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COMO NOSSOS PAIS1
Cláudio Rafael Mendes Costa
Resumo: o presente artigo se propõe a fazer uma análise
geopolítica da Guerra do Vietnã, que contribuiu para definir novas
bases nas relações internacionais entre os Estados do bloco capitalista
e os do bloco socialista e interbloco socialista. A Guerra do Vietnã
tornou-se um evento marcante no palco da guerra ideológica entre
capitalismo/socialismo, ampliando o teatro bélico para além das fronteiras vietnamitas.
Palavras-chave: Vietnã, Rimland, poder terrestre e poder marí-
timo
ste artigo se propõe a analisar um dos conflitos mais cinematográficos
do século XX: a Guerra do Vietnã. Cinematográfico do ponto de vista
da magnitude de um conflito aparentemente ilógico e ficcional e do ponto de
vista de que tal guerra inspirou e ainda inspira diversos profissionais da sétima
arte, como o talentoso Francis Ford Coppolla e seu Apocalypse Now (referência quase obrigatória para aqueles que desejam saber mais sobre o assunto).
O que foi visto foi a intervenção direta das forças militares (Exército,
Marinha e Aeronáutica) e civis (agentes da CIA) dos Estados Unidos no
Vietnã (do Sul e posteriormente até no do Norte), que nada mais era que
um país distante do Pentágono, pequeno e recém-independente.
O argumento utilizado não variou na retórica utilizada pelos líderes
estadunidenses desde há muito tempo: levar democracia (a esse povo asiático). Desde que se mostraram ao mundo, rompendo grilhões isolacionistas,
os americanos exaltam o valor da democracia como um bem a que toda a
humanidade deveria ter acesso. Para isso, mostram-se pacientes e ‘caridosa-
E
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mente’ dispostos a levar pessoalmente a democracia a qualquer canto do
globo.
Sem desprezar ou menosprezar tais paradigmas ideológicos, o presente artigo lança luz sobre objetivos mais realistas dessa entidade chamada
Estado (norte-americano).
Tributária das teorias geopolíticas de sir Halford Mackinder, Nycholas
Spykman e Zbiegniew Brzezinski, o Departamento de Estado americano
formulou uma política de contenção da União das Repúblicas Socialistas
Soviéticas (URSS) impossibilitando-a de sair para mares quentes e adiantando a linha de defesa da segurança nacional americana para o continente
Eurasiático.
Ao adiantar a linha de defesa do continente americano para as duas
pontas da Eurásia, do outro lado dos oceanos Atlântico e Pacífico, os americanos se visualizavam defendendo a barreira imposta a uma hipotética expansão soviética e, caso viesse a ocorrer um ataque ao território dos Estados Unidos
propriamente dito, levaria algum tempo, possibilitando sua defesa efetiva. Essa
expansão da linha de defesa dava a certos Estados uma importância incontestável na doutrina de segurança americana, daí o porquê de sua defesa contra
uma influência comunista aos Estados da região se tornar essencial. Tais Estados foram denominados de Estados-pinos geopolíticos (numa referência
ao jogo de boliche, no qual a queda de um pino pode ocasionar a queda de
outros ou de todos).
Assim, a Guerra do Vietnã tornou-se um conflito que, de simples intervenção militar, atingiu proporções quase épicas, de batalhas aparentemente
sem-fim entre militares fortemente armados e guerrilheiros asiáticos dispostos a dar suas vidas até a vitória total. Os americanos, com destaque para
o general Westmoreland2 e os secretários de Estado Kissinger e Mc Namara,
não tinham idéia da loucura em que estavam dispostos a cometer Ho Chi
Minh e os quiméricos guerrilheiros do Tet. Ainda que no final a quimera
tenha se tornado real.
VIETNÃ POR VIETNÃ
O Vietnã é um país com pouco mais de 330.000km² (menor que
dois Kansas3), com população majoritariamente budista, que fala vietnamita
e localizado a milhares de quilômetros de Washington.
O território vietnamita localiza-se entre o paralelo 10°N e o Trópico
de Câncer e entre os meridianos 100°L e 110°L, sendo banhado pelo mar
da China meridional, que desemboca no Oceano Pacífico.
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Esse país do sudeste asiático foi colônia francesa, no século XIX, por
iniciativa de missionários seguidos por soldados do imperador Napoleão
III. O Vietnã, juntamente com seus vizinhos Laos e Camboja, enquanto
unidade explorada pela França, recebia o nome de União Indochinesa (desde 1887) e produzia carvão, chá e arroz.
Durante a II Guerra Mundial, esses povos foram submetidos aos japoneses, e Ho Chi Minh, líder nacionalista, fundou a liga revolucionária
Vietminh para a libertação do Vietnã.
Ao fim da guerra, Ho Chi Minh proclama a independência vietnamita, mas enfrenta a resistência francesa, desejosa de reocupar a região. Tal
resistência é totalmente derrotada em 1954 na batalha de Diem Bien Phu4.
A independência do Vietnã é reconhecida na Conferência de Genebra (1954), porém, com o país dividido em Vietnã do Norte (capital Hanói) e Vietnã do Sul (Capital Saigon) até as eleições de 1956, na altura do
paralelo 17° N.
Mas a resistência norte-vietnamita a uma separação semelhante à da
Coréia leva Ho Chi Minh e seus aliados a iniciarem uma luta pela reunificação
do país, lutando contra sul-vietnamitas mais tendentes a uma aliança com
a ex-metrópole e, pouco a pouco, com os Estados unidos.
Num mundo bipolar, tornava-se evidente que a luta anti-colonialista
vietnamita levaria os rebeldes a buscarem apoio no pólo oposto do capitalismo, liderado pela União Soviética (que percebeu a importância geopolítica de tal união) e pela China (que buscava aliados em sua fronteiras).
A situação da URSS é vista por Brzezinski (apud MELLO, 1999, p.
156) como problemática:
É um país mediterrâneo, praticamente fechado para o mundo e cercado por países periféricos que se interpõem entre o território russo
e os oceanos do planeta. Ao norte a livre navegação russa está bloqueada pelas águas geladas do Oceano Ártico; a oeste, a Europa Ocidental controla as saídas ao mediterrâneo e ao atlântico; ao sul, um arco
de países que vai do Oriente Próximo até a Índia barra o acesso ao
Golfo Pérsico e ao Oceano Índico; a leste, a China e os países insulares da orla oriental (Vietnã, por exemplo) vedam o contato com o
Pacífico.
Daí a razão de uma aliança com o Vietnã ser importante e necessária
para os soviéticos alcançarem uma saída marítima permanente, rompendo
seu isolamento.
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5 TO 15: OS EUA NO ORIENTE
“Tudo começou na melhor das intenções”. Essa é a definição da participação americana no Vietnã dada pelo secretário de Estado (da época) Henry
Kissinger. Vitoriosos na Segunda Grande Guerra, os EUA apareceram ao mundo como nação de bem, pacífica por natureza, modelo a ser seguido. Nesse
sentido, virou paladino do ideal democrático preconizado por Washington,
Jefferson, Franklin e Adams6. Assim fizeram na Europa Ocidental, Japão e
Coréia do Sul. Mas no Vietnã nem tudo foi como o esperado:
Em 1954, havia pouca base no Vietnã do Sul para uma nação, menos
ainda para uma democracia. Mas a estimativa estratégica dos EUA e sua
convicção de que o Vietnã do Sul tinha de ser salvo pela reforma democrática não levaram em conta essas realidades. Com o entusiasmo dos
inocentes, o governo Eisenhower jogou-se impetuosamente em defesa
do Vietnã do Sul, contra a agressão comunista e na tarefa de construir
uma nação, para que uma sociedade, cuja cultura era imensamente diferente da americana, mantivesse sua recém adquirida independência e
praticasse a liberdade no sentido americano (KISSINGER, 2001).
Praticar democracia exige amadurecimento político da sociedade civil,
para que todos os cidadãos participem ativa e constantemente da vida
sociopolítica da coletividade, a fim de proporcionar uma divisão mais justa e
eqüitativa das benesses. Uma democracia pressupõe, segundo Tocqueville (1969),
um maior nível de igualdade entre os diferentes cidadãos, aliada a liberdades (de
imprensa, de opinião, de crença etc.), sob uma espécie de contrato em que nem
um, nem todos, decidem, O poder é da maioria. Paradoxalmente à sua experiência histórica, os americanos acreditaram poder transformar uma sociedade
colonial, agrária e pobre em democrática, de forma instantânea.
Mas o Vietnã do Sul não se tornou democrático, e o Vietnã do Norte,
comunista, desrespeitou o estabelecido em Genebra (ao enviar guerrilheiros comunistas para o Vietnã do Sul, violar a neutralidade do Laos, e posteriormente do Camboja, criando uma estrutura logística em seu território
etc.), forçando os EUA a aceitar que as necessidades e realidades geopolíticas
superaram todo aquele idealismo quase wilsoniano7.
Para Aron (1962), a defesa dos interesses nacionais é a essência da política
externa. E acrescenta que, se uma grande potência está decidida a obter certos
benefícios mesmo contra as normas e leis internacionais, a única maneira de
a impedir é empregar a força ou estar disposto a empregá-la. E a União So132
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viética, única entidade capaz, não se mostrou favorável a nenhuma dessas
opções. Antes, preferiu brigar de forma indireta, “por correspondência”.
Defensor da realpolitk8, Aron (1962) analisa as relações internacionais como um contínuo estado de guerra, na qual o diplomata e o soldado
desenvolveriam funções diferentes da mesma atividade. Daí por que ele
concorda com Clausewitz (1979) quando este diz que “a guerra é a política
por outros meios”, ou seja, a guerra era um instrumento político de forças,
um verdadeiro ato político que daria prosseguimento a relações (políticas)
pretendidas e preferidas pelo mais forte.
Partindo dessas premissas, nada mais natural que os EUA resolvessem
intervir no Vietnã. Essa intervenção partia inicialmente da questão da hegemonia
mundial. O mundo, que era ideologicamente bipolar, confrontava-se com outro
dualismo: poder terrestre soviético versus poder marítimo norte-americano.
Os exemplos históricos permitiam delinear um modelo desse antagonismo secular baseado em duas concepções estratégicas mutuamente excludentes: uma oceânica e outra continental. As potências
terrestres utilizaram-se de sua posição central e de suas linhas interiores para se expandir em direção as regiões periféricas e conseguir
saídas para os mares e oceanos; as potências marítimas apoiavam-se
em sua posição insular e em suas linhas exteriores para dominar as
regiões litorâneas e manter as potências terrestres encurraladas dentro dos limites de sua posição mediterrâneas (MELLO, 1992, p. 37).
Ao final da Segunda Guerra Mundial, ficou explícito que a União
Soviética (basicamente uma ex-Rússia czarista) mantinha uma posição central, quase isolada no coração da Eurásia, e os Estados Unidos se mantinham em suas linhas exteriores marítimas, ambos com desejos de expansão.
Fazia-se, então, mister impedir que os soviéticos chegassem às regiões
litorâneas via Vietnã:
A tese por ele (Mackinder) defendida era a de que o poder terrestre
poderia conquistar as bases do poder marítimo, caso conseguisse
adicionar à sua retaguarda continental uma frente oceânica que lhe
possibilitasse tornar-se um poder anfíbio, simultaneamente terrestre
e marítimo (MELLO, 1992, p. 39).
Nada mais natural que os americanos se vissem ameaçados por essa
política soviética e tentassem abortá-la o quanto antes.
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Outra característica da política externa americana que justificava a
intervenção em território vietnamita consistia na expansão da primeira linha de defesa estadunidense do continente americano para as duas pontas
da Eurásia. Aqui, há que se ressaltar que a simples expansão do comunismo
já representava uma agressão ao establishment ianque:
A análise geopolítica dos perigos da tomada comunista de um país
distante seguia o duplo ‘slogan’ de resistir à agressão no abstrato e evitar
a difusão do comunismo. A vitória comunista na China reforçou a
convicção dos formuladores americanos de que mais expansão comunista era intolerável (KISSINGER, 2001, p. 680).
O Vietnã do Sul, portanto, não poderia se tornar comunista sob o risco
de aumentar o bloco em que se destacavam União Soviética e China e porque
tal mudança ideológica representava uma verdadeira agressão à Casa Branca.
Washington não deveria aceitar um ataque tão direto à sua política.
Formulador das bases paradigmáticas que inspirariam a política de
contenção do Departamento de Estado americano nas décadas de 19601970, Nycholas Spykman acreditava que qualquer alteração nas relações de
força afetaria os grandes atores internacionais, daí por que eles não poderiam ficar alheios aos fatos do mundo.
Os estudos de Spykman se realizaram utilizando um mapa de projeção
azimutal eqüidistante centrada no pólo norte9. Aqui, o grande núcleo de terras emersas situa-se em volta do oceano Ártico (hemisfério norte), concluindo esse pensador que as relações entre os EUA e as duas extremidades da Eurásia
são determinantes para os rumos da política mundial. Daí por que o Vietnã,
de localização geográfica periférica, se tornar politicamente central.
Outro fator interessante da teoria de Spykman é a substituição do termo
inner crescent, da teoria mackinderiana, por Rimland, definindo com maior
precisão as regiões costeiras (fimbrias marítimas) que contornavam o Heartland10.
Essa nova terminologia procurava ressaltar a característica anfíbia dessa região,
destacando sua importância geopolítica para quem o controlasse.
Em Spykman, o Rimland (região em que o Vietnã se localiza) atinge
uma importância central, a ponto de poder se afirmar: “quem controla o
Rimland, domina a Eurásia; quem controla a Eurásia, domina o mundo”.
Em sua dimensão estritamente militar, a estratégia de segurança aplicada pelos EUA contra a União Soviética no auge da Guerra Fria,
baseava-se nos princípios antagônicos de expansão-contenção. No
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primeiro caso, tratava-se da visão mackinderiana da tendência histórico-geográfica do expansionismo grão-russo de pressionar, a partir
das linhas interiores de sua posição central, para satelitizar os países
da periferia eurasiana e atingir finalmente os mares quentes. No segundo, tratava-se do intervencionismo spykmaniano que advogava
a presença de um poder anfíbio americano nas regiões marginais e
ilhas costeiras eurasianas como único meio de manter os russos encurralados no interior do continente (MELLO, 1999, p. 129).
A influência de Spykman e seu Rimland como centro nevrálgico do conflito americano-soviético fica patente nos acordos bilaterais militares fechados
entre Estados Unidos e países como Japão, Taiwan, Filipinas etc e o pacto militar
da Organização do Tratado do sudeste Asiático (Otase), (união dos EUA com
os países do Rimland asiático vedando aos russos acesso ao oceano Pacífico).
Criada em 1954, a Otase contava com EUA, Paquistão, Filipinas,
Tailândia, Austrália, nova Zelândia, Inglaterra e França. Os Vietnãs, assim
como Laos e Camboja, estavam proibidos de entrar no acordo, pela Conferência de Genebra. A Otase forneceu a estrutura legal à defesa da Indochina
pelos EUA, daí porque ela era mais específica sobre uma agressão comunista a essas três nações do que a um ataque comunista contra os signatários.
Já o pensador Brzezinski analisava a lógica soviética de expansão sob
um prisma defensivo, ou seja, visava romper o cerco dos americanos e seus
aliados, ao mesmo tempo em que (numa postura já mais ofensiva) procurava cortar os contatos dos EUA com as duas pontas da Eurásia.
Brzezinski acreditava que existiam Estados no continente eurasiático
cujo controle pelos EUA era uma questão vital. Chamados de Estados-pinos geopolíticos, esses países desenvolviam uma influência política, tinham
um certo peso econômico, ou posição geoestratégica importantes, de forma
que poderiam alterar a correlação de forças mundiais.
A Indochina, como um todo, havia sido considerada essencial para esse
equilíbrio de poderes desde que se caracterizou a divisão bipolar do mundo
e tornou-se essencial evitar que qualquer um dos pólos de poder dominasse
uma região que não a sua (Américas e região do Heartland, para EUA e URSS,
respectivamente). Assim, evitar que os Vietnãs se tornassem comunistas era
evitar que toda a Indochina e Tailândia, Birmânia (hoje Mianma) e Filipinas
se tornassem hostis à política americana. Se esses últimos caíssem na linha de
influência soviética, Índia, Paquistão e Japão, baluartes do capitalismo no
Oriente, poderiam também cair. Isso já seria considerado “estado de alerta
máximo” para o departamento de Estado americano.
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CONCLUSÃO
“Eu adoro o cheiro de napalm pela manhã”. Essa frase dita pelo ator
Robert Duvall ao interpretar um coronel do batalhão de cavalaria do exército americano, no filme Apocallyse Now, elucida diversos fatos da participação americana na Guerra do Vietnã.
Em primeiro lugar, encontrava-se a arrogância e a loucura americanas. Cientes de sua superioridade militar, os EUA não conseguiam traduzir
tal poder em vitórias efetivas.
Do momento em que chegou ao Vietnã, a tropa americana começou
aplicar seu método familiar de combate: o atrito sustentado pelo poder de fogo, a mecanização e mobilidade. Métodos, todos, inaplicáveis
ao Vietnã. O exército sul-vietnamita, treinado pelos americanos, logo
caiu na mesma armadilha que a força expedicionária da França, uma
década antes. O atrito funciona contra um adversário que não tem
escolha, senão defender um ponto vital. Guerrilhas raramente têm um
ponto vital que defender. A mecanização e a organização em divisões
tornou o exército vietnamita quase irrelevante, na luta por seu próprio
país (KISSINGER, 2001, p. 699).
O desprezo por um adversário que nunca parecia perder, somado a
uma permanência excessiva no front, proporcionava desespero e perda da
razão entre os militares.
Uma segunda observação procede de uma peculiaridade da Guerra do
Vietnã. Impossibilitados de utilizar seus animais eqüinos, em razão da insegurança, a cavalaria do exército americano trocou seus cavalos por helicópteros, possibilitando dar vôos rasantes pela floresta e encontrar focos guerrilheiros.
A localização do inimigo, que se camuflava e se escondia no meio de
uma floresta tropical fechada, recebia o auxílio, em terra, do “agente laranja”11, e, no ar, de bombas napalm12.
O despejo de bombas napalm nas florestas do Vietnã do Norte, Vietnã
do Sul, no Laos (tentando neutralizar a logística norte-vietnamita, na chamada Trilha Ho Chi Minh) e até Camboja (santuários na floresta), tornouse a função principal da força aérea estadunidense, recebendo o nome de
campanha Rolling thunder13, que também tencionava proporcionar retaliações aos guerrilheiros pelas baixas norte-americanas.
Depois de décadas de conflito, sem lograr uma vitória explícita,
milhares de soldados mortos, repudiados pela comunidade internacional e
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recebendo protestos diários de seus concidadãos, os EUA resolvem se retirar de forma definitiva e total do Vietnã14.
Na rádio militar, uma mensagem de feliz natal (em abril!) e que os
soldados telefonassem para suas mães, seguida de uma música de Billy
Halliday, foi o código para evacuação imediata do país.
Em 30 de abril, Saigon, capital do Vietnã do Sul, caía nas mãos de
norte-vietnamitas (vietnamitas e guerrilheiros do Tet) e vietcongs (guerrilheiros sul-vietnamitas), abrindo espaço para a reunificação do país. Nesse
mesmo dia, Saigon tornou-se Ho Chi Minh.
A derradeira derrota norte-americana foi registrada pelos modernos meios
televisivos, ao vivo, para todo mundo. A multidão amedrontada, composta por americanos e seus aliados vietnamitas, dirigia-se para a embaixada norte-americana, imaginando encontrar ali uma saída, um transporte
para escapar dos vietminhs e vietcongs, que avançavam
incontroladamente sobre Saigon [...] assim os últimos interventores militares americanos deixaram Saigon – cegos [em razão de gás lacrimogêneo que a hélice do helicóptero puxava para eles], num vôo suicida. Pouco
depois, as tropas norte-vietnamitas e os vietcongs entravam triunfantes
em Saigon15.
Notas
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“Como nossos pais” é uma música de autoria do compositor brasileiro Belchior, e critica o fato de a juventude dos anos 1970 apresentar um estilo de vida igual ao de seus pais (tendo, inclusive, como refrão
o trecho: “Ainda somos os mesmos e vivemos como nossos pais”). A música, guardadas as devidas proporções, serve para caracterizar a juventude “Guerra do Vietnã”, que é filha da juventude “II Guerra/Guerra
da Coréia”.
Sim, o nome do comandante das Forças Militares americanas era (traduzindo literalmente) “Mais
terras para o Ocidente”.
Estado do meio-oeste americano.
Diem Bien Phu é um entroncamento de estradas, na região noroeste do Vietnã, junto à fronteira com
o Laos. A França deslocou uma força de elite para a região, na tentativa de atrair os rebeldes vietnamitas
para uma batalha campal de atrito. Já no assalto inicial, os rebeldes arrasaram dois fortes externos que
deveriam dominar o terreno alto, usando artilharia fornecida pela China. Menos de dois meses depois,
mesmo com a diplomacia reunida em Genebra para discutir a questão da Indochina, Diem Bien Phu
caiu definitivamente.
“Cinco contra um” é uma música da banda de roque americana The Doors. Lançada no final da década
de 1960, a referida musica, que nasceu no seio da geração “paz e amor”, critica a violência excessiva
inerente da sociedade americana (criticando, então, a Guerra do Vietnã), conclamando os (jovens e)
seres humanos, em geral, a adotarem um estilo de vida mais pacífico.
Entre outros, esses foram patriarcas da independência americana (1776).
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Woodrow Wilson era o presidente dos EUA no pós-I Guerra e era idealista quanto ao futuro da sociedade mundial, chegando a propor um mundo mais democrático com a criação da Liga das Nações.
Política do Realismo.
Para efeito de informação, essa projeção cartográfica é a mesma utilizada na bandeira da ONU.
Grosso modo, o heartland correspondia à região da Rússia e parte do leste europeu.
Elemento químico que proporcionava a queda da folhagem das árvores. Altamente cancerígeno.
Gasolina gelatinizada utilizada em bombas incendiárias.
Caindo trovão.
Nos anos anteriores, os EUA adotaram a tática de ‘vietnamização da guerra’, ou seja, retirar pouco
a pouco seus soldados da guerra, fornecendo apoio logístico ao Vietnã do Sul.
Santarrita, Marcos. Vietnã 10 anos depois. In: Revista Fatos, p. 37-8.
Referências
APOCALIPSE NOW. EUA, 1975. Dir. Francis Ford Coppolla. (Filme).
ARON, R. Paz e guerra entre as nações. Brasília: Ed. da UnB, 1962.
BELCHIOR. Como nossos pais. (CD Áudio).
CLAUSEWITZ, K. V. Da guerra. Brasília: [s. n.], 1969.
KISSINGER, H. Diplomacia. Rio de Janeiro: F. Alves, 2001.
MELLO, L. I. A. Quem tem medo de geopolítica? São Paulo: Edusp, 1999.
THE DOORS. Waiting for the sun. Elektra, july 1968. (CD Áudio).
TOCQUEVILLE, A. de. Democracia na América. São Paulo: Nacional,1969.
Abstract: present article has been proposed to make a geopolitical analysis of
The Vietnam War, contributed to define new bases on international relations
between the States of the capitalism side and those from the socialism side
and also between States all inside the socialism side. The Vietnam War became
an important event on the ideological war stage between capitalism/socialism,
enlarge warlike theatre beyond Vietnamese’s borders
Key words: Vietnam, Rimland, land power and sea power
Artigo desenvolvido na disciplina Geopolítica do Espaço Mundial II, para fins de avaliação parcial de
N2 no curso de Relações Internacionais da Universidade Católica de Goiás (UCG), sob orientação do
professor José Renato Masson.
CLÁUDIO RAFAEL MENDES-COSTA
Acadêmico do curso de Relações Internacionais do Departamento de História, Geografia, Ciências Sociais
e Relações Internacionais da UCG.
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