materia ronco - Revista Vox Objetiva

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Um barulho inconveniente
Também conhecida como apneia do sono, o ronco é uma interrupção parcial na respiração que traz quadros
mais graves de sobrecarga cardiopulmonar, sonolência durante o dia e baixo rendimento
Wander Veroni
Durante mais de dois anos, a hora de dormir era um verdadeiro pesadelo na casa do
auxiliar administrativo, *R.S.M., 32 anos, natural de Belo Horizonte. Por conta de uma rotina
exaustiva de trabalho, sedentarismo e maus hábitos alimentares, *R.S.M. viu o ronco quase
destruir o casamento e afetar diretamente a sua qualidade de vida. “Na hora que ia dormir,
roncava tão alto que a minha esposa teve que ir para outro cômodo da casa para ver se ela
conseguia dormir também. Quando acordávamos, no dia seguinte, era sempre uma briga
atrás da outra por conta do ronco. No meu trabalho estava sempre estressado e meu
rendimento caiu pela metade. As brigas constantes entre a minha mulher e eu foram nos
afastando. Ficava evitando de dormir, ao máximo, para não atrapalhar ninguém. Me sentia
incomodado com o meu ronco, pois é algo difícil de se controlar sozinho”, relembra.
*R.S.M. conta ainda que a “ficha dele caiu” quando ele hospedou a irmã em casa por uns
dias e ela fez um comentário sobre o barulho que ele emitia durante o sono. “Estávamos
conversando e minha irmã falou que ouviu um barulho estranho a noite, parecendo que a
geladeira ou outro aparelho da casa havia estragado. Daí a minha esposa me olhou, mas
não falou nada. Fiquei com vergonha da situação e assim percebi o quanto o ronco estava
atrapalhando as pessoas que estavam em minha volta. Depois desse dia resolvi procurar o
médico por conta própria. Hoje, mudei a minha alimentação, voltei a fazer academia, estou
trabalhando menos e há alguns meses comecei a fazer um acompanhamento médico
regular para que não volte a roncar. Agora a minha esposa não reclama mais do barulho!”.
Assim como *R.S.M., cerca de 30% das pessoas em todo mundo roncam ou já roncaram,
segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS). No Brasil, um em cada cinco adultos,
que procuram tratamento, é do sexo feminino. Na contramão, ainda são os homens que
liderarem quando o assunto é ronco. “Até os cinquenta anos os homens roncam mais. Após
a menopausa as mulheres, devida à mudança hormonal entre outros fatores, tendem a
galgar espaço. Quanto mais velhos ficamos, menos diferença haverá”, explica o médico
psiquiatra, Dirceu de Campos Valladares Neto, 55 anos, especializado em medicina do
sono pela Universidade da Califórnia em San Diego, nos Estados Unidos, e um dos
diretores da Clínica do Sono, em Nova Lima, na Grande Belo Horizonte.
Causado pelo relaxamento dos músculos da garganta, língua e palato durante o sono, o
ronco é o som gerado pela vibração dos tecidos moles da garganta. Para que ele ocorra
envolve, geralmente, regiões como o palato mole, a língua, mas também pode ser devida à
vibração dos tecidos moles do nariz. Segundo Dirceu, o ronco é um sinal de que a
respiração não está muito boa. “O ronco é um aviso de que pode faltar oxigênio no cérebro
e isto pode fazer com que a pessoa acorde sem perceber que acordou centenas de vezes
numa noite, por exemplo. São microacordares que só são percebidos quando avaliados
através de um exame realizado enquanto a pessoa dorme, chamado de polissonografia”,
explica o psiquiatra.
Ainda, de acordo com o médico, o ronco é uma epidemia que pode evoluir para a apneia,
que é a parada respiratória por mais de 10 segundos. Por isso, todo cuidado é pouco. “À
medida que envelhecemos e/ou engordamos aumentam-se as chances de roncarmos.
Como o ronco vai aumentando devagar, a pessoa geralmente não percebe como incomoda
e castiga. Só procura tratamento quando recebe cartão vermelho do parceiro, de parentes
ou de algum vizinho”, comenta Dirceu.
Tratamento
O ronco é um fenômeno físico da respiração quando se está dormindo. Segundo os
especialistas, o ronco não está ligado ao estresse, diretamente. O ronco, por si só, pode ter
potencial para provocar derrame cerebral (AVC), é o que explica o dentista Eduardo Rollo
Duarte, 44 anos, que é Mestre e Doutor em Prótese Dental pela Universidade de São Paulo
(USP) e especialista em Odontologia do Sono. Segundo Eduardo, é muito difícil se livrar do
ronco sozinho. “Pelo potencial que o ronco tem de provocar consequências, isso pode ser
perigoso. Ao se perder peso, por exemplo, o ronco pode desaparecer. Porém, o sobrepeso
não é a única causa do ronco. Outros fatores como história familiar, anatomia da face e
garganta provocam ronco mesmo em pessoas magras. Além disso, o ronco pode sumir
sozinho, mas pode estar escondendo uma apneia silenciosa", revela.
O dentista conta ainda que existem dois tratamentos muito usados para que as pessoas
parem de roncar. “Um deles é o CPAP (Pressão positiva aérea) que é uma máscara que
possui um tubo ligado a uma espécie de compressor elétrico portátil. Essa máquina elétrica
injeta ar sob pressão pela máscara que cobre a região nasal e bucal. Com a pressão, o
fluxo aéreo abre a musculatura da orofaringe. Esse é um tratamento controlado pelo médico
do sono que regula a pressão de ar de acordo com a necessidade do paciente. Já o outro
tratamento é o uso de um aparelho odontológico, que não é ortodôntico, pois não tem
objetivo de movimentação dental. Esse aparelho é formado por duas placas unidas que se
encaixam nos dentes e tem a função de tracionar a musculatura da orofaringe para abrir a
garganta desbloqueando-a. Com isso o ar volta a passar sem bater na musculatura. É um
tratamento que deve ser realizado e controlado por um dentista especialista em odontologia
do sono. Ambos os tratamentos são eficazes. A escolha depende de uma avaliação clínica
profissional e que deve ser discutida com a equipe que envolve o médico e o dentista do
sono”, explica.
Já o médico psiquiatra Dirceu lembra que existe uma série de fatores que podem ocasionar
e ou agravar o ronco. Na maioria das vezes são mais de duas condições. Assim, um
diagnóstico correto sempre deve preceder o tratamento. “É fundamental que a pessoa
passe por uma avaliação especializada. Geralmente, se o paciente apresenta sonolência
durante o dia, acorda cansado, sente o sono não reparador, ele será submetido a uma
polissonografia, ou duas, caso na primeira avaliação o paciente não ronque. Na Clínica do
Sono, devida a presença de médico e equipe especializados, muitos pacientes são
diagnosticados e tratados na mesma noite. Suas famílias geralmente agradecem. O
tratamento vai desde a retirada de medicamentos relaxantes, como os “tarjas preta”, a
perda de peso, posicionamento no leito, cuidados com o nariz, aparelhos respiratórios a
aparelhos odontológico. Raramente as cirurgias estão indicadas por apresentarem um efeito
passageiro”, explica Dirceu.
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Nota do editor: *R.S.M. é a sigla do nome do personagem que concedeu entrevista para a reportagem da
Revista Vox Objetiva. A pedido do entrevistado, ele preferiu não ser identificado.
Sugestão de infográfico:
O ronco e a saúde
Dependência química – o uso de drogas, cigarro e álcool agravam o problema do ronco. Se não
tratado, pode evoluir para a chamada Apneia do Sono – uma parada respiratória que ocorre durante
o sono e que pode ocasionar sérios problemas à saúde como hipertensão, enfarte do miocárdio e
AVC (derrame). Ainda há outros riscos, como sofrer acidentes automobilísticos, devido a perda da
qualidade do sono, além dos transtornos sociais e psicológicos.
Obesidade – Um sono ruim está ligado à obesidade tanto em adultos como adolescentes, apontam
os especialistas. Uma das explicações para o problema assinala que a alteração no padrão de sono
pode alterar a produção de hormônios que regulam o apetite.
Problemas cardíacos – Durante o sono, a apneia causa o relaxamento da faringe, dificultando a
passagem do ar. A obstrução das vias respiratórias faz com que o organismo precise de uma força
maior para que o ar chegue até o pulmão e possa ser distribuído para o organismo, o que força o
coração a bombear o sangue com mais força ou rapidez.
Sonolência diurna – Resultado de uma noite mal dormida. Pacientes que roncam não atingem um
sono profundo, já que ficam em estado de semialerta. A falta do descanso ideal causa sonolência
diurna, o que pode acarretar em acidentes de trânsito, acidentes de trabalho e uma péssima
qualidade de vida.
Glaucoma – O glaucoma é o distúrbio visual que pode levar à cegueira. A apneia do sono pode ser
associada a algumas condições oftalmológicas como o glaucoma, devido às paradas respiratórias.
Durante o sono ocorre a diminuição do oxigênio sanguíneo que reduz a espessura no nervo retinal,
o que leva ao glaucoma. Pacientes com apneia do sono devem fazer exames periódicos para avaliar
sinais precoces de glaucoma, da mesma forma, pacientes com distúrbios ópticos devem ficar
atentos e apurar a presença de apneia.
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Fonte: Instituto do Sono / Universidade Federal de São Paulo.
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