profissionais que possuem aversão à referida disciplina. O que
se verifica de fato é uma dificuldade em relação à aritmética, que é uma parte da
Matemática relacionada aos raciocínios lógicos, perceptivos e sensoriais (tamanhos,
formas, espaço, dimensão e quantidade).
A incapacidade de compreensão dos números e das operações denomina-se
discalculia. Os disléxicos que apresentam a discalculia como comorbidade têm
dificuldades para adquirirem rapidez e fluência em simples cálculos: adição,
subtração, multiplicação, divisão e na tabuada, mas eles poderão ter, não obstante,
boa habilidade em Matemática. Este fato acontece porque não há áreas do cérebro
21
que só se ocupam especificamente da leitura e soletração. As áreas usadas para a
linguagem escrita são usadas também para outros materiais simbólicos, incluindo
números, fórmulas, gráficos, diagramas, espaço-tempo, etc. Assim, se há um
problema nessas partes do cérebro, será afetado o processamento eficiente de
qualquer material simbólico, linguagem e matemática incluídas, significa que as
falhas em uma área de aprendizagem podem estar freqüentemente vinculadas a
falhas em outras áreas.
Segundo SMITH e STRICK (2001) na discalculia as habilidades que podem
estar comprometidas são:
Linguísticas - incapacidade para compreender ou nomear termos, operações
ou conceitos matemáticos e transpor problemas escritos para
símbolos matemáticos.
Perceptivas - reconhecer ou ler símbolos numéricos ou aritméticos e agrupar
objetos em conjuntos.
Atentivas - não copiam corretamente cifras ou números,
observar os sinais das operações (não diferenciam + de x).
Matemáticas - dificuldade em seguir etapas, contar objetos e aprender a
tabuada de multiplicação.
Nestes casos é importante a estimulação da aprendizagem que propicie o
desenvolvimento das habilidades de manipular, seriar, classificar, transportar, juntar
e copiar, processo esse chamado de pensamento pré-operacional e operacional,
segundo PIAGET (1999). Este tipo de estimulação é importante para o
desenvolvimento das referidas habilidades para qualquer criança, com ou sem
distúrbio de aprendizagem.
A linguagem escrita e a linguagem Matemática possuem algumas
semelhanças: ambas são linguagens representadas por símbolos que apresentam
pequena ou nenhuma relação com as situações e eventos que eles descrevem.
22
Portanto, o uso da letra a ou do número 4 constitui uma representação simbólica em
ambos os exemplos, e que pouco ou nada tem a ver com a representação concreta.
Os dois símbolos (letras / números) têm estruturas e requerem uma ordem e
seqüência para serem usados eficientemente, ambos requerem facilidade verbal
para uma aprendizagem fluente e sua conseqüente memorização.
Encontram-se
dois
subgrupos
de
disléxicos
que
apresentam
como
comorbidade a discalculia (SMITH e STRICK, 2001):
1. Aqueles que compreendem os conceitos, mas são incapazes de
representá-los no papel, isto é, eles sabem que processo ou operação
usar, mas não conseguem fazê-lo com precisão quando lhes é solicitado a
representação escrita (daí a importância de diferentes tipos de avaliações,
que possam valorizar esta habilidade, deixando de priorizar somente a
escrita).
2. Aqueles que têm pouca ou nenhuma idéia do por que os números ou
símbolos são usados, ou seja, não compreendem os conceitos
subentendidos em Matemática.
Os
resultados
das
pesquisas
em
Dislexia
e
Matemática
variam
consideravelmente e uma estimativa conservadora, baseada em estudos iniciais
(SMITH e STRICK, 2001), sugeria que quase 60% dos disléxicos têm alguma
dificuldade em Matemática, dois terços dos disléxicos encontram-se na faixa etária
entre 8 a 14 anos, 11% dos disléxicos são excelentes em Matemática e 29% tem
bom desempenho.
Existem casos em que a criança pode apresentar somente a discalculia, pois
este é um distúrbio independente, porém a incidência é muito pequena em relação
aos demais distúrbios e em especial à Dislexia.
É bom lembrar que nem todo disléxico apresenta discalculia e vice-versa,
porém existe uma relação considerável entre ambos.
23
No campo da investigação muito se tem estudado sobre Dislexia, porém em
relação à discalculia os achados são poucos2.
4.2
Disgrafia
Também chamada de forma mais simplória como “letra feia”. Geralmente
ocorre devido à dificuldade de recordar a grafia correta para representar um
determinado som (seja ele lido, ouvido ou elaborado mentalmente). Em geral, o
disgráfico apresenta baixo desempenho em cópias ou escrita espontânea devido à
produção ilegível e, em casos mais severos, ininteligíveis.
Neste caso, quando existe a necessidade de produção escrita, a criança pode
ser confundida como portadora de alguma patologia neurológica, porém na realidade
possui inteligência na média ou acima para poder responder corretamente qualquer
questão. Não há relação entre este distúrbio e rebaixamento de QI.
Por estar relacionada à má organização de espaço temporal, tanto na
discalculia
como
na Dislexia,
é
comum
serem
percebidas
as
seguintes
características nas produções escritas de um disortográfico, entre elas (SMITH e
STRICK, 2001):
• possui ritmo lento ao escrever, corrigindo-se com o intuito de “retocar”
aquilo que percebe ter errado, porém o faz de forma inadequada,
apresentando um resultado insatisfatório, pois acaba produzindo um
amontoado de letras;
• utiliza de maneira inadequada os espaços entre as palavras e o próprio
espaço do papel;
• não respeita as margens da folha;
• sua escrita pode ser ascendente ou descendente;
2
Nas investigações da autora, referente à Discalculia, constatou-se que em todo material consultado,
os autores dedicam um ou dois capítulos a livros destinados aos distúrbios de aprendizagem e em
relação às comorbidades, porém um livro específico sobre Discalculia não foi encontrado durante a
elaboração deste trabalho.
24
• a grafia das letras é deformada e muito irregular, devido à falta de pressão
na pegada do lápis (movimento de pinça), ou pode ocorrer o outro extremo,
quando possuem um traçado demasiadamente forte que acaba vincando o
papel;
• a organização do caderno inexiste, assim como sua própria orientação
espacial.
4.3
Disortografia
De acordo com o DSM-IV de 2002, a disortografia é um transtorno de
aprendizagem que compromete o rendimento acadêmico, no caso de crianças e
adolescentes, e profissional, no caso de adultos, visto que a escrita é muito presente
em quase todos os contextos sociais. Ela só pode ser diagnosticada de fato ao final
do período de alfabetização, como sendo um transtorno da expressão escrita (DSMIV, 2002) ou disortografia (CID 10, 1993). Mais uma vez, cabe ressaltar que não
pode ser justificada por condição neurológica, outra condição médica geral ou déficit
sensorial.
Para ser disortografia é importante levar-se em conta que as habilidades de
escrita estão “acentuadamente abaixo do esperado, considerando a idade
cronológica, a inteligência medida e a escolarização apropriada à idade do
indivíduo”. (DSM-IV, 2002)
Os transtornos causados por este distúrbio são percebidos na aprendizagem
da ortografia, gramática e redação, apesar de o sujeito possuir uma inteligência
normal, saúde e órgãos sensoriais intactos, bem como instrução adequada.
(CAPOVILLA; MACEDO, 2005, pg. 219).
Características da disortografia são assinaladas por esses mesmos autores:
• dificuldade em expressar idéias pelo código escrito;
• uso restrito de vocabulário;
25
• junções e separações de palavras de maneira inadequada;
• apoio excessivo na oralidade;
• trocas de letras que se assemelham visualmente por “espelhamento”;
• substituição entre letras auditivamente semelhantes;
• omissões ou acréscimos de letras e sílabas.
Figura 3 – Redação de aluna de 6º ano com disortografia
Fonte – acervo pessoal da autora (2007)
Abaixo, reprodução na íntegra do texto (Fig. 3) produzido por uma aluna
portadora de Disortografia.
INTENÇÃO DE ESCRITA
Era uma vez uma menina chamada
Andréia.
ESCRITA DA ALUNA
Uma veis a menina chamada Andréia
Ela acordou muito feliz e foi correndo Ela acordou hoje de manha Ela a cordou
tomar café.
muta feliz.
Foi correndo para o café da manhã
foi corendo para o café
26
INTENÇÃO DE ESCRITA
E disse: na quinta aula tem
Português.
ESCRITA DA ALUNA
edice no quinta aula tem portugues
E o irmão dela falou:
eo irmão dela falo-
-Como você gosta de Português?
como você gosta de português?
- É porque a professora tem o
- È Porque a Profa tem o mesmo nome qui
mesmo nome que o meu!
o meu!
Eu vou adorar a aula.
e eu vou adora a ula
Aí a professora Andréia disse: -Tudo
bem?
ai profa andréia tudo Bem tudo
Vamos gente a aula começou.
kamo gete a aula comeso u
Fizeram um texto e ela adorou.
fiserão um texto e ela adoro
E foram para a casa deles e ela ficou E fo para casa de e ela ficou muito com
muito contente.
4.4
tem te.
TDAH
O Transtorno do Déficit de Atenção – Hiperatividade (TDAH) é um transtorno
neurobiológico, de base genética, que se caracteriza por sintomas de desatenção,
acompanhada ou não de hiperatividade e impulsividade, resultante de um
desenvolvimento não adequado e causando dificuldades na vida diária. Pode ser
chamado também de DDA (Distúrbio de Déficit de Atenção) ou DDAH (Distúrbio de
Déficit de Atenção – Hiperatividade) (WAJNSZTEJN, 2005).
As crianças que sofrem de TDAH formam, aproximadamente, 3 a 5% da
população escolar mundial (SMITH; STRICK, 2001).
Segundo a Associação Americana de Psiquiatria (American Psychiatric
Association), existe uma lista de sintomas deste transtorno que devem estar
presentes no indivíduo e o diagnóstico é de alçada médica.
27
Abaixo segue uma lista de sintomas, sendo que, em cada uma delas, o
indivíduo deve ter pelo menos 6 deles (SMITH; STRICK, 2001):
Desatenção:
• com freqüência deixa de prestar atenção a detalhes ou comete erros por
descuido em atividades escolares, de trabalho ou outras;
• com freqüência tem dificuldades para manter a atenção em tarefas ou
atividades lúdicas;
• com frequência parece não escutar quando lhe dirigem a palavra;
• com frequência não segue instruções e não termina seus deveres
escolares e tarefas domésticas;
• com frequência reluta em envolver-se em tarefas ou atividades ou evita-as;
• com frequência tem dificuldade para organizar tarefas e atividades;
• com frequência perde coisas (como brinquedos, tarefas escolares, livros,
material escolar);
• distrai-se facilmente com visões e sons irrelevantes;
• com frequência apresenta esquecimento em tarefas diárias.
Hiperatividade e Impulsividade:
• com frequência retorce as mãos e os pés, remexendo-se na carteira;
• com frequência levanta da cadeira em sala de aula ou em outras situações
nas quais se espera que permaneça sentado;
• corre e sobe demasiadamente nos objetos em situações nas quais isso é
impróprio;
• tem grande dificuldade para brincar em silêncio;
• com frequência está a “mil por hora” ou age como se “impulsionado por um
motor”;
• fala excessivamente;
• com frequência dá respostas precipitadas antes das questões terem sido
completadas;
• com frequência tem dificuldade em esperar sua vez;
• com frequência interrompe ou intromete-se nos assuntos de outros.
28
Muitas pessoas confundem o TDAH com a Dislexia. Alguns até usam os dois
termos
indiscriminadamente.
Mas
o
TDAH
e
a
Dislexia
são
disfunções
completamente diferentes. Enquanto a Dislexia é uma disfunção cuja base é a
linguagem, e que afeta a leitura, o TDAH é um problema que reflete dificuldades
para distribuir, focar e sustentar a atenção. Entre 12 e 24% dos indivíduos disléxicos
tem como comorbidade o TDAH. (SHAYWITZ, 2006).
5 Sinais de Dislexia nas diferentes fases da infância e escolarização
É importante destacar que a precocidade da identificação de alguns sinais de
Dislexia são perceptíveis desde a pré-escola e, de acordo com SHAYWITZ (2006), o
primeiro sinal de um problema de linguagem (e de leitura) pode ser o início tardio em
começar a falar.
A seguir, serão elencadas algumas orientações, direcionadas especificamente
aos educadores, com a finalidade de fornecer-lhes mais uma ferramenta, que
possam auxiliá-los a identificar características que sugiram investigação específica,
segundo SHAYWITZ (2006).
Na pré-escola observar as seguintes características e/ou dificuldades quando
a criança começar a falar:
• problemas de aprendizagem de rimas infantis comuns ( quando o aluno não
consegue decorar uma rima simples – “Um dois, feijão com arroz” );
• falta de interesse pelas rimas;
• palavras mal pronunciadas; persistência da chamada linguagem de bebê;
• dificuldade em aprender e lembrar o nome das letras, cores e números;
• deficiência em saber o nome das letras de seu próprio nome.
29
1º e 2º anos
• deficiência em entender que as palavras podem ser divididas em partes
(guarda-chuva), e que depois esta palavra pode ser dividida em duas
palavras (com significados distintos) e por fim em sons;
• incapacidade de aprender a associar letras e sons, incapaz de fazer a
correspondência do grafema B ao som “B”;
• erros de leitura que não demonstram conexão alguma dos sons com as
letras (ler a palavra casa como pote);
• incapacidade de ler palavras simples de uma só sílaba ou de pronunciar
mesmo as palavras mais simples (pó, pá, meu, dói, ai, deu);
• reclamações sobre o quanto é difícil ler, podendo sair do local ou esconderse na hora da leitura;
• histórico de problemas de leitura presentes em pais e irmãos.
Nesta fase, também devem ser observados indícios de pontos fortes, nos
processos de pensamento, além daqueles de fala e leitura:
• curiosidade;
• grande imaginação;
• capacidade de descobrir como as coisas acontecem;
• forte envolvimento com idéias novas;
• boa compreensão do ponto essencial das coisas;
• boa compreensão de novos conceitos;
• maturidade surpreendente;
• grande vocabulário para sua faixa etária;
• satisfação ao resolver quebra-cabeças e problemas;
• talento para construção de modelos;
• excelente compreensão de histórias que lhe são lidas ou contadas.
30
A partir do 3º ano:
Em relação à fala:
• pronúncia incorreta de palavras longas, desconhecidas ou complicadas;
• ruptura de palavras – omite ou confunde a ordem das partes de uma
palavra (escola por secola, salada por sadala);
• discurso não fluente, contendo pausas ou hesitações freqüentes;
• uso de linguagem imprecisa, utilizando termos como coisa, negócio em
vez de utilizar o nome correto do objeto (disnomia – incapacidade para
recordar nomes próprios);
• incapacidade de encontrar a palavra correta, confundindo palavras que
tenham sonoridade semelhante, mas com sentido diverso (frito por grito);
• necessidade de tempo maior para elaborar uma resposta oral ou
incapacidade de dar uma resposta verbal de maneira rápida ao ser
questionado;
• dificuldade de lembrar partes isoladas de informação verbal (memória
imediata) como datas, nomes, números de telefones, listas aleatórias.
Em relação à leitura:
• progresso muito lento na aquisição das habilidades de leitura;
• falta de estratégias para a leitura de palavras novas;
• problemas ao ler palavras desconhecidas (novas ou não familiares) que
devem ser pronunciadas em voz alta; tentativa de adivinhar a palavra ao lêla; falhas na organização dos sons das palavras quando as pronuncia;
• inabilidade para ler palavras funcionais, como por exemplo: em, na, e,
aquela;
• medo acentuado em ler em voz alta; quando o faz apresenta uma leitura
contaminada por substituições, omissões, e palavras mal pronunciadas,
além de um ritmo pouco fluente, lento, entrecortado e trabalhoso; não tem
inflexão e parece a leitura de uma língua estrangeira;
31
• desempenho desproporcionalmente fraco em testes de múltipla escolha,
além de não conseguir finalizá-los no tempo estabelecido;
• substituições de palavras de mesmo significado quando não consegue
pronunciar, como: blusa por roupa;
• dificuldade de leitura e conseqüente incompreensão dos enunciados dos
exercícios de Matemática;
• escrita (à mão) confusa, com ortografia desastrosa, mas grande facilidade
ao utilizar o editor de textos, possuindo rapidez para digitar;
• extrema dificuldade para aprender uma língua estrangeira;
• falta de entusiasmo em relação à leitura; evita ler livros ou até mesmo uma
frase; quando pode, faz escolha por textos que sejam pequenos, tenham
letras maiores e muitas figuras (características esperadas para alunos de
anos anteriores);
• com o decorrer do tempo pode aumentar a precisão da leitura, porém ainda
continua a ser sem fluência e trabalhosa;
• auto-estima em declínio, presença de sofrimentos nem sempre visíveis;
• histórico
familiar
com
as
mesmas
características
em
relação
à
aprendizagem, leitura e ortografia.
Mesmo apresentando estas características relacionadas a problemas
fonológicos, há indícios de habilidades nos processos de pensamento de alto nível:
• excelentes habilidades de pensamento: contextualização, raciocínio,
imaginação e abstração;
• capacidade de entender “o todo”;
• capacidade para ler e compreender palavras já aprendidas relativas a uma
determinada área de interesse;
• vocabulário de alto nível, em relação à sua idade e escolaridade, no que diz
respeito às palavras que ouve;
• compreensão acima da média, daquilo que lhe foi lido;
• excelência em áreas que não dependam de leitura, como artes visuais,
computação, ou em áreas que não exijam relacionar a fatos imediatos,
filosofia, biologia, neurociências.
32
Ao trabalhar com alunos disléxicos (ou alunos portadores de outros
distúrbios), deve-se sempre verificar aquilo que ele tem preservado em relação a
suas habilidades específicas, valoriza-las e incentiva-los a desenvolvê-las muito
mais. Desta forma é possível sair do quadro de insucesso ou fracasso escolar e
resgatar sua auto-estima, fazendo-o acreditar e perceber que tem capacidade para
outras tarefas, e não fixar-se somente numa inabilidade devido ao distúrbio.
33
CAPÍTULO II – LEI A FAVOR DO DISLÉXICO
O homem não é nada além daquilo que a educação faz dele.
Immanuel Kant
Em relação à Dislexia, é importante saber que existem Leis específicas que
contemplam os portadores deste distúrbio.
Para a promoção do sucesso escolar dos disléxicos, além da necessidade de
conhecimento e capacitação específicos por parte daqueles que estão envolvidos no
processo de ensino-aprendizagem, é importante saber o que a Lei diz ou não em
relação a este distúrbio.
As Leis educacionais não fazem referência específica à Dislexia, porque
sempre se referem aos portadores de necessidades educacionais especiais, ou
seja, são generalizadoras.
Estão inclusos neste grupo aqueles que apresentam incapacidade física e
mental, independente do grau de comprometimento em relação ao ensinoaprendizagem, assim como os superdotados.
Em todas as Leis, legislação e diretrizes educacionais existem considerações
gerais em relação à inclusão escolar, sendo este um direito de qualquer cidadão.
1 Leis vigentes
De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases (LDB) 9.394/96 art. 32 §1 - cabe
ao Ensino Fundamental o desenvolvimento da capacidade de aprender, tendo como
meios básicos o pleno domínio da leitura, da escrita e do cálculo.
Dentre os vários problemas encontrados no sistema educacional, a inclusão
de crianças portadoras de necessidades educacionais especiais, é a que apresenta
uma das maiores preocupações.
34
A Organização Mundial de Saúde (OMS) estima que em torno de 10% da
população mundial tem necessidades especiais, no Brasil estima-se cerca de 15
milhões de pessoas.
O Estado brasileiro tem como compromisso educar a todos sem qualquer
discriminação ou exclusão social e prover acesso ao Ensino Fundamental para os
educandos, em idade escolar, sendo este um direito público.
Tanto a LDB quanto a Constituição Federal apresentam artigos beneficiários
a estudantes com necessidades especiais.
Alguns deles são:
Emenda LDB – ENTEC/ SEESP
Artigo 2º da LDB “A educação, dever da família e do estado, inspirada nos
princípios da liberdade e nos ideais de solidariedade humana, tem por
finalidade o pleno desenvolvimento do educando, seu preparo para o
exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho”.
Artigo 12 - Os estabelecimentos de ensino, respeitadas as normas comuns
e as do seu sistema de ensino, terão a incumbência de:
I – Elaborar e executar sua proposta pedagógica.
V – Prover meios para recuperação dos alunos de menor rendimento.
Artigo 23 – A educação básica poderá organizar-se em séries anuais,
períodos semestrais, ciclos, alternância regular de períodos de estudos,
grupos não seriados, com base na idade, na competência e em outros
critérios, ou por forma diversa de organização, sempre que interesse do
processo de aprendizagem assim o recomendar.
Artigo 24 – Avaliação contínua e cumulativa, prevalência dos aspectos
qualitativos sobre os quantitativos e dos resultados ao longo do período.
No seu artigo 4º, inciso III, a LDB diz que o dever do Estado com a educação
escolar pública será efetivado mediante a garantia de “atendimento educacional
especializado
gratuito
aos
educandos
com
necessidades
especiais,
preferencialmente na rede regular de ensino”.
O quadro dos distúrbios de aprendizagem absorve uma diversidade de
necessidades educacionais, destacadamente associadas a:
• problemas psicolingüísticos (Dislexia e disfunções correlatas);
35
• psicomotores, motores, cognitivos (atenção, concentração, percepção,
memória) hiperatividade;
• fatores ambientais e socioeconômicos, como as privações de caráter
sociocultural e nutricional.
Os avanços do dispositivo da Lei 9.394/96 são:
• o atendimento educacional é gratuito, portanto a oferta do atendimento
especializado, no âmbito da rede oficial de ensino, não pode ser cobrada;
• pessoas em idade escolar que são consideradas “educandos com
necessidades especiais” incorrem num enfoque pedagógico, ou mais,
precisamente,
um
enfoque
psicopedagógico,
em
se
tratando
do
atendimento educacional;
• o corpo e a alma dos educandos são de responsabilidade de todos os que
promovem a formação escolar.
O artigo 58 da LDB, no entanto, mistura um pouco os enfoques clínico e
pedagógico ao conceituar a educação especial “como modalidade de educação
escolar, oferecida, preferencialmente, na rede regular de ensino, para educandos
portadores de necessidades especiais”. Ainda neste artigo, o legislador diz que
“haverá, quando necessário, serviços de apoio especializado, na escola regular,
para atender às peculiaridades da clientela de educação especial”.
Os pareceres e a Resolução manifestos pelo Conselho Nacional de Educação
(CNE) são exemplos de legislação. Em geral, para ter força jurídica, são
homologadas pelo Ministro da Educação e Desporto que as respaldam para
aplicação na organização da educação nacional.
Dentro de todas as perspectivas de um sistema educacional inclusivo e com
sucesso em resultados, devemos nós, como educadores, rever posições do que a
Lei nos possibilita e a distância entre a realidade vivida pelas escolas,
principalmente as públicas. Assim, procurar conhecimentos que levem à formação
de crianças e jovens sem nenhuma real exclusão.
36
2 Lei específica sobre Dislexia
A Lei nº 12.524, de 3 de Janeiro de 2007, de autoria da Deputada Maria Lucia
Prandi, do Partido dos Trabalhadores, é específica para os disléxicos (Anexo 1).
Dispõe sobre a criação do Programa Estadual para a Identificação e
Tratamento da Dislexia na Rede Oficial de Educação.
Esta lei foi promulgada nos termos do artigo 28, § 8°, da Constituição do
Estado de São Paulo, discorre o seguinte:
Artigo 1º - Fica o Poder Executivo obrigado a implantar o Programa
Estadual para Identificação e Tratamento da Dislexia na Rede Oficial de
Educação, objetivando a detecção precoce e acompanhamento dos
estudantes com o distúrbio.
Parágrafo único - A obrigatoriedade de que trata o “caput” refere-se à
aplicação de exame nos educandos matriculados na 1ª (primeira) série do
Ensino Fundamental, em alunos já matriculados na rede quando da
publicação desta lei, e em alunos de qualquer série admitidos por
transferência de outras escolas que não da rede pública estadual.
Artigo 2º - O Programa Estadual para Identificação e Tratamento da Dislexia
na Rede Oficial de Educação deverá abranger a capacitação permanente
dos educadores para que tenham condições de identificar os sinais da
dislexia e de outros distúrbios nos educandos.
Artigo 3º - Caberá às Secretarias da Saúde e da Educação a formulação de
diretrizes para viabilizar a plena execução do Programa Estadual para
Identificação e Tratamento da Dislexia na Rede Oficial de Educação.
Artigo 4º - O Programa Estadual para Identificação e Tratamento da Dislexia
na Rede Oficial de Educação terá caráter preventivo e também proverá o
tratamento do educando.
Artigo 5º - As despesas decorrentes da execução desta lei correrão à conta
das dotações orçamentárias próprias.
Artigo 6º - O Poder Executivo regulamentará esta lei no prazo de 30 (trinta)
dias, a contar da data de sua publicação.
Artigo 7º - Esta lei entra em vigor na data de sua publicação.
Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo, aos 2 de janeiro de 2007.
RODRIGO GARCIA, Presidente.
Publicada na Secretaria da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo,
aos 3 de janeiro de 2007.
Marco Antonio Hatem Beneton, Secretário Geral Parlamentar.
Se anteriormente a LDB não fazia uma distinção entre distúrbios de
aprendizagem e educandos portadores de necessidades educacionais especiais, a
lei 12.524 visa preencher esta lacuna, não somente em relação à Dislexia, mas
também aos demais distúrbios de aprendizagem, como descrito em seu artigo 2º.
37
Esta lei acena para um futuro progresso em relação à inclusão, explicita as
necessidades do ser humano, seus direitos e o favorece nas oportunidades que o
Estado, a Família e a Escola devem promover para o seu desenvolvimento pleno. É
importante que exista sempre uma fundamentação teórica que sustente esta prática
inclusiva.
38
CAPÍTULO III – A DISLEXIA E O EDUCADOR
Fui totalmente desestimulado em meus dias de escola. E nada é mais
desencorajador do que ser marginalizado em sala de aula, o que nos leva a
sentirmo-nos inferiores em nossa origem humana.
Winston Churchill
Dando prosseguimento ao conhecimento específico sobre Dislexia, neste
capítulo serão abordados tópicos que podem auxiliar o educador a compreender
melhor o distúrbio, assim como, apropriar-se de práticas que facilitem seu trabalho
pedagógico frente ao aluno disléxico.
1 Embasamento teórico
Três autores fundamentaram esta monografia pela importância de suas idéias
para a compreensão da Dislexia: Sally Shaywitz, Antonio Manuel Pamplona de
Moraes e Corinne Roth Smith.
Sally Shaywitz é neurocientista, doutora em Medicina, professora de pediatria
e co-diretora de Estudos de Aprendizagem e da Atenção na Universidade de Yale
(EUA); é membro do Instituto de Medicina da Academia Nacional de Ciências dos
Estados Unidos; estuda a leitura e escreve frequentemente em publicações
científicas. Esta autora é referência unânime em todo e qualquer trabalho
relacionado à Dislexia, pois estuda este distúrbio há duas décadas, e continua
pesquisando, sempre com o objetivo de fazer com que leigos, profissionais e
disléxicos possam compreender a Dislexia.
Antonio Manuel Pamplona de Morais é Psicólogo pela USP (Universidade de
São Paulo) e Mestre em Psicologia da Educação pela PUC (Pontifícia Universidade
Católica) de São Paulo. Por ser psicólogo clínico e prestar assessoria a escolas (há
quase 30 anos), realizando avaliações de crianças e treinamentos de professores,
possui vasto conhecimento em relação aos distúrbios de aprendizagem.
39
Corinne Roth Smith é PhD da Universidade de Syracuse (EUA), onde
desempenha as funções de fundadora e diretora do Laboratório de Ensino
Psicoeducacional (centro que desenvolveu abordagens não padronizadas de
avaliação de crianças com dificuldades extraordinárias de aprendizagem e
disfunções comportamentais), professora de Liderança e Ensino e Doutora
assistente de Educação. É famosa por seu livro-texto, pioneiro no tema sobre
deficiências de aprendizagem, "Learning Disabilities: The Interaction of Learner,
Task and Setting"3, já em sua quarta edição em Inglês. A Drª. Smith é também
conhecida por seu livro de ajuda aos pais, "Learning Disabilities - A – Z”
(Dificuldades de Aprendizado, de A à Z), já traduzido e editado em português (2001),
escrito em parceria com a escritora Lisa Strick.
O enfoque do livro – Dificuldade de Aprendizagem, de A à Z - refere-se à
importância de se estimular os pontos fortes da criança em vez de se
concentrar nas dificuldades. Apresenta estratégias valiosas no trabalho com
crianças e oferece recursos que satisfazem as necessidades de pais e professores.
Mais importante, as autoras expõem casos reais e oferecem “insights” valiosos em
relação a essas crianças.
É possível constatar o quanto este distúrbio de aprendizagem é motivo
gerador de confusões por parte do principal elemento de formação dos alunos, o
professor. Sabe-se que toda a responsabilidade recai justamente sobre ele, porém
este nem sempre possui condições adequadas para lidar com o aluno disléxico,
além de não possuir conhecimento específico sobre o mesmo.
Em relação à falta de conhecimento específico, é essencial considerar a
formação do educador. Somente boa vontade e afeto, por parte dele, não são
suficientes para promover o sucesso escolar do aluno disléxico; contribuem de
maneira positiva e são importantes, porém não privilegiam todos os aspectos
necessários para garantir os avanços e conquistas deste aluno.
3
Tradução livre da autora desta monografia: Deficiências de aprendizado: interação entre aprendiz,
tarefa e ambiente (sem título em português).
40
Diante deste panorama, assinalam-se aqui aspectos importantes, os quais
podem auxiliar o professor tanto na percepção primária de que algo está em
descompasso com seu aluno em relação aos demais, assim como práticas em sala
de aula que possam melhorar as condições de aprendizagem deste aluno.
Vale destacar que nem sempre será possível recorrer às Leis naquilo que se
refere a diagnósticos e terapias, pois na rede pública as dificuldades para marcar
consultas e a falta de profissionais que sejam especialistas em distúrbios de
aprendizagem retardam o diagnóstico, independente daquilo que é garantido por lei.
Na rede privada, mesmo para aquelas famílias que dispõem de certa
condição econômica e planos particulares de saúde, o custo de uma avaliação
multiprofissional pode variar de R$ 600,00 (seiscentos reais) a R$ 1.500,00 (mil e
quinhentos reais), ou seja, também não serão todos os alunos que estejam no grupo
de risco que poderão passar por tal avaliação.
Salienta-se uma vez mais que não cabe ao educador o diagnóstico, pois este
é de alçada médica, mas caberá a ele fazer o papel diferencial na vida de seu aluno
e contribuir com informações precisas e adequadas ao especialista.
1.1
Sinais de Dislexia
Os três autores que fundamentam este trabalho contribuem de maneira direta
e dinâmica para que o educador seja capaz de identificar sinais da Dislexia.
Algumas características comuns que o educador pode observar, segundo
SHAYWITZ (2006):
• problemas em reconhecer, ler ou escrever palavras isoladas;
• dificuldade em estruturar trabalhos escritos, como redações;
• problemas com ortografia;
• inversão de letras;
• dificuldade de memória a curto prazo;
41
• dificuldade em revisar ou identificar erros;
• compreensão auditiva inferior à média;
• problemas com organização;
• dificuldade em escrever à mão;
• baixo limiar de atenção quando escuta;
• problemas com discriminação visual;
• problemas com percepção espacial;
• dificuldade em lembrar nomes;
• lentidão em fazer tarefas escolares;
• pouca noção de tempo;
• dificuldade em distinguir certos sons entre vogais e consoantes;
• confusão com símbolos e com o alfabeto;
• problemas em lembrar a rotina diária;
• compreensão inferior de leitura.
1.2
Aspecto pedagógico
Aspectos que devem ser praticados pelos educadores, de acordo com
SMITH e STRICK (2001):
Na sala de aula
• permitir assentos preferenciais (próximo ao professor, próximo ao quadro
negro);
• providenciar cópias de anotações (podem ser oferecidas pelo professor ou
por outro aluno);
• manter sempre o contato visual, certificando-se que o aluno está olhando
diretamente para você;
• permitir uso de gravador para registro de aulas expositivas;
• permitir o uso de calculadoras;
• providenciar o acesso a um computador;
42
• permitir atividades alternativas (pedir que o aluno prepare um vídeo ao
invés de um relatório escrito);
• sublinhar, ou salientar de outro modo, textos e exercícios para que os
estudantes localizem melhor o material mais importante;
• oferecer instruções tanto oralmente (certificar-se que ele está ouvindo e
prestando atenção naquilo que está sendo dito) quanto por escrito;
• oferecer fácil acesso a tabuadas, listas de fórmulas, mapas (ao invés de
exigir que o aluno memorize);
• designar parceiros de estudos;
• realizar pré-leitura do material escrito (discutir os conteúdos dos textos
distribuídos previamente);
• não solicitar que faça leitura em voz alta (somente se o aluno explicitar esta
vontade), principalmente diante do grupo;
• utilizar atividades lúdicas para introduzir novos conceitos ou reforça-los;
lançar mão deste recurso sempre que possível, pois permitirá que o aluno
disléxico mostre sua capacidade de aprender através de outras habilidades,
que não a de leitura.
Avaliações
• permitir ambientes alternativos (o estudante poderá realizar a avaliação em
outra sala, que não possua elementos distratores, assim como solicitar que
alguém faça a leitura dos enunciados, um por vez, esperando que registre
sua resposta, para somente então seguir com a leitura. Se possuir um grau
severo de Dislexia, este leitor – coordenadora professora assistente poderá fazer o registro escrito da resposta do aluno, sendo fiel àquilo que
foi dito por ele, inclusive se estiver incorreto);
• estender ou abandonar o limite de tempo para a execução da avaliação;
• reformular as questões de uma maneira mais resumida e simples;
• permitir que responda oralmente as questões ao invés de fazê-lo por
escrito;
• elaborar avaliações com respostas curtas ou aceitar respostas resumidas e
diretas;
43
• reduzir o número de questões.
Deveres de casa
• dar as tarefas de casa por escrito com regularidade, ao invés de exigir que
copie da lousa ou que ouça aquilo que deverá fazer;
• permitir que os textos sejam lidos ou gravados para o aluno;
• reduzir a quantidade de material a ser lido (o professor pode destacar as
passagens mais importantes);
• permitir que o aluno assista ao filme ao invés de ler o livro (quando
possível);
• permitir que o aluno dite seu trabalho a um “escriba” (geralmente os pais ou
irmão mais velho), ou solicitar que ofereça oralmente;
• reduzir número de questões que deverão ser respondidas;
• não reduzir a nota ou descontar pontos por erros de ortografia (somente se
for avaliação exclusiva de ortografia).
2 O papel do educador
O educador possui papel de destaque na vida acadêmica de todos
educandos, mas em relação àqueles que apresentam um ou alguns distúrbios de
aprendizagem ele é vital na promoção do sucesso escolar destes.
De acordo com Morais (1996), existem atitudes em relação às práticas do
educador, assim como em relação às suas próprias expectativas, que devem ser
muito bem definidas ao trabalhar com o aluno disléxico. Dentre elas, destacam-se:
• compreender que apesar de todo esforço por parte do aluno, muitas vezes
ele não conseguirá corresponder às expectativas, mas não por “preguiça”
ou “má vontade”;
• respeitar suas dificuldades;
• respeitar seu ritmo e não envolvê-lo em situações de competição com os
demais colegas (somente se o aluno assim o desejar);
44
• não colocá-lo em situações geradoras de ansiedade (pedir que leia em voz
alta diante da sala, solicitar que escreva na lousa frases ditadas);
• não compará-lo com os demais alunos;
• conversar separadamente com o aluno, explicando-lhe que sabe sobre seu
distúrbio e que poderá sempre auxilia-lo, estabelecendo assim um clima de
sinceridade, onde o aluno sentirá que tem apoio e que pode ficar mais
tranquilo sobre suas possíveis ações, frente ao distúrbio;
• desenvolver sua auto-estima, identificando suas áreas de interesse e
estimulá-las;
• compensar sua limitação em relação à leitura, reforçando as demais áreas
que possui considerável desenvoltura;
• reforçar de maneira positiva (elogios) todo e qualquer esforço em relação
ao seu desempenho escolar, ainda que tenha ocorrido de maneira discreta,
visando desenvolver a autoconfiança do aluno;
• focalizar sempre as capacidades e habilidades e nunca o contrário;
• ter em mente que Dislexia não é uma doença, mas um modo peculiar de
funcionamento dos centros neurológicos de linguagem (disfunção cerebral),
por isso não existe tratamento medicamentoso; não tem cura e existe uma
predisposição genética;
• os bons ou maus vínculos são preditivos de sucesso ou fracasso,
principalmente na vida acadêmica do disléxico, portanto os vínculos
afetivos e estratégias que privilegiem a maneira de aprender deste aluno
são extremamente importantes para garantir seu sucesso;
• encoraje a independência provendo compreensão e apoio;
• forneça elementos para que possa expressar sua criatividade;
• ensine-o a usar sua intuição; explique de que forma você a utiliza para
ajudar a si mesmo;
• lembre-se: o disléxico é persistente e não teimoso, possui a capacidade
intelectual preservada.
Os três autores reforçam o quanto é importante valorizar as habilidades que o
educando possui e não fixar-se somente no distúrbio. Pontuam, ainda, que sem um
conhecimento específico, por parte dos educadores, a inclusão do aluno disléxico
45
não ocorre. No próximo capítulo será mostrado como o educador sente-se frente a
este aluno.
46
CAPÍTULO IV – A PESQUISA
1 Percurso Metodológico
O presente trabalho de pesquisa está voltado para questões relacionadas ao
conhecimento por parte do educador em relação à Dislexia; reconhecida como
distúrbio de aprendizagem que está presente em sala de aula, desperta e instiga no
educador o desejo de não só compreende-la para reconhecer seus sinais, como
também, para lidar com o aluno(a) disléxico(a) no seu dia-a-dia.
Esta monografia foi conduzida em duas etapas. A primeira consistiu na
identificação de autores que serviram de embasamento teórico, feito por meio de
uma revisão bibliográfica. Da experiência da autora com colegas (da área de
Educação) e relatos ocasionais, constatou-se que os educadores deparam-se
freqüentemente com equívocos relacionados à natureza da Dislexia, e também
inadequações nas questões que não estão ligadas ao distúrbio, mas sim a inúmeros
fatores que podem contribuir para o insucesso de uma criança frente à leitura. Este
embasamento teórico contribuiu para o amadurecimento da fundamentação teórica
deste trabalho, possibilitou à autora aprofundar-se na compreensão sobre Dislexia e
foi imprescindível na sustentação da análise dos dados de pesquisa.
Em uma segunda etapa, correspondente à pesquisa de campo na abordagem
quantitativa, foi efetuado o levantamento de dados contemplando as percepções de
15 educadores do Ensino Fundamental I frente aos conhecimentos sobre o distúrbio,
sua prática com os alunos portadores e a fundamentação didático-pedagógica na
inteiração cotidiana em sala de aula. Para tal, elegeu-se como instrumento de
pesquisa um questionário objetivo com o intuito de conhecer, no universo de atores
pesquisados, a percepção básica sobre a Dislexia, a natureza do trabalho realizado
e dados complementares, tais como formação, tempo de docência e área de
atuação. Este questionário encontra-se no Apêndice I, ao final deste trabalho.
47
Do resultado das respostas por parte das 15 educadoras, do Ensino
Fundamental I, de uma escola da rede privada procedeu-se, então, a análise e
discussão frente aos autores que fundamentam a pesquisa.
2 Cenário e atores
A seguir a constatação a partir dos dados obtidos com as respostas do grupo
pesquisado.
Dentre as 15 professoras que responderam o questionário, é importante
destacar que:
1) Todas trabalham em uma mesma instituição de rede privada. A estrutura da
instituição é de médio porte (400 alunos, de Educação Infantil até o 9º ano
do Ensino Fundamental II), com até 25 alunos por turma, sendo que nas
salas da Educação Infantil, juntamente com 1ºs e 2ºs anos, em todas há
uma professora assistente. Todas possuem jornada parcial de trabalho.
2) Todas possuem nível superior, sendo que oito são pós-graduadas e uma
possui o título de Mestre.
3) Onze delas são Pedagogas, uma é formada em Letras, outra em Normal
Superior e outras duas não especificaram sua formação.
4) Seis lecionam há mais de 10 anos. Três lecionam entre 5 e 10 anos. Três
lecionam entre 2 e 5 anos e três lecionam há menos de 2 anos.
5) Todas já ouviram falar sobre Dislexia.
6) Dez professoras tiveram como fonte de informação, a respeito do que é
Dislexia, livros sobre o tema. Três outras, tomaram conhecimento durante
sua formação na Faculdade e somente duas buscaram esta informação na
Internet.
7) Todas tem interesse em saber mais sobre Dislexia.
8) Todas discordam que “Dislexia é modismo”.
9) Em relação à definição de Dislexia, sete professoras responderam
acertadamente que nenhuma afirmação estava correta, cinco assinalaram a
opção “uma característica de quem não sabe ler e escrever” e três não
possuíam opinião formada.
48
10) Somente uma professora possui aluno disléxico em sala de aula.
6,25%
Sim
Não
93,75%
Gráfico 1 – Quantidade de professoras que possuem aluno disléxico
11) Esta mesma professora, que possui um aluno disléxico, respondeu que
não é fácil trabalhar numa sala onde exista aluno com este distúrbio.
0,00%
Sim
Não
100,00%
Gráfico 2 - Facilidade para trabalhar com aluno disléxico
49
12) Houve unanimidade entre as professoras ao responderem positivamente
em relação à capacidade de aprender do aluno disléxico.
0,00%
Sim
Não
100,00%
Gráfico 3 – Capacidade do aluno disléxico em aprender
13) A maioria das professoras se sente despreparada para trabalhar com o
aluno disléxico.
12,50%
Sim
Não
87,50%
Gráfico 4 – As professoras no trabalho com aluno disléxico
50
14) As mesmas professoras que se sentem despreparadas para trabalhar com
o aluno disléxico (87,5%), responderam que a instituição na qual trabalham
não garante qualquer apoio pedagógico para que possam trabalhar de
forma diferenciada junto a este aluno, porém 12,5% responderam o
contrário.
12,50%
Sim
Não
87,50%
Gráfico 5 – Posição da instituição em relação à inclusão ao aluno disléxico
3 Análise Interpretativa
O desenvolvimento do pensamento, mais que um simples processo lógico, desenvolve-se
em resposta a desafios vitais. Sem o desafio da vida o pensamento fica a
dormir... O pensamento se desenvolve como ferramenta para construirmos as
conchas que a natureza não nos deu.
(Rubem Alves)
Os resultados da pesquisa quantitativa sugerem as seguintes considerações:
•
Todas as educadoras demonstraram que sabem o que é distúrbio de
aprendizagem, assim como, compreendem que este aluno é tão capaz
quanto os demais de aprender, indo ao encontro do que Morais (1996)
explicita sobre o papel do educador: este deve saber sobre as dificuldades
de seus alunos.
51
•
Especificamente em relação ao conhecimento sobre Dislexia, mais da
metade das professoras soube responder (Dislexia é...), porém mesmo
assim, sentem-se inseguras e/ou despreparadas para trabalhar com o
aluno disléxico.
Uma característica de
quem não sabe escrever
12,50%
0,00%
12,50%
Uma característica de
quem não sabe ler
Característica de que não
sabe ler e escrever
Nenhuma afirmação está
correta
75,00%
Não tenho opinião formada
a respeito
Gráfico 6 – Conhecimento sobre Dislexia
•
É importante registrar que todas as professoras trabalham na mesma
instituição, porém não foram unânimes ao responder se ela garante algum
apoio pedagógico específico que permita ao educador trabalhar de forma
diferenciada junto ao aluno disléxico (vide o gráfico 5).
A relevância desta questão está na interpretação de que a prática
pedagógica diferenciada não é compreendida de forma clara para o
educador. Ao mesmo tempo em que 87,5% afirmam que não possuem
nenhum apoio por parte da instituição, os 12,5% restantes afirmam que
recebem este apoio. Se todas trabalham na mesma instituição, existe um
equívoco quanto à compreensão, por parte das professoras, daquilo que é
ou não específico ao trabalho junto ao aluno disléxico.
•
As educadoras sentem-se despreparadas e ansiosas em relação ao
desenvolvimento de seus alunos disléxicos.
52
Segundo Morais (1996) muitas vezes este aluno não corresponderá às
expectativas do educador, portanto é imprescindível ter este ponto muito claro
quando se lida com disléxicos, pois a ansiedade atrapalha todo e qualquer trabalho
pedagógico, sendo o aluno disléxico ou não.
Se o educador possuir conhecimentos específicos sobre Dislexia, mas não
conseguir colocá-la em prática no dia-a-dia, não está garantido que o aluno disléxico
seja incluído de fato, passando à inclusão teórica, perpetuando o insucesso tanto do
aluno, quanto do trabalho do educador.
Já o educador que se sente despreparado diante do aluno disléxico, se num
primeiro momento for orientado a respeito das características positivas que seu
aluno possui (habilidades nas diversas áreas, assuntos de seu interesse – tão bem
pontuados por Smith e Strick, 2001), assim como, quais os pontos que lhe geram
ansiedade e maior dificuldade, é possível que o processo ensino-aprendizagem
ocorra, devido às práticas pedagógicas específicas utilizadas por parte do educador.
A conclusão possível, a partir dos resultados obtidos nesta pesquisa, remete
à complexidade do tema e confirma que o mesmo representa um grande desafio
para o educador.
Tal desafio, real e concreto, remete-se ao despreparo do educador frente a
este e aos demais distúrbios de aprendizagem. Além disso, outro fator importante
está relacionado ao papel da escola no que tange à inclusão.
Muitas escolas possuem um discurso inclusivo, quando na verdade
promovem somente a integração do aluno em sala de aula e param neste ponto. É
necessário muito mais do que efetuar a matrícula, este sim o primeiro passo. É
importante saber o quanto os educadores sabem e sentem-se preparados para
trabalhar com o aluno disléxico.
Cabe à escola fazer este levantamento, inclusive quando necessário,
promover cursos de capacitação para aqueles ligados diretamente aos alunos
53
disléxicos. Também lhe cabe a orientação específica em relação a cada um deles,
pois como é perceptível, cada qual apresentará dificuldades específicas, por conta
da presença ou não das comorbidades.
Para finalizar esta
linha de raciocínio, diante dos resultados obtidos na
pesquisa, pontua-se que o conhecimento específico é vital e deve ser aliado ao
trabalho de equipe, que alcance todos aqueles que estão envolvidos na educação
do aluno disléxico (direção, coordenadores,educadores polivalentes e especialistas),
visando sempre o sucesso escolar do mesmo.
Salienta-se que somente um aspecto (conhecimento específico sobre Dislexia
ou somente conhecimento a respeito do distúrbio do aluno) será insuficiente para
que o ensino-aprendizagem ocorra de maneira progressiva, consistente e com
sucesso.
Por fim, ressalta-se o seguinte trinômio, que garantirá o sucesso escolar do
aluno disléxico:
conhecimento
específico
+
SUCESSO
conhecimento das peculiaridades
ESCOLAR
do aluno disléxico
DO ALUNO
+
DISLÉXICO
práticas pedagógicas
possíveis e inclusivas
54
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A maior lei da natureza, da vida e da educação é exteriorizar o interior e
interiorizar o exterior, elevando os dois processos à harmoniosa síntese.
Froebel
Durante a pesquisa teórica e diante das respostas dos educadores infere-se
que compreender o tema é muito complexo de fato, pois são inúmeros os aspectos
que estão envolvidos em relação ao aluno disléxico.
Parafraseando a citação de Froebel, no início desta página, compreende-se
também que para existir uma síntese harmoniosa, entre o que o aluno disléxico pode
produzir e o que o educador espera dele, existe um caminho a ser percorrido,
principalmente por parte do educador, pois este possui papel vital na vida do
disléxico.
Caberá ao educador conduzi-lo no caminho do sucesso acadêmico. Aos
demais
profissionais,
cada
qual
com
sua
importância
(neuropediatra,
psicopedagogo, fonoaudiólogo, entre outros), é importante saber trabalhar em
parceria com este educador, porém o trabalho maior recairá sobre este educador
compromissado com seu aluno.
Encerra-se este trabalho, pontuando-se questões que não podem ser
esquecidas:
• o aluno disléxico não é preguiçoso e tão pouco gosta de fracassar na vida
acadêmica;
• ele sente satisfação em fazer suas tarefas bem feitas e quando isso não
ocorre, não quer dizer que não o fez porque simplesmente não quis;
• o reforço positivo, em relação àquilo que consegue fazer bem, só poderá
resultar em sentimentos positivos para o disléxico (autoconfiança);
• na educação, todos somos desafiados o tempo todo; superar desafios nada
mais é do que transpor aquilo que julgávamos impossível ou difícil,
55
resultado de persistência e dedicação, característica latente no aluno
disléxico.
Por fim, na realização deste trabalho, foi possível à pesquisadora
compreender um pouco mais sobre a Dislexia, o aluno disléxico e o educador deste.
Contudo, tem consciência que muito mais precisará compreender e estudar,
mas só pode chegar a esta tomada de consciência através da manutenção de sua
inquietação inicial e a partir dos conhecimentos adquiridos na elaboração deste
trabalho.
56
REFERÊNCIAS
BRADY, Susan et alli. Annals of Dyslexia vol. 53, 2003. Acesso em: 26/ jan./ 2007.
Disponível em: <www.dislexia.org.br/material/artigos/artigo014.html>
BRASIL. Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nº. 9.394/96. Diário Oficial da
República Federativa do Brasil, n.248, 23 dez. 1996.
CAPOVILLA, Alessandra G. S. e CAPOVILLA, Fernando C. Alfabetização: Método
fônico. 3ª edição. São Paulo: Memnon, 2004.
_________. Avaliação e intervenção em habilidades metafonológicas e de
leitura e escrita. Coleção: Temas de Psicopedagogia, livro 5. São Paulo: Memnon,
2003.
_________. Problemas de leitura e escrita. 4ª edição. São Paulo: Memnon, 2004.
CAPOVILLA, Fernando C. MACEDO, Elizeu C. Temas em Neuropsicolinguística.
São Paulo: Tecmedd, 2005
CID 10 Classificação de Transtornos Mentais. Porto Alegre: Artmed, 1993.
CONDEMARIN, Mabel; BLOMQUIST, Marlys. Dislexia: manual de leitura
corretiva. Tradução: Ana Maria Neto Machado. Porto Alegre: Artes Médicas, 1988.
DSM-IV-TR-TM. Manual de Diagnóstico e Estatístico das Perturbações Mentais.
4ª ed. Porto Alegre: Artmed, 2002.
FRANK, Robert. A vida secreta da criança com dislexia. Tradução: Tatiana
Kassner. São Paulo: M.Books, 2003.
HOUT, Anne Van; ESTIENNE, Françoise. Dislexias: descrição, avaliação,
explicação, tratamento. Tradução: Cláudia Schilling. Porto Alegre: Artmed, 2001.
IANHEZ, Mª Eugenia e NICO, Mª Ângela. Nem sempre é o que parece. São Paulo:
Alegro, 2001.
57
MORAIS, Antônio Manoel Pamplona. Distúrbios da aprendizagem, uma
abordagem psicopedagógica. São Paulo: EDICON, 1996.
PIAGET, Jean.
Martins,1999.
A linguagem e o pensamento da criança. São Paulo:
SÁNCHEZ, Jesús-Nicasio Garcia. Dificuldades de aprendizagem e intervenção
psicopedagógica. Porto Alegre: Artmed, 2004.
SHAYWITZ, Sally. Entendendo a dislexia. Tradução: Vinicius Figueira.
Alegre: Artmed, 2006.
Porto
SMITH, Corine; STRICK, Lisa. Dificuldades de aprendizagem de A a Z. Tradução:
Dayse Batista. Porto Alegre: Artmed, 2001.
SNOWLING, Margaret; STACKHOUSE, Joy. Dislexia, fala e linguagem. Tradução:
Magda França Lopes. Porto Alegre: Artmed, 2006.
SOUZA, Paulo N. Pereira; SILVA, Eurides Brito. A nova LDB. Como entender e
aplicar. São Paulo: Pioneira, 1997.
WAJNSZTEJN, Alessandra Caturani; WAJNSZTEJN, Rubens. Dificuldades
escolares: um desafio superável. São Paulo: Ártemis Editorial, 2005.
58
APÊNDICE
59
APÊNDICE I – QUESTIONÁRIO
Eu, Kátia S.F.R. Lima, pós-graduanda do curso de especialização em
Distúrbios de Aprendizagem do CRDA – Centro de Referência em Distúrbios de
Aprendizagem (São Paulo – Capital), solicito que você responda este
questionário, para que eu possa concluir minha pesquisa de campo referente
ao meu trabalho de conclusão do curso (TCC).
O objetivo desta pesquisa consiste em mensurar o conhecimento que os
profissionais da área de educação possuem em relação à Dislexia.
Esclareço que não será necessária sua identificação.
Antecipadamente, agradeço sua colaboração.
1)
Tipo de instituição que trabalha:
( ) Pública/Estadual
2)
( ) Pública/Municipal
( ) Privada
Sua formação:
( ) Magistério ( ) Curso Superior ( ) Pós-Graduação
( ) Mestrado ( ) Doutorado
3)
Se você tem nível superior, especifique:
( ) Pedagogia
4)
( ) Normal Superior
( ) de 5 a 10 anos ( ) mais de 10 anos
Já ouviu falar em Dislexia?
( ) Sim
6)
( ) Outros
Tempo em que atua em sala de aula:
( ) até 2 anos ( ) de 2 a 5 anos
5)
( ) Letras
( ) Não
Se respondeu sim à pergunta anterior, assinale qual foi sua fonte de
informação:
( ) TV
( ) Internet
( ) Livro
( ) Faculdade
( ) Outros
60
7)
Você tem interesse em estudar/conhecer mais sobre Dislexia?
( ) Sim
8)
Você concorda com a seguinte frase: “Dislexia é modismo”.
( ) Sim
9)
( ) Não
( ) Não
Dislexia é:
( ) uma característica de quem não sabe escrever
( ) uma característica de quem não sabe ler
( ) uma característica de quem não sabe ler e escrever
( ) Nenhuma afirmação está correta
( ) Não tenho opinião formada a respeito
10) Na sua sala de aula, tem algum aluno com diagnóstico de Dislexia?
( ) Sim. Quantos? ________
( ) Não
11) Se respondeu sim à questão anterior, responda: É fácil trabalhar numa sala que
tenha aluno disléxico?
( ) Sim
( ) Não
12) O aluno disléxico tem capacidade para aprender?
( ) Sim
( ) Não
13) Você se sente preparada para trabalhar com o aluno disléxico?
( ) Sim
( ) Não
14) A instituição em que você trabalha segue alguma orientação para lidar com
este aluno e promover a inclusão de fato?
( ) Sim
( ) Não
61
ANEXO
62
ANEXO I – LEI 12.524/07
Lei 12.524/07 (Originada a partir do PL Nº 321, DE 2004)
Dispõe sobre a criação do Programa Estadual para
Identificação e Tratamento da Dislexia na Rede Oficial de
Educação
A ASSEMBLÉIA LEGISLATIVA DO ESTADO DE SÃO PAULO DECRETA:
Artigo 1º - Fica obrigado o Poder Executivo a implantar, em 90 dias, o Programa
Estadual para Identificação e Tratamento da Dislexia na Rede Oficial de Educação,
objetivando a detecção precoce e acompanhamento dos estudantes com o distúrbio.
Parágrafo único - A obrigatoriedade de que trata o caput deste artigo referese à aplicação de exame nos educandos matriculados na 1ª série do Ensino
Fundamental, em alunos já matriculados na rede, com o advento desta lei, e em
alunos de qualquer série admitidos por transferência de outras escolas que não da
rede pública estadual.
Artigo 2º - O Programa Estadual para Identificação e Tratamento da Dislexia na
Rede Oficial de Educação deverá abranger a capacitação permanente dos
educadores para que tenham condições de identificar os sinais da dislexia e de
outros distúrbios nos educandos.
Artigo 3º - Caberá às Secretárias de Saúde e de Educação a formulação de
diretrizes para viabilizar a plena execução do Programa Estadual para Identificação
e Tratamento da Dislexia na Rede Oficial de Educação, sendo obrigada a criação de
equipes multidisciplinares com os profissionais necessários à perfeita execução do
trabalho de prevenção e tratamento.
Parágrafo único – A equipe multidisciplinar responsável pelo diagnóstico
deverá ter obrigatoriamente um (a) profissional das áreas de Psicologia,
Fonoaudiologia e Psicopedagogia.
SPL - Código de Originalidade: 515039 070504 1248
63
Artigo 4º - O Programa Estadual para Identificação e Tratamento da Dislexia na
Rede Oficial de Educação terá caráter preventivo e também proverá o tratamento do
educando.
Artigo 5º - As despesas decorrentes da execução desta lei correrão por conta de
dotações orçamentárias próprias.
Artigo 6º - O Poder Executivo regulamentará o disposto nesta lei em até 30 (trinta)
dias a contar de sua entrada em vigor.
Artigo 7º - Esta lei entrará em vigor na data de sua publicação.
Justificativa
Dislexia é derivada de dis = distúrbio e lexia que significa linguagem (grego) ou
leitura (latim). Portanto, dislexia é um distúrbio da linguagem e/ou leitura. Talvez por
soar como nomenclatura de uma doença, o termo dislexia causa medo
especialmente entre os pais que, por falta de informações, muitas vezes acreditam
ser o fim do mundo ter um filho disléxico.
Pesquisas realizadas em vários países mostram que cerca de 10 a 15% da
população mundial é disléxica. Ao contrário do que muitos acreditam, a dislexia não
é o resultado de má alfabetização, desatenção, desmotivação, condição sócioeconômica ou baixa inteligência. É uma condição hereditária com alterações
genéticas, apresentando ainda mudanças no padrão neurológico.
Por tudo isso, a dislexia deve ser diagnosticada por uma equipe multidisciplinar.
Esse tipo de avaliação dá condições de um acompanhamento pós-diagnóstico mais
efetivo, direcionado às particularidades de cada indivíduo. Os sintomas que podem
identificar a dislexia, antes de um diagnóstico multidisciplinar, só indicam um
distúrbio de aprendizagem.
Identificado o problema de rendimento escolar ou sintomas isolados, que podem ser
percebidos na escola ou mesmo em casa, deve-se procurar ajuda especializada.
SPL - Código de Originalidade: 515039 070504 1248
64
Cabe à uma equipe multidisciplinar, formada por psicóloga, fonoaudióloga e
psicopedagoga clínica, iniciar uma minuciosa investigação. Essa equipe deve
garantir maior abrangência do processo de avaliação, verificando a necessidade do
parecer de outros profissionais, como oftalmologista e neurologista.
A identificação do distúrbio não parte da dislexia. Ao contrário, chega-se a ela a
partir da exclusão de qualquer outra possibilidade. Caso outro problema seja
detectado, deve haver o encaminhamento para o tratamento adequado. Quando a
dislexia é identificada começa, então, um acompanhamento cujos métodos irão
variar de acordo com os diferentes graus do distúrbio (leve, moderado e severo),
podendo levar até cinco anos.
Crianças disléxicas que têm o distúrbio identificado precocemente, e dão início ao
tratamento, apresentam menor dificuldade ao aprender a ler. Isto evita problemas no
rendimento escolar, que levam meninos e meninas a desgostarem de estudar, terem
comportamento inadequado e atrasos na relação idade/série. Apesar do Poder
Público permanecer de olhos fechados para esta realidade, a dislexia está
diretamente relacionada à evasão escolar e à sensação de fracasso pessoal.
Atualmente, a imensa maioria da rede educacional pública e particular não está
capacitada para este desafio. Daí a importância de criarmos em nossas escolas um
programa efetivo, que capacite professores a identificar estes distúrbios, crie
equipes multidisciplinares para realizar uma avaliação precisa e garanta o
acompanhamento profissional necessário.
Dessa forma, estaremos garantindo que milhões de crianças e jovens em idade
escolar tenham condições de corrigir um distúrbio, que restringe sua capacidade de
aprendizado. Estaremos abrindo as portas para que eles tenham um futuro sem
traumas, de sucesso profissional e com qualidade de vida.
Sala das Sessões, em 7/5/2004
a) Maria Lúcia Prandi - PT
SPL - Código de Originalidade: 515039 070504 1248
65
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