Ciclo Evolutivo Hospedeiro Invertebrado (86,5

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Hospedeiro Invertebrado
Patrícia Azambuja; Eloi S. Garcia
Laboratório de Bioquímica e Fisiologia de Insetos, Instituto Oswaldo Cruz, Fiocruz, 21040-900, Rio de Janeiro, RJ, Brasil
E-mail: [email protected]; [email protected]
O Trypanosoma cruzi infecta em condições naturais mais de 100 espécies de mamíferos de diferentes ordens. O
parasito na natureza existe em diferentes populações de hospedeiros vertebrados tais como seres humanos, animais
silvestres e animais domésticos, e os invertebrados, a exemplo dos insetos vetores. T. cruzi possui variações
morfológicas e funcionais, alternando entre estágios que sofrem divisão binária e as formas não replicativas e
infectantes. Como formas replicativas estão incluídas os epimastigotas presentes no tubo digestivo do inseto vetor
e amastigotas observados no interior das células de mamíferos. As formas não replicativas e infectantes,
os tripomastigotas metacíclicos, são encontrados nas fezes e urina do inseto vetor e os tripomastigotas circulantes no
sangue de mamíferos.
Durante a fase no hospedeiro invertebrado, o T. cruzi se transforma em epimastigotas e então, no intestino
posterior, diferenciam em tripomastigotas metacíclicos (um processo conhecido como metaciclogênese) os quais,
eliminados pelas fezes e urina do inseto vetor, são capazes de infectar o hospedeiro vertebrado. O parasita não penetra
a pele intacta, somente infectando o hospedeiro via mucosa ou ferimentos na pele. Nos mamíferos, os parasitos se
desenvolvem no interior das células sendo liberados no sangue circulante após as células do hospedeiro se romper.
Inúmeros fatores podem influenciar o desenvolvimento de T. cruzi no inseto vetor. Alguns deles foram primeiramente
descritos por Carlos Chagas (1909) e Emanuel Dias (1934). No entanto, a complexidade da interação T. cruzi–inseto
vetor foi somente revisada mais recentemente. Durante a alimentação do inseto, as formas tripomastigotas que se
encontram no sangue do hospedeiro vertebrado infectado, são ingeridas pelos insetos. Alguns dias após a alimentação
do inseto, os parasitas se transformam em epimastigotas e esferomastigotas. Uma vez a infecção seja estabelecida no
estômago do inseto vetor, as formas epimastigotas do parasito se dividem repetidamente por divisão binária e podem
aderir às membranas perimicrovilares das células intestinais. Em grande número, os epimastigotas se ligam à cutícula
retal, se diferenciam em tripomastigotas metacíclicos podendo assim ambas as formas, diferenciadas ou não, serem
eliminadas pelas fezes e urina.
O estabelecimento da infecção pelo T. cruzi do tubo digestivo do inseto-vetor é dependente e regulado por
fatores fisiológicos e bioquímicos do inseto vetor. Em nosso laboratório foram desenvolvidos bio-ensaios para avaliação
de uma variedade de fatores que influenciam no desenvolvimento do parasito, tais como (i) das alterações
ultraestruturais das células epiteliais do intestino médio, (ii) dos fatores líticos, (iii) das enzimas digestivas e (iv) da
fisiologia hormonal do desenvolvimento do inseto, como recentemente revisto por Garcia e colaboradores.
Após a ingestão do sangue infectado, na região anterior e posterior do intestino médio (estômago e intestino,
respectivamente), os parasitos se confrontam com componentes existentes nestes compartimentos digestivos. Estes
incluem os fatores hemolíticos, peptídeos derivados da cadeia α D-globina, lisozimas, defensinas, sistema
profenoloxidase, NO e lectinas etc; os quais podem modular a dinâmica da multiplicação e diferenciação do T. cruzi no
tubo digestivo do inseto vetor e ilustrar a complexidade dos mecanismos envolvidos na interação com o T. cruzi.
Pereira e colaboradores reportaram lectinas no tubo digestivo e hemolinfa de R. prolixus e sugeriram que estas
moléculas poderiam estar envolvidas no desenvolvimento do T. cruzi no inseto vetor. Mello e colaboradores
demonstraram diferenças no desenvolvimento de três cepas de T. cruzi no intestino de R. prolixus e relacionaram a
infectividade destes parasitos com a habilidade do extrato do tubo digestivo aglutinar in vitro os flagelados. Assim,
lectinas aglutinaram o clone Dm28c do T. cruzi, o qual apresentava o máximo nível de infectividade, enquanto, ao
contrário, a cepa Y do parasito, a qual não era aglutinada, era lisada no tubo digestivo do inseto vetor.
Frainderaich e colaboradores demonstraram que a metaciclogênese do T. cruzi era induzida in vitro por
peptídeos derivados a α-D-globina. Garcia e colaboradores estudaram, emR. prolixus in vivo, os efeitos da hemoglobina
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e peptídios sintéticos correspondentes as regiões fragmentadas da seqüência da alfa-D-globina sobre o
desenvolvimento e transformação de epimastigotas de T. cruzi em tripomastigotas metacíclicos. Esta diferenciação no
tubo digestivo de inseto ocorria quando hemoglobina e os peptídios sintéticos correspondentes aos resíduos 30-49 e 3573 da alfa-D-globina eram adicionados na dieta de plasma. Entretanto, o peptídio sintético 41-73 não induziu a
diferenciação de epimastigotas para tripomastigotas metacíclicos, mesmo na presença dos dois primeiros peptídios. A
hemoglobina demonstrou ser um componente importante do sangue para o desenvolvimento dos parasitos. Estes
resultados identificaram um mecanismo molecular incomum, o qual modula a dinâmica de transformação de
epimastigotas para tripomastigotas metacíclicos no tubo digestivo do inseto vetor.
No que se referem às enzimas digestivas, recentes experimentos demonstraram que insetos infectados com T.
cruzi tiveram aumentado à atividade de catepsina D. Entretanto, a alimentação de R. prolixus com o inibidor de
proteinase SH-dependente não teve efeito sobre a infecção do inseto vetor. Ursic-Bedoya e Lowernberger revelaram que
o nível de transcrição de catepsina B não variava quando se comparava inseto vetor infectado e não infectado.
Um dos processos importantes da interação fisiológica do T. cruzi e seu inseto vetor são as aderências do
parasito na superfície das células intestinais. Nogueira e colaboradores utilizando-se de análise em videomicroscópio
demonstraram que as formas epimastigotas e tripomastigotas de T. cruzi se movem na direção e sentido da superfície
das células epiteliais do epitélio intestinal, mas enquanto as formas tripomastigotas não aderem ao epitélio, os
epimastigotas aderem no estômago e nos intestino. Aparentemente este processo de reconhecimento envolve moléculas
de fosfolipídeos de glicoinositol (GIPLs) que se encontram abundantemente na superfície de epimastigotas. A ligação de
GIPLs purificadas à superfície das células do intestino posterior através a exposição à imunofluorescência indicou que
estas moléculas são um dos componentes envolvidos na adesão de T. cruzi no intestino do inseto, como revisto por
Nogueira e colaboradores. O mesmo grupo demonstrou que proteínas hidrofóbicas localizadas na superfície de
epimastigotas ligam-se a glicoproteínas das membranas perimicrovilares intestinais. A inibição de um gene envolvido a
síntese de glicoproteína do T. cruzi, resultou na não aderência do flagelo do parasito no intestino e diminuiu a população
de parasitosno inseto vetor.
Um enfoque para inibir as interações entre T. cruzi e o inseto vetor foi o uso de bactéria simbiótica transgênica
que atacava diretamente o parasito. Rhodococcus rhodnii, um simbionte deR. prolixus, pode ser geneticamente
modificado pela inserção do gene da cecropina A, um peptídeo antimicrobiano induzido pela resposta imunológica
humoral de Hyalophora cecropia, capaz de destruir bactérias Gram-positivas e Gram-negativas. Este composto
produzido pelo simbionte transformado reduziu drasticamente o número de T. cruzi no tubo digestivo do inseto vetor e
apresentando, portanto, um enorme potencial para reduzir a competência vetorial.
Recentemente, Azambuja e colaboradores demonstraram que bactérias presentes no tubo digestivo de R.
prolixus poderiam lisar eritrócitos e também diminuir a infecção pelo T. cruzi. Os autores isolaram a bactéria e
identificaram como sendo Serratia marcescens biotype A1a, produtora do pigmento prodigiosina. Aparentemente a lise
do parasito depende de receptores dependentes de manose. A investigação sobre bactérias presentes no trato digestivo
do inseto vetor poderá identificar ferramentas para bloquear o desenvolvimento do parasito no inseto vetor.
Resultados interessantes sobre a interação T. cruzi–insetos vetores foram obtidos das investigações realizadas
com o composto azadiractina, um inibidor de crescimento de insetos, obtidos da planta Azadirachta indica, que interfere
fortemente na regulação neuroendócrina do inseto. Esta droga administrada via oral, antes, durante ou mesmo após a
infecção com T. cruzi, não somente interfere no desenvolvimento do inseto, mas também no estabelecimento da
infecção parasitária no tubo digestivo de diferentes espécies de triatomíneos.
Quando larvas de R. prolixus foram decapitadas ou tratadas com azadiractina, parasitas na forma epimastigota
foram incapazes de aderir ao epitélio do intestino médio do inseto). A terapia do inseto com ecdisona e o implante de
cabeça normal nos insetos tratados com azadiractina, reverteram o processo de adesão e desenvolvimento do parasito,
como revisto por Garcia e colaboradores. Os insetos que receberam a droga ou foram decapitados demonstraram uma
desorganização nas membranas perimicrovilares das células epiteliais do intestino e indicaram que a via do hormônio
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protorácicotrópico, hormônio estimulador da síntese de ecdisona, está envolvida no processo de desenvolvimento de T.
cruzi em seu inseto vetor.
Ciclo evolutivo do Trypanosoma cruzi - No hospedeiro invertebrado (A) formas epimastigotas (B) se multiplicam no
lúmen do intestino. Diferenciação para tripomastigotas metacíclicos (C) ocorre na porção final do intestino. Estas formas
infectam o hospedeiro vertebrado (D). Após adesão (E) e penetração (F) nas células hospedeiras, os tripomastigotas se
diferenciam em amastigotas multiplicativos (G). após diferenciação e liberação de tripomastigotas sangüíneos (H), estas
formas podem invadir músculos e outros tecidos. O ciclo se fecha quando o indivíduo infectado é picado pelo triatomíneo
(A: Demetry C, capturado em 26/07/2005; B: Santa-Rita e cols., 2005; C: Vatarunakamura e cols., 2005; D: USP,
capturado em 25/07/05; E: Barbosa HS, capturado em 26/07/2005; F: Andrews N, capturado em 26/07/2005; G:
FIOCRUZ, capturado em 25/07/2005; H: Dantas e cols., 2003)
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