PAULA FERNANDA XAVIER MEDEIROS

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UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SANTOS
Mestrado em Saúde Coletiva
Pensar o Cuidar no Morrer: entre a Obstinação
e a Esperança
PAULA FERNANDA XAVIER MEDEIROS
SANTOS
2012
UNIVERSIDADE CATÓLICA DE SANTOS
Mestrado em Saúde Coletiva
Pensar o Cuidar no Morrer: entre a Obstinação
e a Esperança
PAULA FERNANDA XAVIER MEDEIROS
Dissertação apresentada ao Programa de Pós Graduação strictu sensu em Saúde Coletiva da
Universidade Católica de Santos, como requisito
parcial para obtenção do grau de Mestre em Saúde
Coletiva.
Área de concentração: Políticas e Práticas de Saúde
Orientadora: Profª Drª Amélia Cohn
SANTOS
2012
Dados Internacionais de Catalogação
Sistema de Bibliotecas da Universidade Católica de Santos
SibiU
_________________________________________________________
M488p
Medeiros, Paula Fernanda Xavier
Pensar o cuidar no morrer: entre a obstinação e a
esperança/ Paula Fernanda Xavier Medeiros ;
orientadora
Amélia Cohn - Santos: [s.n.], 2012.
122 f.; (Dissertação de Mestrado) – Universidade Católica de
Santos, Programa de Mestrado em Saúde Coletiva.
1. Cuidados Paliativos. 2. Morte. 3. Obstinação Terapêutica
I. Cohn, Amélia (Orientadora).
II. Universidade Católica de Santos. III. Título.
CDU 614(043.3)
_________________________________________________________
FOLHA DE APROVAÇÃO
PAULA FERNANDA XAVIER MEDEIROS
Pensar o Cuidar no Morrer: entre a Obstinação
e a Esperança
Dissertação apresentada ao Programa de Pós Graduação strictu sensu em Saúde Coletiva da
Universidade Católica de Santos, como requisito
parcial para obtenção do grau de Mestre em Saúde
Coletiva.
Área de concentração: Políticas e Práticas de Saúde
Santos, ______de ________________de 2012.
BANCA EXAMINADORA
____________________________________________________________
Dra. Amélia Cohn
Orientadora – Membro Titular - UNISANTOS
____________________________________________________________
Dra. Silvia Maria Tagé Thomaz
Membro Titular - UNIFESP
____________________________________________________________
Dra. Rosa Maria Ferreiro Pinto
Membro Titular - UNISANTOS
DEDICATÓRIA
A Sidney Medeiros, a Família, aos
Amigos e a todos que se preocupam, em
tempos difíceis, com o sofrimento
humano e lutam por tempos mais
iluminados.
AGRADECIMENTOS
Aos Meus Pais Dora e Américo que sempre me deram amor e força, valorizando
meus potenciais.
A Meu Marido Sidney pela compreensão, carinho e companheirismo. Amo você.
A Todos os Meus Amigos e Amigas que sempre estiveram presentes. Agradeço a
torcida e amizade de anos.
A Minha Turma, pelo aprendizado, convívio e discussões saudáveis que
compartilhamos. Especialmente a minha colega de turma e amiga Sandra Alves
que embarcou comigo nesse desafio e juntas conseguimos concretizá-lo.
A Minha Orientadora, Profª Dra Amélia Cohn, que apostou na abordagem de um
tema novo no Mestrado de Saúde Coletiva da UNISANTOS e me acompanhou
nesse processo, compartilhando do meu entusiasmo. Obrigada, principalmente pela
confiança, o apoio, a partilha do saber, o incentivo à autonomia no aprendizado. E
claro pelas conversas na serra.
As Professoras Dra Rosa Maria Ferreiro Pinto e Dra Silvia Maria Tagé Thomaz
pelas importantes sugestões no Exame de Qualificação e por incentivarem a
abordagem do tema.
Aos Professores do Mestrado de Saúde Coletiva da UNISANTOS que contribuíram
na minha formação, compartilhando muitas vezes mais do que o conhecimento
técnico e científico.
Ao NEPEC, grupo de pesquisa, pela experiência de uma vida, por compartilhar o
conhecimento, incentivar a pesquisa e pelo acolhimento generoso. E especialmente
às professoras Rosa Maria Ferreiro Pinto e Fátima Micheletti que têm o dom de
captar a beleza onde muitos vêm miséria e dividirem esse desvelamento da
realidade com todos.
As colegas de Barueri que apoiaram e compreenderam as minhas ausências,
especialmente as assistentes sociais Regiane Rodrigues e Suellen Costa.
Aos serviços de saúde e assistência social pela cooperação que autorizaram a
participação dos profissionais de saúde neste estudo. Agradeço a generosidade e
disponibilidade dos profissionais de saúde, sujeitos desse estudo, em compartilhar
suas experiências pessoais e profissionais.
RESUMO
Os dados epidemiológicos de saúde das últimas décadas constatam a ocorrência
de mudanças significativas na esperança de vida ao nascer e no perfil de
morbimortalidade da população com o aumento do número de portadores de
doenças crônicas. Esse novo cenário revela o fenômeno do envelhecimento
populacional, como resultante de um processo gradual de transição demográfica no
país. O presente estudo propôs-se a entender o significado que os profissionais de
equipes de saúde atribuem aos Cuidados Paliativos e a seus respectivos papeis
nesse tipo de conduta. Determinaram-se como objetivos específicos: desvelar o
significado atribuído à morte pelos profissionais de equipes de saúde; compreender
como esses profissionais trabalham a questão da morte nos Cuidados Paliativos;
investigar as dificuldades enfrentadas por eles em relação à questão da morte e
pacientes terminais e/ ou sem possibilidades de cura no seu cotidiano de trabalho;
evidenciar o entendimento que tem sobre os Cuidados Paliativos. Dada a
complexidade do tema optou-se por priorizar profissionais de saúde cujos espaços
de atuação são o hospital, a instituição de longa permanência para idosos e a
assistência domiciliar. Trata-se de uma pesquisa social de metodologia qualitativa
que utilizou a entrevista semi-estruturada com 09 profissionais de 03 categorias
diferentes, médico (a), assistente social e enfermeiro (a). A interpretação dos dados
levou à identificação de quatro eixos de análise: sobre o significado da morte e do
morrer; prática profissional e sua relação com a morte; dificuldades em relação à
questão da morte e pacientes terminais e/ ou pacientes sem possibilidades de cura;
identificação e compreensão dos Cuidados Paliativos. A morte é encarada como
parte do cotidiano de trabalho pelos profissionais. Foi possível observar a falta de
preparo para lidar com a morte e a relação com a família, bem como a
ideologização do hospital como espaço de cura. Os Cuidados Paliativos não são
entendidos por todos os profissionais como uma nova forma de cuidados na saúde.
Por fim, as considerações apontam toda a complexidade do enfrentamento da
questão da morte no cotidiano de trabalho dos profissionais de saúde e colocam os
Cuidados Paliativos como uma ideia subversiva, entre outras coisas, por supor o
estabelecimento de um vínculo entre profissionais e pacientes, bem como, a
valorização da subjetividade nessa relação.
Palavras-Chave:
cuidados paliativos; morte; obstinação terapêutica.
ABSTRACT
Epidemiological evidence of health in recent decades show the occurrence of
significant changes in life expectancy at birth and mortality profile of the population
with increasing number of patients with chronic diseases. This new scenario reveals
the phenomenon of population aging as a result of a gradual process of
demographic transition in the country. This study aimed to understand the meaning
that the teams of health professionals attribute to palliative care and their respective
roles in such conduct. It was determined the following objectives: to reveal the
meaning attributed to death by teams of health professionals; to understand how
these professionals work the question of death in palliative care; investigate the
difficulties faced by them in relation to the issue of death and dying patients and / or
no possibility of healing patients in their daily work, highlight the understanding they
have about Palliative Care. Given the complexity of the subject we chose to
prioritize health professionals whose areas of expertise are the hospital, long-term
institution for seniors and home care. It is a qualitative methodology of social
research that used semi-structured interview with 09 professionals in 03 different
categories, MD, social worker and nurse. The interpretation of the data led to the
identification of four areas of analysis: on the meaning of death and dying;
professional practice and its relationship with death, difficulties in the matter of death
and dying patients and / or patients with no possibility of cure; identification and
understanding of Palliative Care. Death is seen as part of the daily work of
professionals. It was possible to observe the lack of preparedness to deal with death
and the relationship with the family, as well as the ideological space of the hospital
as cured. Palliative care is not understood by all professionals as a new form of
health care. Finally, all considerations point to the complexity of dealing with the
issue of death in the daily work of health care professionals and lay Palliative Care
as a subversive idea, among other things, supposed to establish a link between
professionals and patients as well as the value of subjectivity in this relationship.
Keywords:
palliative care, death, medical futility.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
1 – Tabela 1 – Alguns precedentes históricos do movimento hospice.....................21
2 – Figura 1 – Linha de cuidado no câncer..............................................................23
3 – Figura 2 – Atenção Integral à Saúde: um olhar sobre o sujeito.........................24
4 – Quadro 1 – Dados de Identificação dos sujeitos da pesquisa...........................79
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
ABCP
Associação Brasileira de Cuidados Paliativos
AIDS
Síndrome da Imunodeficiência Adquirida
AVDs
Atividades da Vida Diária
CFESS
Conselho Federal de Serviço Social
COMET
Comitê de Ética
CP
Cuidados Paliativos
CREMESP
Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo
CTIs
Centros de Tratamento Intensivo
EUA
Estados Unidos da América
FMUSP
Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo
GM
Gabinete do Ministro
IBGE
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
ILPIs
Instituições de Longa Permanência para Idosos
INCA
Instituto Nacional do Câncer
IPEA
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada
NEPEC
Núcleo de Estudos e Pesquisas em Educação em Saúde
Coletiva
OMS
Organização Mundial de Saúde
PAD
Programa de Atendimento Domiciliar
RMBS
Região Metropolitana da Baixada Santista
SEADE
Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados
SECPAL
Sociedad Española de Cuidados Paliativos
SUS
Sistema Único de Saúde
TECLE
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
UNIFESP
Universidade Federal de São Paulo
UNISANTOS
Universidade Católica de Santos
USP
Universidade de São Paulo
UTI
Unidade de Terapia Intensiva
SUMÁRIO
Introdução...............................................................................................................13
Capítulo 1 - CUIDADOS PALIATIVOS: UMA NOVA FILOSOFIA DE CUIDADO
1.1 Das origens remotas: Breviário dos Cuidados Paliativos...................................19
1.2 Conceitos de Cuidados Paliativos......................................................................25
1.2.1 Cuidados Paliativos e qualidade de vida .............................................27
1.3 Filosofia dos Cuidados Paliativos.......................................................................27
1.4 A Questão da Dor...............................................................................................29
1.5
A
Organização
dos
Serviços
Cuidados
Paliativos:
modalidades
de
atendimento..............................................................................................................30
1.6Abordagem multiprofissional e interdisciplinar: quando a soma das diferenças
multiplica os resultados ...........................................................................................33
1.6.1 Equipe Multiprofissional........................................................................33
1.6.2 Interdisciplinaridade..............................................................................37
1.7 O doente: autonomia e dignidade......................................................................39
1.8 A Família como cuidadora informal....................................................................43
1.8.1 A família e a equipe de Cuidados Paliativos........................................43
1.8.2 O cuidado: legado familiar?..................................................................46
1.9 Notas sobre legislação em Cuidados Paliativos.................................................48
Capítulo 2 – A SOCIEDADE E O MORRER
2.1 A Representação Social da Morte no Ocidente..................................................50
2.2 A contribuição da Tanatologia para o entendimento do processo do morrer.....56
2.2.1 Estágio da Negação e Isolamento........................................................57
2.2.2 Estágio da Raiva...................................................................................58
2.2.3 Estágio da Barganha............................................................................58
2.2.4 Estágio da Depressão..........................................................................59
2.2.5 Estágio da Aceitação............................................................................59
2.2.6 Luto.......................................................................................................60
2.3 A questão da morte e os profissionais da saúde................................................61
2.4 Obstinação terapêutica: o cuidado em seu excesso..........................................64
2.5 Educar para a morte...........................................................................................66
Capítulo 3 – A PESQUISA E O DESAFIO DO CONHECIMENTO NO PROCESSO
DE INVESTIGAÇÃO
3.1 A metodologia: caminhos percorridos................................................................70
3.2 Sobre a coleta de dados.....................................................................................72
3.2.1 Aspectos éticos.....................................................................................72
3.2.2 Dificuldades e limitações......................................................................73
3.2.3 Pesquisa de campo..............................................................................73
3.3 Os cenários da pesquisa....................................................................................74
3.3.1 ILPI........................................................................................................75
3.3.2 Hospital.................................................................................................76
3.3.3 Home Care............................................................................................77
3.4 Reflexões a partir das entrevistas: resultados e discussões..............................78
3.4.1 Eixos de análise....................................................................................79
3.4.1.1 Sobre o significado da morte e do morrer...............................80
3.4.1.2 Prática profissional e sua relação com a morte.......................83
3.4.1.3 Dificuldades em relação à questão da morte e pacientes
terminais e/ ou pacientes sem possibilidades de cura .......................93
3.4.1.4 Identificação e compreensão dos Cuidados Paliativos.........100
Considerações Finais......................................................................................... 103
Referências Bibliográficas .................................................................................111
Apêndices
I - Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
II- Roteiro de entrevista
13
INTRODUÇÃO
Quando se referem aos dados epidemiológicos de saúde das últimas
décadas constata-se que ocorreram mudanças significativas na esperança de vida
ao nascer e no perfil de morbimortalidade da população.
O último Senso Demográfico realizado pelo do Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE) em 2010 revela que 11,68% da população total do
país representa a população com 60 anos ou mais. Informações de 2011
apontadas nos estudos da Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados
(SEADE)1 apontam que a população com 60 anos ou mais do Estado de São Paulo
corresponde a 11,53% do total. Enquanto no município de Santos chega a 18,04%
e a Região Metropolitana da Baixada Santista (RMBS) tem 13,17% da população
com 60 anos ou mais. A projeção da SEADE para 2020 dessa faixa etária da
população no Estado de São Paulo refere em números totais que serão em torno
de 7 milhões de pessoas que representarão aproximadamente 15,9% da
população.
Além das modificações populacionais, o Brasil tem experimentado uma
transição epidemiológica, com alterações relevantes no quadro de morbimortalidade. As doenças infecto-contagiosas, que representavam 40% das
mortes registradas no País em 1950, hoje são responsáveis por menos de
10%. O oposto ocorreu em relação às doenças cardiovasculares: em
1950, eram causa de 12% das mortes e, atualmente, representam mais de
40%. Em menos de 40 anos, o Brasil passou de um perfil de mortalidade
típico de uma população jovem para um desenho caracterizado por
enfermidades complexas e mais onerosas, próprias das faixas etárias mais
avançadas (GORDILHO et al apud IBGE, 2009, p.84).
Em síntese, as informações sobre a esperança de vida ao nascer
apontam, claramente, para um processo de envelhecimento populacional
no País, o que vai exigir novas prioridades na área das políticas públicas a
serem direcionadas para grupos populacionais específicos. Como exemplo
dessas prioridades, destaca-se a formação urgente de recursos humanos
para atendimento geriátrico e gerontológico, além de providências a serem
tomadas com relação à previdência social, que deverá se adequar a essa
nova configuração demográfica (IBGE, 2009, s.p.).
Os
dados
supracitados
refletem
o
fenômeno
do
envelhecimento
populacional, como resultante de um processo gradual de transição demográfica no
país.
1
Disponível em: www.seade.gov.br . Acesso em 10.jun.2011.
14
Um novo padrão demográfico brasileiro se caracteriza pela redução da taxa
de crescimento populacional e por grandes mudanças na estrutura etária da
população, com um significativo aumento do contingente de idosos (IBGE, 2009).
Estas modificações, por seu turno, tem imprimido importantes mudanças também
no perfil epidemiológico da saúde da população, com alterações relevantes nos
indicadores de morbidade e mortalidade.
Dados do IBGE2 referentes às morbidades hospitalares3 para o Estado de
São Paulo revelam que em 2007 ocorreram 11.140 óbitos por neoplasias (tumores).
Os óbitos por neoplasias são mais baixos apenas do que os óbitos por doenças dos
aparelhos respiratório e circulatório.
Uma projeção da Organização Mundial de Saúde (OMS) das principais
causas de morte para 2030, estima que as doenças crônicas4 como o câncer e as
doenças cardiovasculares representarão 75,8% das causas de morte (IPEA, 2009).
As novas condições clínicas implicam o predomínio das doenças crônicas
não transmissíveis e não mais das doenças infecciosas. Tais mudanças levaram à
incorporação de padrões de saúde e doença por meio de alterações nos
determinantes socioeconômicos, ecológicos e de estilo de vida da população.
Na visão tecnológica da medicina, as doenças funcionam como desafio à
ciência, ao progresso e reafirmam a ideologia desenvolvimentista,
segundo a qual, um dia, as descobertas acabarão com as enfermidades e
a morte será vencida. A partir dos interesses coorporativos, elas são o
espaço privilegiado de acirramento na guerra competitiva entre grupos
profissionais, laboratórios e indústrias de equipamento. Elas medeiam a
luta entre saber e poder econômico, organicamente relacionados com o
sistema de produção médico. No entanto, a contradição é que, a despeito
da imagem salvadora e filantrópica que a corporação médica tenta projetar
de si e de seu poder, sua história está carregada de fracassos que
evidenciam sua impotência ante a morte. A noção de fracasso,
materializada na morte, portanto, faz parte da representação médica da
doença. (MINAYO, 2006, p.248)
2
Fonte: Ministério da Saúde, Departamento de Informática do Sistema Único de Saúde – DATASUS
2009. Informações apenas das internações efetuadas através da AIH – Autorização de Internação
Hospitalar das unidades hospitalares participantes do SUS (públicas e particulares conveniadas).
Disponível em: www.ibge.gov.br. Acesso em 10.jun.2011.
3
O problema da sub notificação das doenças na área de saúde não foi considerada.
4
Trata-se de doença que acompanha a pessoas por um longo período de tempo, podendo ter fases
agudas, momentos de piora ou melhora sensível.
15
Além disso, o avanço da tecnologia na área da saúde, tanto em relação ao
avanço de novos equipamentos hospitalares que contam cada vez mais com
instrumentos capazes de realizar diagnósticos mais precisos quanto com o
surgimento de novos medicamentos desenvolvidos pela indústria farmacêutica,
refletem profundamente na prática médica, principalmente na direção da obstinação
terapêutica que surge como opção para esta sociedade que encara a morte como
fracasso. A obstinação terapêutica também conhecida como futilidade terapêutica é
o comportamento de submeter pacientes a tratamentos cujo resultado é mais
prejudicial ao paciente do que os sintomas da doença.
De tal modo que a partir do momento que a tecnologia possibilitou a cura de
inúmeras doenças passou-se a acreditar inconscientemente na imortalidade, sendo
a morte tema tabu que se constitui num dos fantasmas do consciente humano; a
sociedade ocidental contemporânea passa então a negá-la. Essa negação reflete
as mudanças na sociedade que valoriza a produtividade, a juventude e a
independência.
Por mais que a tecnologia na área da saúde tenha avançado o paciente
ainda
está
sofrendo,
talvez
não
fisicamente,
mas
emocionalmente.
As
necessidades de pacientes sem possibilidades de cura e pacientes terminais não
mudaram ao longo dos anos; mudou apenas a capacidade em satisfazê-las na
medida em que a família e profissionais de saúde se tornaram incapazes de cuidar
porque todos estão preocupados em produzir, permanecerem jovens (negação do
envelhecimento) e independentes, valores altamente valorizados pela sociedade
contemporânea; e à medida que a doença avança esses ideais não são
alcançáveis por esses pacientes. Essas mudanças afetaram sobremaneira a
organização familiar com a inserção das mulheres no mercado de trabalho, que até
então eram responsáveis pelos cuidados dos demais membros da família. Contudo,
mesmo com a pouca disponibilidade, quando necessário ainda é a mulher quem
mais se desdobra para atender os familiares.
Assim, o envelhecimento da população, como resultado da prevenção e
evolução tecnológica da medicina, os problemas relativos às condições de vida da
população (desemprego, falta de acesso aos serviços de saúde, moradia precária,
alimentação inadequada), o aumento da esperança de vida e o processo acelerado
de urbanização e industrialização que contribuem para o crescimento de doenças
crônico-degenerativas
na
população
mundial,
causará
impacto
e
exigirá
16
transformações nas políticas públicas, principalmente nas áreas de Saúde,
Previdência e Assistência Social. As doenças crônicas não transmissíveis trazem
uma carga econômica às pessoas portadoras dessas doenças, às famílias e à
sociedade em geral ao produzirem elevados custos para os sistemas de saúde,
assistência social e previdência social devido à mortalidade e invalidez precoces.
Diante da grande incidência de doenças como o câncer e as diversas
doenças crônicas, os Cuidados Paliativos chegam, na contramão da visão
utilitarista da sociedade capitalista, com uma proposta de aliviar o sofrimento
humano que nem sempre se reduz ao aspecto físico.
O modelo assistencial que se persegue no cuidado dessas doenças articula
os recursos nos diferentes níveis de atenção, para que seja garantido o acesso aos
serviços e o cuidado integral. A abordagem dos indivíduos com essas doenças
deve acolher as diversas dimensões do sofrimento (físico, espiritual e psicossocial)
e buscar o controle da mesma com preservação da qualidade de vida possível. De
tal modo, as pessoas devem ser vistas como sujeitos, na singularidade de sua
história de vida, condições socioculturais, anseios e expectativas.
Os Cuidados Paliativos possibilitam a construção de novas concepções para
a vida e, sobretudo, novas significações para a morte. Faz-se urgente quebrar a
barreira que se construiu e voltar a discutir a morte, o luto e a perda como processo
natural para que se possa contribuir para uma nova postura e atitude diante do
inexorável, e encarar o desafio de dar qualidade de vida aos pacientes sem
possibilidades de cura e/ ou pacientes terminais.
Independentemente da existência ou não de serviços especializados em
Cuidados Paliativos nos hospitais, pacientes sem possibilidades de cura ou
terminais são usuários cotidianos dos diversos serviços de saúde e o atendimento a
esses pacientes pode representar uma situação de extrema dificuldade para a
equipe de saúde.
O presente estudo propôs-se a compreender como se dá o cuidado a
pacientes terminais e/ ou sem possibilidades de cura na visão dos profissionais de
equipes de saúde. Para tanto foi estabelecido como objetivo geral: entender o
significado que os profissionais de equipes de saúde atribuem aos Cuidados
Paliativos e a seus respectivos papeis nesse tipo de conduta. E determinaram-se
como objetivos específicos:
17
- desvelar o significado atribuído à morte pelos profissionais de equipes de
saúde;
- compreender como esses profissionais trabalham a questão da morte nos
Cuidados Paliativos;
- investigar as dificuldades enfrentadas por eles em relação à questão da
morte e pacientes terminais e/ ou sem possibilidades de cura no seu cotidiano de
trabalho;
- evidenciar o entendimento que tem sobre os Cuidados Paliativos.
Dada a complexidade do tema optou-se por priorizar profissionais de saúde
cujos espaços de atuação são o hospital, a instituição de longa permanência para
idosos (ILPI) e a assistência domiciliar (serviço de Home Care). Foram
entrevistados, em cada serviço, profissionais de três categorias diferentes, médico
(a), assistente social e enfermeiro (a).
O estudo de abordagem qualitativa está estruturado em três capítulos. O
primeiro capítulo foca os Cuidados Paliativos, abordando entre outros temas a
implantação, a filosofia e os princípios fundamentais da sua assistência. O segundo
capítulo trata da representação social da morte no ocidente, da contribuição da
tanatologia, da questão da morte e os profissionais de saúde e da obstinação
terapêutica. O terceiro capítulo compreende o percurso metodológico empregado e
a apresentação dos resultados encontrados na pesquisa de campo. Por fim, as
considerações sobre o estudo desenvolvido revelam toda a complexidade do
enfrentamento da questão da morte no cotidiano de trabalho dos profissionais de
saúde e colocam os Cuidados Paliativos como uma ideia subversiva, entre outras
coisas, por supor o estabelecimento de um vínculo entre profissionais e pacientes.
O interesse na realização deste estudo na área de Saúde Coletiva deu-se à
medida que este campo de conhecimento procura conhecer de que forma a
sociedade identifica suas necessidades e problemas de saúde e de que forma se
organiza ou não para enfrentá-los.
Os Cuidados Paliativos convergem com a
Saúde Coletiva, enquanto prática, na medida em que esta propõe um novo modo
de organização do processo de trabalho em saúde que enfatiza a melhoria da
qualidade de vida, privilegiando mudanças nos modos de vida e nas relações entre
os sujeitos sociais envolvidos no cuidado à saúde da população. Entendendo que
exista uma potencial necessidade dos Cuidados Paliativos uma vez que a medicina
18
curativa não consegue dar respostas que aliviem o sofrimento em todas as
dimensões de pacientes sem possibilidades de cura e ou pacientes terminais.
19
Capítulo 1 - Cuidados Paliativos: uma nova
nova filosofia de cuidado
“Não, não tenho caminho novo.
O que tenho de novo é o jeito de caminhar.”
(Thiago de Mello)
1.1 Das origens remotas: Breviário dos Cuidados Paliativos
Numa perspectiva histórica, o surgimento dos Cuidados Paliativos vem de
longe e estariam relacionados às origens dos hospices5 que davam assistência aos
moribundos na Europa da Idade Média quando a religiosidade predominava no
período.
A origem dos hospices remonta à Fabíola, matrona romana que no século
IV da era cristã abriu sua casa aos necessitados, praticando assim ‘obras
de misericórdia’ cristã: alimentar os famintos e sedentos, visitar os
enfermos e prisioneiros, vestir os nus e acolher os estrangeiros. Naquele
tempo, hospitium incluía tanto o lugar onde se dava a hospitalidade como
a relação que ali se estabelecia. Essa ênfase é central para a medicina
paliativa até hoje. Mais tarde, a Igreja assumiu o cuidado dos pobres e
doentes, fato que continuou na Idade Média. Na Grã-Bretanha isso foi
interrompido abruptamente com a dissolução dos mosteiros no século XVI.
O primeiro hospice fundado especificamente para os moribundos foi
provavelmente o de Lyon, em 1842. Depois de visitar pacientes com
câncer que morriam em suas casas, Madame Jeanne Garnier abriu o que
ela chamou um hospice e um Calvário. Na Grã-Bretanha, o renascimento
ocorreu em 1905, com o St. Joseph Hospice em Hackney, fundado pelas
Irmãs Irlandesas da Caridade. Sua fundadora, Madre Mary Akenhead, era
contemporânea de Florence Nightingale, que fundou em Dublin, em 1846,
uma casa para alojar pacientes em fase terminal (Our Lady’s Hospice) e
chamou-a de hospice, por analogia às hospedarias para o descanso dos
viajantes, na Idade Média. Neste mesmo período foram abertos em
Londres outros hospices, entre eles o St. Columba (1885) e o St. Lukes
5
Hospice: filosofia de assistência onde não somente o paciente e sua família recebem tratamento,
mas o grupo que ali trabalha e interage com eles é semelhante a uma casa. O respeito que se
oferece é a base para uma relação que se dá tanto no breve espaço de tempo e contato entre a
equipe, paciente e seus familiares, quando na via daqueles que ali permanecem, isto é a busca do
sentido que todos necessitamos encontrar para organizar, a história de nossa vida em uma forma
que facilite nossa viagem final (Cicely Saunders). Um típico hospice inglês compreende: Serviço de
Assistência Domiciliar com médicos, enfermeiras e assistentes sociais especializadas em visitas e
cuidados domiciliares (Home Care), centro de cuidados diários (Day Hospice), enfermarias, às
vezes Grupos de Pesquisas, Grupos de Apoio ao luto dos familiares e usualmente Serviço de
Educação e Especialização. A direção dos serviços cabe a um médico especialista, enfermeira
especialista, ou qualquer outro elemento da equipe multiprofissional capacitado para administrar
cuidados paliativos (MATOS e MORAIS in Figueiredo, s.d., p.49).
20
(1893), o único fundado por um médico, o Dr. Howard Barret, para acolher
pobres moribundos.
Em 1967 surge na Inglaterra o St. Christopher Hospice e a pessoa
extraordinária e carismática de Cicely Saunders, uma assistente social que
cuidava das necessidades dos pacientes em fase final no hospital St.
Thomas, em Londres (PESSINI apud Menezes, 2004, p.01-02).
Nos Estados Unidos, o movimento hospice tem seu início em 1974, no
desenvolvimento de um serviço de internação no hospice de Connecticut,
em New Haven. O ethos inicial do movimento em terras americanas foi
prevalecentemente anti-médico. No final dos anos 1970 e começo dos
anos 1980, o movimento era uma organização popular, comunitária,
dirigida por voluntários e enfermeiras, sem muito envolvimento de
médicos. Nos Estados Unidos a atenção à saúde se baseava
majoritariamente em empresas de seguro (hoje muito mais), que não
incentivavam economicamente tanto os médicos como os hospitais, já que
no início dos cuidados de hospice não eram cobertos pelos seguros. Hoje
os cuidados paliativos estão contemplados em lei desde 1983, embora
ainda existam resistências da Associação Médica Americana em relação à
medicina paliativa. Aos poucos essas barreiras vão sendo desfeitas. A
American National Hospice Organization, (criada em 1978) registrava em
1988 mais de 2.800 associados, entre serviços de pequeno e médio porte,
filantrópicos e curativos. Estima-se hoje que cerca de 500 mil pacientes,
dos 2,3 milhões que morrem anualmente nesse país, recebam assistência
de hospice (NATIONAL HOSPICE ORGANIZATION apud Pessini in
Bertachini e Pessini, 2004, p.185).
A tabela abaixo sintetiza alguns precedentes históricos do Movimento
Hospice (SECPAL apud Maciel in CREMESP, 2008, p.29):
21
1 – Tabela 1 - Alguns Precedentes Históricos do Movimento Hospice.
Assim, o movimento moderno dos Cuidados Paliativos teve início na
Inglaterra na década de 1960 com o St. Christhopher´s Hospice e posteriormente
foi se desenvolvendo no Canadá, nos Estados Unidos da América (EUA) e nas
últimas duas décadas no restante da Europa. O movimento evidenciou a falta de
respostas por parte dos serviços de saúde diante da especificidade dos cuidados
que teriam que ser dispensados aos doentes incuráveis.
Entre as décadas de 1970 a 1990 ocorreu uma ampliação dos programas de
cuidados paliativos na Europa e, hoje, o país com a maior rede de cobertura de
cuidados paliativos no mundo é a Inglaterra, seguida pela Espanha que em 2000
contabilizava 206 programas específicos de Cuidados Paliativos (PASCUAL apud
Andrade, 2007, p.35).
Na década de 1980 o movimento dos cuidados paliativos ganha apoio da
Organização Mundial de Saúde (OMS), que passa a estimular os países membros
22
a desenvolver programas de controle de câncer que incluíssem prevenção,
detecção precoce, tratamento curativo, alívio da dor e cuidados paliativos. Em 1986
publica o manual Cancer pain relief and palliative care report (O alívio da dor de
câncer e os cuidados paliativos) (PESSINI in Bertachini e Pessini, 2004, p.185).
Esse modelo de cuidados chegou ao Brasil no início dos anos de 1980,
período em que os brasileiros ainda viviam o final de um regime de ditadura militar,
cujo sistema de saúde priorizava a modalidade hospitalar, basicamente curativa. O
ensino universitário na área de enfermagem, tal como o da medicina, estavam
voltados para os aspectos biológicos da doença. A prática era em sua maior parte
individual, com abordagens fragmentadas de diversos profissionais, ou seja,
intervenções multiprofissionais para um mesmo paciente. Via-se a doença e não a
pessoa com uma doença.
Vários fatores dificultam a disseminação dos cuidados paliativos no Brasil.
Dentre eles, as diferenças socioeconômicas da população e das regiões, a
dimensão geográfica do país, a formação nos cursos da área de saúde, a
resistência dos profissionais em aderir ao paradigma do cuidar quando não há mais
cura, entre outros.
Existem 65 serviços de Cuidados Paliativos cadastrados no site da
Associação Brasileira de Cuidados Paliativos6 (ABCP), presentes principalmente
nas capitais. Estes serviços, na maioria das vezes, iniciaram suas ações com o
controle da dor e, posteriormente, agregaram os Cuidados Paliativos. Eles estão
inseridos tanto em instituições hospitalares públicas como em clínicas privadas. A
psicóloga clínica Ana Geórgia Cavalanti de Melo7 (2008, p.7) aponta outras
dificuldades a serem vencidas para a expansão dos Cuidados Paliativos no país:
ausência de uma política nacional de alívio de dor; deficiência na educação de
profissionais de saúde e comunidade; preocupações quanto ao uso da morfina e
outros opióides8; limitações no fornecimento de outras drogas necessárias para o
6
Fundada em outubro de 1997, é uma associação sem fins lucrativos que visa implantar e promover
os cuidados paliativos em doenças crônico-evolutivas durante a fase de progressão e a
terminalidade, através da formação de profissionais de saúde, promovendo assistência e
desenvolvimento de pesquisas científicas.
7
Fundadora e Ex – Presidente da Associação Brasileira de Cuidados Paliativos (ABPC), atual
Secretária Executiva da ABPC.
8
Opióides são substâncias derivadas do ópio. Eles são classificados em naturais ou sintéticos, de
acordo com sua natureza química. Quanto à intensidade de sua ação farmacológica, são fracos ou
fortes, sendo os primeiros indicados para a dor moderada e os últimos para a dor intensa ou severa.
Combinam-se aos receptores opióides para produzir seus efeitos e são antagonizados pela
naloxona (CREMESP, 2008, p.379).
23
alívio da dor; carência de recursos financeiros para pesquisa e desenvolvimento em
cuidados paliativos.
Um dos serviços de referência é o Serviço de Suporte Terapêutico
Oncológico do Instituto Nacional de Câncer (INCA) no Rio de Janeiro, que funciona
desde 1989, na modalidade de assistência domiciliar e hospitalar. Com vistas a
melhor atender esses pacientes, em 8 de Dezembro de 2005 o então Ministro da
Saúde, Saraiva Felipe, criou a Portaria Nº 2.439/GM que institui a Política Nacional
de
Atenção
Oncológica:
Promoção,
Prevenção,
Diagnóstico,
Tratamento,
Reabilitação e Cuidados Paliativos, a ser implantada em todas as unidades
federadas, respeitadas as competências das três esferas de gestão.
Dessa forma, o modelo assistencial na linha de cuidado no câncer deve
articular os recursos nos diversos estágios de atenção, para que sejam garantidos
o acesso aos serviços e o cuidado integral. Todas as pessoas devem ser vistas
como sujeitos, na singularidade de sua história de vida – da qual são protagonistas,
condições socioculturais, aspirações e expectativas. A abordagem dos indivíduos
com a doença deve acolher as diversas dimensões do sofrimento (físico, espiritual
e psicossocial) e buscar o controle do câncer com a preservação da qualidade de
vida.
As figuras a seguir ilustram o caminho a ser percorrido por pacientes
diagnosticados com câncer e a forma pela qual estes pacientes devem ser
atendidos visando à integralidade do atendimento.
Figura 2 – Linha de cuidado no câncer. Fonte: INCA – Instituto Nacional do Câncer.
24
Figura 3 – Atenção Integral à Saúde: o olhar sobre o sujeito. Fonte: INCA – Instituto Nacional
do Câncer.
Apesar de a maioria dos trabalhos científicos e dos serviços existentes
estarem relacionados a pacientes em tratamento na especialidade de oncologia, os
cuidados paliativos poderiam e deveriam ser oferecidos a pacientes diagnosticados
com diferentes patologias, como:
• Neurológicas – doença de Alzheimer, doença de Parkinson, esclerose múltipla,
tetraplegias, doenças cerebrovasculares, etc.;
• Osteomusculares – osteossarcomas, artrite avançada, osteomielite, etc.;
• Cardiopulmonares – quadro asmático grave, enfisema pulmonar, bronquite
crônica, insuficiência cardíaca, etc.;
• Lúpus Eritematoso Sistêmico;
• Quadros metastático;
• AIDS;
• Insuficiência renal crônica, dentre outras.
Tradicionalmente, dada sua origem histórica, os Cuidados Paliativos eram
vistos como sendo aplicáveis unicamente no momento em que a morte era
iminente. Hoje, os Cuidados Paliativos são oferecidos no estágio inicial do curso de
uma determinada doença progressiva, avançada e incurável.
25
Um estudo9 realizado em 2009 por pesquisadores do Massachusetts
General
Hospital
em
Boston
-
EUA
comparou
pacientes
recentemente
diagnosticados com metástase de câncer de pulmão de células não pequenas que
receberam tratamento padrão e aqueles que receberam Cuidados Paliativos ao
longo do tratamento focado na cura desde o momento do diagnóstico, e
demonstrou os benefícios desse modelo de atenção. O grupo de pacientes que
recebeu os Cuidados Paliativos desde o início do tratamento apresentou melhora
na sua qualidade de vida, com menor número de quadros de depressão, além do
aumento da sua sobrevida em pelo menos 2,7 meses. Os resultados desse estudo,
que foi publicado pelo New England Journal of Medicine, reforçam os Cuidados
Paliativos como uma intervenção apropriada e benéfica quando é introduzida desde
o momento do diagnóstico de doenças crônicas. Ou seja, essa intervenção deve
acontecer concomitantemente a todos os outros tratamentos médicos ligados à
doença em si e passar a ocupar mais espaço no acompanhamento do paciente à
medida que a doença avançar.
A questão que deve ser esclarecida é que, diagnosticada a impossibilidade
de cura de uma doença, não significa que o paciente esteja em fase terminal,
podendo ainda viver muito tempo com a doença, e é preciso buscar a melhor
qualidade de vida para o mesmo. Assim, admitir que se esgotaram os recursos
para a cura e que o paciente se encaminha para o fim da vida não significa que não
há mais o que fazer: contrariamente, inúmeros outros procedimentos podem e
devem ser oferecidos ao paciente e sua família.
1.2 Conceitos de Cuidados Paliativos
O conceito de Cuidados Paliativos evoluiu ao longo do tempo e à medida
que foi se desenvolvendo em várias partes do mundo. A sua definição levou em
consideração as necessidades dos pacientes sem possibilidades de cura e sua
família, e não fatores como idade, o órgão do corpo atingido ou uma determinada
patologia. Os Cuidados Paliativos podem influenciar outras formas de cuidados de
saúde, valorizando aspectos que ficaram em segundo plano a partir do domínio da
9
Early Palliative Care for Patients with Mestastatic Non-Small-Cell Lung Câncer, 2010.
26
medicina chamada científico-tecnológica, tais como dimensões humanas e éticoespirituais da pessoa humana (PESSINI, 2005).
A OMS em 1990 definiu Cuidados Paliativos como:
O cuidado ativo total de pacientes cuja doença não responde mais ao
tratamento curativo. Controle da dor e de outros sintomas e problemas de
ordem psicológica, social e espiritual são prioritários. O objetivo dos
Cuidados Paliativos é proporcionar a melhor qualidade de vida para os
pacientes e seus familiares.
Essa definição é positiva no sentido de que se centra no paciente, enfatiza a
natureza múltipla da condição humana e identifica a qualidade de vida como seu
objetivo maior. Contudo, o uso do termo “curativo” não ajuda, uma vez que muitas
enfermidades crônicas não podem ser curadas, mas podem ser compatíveis com
uma expectativa de vida por vários anos e até décadas.
Os Cuidados Paliativos são cuidados coordenados e integrais, e incluem a
assistência aos familiares, ministrados por equipes e unidades específicas de
cuidados paliativos, em regime ambulatorial, de internamento ou no domicílio. Os
elementos essenciais que os constituem são o alívio dos sintomas, o apoio
psicológico, espiritual e emocional do doente e o apoio à família durante a fase do
luto, o que implica o envolvimento de uma equipe interdisciplinar de estruturas
diferenciadas.
A OMS em 1998 definiu também Cuidados Paliativos para crianças, como
sendo:
Cuidado ativo total para o corpo, mente e espírito, e também envolve o
apoio para a família; tem início quando a doença é diagnosticada, e
continua independente de a doença da criança estar ou não sendo tratada;
os profissionais da saúde devem avaliar e aliviar o estresse físico, psíquico
e social da criança; para serem efetivos exigem uma abordagem
multidisciplinar que inclui a família e a utilização dos recursos disponíveis
na comunidade; podendo ser implementado mesmo se os recursos são
limitados; pode ser realizado em centros comunitários de saúde e mesmo
nas casas das crianças.
27
Em 2002, a OMS redefiniu o conceito de Cuidados Paliativos, colocando
ênfase na prevenção do sofrimento:
Cuidados Paliativos é uma abordagem que aprimora a qualidade de
vida, dos pacientes e famílias que enfrentam problemas associados com
doenças ameaçadoras de vida, através da prevenção e alívio do
10
sofrimento , por meios de identificação precoce, avaliação correta e
tratamento da dor e outros problemas de ordem física, psicossocial e
espiritual.
Os dois conceitos introduzidos agora colocam o ato de tratar e alíviar os
sintomas como objetivos dos Cuidados Paliativos, bem como ampliam a atenção
para além dos pacientes, abordando também seus familiares.
1. 2.1 Cuidados Paliativos e qualidade de vida
O que se busca para o paciente sem possibilidade de cura e/ ou paciente
terminal é aprimorar a sua qualidade de vida, e nestes casos esta não pode ser
entendida apenas como ausência de doença; ou seja, a qualidade de vida nestes
casos não se refere exclusivamente à questão da saúde.
Em 1994 o Grupo de Qualidade de Vida da OMS definiu o termo como sendo
“a percepção do indivíduo de sua posição na vida no contexto da cultura e sistemas
de valores nos quais ele vive e em relação aos seus objetivos, expectativas,
padrões e preocupações” (OMS apud Minayo et. alii, 2000, p.13). É possível afirmar
que este conceito de qualidade de vida não é abordado nessa perspectiva de
construção subjetiva em profundidade pelos diversos cursos da área de saúde,
como também não é de entendimento da sociedade como um todo.
1.3 Filosofia dos Cuidados Paliativos
Os Cuidados Paliativos destinam-se a doentes que não tem perspectiva de
tratamento curativo, ou seja, pacientes com doença que progride e cuja expectativa
10
Grifos meus.
28
de vida a princípio é limitada, o seu sofrimento é intenso e apresentam problemas e
necessidades de difícil resolução, que exigem apoios específicos, organizados e
interdisciplinares. São pacientes sem possibilidades de cura que demandam
Cuidados Paliativos.
Antes é preciso distinguir ação paliativa de Cuidados Paliativos. A ação
paliativa é toda medida terapêutica, sem finalidade de cura, que busca diminuir as
consequências negativas da doença sobre o bem-estar geral do doente internado
ou no domicílio. As ações paliativas integram a prática profissional, independente
da doença ou estágio de evolução. Já os Cuidados Paliativos, embora não tenham
a finalidade de cura, tem uma abordagem mais ampla (aspectos espirituais, físicos,
psicossociais), portanto, exigem dos profissionais uma capacitação para lidar com a
finitude humana.
Assim, a partir da definição de Cuidados Paliativos da OMS, tem-se os
seguintes princípios fundamentais (OMS, 2002) que norteiam tais cuidados:
• Valorizam o atingir e manter um nível ótimo de dor e administração dos
sintomas;
• Afirmam a vida e encaram o morrer como um processo normal;
• Não apressam e nem adiam a morte. Intervenções de Cuidados
Paliativos não devem ser para abreviar a vida prematuramente;
• Integram aspectos psicológicos e espirituais dos cuidados do paciente.
Um nível elevado de cuidado físico é certamente de vital importância, mas
não suficiente em si mesmo. A pessoa humana não se reduz a uma mera
entidade biológica;
• Oferecem um sistema de apoio para ajudar os pacientes a viver tão
ativamente quanto possível, até o momento da sua morte. Neste sentido, é
importante ressaltar que o paciente estabelece os objetivos e prioridades.
O papel do profissional da saúde é capacitar e assistir o paciente em
atingir seu objetivo identificado;
• Ajudam a família a lidar com a doença do paciente e no luto. Em
Cuidados Paliativos a família é uma unidade de cuidados. Neste sentido,
os membros da família terão suas questões e dificuldades, que devem ser
identificadas e trabalhadas;
• Exigem uma abordagem em equipe. É evidente que do exposto até o
momento nenhuma pessoa, ou disciplina somente, pode adequadamente
lidar com a gama e complexidade das questões que surgem durante o
período de cuidados paliativos;
• Buscam aprimorar a qualidade de vida;
• São aplicáveis no estágio inicial da doença, concomitantemente com as
modificações da doença e terapias que prolongam a vida.
É importante ressaltar que os Cuidados Paliativos não devem ser encarados
como essencialmente diferentes de outras formas ou áreas de cuidados de saúde.
29
O que tornaria complicado, senão impossível, a sua integração no sistema de
saúde regular. Diversos elementos cruciais dos Cuidados Paliativos se aplicam
perfeitamente à medicina curativa, bem como, de outro lado, o desenvolvimento
dos Cuidados Paliativos pode influenciar positivamente outras formas de cuidados
de saúde.
1.4 A Questão da Dor
A inglesa precursora e referência nos Cuidados Paliativos, Dame Cecily
Saunders11 (KÓVACS apud Bertachini e Pessini, 2004, p.286), criou o conceito de
“dor total”, uma combinação de elementos das dimensões física, psíquica, social e
espiritual da pessoa humana. Frente à mentalidade utilitarista de eliminar o sofredor
por causa do sofrimento, Saunders propõe que “o sofrimento somente é intolerável
se ninguém cuida” (apud PESSINI in Bertachini e Pessini, 2004, p.24).
É fato que a dor ainda não recebe a atenção devida na assistência à saúde.
Pesquisas realizadas nas Universidades de Cuidados Paliativos e câncer da OMS
revelam que anualmente milhões de pacientes morrem, tanto nos países
desenvolvidos como em desenvolvimento, sem receber o devido tratamento da dor
e sem terem sido considerados outros sintomas que são tão importantes quanto a
dor e também causam sofrimentos.
Aqui há que se distinguir entre dor e sofrimento. Para tanto, recorre-se a
Pessini (in Bertachini e Pessini, 2004), quando explica as dimensões da
dor/sofrimento:
• Física – facilmente identificada. Surge de um ferimento, de uma doença ou da
degradação progressiva do corpo, impedindo o funcionamento físico e o
relacionamento com os outros;
• Psíquica – múltiplos fatores podem desencadear sofrimento psíquico, entre eles o
enfrentamento da própria finitude que levam à perda da esperança e sonhos ou à
necessidade de redefinir-se diante do mundo;
• Social – marcada pelo isolamento, consequência da dificuldade de comunicação
sentida no processo de morrer, e que muitas vezes leva à perda do papel familiar;
11
Cecily Saunders era assistente social, médica e tinha graduação em inglês.
30
• Espiritual – este tipo de sofrimento surge da perda de significado e do sentido da
vida e da esperança.
Com relação à dor física, o uso de medicamentos para o seu controle é
essencial. Porém, o uso da morfina, ou melhor, a falta de prescrição médica da
medicação sob o pretexto de que a droga causa dependência, deixa milhares de
pacientes sofrendo dores incomensuráveis. O sofrimento pelo qual passam essas
pessoas pode levá-las a desejar a morte e a desistirem da vida. No entanto,
pacientes com prognósticos reservados12 deveriam ter a oportunidade de gozar do
tempo que lhes resta sem dor, sem tanto sofrimento. Todas as pessoas necessitam
de um sentido e de uma razão para viver, e para morrer e a dor pode gerar um
pedido de morte.
Embora essas dimensões do sofrimento sejam e estejam inter-relacionadas,
nem sempre é fácil distingui-las umas das outras, mas todas as dimensões devem
fazer parte do atendimento ao paciente.
1.5 Organização dos Serviços de Cuidados Paliativos: Modalidades de
Atendimento
O funcionamento de um serviço ou unidade de Cuidados Paliativos com uma
equipe de profissionais diversificada pode incluir: atendimento simultâneo
interdisciplinar aos pacientes/familiares; identificação, capacitação e participação
ativa do cuidador e da família; execução conjunta do plano de cuidados,
adequando-se à realidade socioeconômica e cultural da família; atendimento
psicológico individual ao paciente e familiares; visita domiciliar para identificar as
condições de moradia e serviços de saúde mais próximos ao local para
atendimento de situações emergenciais em conjunto com outros profissionais;
avaliação contínua do atendimento, adequando-se às necessidades do paciente e
familiares; contato através de ligações telefônicas periódicas; contato com outros
serviços para que haja envolvimento nos casos de retorno à cidade de origem;
acompanhamento psicológico do cuidador/família na fase de luto; discussão dos
casos e condutas pela equipe para manter coerência e unidade nas decisões;
12
Prognóstico reservado é uma expressão largamente utilizada no meio médico, referente à
impossibilidade de cura da doença e proximidade da morte (MENEZES, 2004, p.119).
31
discussão de artigos específicos visando à contínua atualização entre as
especialidades.
Após a adesão do paciente e da família aos Cuidados Paliativos, o paciente
é atendido pela (o) assistente social, que lhe repassa todas as informações
referentes ao funcionamento do serviço, levanta dados sobre sua condição
socioeconômica e familiar, seus possíveis cuidadores, suas angústias, dúvidas e
preocupações, assim como de seus familiares.
A intervenção do assistente social tem como finalidade levar o paciente e a
família a uma reflexão sobre os determinantes do processo saúde-doença e propor
a construção de formas de enfrentamento da doença, de lidar com os sintomas,
realinhando a vida e as relações sociais à nova etapa de suas vidas. Muitas vezes,
o assistente social é responsável pela vinculação entre o paciente, a família e o
profissional de saúde por meio do fornecimento de informações sobre o
funcionamento da instituição e os serviços oferecidos. Este tipo de informação
ajuda a construir uma relação de confiança entre o paciente e a instituição. Em
seguida, o paciente passa por uma avaliação com a equipe de enfermagem, que
avalia suas condições clínicas e se há necessidade de atendimento domiciliar.
Paralelamente são apresentadas pela (o) assistente social aos outros membros da
equipe as informações levantadas na entrevista social.
Encaminha-se o paciente ao médico, que realiza os encaminhamentos para
procedimentos como exames, avaliações com outros especialistas, internamento,
prescrição de medicamentos, além de reforçar o objetivo do serviço e captar outras
demandas não observadas. Ao mesmo tempo a avaliação do paciente é
complementada de forma integral pelas demais áreas (psicologia, nutrição,
fisioterapia etc.). Caso seja necessário, outros profissionais são acionados e o
paciente ainda pode ser encaminhado para outros programas existentes.
Durante a avaliação o paciente e a família devem ser esclarecidos e
informados quanto ao objetivo do acompanhamento em Cuidados Paliativos e
terem a clareza de que a equipe não possibilitará a cura do mesmo. A seguir, após
a avaliação da equipe, a tomada de decisão é feita de forma conjunta visando
definir o melhor tipo de atendimento a ser oferecido pela instituição de saúde de
acordo com o serviço disponível: hospitalar; domiciliar ou ambulatorial.
O atendimento ambulatorial é destinado aos pacientes que apresentam
condições físicas, socioeconômicas, familiares, de locomoção (transporte) e de
32
acompanhantes que lhes possibilitem comparecer aos controles periódicos no
hospital. As consultas são agendadas com antecedência de acordo com a
gravidade e intensidade dos sintomas. A partir do momento que ocorre o
agravamento da doença e a impossibilidade de comparecer ao hospital, a equipe
passa a atendê-lo no domicílio, se houver o serviço disponível.
O atendimento domiciliar é direcionado aos pacientes que não possuem
condições de deslocar-se até o hospital. Assim, permanecem em suas casas com
seus familiares, recebendo a atenção e os cuidados necessários a partir das
orientações e do apoio dos profissionais, se houver uma estrutura mínima que
garanta o conforto do paciente na residência. A frequência dos atendimentos
domiciliares é analisada de acordo com a necessidade de cada caso. Geralmente,
no mínimo, dois membros da equipe realizam a visita, objetivando observar as
condições físicas e ambientais do paciente, orientar e improvisar as adaptações
necessárias ao atendimento, fiscalizar as condições sanitárias do ambiente,
capacitar os familiares no cuidado com o doente e avaliar a necessidade de
assistência do paciente pelos demais membros da equipe. Depois da primeira visita
domiciliar, a equipe decide sobre as visitas seguintes e coloca-se à disposição para
tirar dúvidas e, a qualquer momento, orientar familiares, se necessário. E mesmo
não existindo demanda para todos os profissionais que realizam a visita domiciliar,
é importante que continuem indo para manter o vínculo com o paciente e a família.
É comum que os hospitais delimitem uma área de abrangência em torno do mesmo
para o atendimento domiciliar. Neste caso, na área territorial onde houver o
Programa de Atenção Domiciliar13 (PAD) pode-se recorrer ao trabalho dessa
equipe.
O atendimento hospitalar, em internamento, é exclusivo para os pacientes
que apresentam sintomas de difícil controle e manejo relatado pela família ou
apresentem sérios problemas que demandem atendimentos diários dos membros
da equipe de saúde.
Independente do tratamento realizado, o paciente e seus familiares devem
ser informados dos riscos que o mesmo apresenta, e o tratamento deve ser com
13
O Programa de Atendimento Domiciliar (PAD) é oferecido para pacientes que necessitam de
cuidado em suas casas. Tem como foco a orientação e a educação continuada para os pacientes,
familiares e cuidadores. São realizadas visitas regulares a pacientes acamados, que não podem se
locomover até uma unidade básica de saúde para receber tratamento. O PAD é oferecido pelos
municípios (alguns) e normalmente atende determinada área de abrangência da Unidade Básica de
Saúde.
33
eles discutido, para que o direito deles de participar ativamente das decisões que
envolvem seu tratamento não seja tolhido. Por outro lado, a falta de entendimento e
de comprometimento de algumas equipes de saúde com os pacientes, de um modo
geral, pode colaborar para o abandono do mesmo na Unidade de Terapia Intensiva
(UTI) e enfermarias dos hospitais.
Por todo o acompanhamento e mesmo após a morte, a comunicação é
elemento fundamental para todos os envolvidos, passando informações de forma
transparente, objetiva e numa linguagem acessível a todos (equipe de
saúde/paciente/família). A importância de falar a verdade sobre o prognóstico está
na possibilidade da resolução de problemas de diferentes ordens (afetivo/
financeiro), da preparação da família para uma nova organização familiar. A
revelação do diagnóstico e do prognóstico pode partir tanto do familiar para o
paciente quanto o inverso, porém primeiro a receber a notícia na maioria das vezes
não é o paciente.
A informação é entendida como direito social, condição para o exercício da
cidadania e para realizar escolhas.
1.6 Abordagem multiprofissional e interdisciplinar em Cuidados Paliativos:
quando a soma das diferenças multiplica os resultados
1.6.1 Equipe multiprofissional
Cabe à equipe de Cuidados Paliativos lidar com a história de vida do
paciente, muito mais do que com a sua doença. Isso implica também lidar com o
imaginário deste e de sua família. Além de instrumentalizá-los a buscar seus
direitos e benefícios sociais adquiridos como portadores de determinadas doenças.
Dentre os profissionais que compõem a equipe de Cuidados Paliativos, o
médico ocupa lugar de destaque por ser portador de uma representação social14
14
“A produção das ideias, das representações, da consciência está, de início, diretamente
entrelaçada com a atividade material e com o intercâmbio material entre os homens, como a
linguagem da vida real. O representar, o pensar, o intercâmbio espiritual dos homens aparece aqui
como a emanação direta de seu comportamento material (...) os homens são produtores de suas
representações, de suas idéias, etc...mas os homens reais, ativos, tal como se acham
condicionados por um determinado desenvolvimento de suas forças produtivas e pelo intercâmbio
que a ele corresponde.” (ENGELS e MARX , 1999, p. 36-37).
34
emblemática. O imaginário social atribuiu ao médico poderes que ele não tem,
como se este fosse um homem (ser humano) munido de “super poderes”, capaz de
driblar e superar a morte. Ao longo do tempo os médicos incorporaram esse ideário
e, muitas vezes se comportam como se fossem “deuses descidos”, e dessa forma
acabaram por adquirir poderes de fato. É no hospital, principalmente, que
demonstram seu poder nas relações de força que estabelecem com os demais,
sejam profissionais de outras categorias, pacientes ou familiares.
Assim, quase sempre o paciente procura o médico com a ideia de que ele
resolverá seu problema, de que ele será seu “salvador”. E quando os “super
poderes” não são suficientes para evitar a morte de um paciente, e isso acontece
com frequência, essa representação de “salvador” muitas vezes já internalizada
pelo médico é tão forte que recai sobre o próprio profissional que se cobra muito e
não reconhece os limites da sua atuação profissional.
Os médicos se sentem desconfortáveis ao lidar com pacientes sem
possibilidade de cura, pois enfrentam a realidade de que seus conhecimentos
médicos e habilidades técnicas nem sempre serão suficientes. A expectativa criada
a partir dessa relação pode levar o profissional à frustração e ao estresse. No
entanto, não raro, como no caso, por exemplo, de uma pessoa que perdeu um ente
querido numa cirurgia, a culpa “do fracasso” recai sobre a equipe ou o hospital, e
não na figura do médico. Percebe-se mesmo nesses casos que a responsabilidade
pela morte não é dirigida diretamente ao médico. As pessoas não se dão conta que
mesmo com o comprometimento total dos profissionais de saúde, eles encontram
limitações na sua prática, inclusive pelas condições de trabalho que lhes são
oferecidas.
Rubem Alves relembra uma cena de infância, a tela de Sir Samuel Luke
Fildes (1844-1927) O médico (1891) enquanto aguardava uma consulta
médica e escreve sobre a relação entre o médico e paciente.
Instrumentos musicais existem não por causa deles mesmos, mas pela
música que podem produzir. Dentro de cada instrumento há uma infinidade
de melodias adormecidas, à espera de que acordem do seu sono. Quando
elas acordam e a música é ouvida, acontece a Beleza e, com a Beleza, a
alegria. O corpo é um delicado instrumento musical. É preciso cuidar dele,
para que ele produza música. Para isso, há uma infinidade de recursos
médicos. E muitos são eficientes. Mas o corpo, esse instrumento estranho,
não se cura só por aquilo que se faz medicamente com ele. Ele precisa
beber a sua própria música. Música é remédio. Se a música do corpo for
feia, ele ficará triste – poderá mesmo até parar de querer viver. Mas se a
música for bela, ele sentirá alegria, e quererá viver. Em outros tempos, os
35
médicos e as enfermeiras sabiam disso. Cuidavam dos remédios e das
intervenções físicas – bons para o corpo – mas tratavam de acender a
chama misteriosa da alegria. Mas essa chama não se acende com poções
químicas. Ela se acende magicamente. Precisa da voz, da escuta, do
olhar, do toque, do sorriso. Médicos e enfermeiras: ao mesmo tempo
técnicos e mágicos, a quem é dada a missão de consertar os instrumentos
e despertar neles a vontade de viver... (ALVES apud Oliveira, 2007, p.95).
Apesar desta forte representação que o médico possui dentro de uma equipe
de Cuidados Paliativos, o relacionamento entre seus membros deverá ser
horizontal, sem a prioridade e hegemonia de uma especialidade sobre outra, nem
de um profissional sobre outro.
Todos os cuidados do doente são realizados por profissionais de diversas
categorias
que
farmacêutico,
visam
terapeuta
atender ao
ocupacional,
sofrimento físico
fisioterapeuta,
(médico,
enfermeira,
nutricionista),
mental
(psiquiatra e psicólogo), social (assistente social) e espiritual (padre, pastor, rabino,
monge budista, espírita etc.). Resumem-se, assim, os papeis de alguns destes:
•
Médico - Especialista em Medicina Paliativa e Terapia da Dor.
•
Enfermeira - Profissional importante da equipe de socorro e manejo da dor.
•
Assistente Social - Elemento importante como elo de ligação entre o
“hospice” ou serviço de saúde, a família, o doente e a comunidade.
Encarrega-se da avaliação social, ambiental e econômica do binômio
doente/família. Fornece informações sobre o território/ comunidade onde o
usuário vive.
•
Psiquiatra e/ou Psicólogo - Profissional que avaliará o perfil psicológico do
paciente, seu estado emocional atual, sua capacidade de enfrentamento da
doença, oferecendo ferramentas para o paciente e familiares para um lidar
mais natural com a situação da finitude de uma vida.
•
Fisioterapeuta - Profissional voltado para a reabilitação do paciente após um
surto de dor incapacitante, estimulação da capacidade funcional residual do
paciente.
•
Farmacêutico - A assistência farmacêutica está sobretudo focada em
informar sobre as disponibilidades dos medicamentos aos demais membros
da equipe, com relação às possibilidades farmacotécnicas e aos aspectos
legais, bem como aos pacientes e familiares, quanto ao uso e ao
36
armazenamento corretos dos medicamentos. Contribui com informações
sobre interações medicamentosas e reações adversas a medicamentos.
•
Terapeuta ocupacional - realiza atividades significativas para os pacientes e
seus familiares; orienta e adapta as Atividades Básicas da Vida Diária,
maximizando a autonomia e independência do paciente; orienta o
posicionamento, a fim de evitar deformidades que aumentem ou causem dor.
Com a progressão da doença, as atividades e recursos terapêuticos são
adaptados de acordo com as possibilidades e interesses do paciente.
•
Cuidador (a) – Principal responsável pelos cuidados do doente, que pode ser
um familiar ou um amigo. Deve ser participante ativo da equipe, embora não
deva ser sobrecarregado de informações e cobranças.
Geralmente o aspecto religioso/espiritual é uma manifestação do próprio
paciente e/ou familiar, embora muitas vezes de maneira indireta. O apoio religioso/
espiritual pode colaborar com o trabalho da equipe de saúde como um todo, visto
que a espiritualidade é uma importante ferramenta para enfrentar determinadas
situações e usá-la sempre que possível pode fortalecer o paciente, independente
da religião à qual seja adepto. De forma que propor o acompanhamento de uma
figura religiosa mais próxima do paciente pode ajudá-lo a enfrentar a própria
terminalidade.
Quando o profissional de saúde atua em Cuidados Paliativos ele passa a
acompanhar o paciente até seu percurso final. O foco da sua prática deixa de ser a
cura e passa a ser o cuidado. Mas, o profissional de saúde não foi preparado para
esse momento na universidade. Por isso, a atenção em relação aos profissionais
de saúde que lidam com pacientes sem possibilidades de cura é necessária. Esse
profissional deverá estar habilitado a lidar com emoções, suas e daqueles com
quem terá que conviver ao longo de sua vida profissional, passar por capacitações
específicas e aperfeiçoar suas habilidades de comunicação.
Em suma, deve-se criar condições para que o profissional se sinta
gratificado com seu trabalho, de forma que possa se sentir
emocionalmente estimulado; que o trabalho possa ser sentido como um
desafio intelectual; que o profissional possa se sentir participando de um
empreendimento socialmente significativo e conseqüentemente valorizado.
Que também se perceba desempenhando papel importante em
experiências humanas; que tenha consciência de suas experiências
37
existenciais também são significativas e que sua experiência profissional é
algo especial (CARVALHO apud Bertachini e Pessini, 2004, p.319).
Todos os dias, os profissionais de saúde estão em contato com a dor, a
angústia, o medo e a solidão. Torna-se imprescindível a discussão com os mesmos
sobre a percepção da representação que tem de suas mortes e seu morrer. Que
sentimentos, fantasias e medos são desencadeados a partir de sua história de vida
e como vivenciam o processo de adoecer e morrer. Todas as organizações e as
instituições de saúde deveriam manter um programa para cuidar de seus
funcionários, para que eles possam cuidar dos pacientes na perspectiva de garantir
a autonomia dos pacientes fora de possibilidades terapêuticas de cura e ou
terminais.
1.6. 2 Interdisciplinaridade
Um dos princípios dos Cuidados Paliativos é a atuação em equipe
interdisciplinar, onde cada profissional, com o seu saber, contribui para o alívio da
dor, independente da sua dimensão, e o preparo para a morte do paciente, mas
ainda é difícil encontrar no cotidiano das instituições de saúde a atuação
interdisciplinar.
O trabalho interdisciplinar exige que os profissionais dialoguem, se
respeitem, e estejam preparados para partilhar suas angústias, preocupações,
inseguranças e fragilidades. Embora nem sempre seja fácil, o esforço garante
resultados melhores e, consequentemente, maior satisfação com o próprio trabalho.
Além do que, evidencia que nenhuma pessoa é capaz de dar todas as respostas
para o enfrentamento das demandas de um paciente em Cuidados Paliativos,
sendo fundamental “ver o todo, não pelo somatório das partes que compõem, mas
pela percepção de que tudo sempre está em tudo, tudo repercute em tudo,
permitindo que o pensamento ocorra com base no diálogo entre as diversas áreas
do saber” (GOULART apud Lima, s.d., s.p.).
A interdisciplinaridade é um instrumento que pode colaborar para a melhoria
do atendimento, ou seja, dar resposta mais qualificada às demandas trazidas pelos
usuários. Mas exige relações horizontais em contraposição à tomada de decisão
38
que sempre vem do alto escalão das instituições e não ouve a equipe como um
todo; disponibilidade; saber lidar com o conhecimento diferente que cada um
possui. Isso implica interdependência disciplinar, trabalhar com as ideias do outro
para que os saberes se complementem. É um exercício de comunicação e relações
interpessoais, sem dúvida um desafio, porque pressupõe uma reavaliação das
relações de poder dentro das instituições.
Para compreender melhor a realidade, a mudança deve ter a direção da
parceria, porque não vivemos sós, porque precisamos do olhar do outro,
porque o outro entende, analisa, vive e observa por um ângulo sempre
diferente do nosso, ampliando nosso próprio olhar (ARNT, 2002, p.74).
Porém, algumas equipes que se propõem a desenvolver uma ação
interdisciplinar ainda estão num primeiro nível de integração do trabalho que é
apenas o nível multiprofissional, caracterizada pela troca de informações. Há uma
dificuldade
em
transitar
pelos
saberes,
mas
na
atuação
das
equipes
interdisciplinares, essa prática deve ser realizada por todas as categorias
profissionais, e se constitui num exercício diário com avanços e recuos.
Desta forma não é mais possível conceber que um atendimento seja só
médico. O atendimento tem que ser interdisciplinar, com a colaboração e
cooperação de diferentes especialidades no exame de um mesmo caso. O ser
humano é o todo, é uma pessoa com inúmeras necessidades e “a ausência da
interdisciplinaridade,
representada
na
fragmentação
dos
dispositivos
das
tecnologias em saúde, pode implicar práticas reificadas” (LEWGOY, MENDES e
SILVEIRA, 2008, p.25).
É relevante atentar para o fato de que os profissionais não podem ser os
únicos responsáveis pela construção de uma prática interdisciplinar, pois para a
sua concretização devem-se levar em consideração as condições objetivas,
materiais, históricas e subjetivas de cada profissional envolvido. Nesta perspectiva,
o livro “Saúde e Serviço Social”
15
organizado por Bravo e outras, traz para a
discussão uma determinada leitura da questão da interdisciplinaridade:
15
2007.
39
Acrescentamos que alguns autores, como Minayo (1994), Frigotto (1995)
e Jantsh & Bianchetti (1995), trazem, para a mesa do debate teórico, a
leitura marxista da interdisciplinaridade, em que está implícita a inclusão
dos determinantes históricos, econômicos, culturais e a fundamentação
ético – política, como elementos constitutivos da totalidade, e em que o
sujeito (profissional de saúde) não pode ser visto como o único
responsável pela desconstrução/ construção de uma prática
interdisciplinar. Devem-se sempre levar em conta as condições objetivas,
históricas, materiais e subjetivas para sua concretização (TEIXEIRA e
NUNES apud Bravo, 2007, p.123).
Um dos desafios da concretização do trabalho interdisciplinar está na
superação do medo por parte de algumas categorias, de perder o prestígio social e
pessoal historicamente construídos e, ainda, a questão da ética profissional, o que
inviabiliza um maior comprometimento dos mesmos com o paciente e a própria
equipe. Destaca-se que muitas vezes os profissionais são atropelados pela
emergência em dar respostas às demandas e acabam subtraindo o privilégio da
reflexão16. Contudo, deve-se manter acesa e renovada a discussão sobre
interdisciplinaridade cuja construção se dá no cotidiano profissional. Nesse tipo de
trabalho, os profissionais de saúde passam a ouvir o paciente e a ter paciência. Na
medida em que a qualidade de vida melhora, os pacientes internados ou que estão
no domicílio demonstram a satisfação pelo atendimento que recebem e os
profissionais se sentem recompensados pelo trabalho realizado.
1.7 O Doente: Autonomia e Dignidade
É através do corpo que toda a fragilidade humana se mostra. A doença
chega com uma série de limitações que podem tirar a autonomia e ferir a dignidade
da pessoa humana.
A doença significa um dano à totalidade da existência. Não é o joelho que
dói. Sou eu, em minha totalidade existencial, que sofro. Portanto, não é
uma parte que está doente, mas é a vida que adoece em suas várias
dimensões: em relação à si mesmo (experimenta os limites da vida
16
O sistema de saúde brasileiro faz com que os profissionais disponham de pouco tempo para ouvir
o seu paciente com atenção e estabelecer com ele uma comunicação adequada. Logo pacientes e
familiares não conseguem espaço para colocar suas dúvidas e aflições, dando margem a fantasias
que dificultam o entendimento do diagnóstico e prognóstico.
40
mortal) em relação com a sociedade (se isola, deixa de trabalhar e tem
que se tratar num centro de saúde), em relação ao sentimento global da
vida (crise na confiança fundamental da vida que se pergunta por que
exatamente eu fiquei doente?) (BOFF, 2000, p.143).
Um pressuposto básico da assistência paliativa é o respeito aos desejos do
paciente e à sua autonomia, importante para se viver e morrer com dignidade. E
quando o doente busca sua própria autonomia significa que ele deseja manter o
controle da situação e espera ser respeitado em suas opções. Para que o paciente
tenha condições de escolha são necessários o esclarecimento das opções
terapêuticas e suas consequências. Além disso, para viver com dignidade é
necessário: manter a privacidade, ter a chance de se expressar, se divertir,
questionar e ter respostas diretas, a oportunidade de ter o melhor controle possível
dos sintomas, tudo isso é parte do que constitui dignidade na vida da pessoa num
programa de Cuidados Paliativos.
A pioneira na abordagem de pacientes no processo de morrer, Elizabeth
Kübler-Ross, fala com propriedade sobre a autonomia nesse momento:
Uma boa morte significa não sofrer e passar por sofrimentos intensos que
faz o paciente clamar contra o mundo. Uma boa morte significa que se
possa escolher onde morrer: caso queira morrer em casa, pode-se morrer
em casa. Uma boa morte significa que se tenha ao lado alguém que
escute e que não nos coloquem na última enfermaria do hospital, longe de
todos, sozinho. Uma boa morte significa que ninguém vai ministrar-me
uma overdose de nada para tirar-me a vida prematuramente: isto é algo
que é contrário a uma lei universal. Morrer com dignidade significa que eu
tenha permissão de morrer com o meu caráter, com minha personalidade,
com meu estilo (apud Figueiredo, s.d., p.107).
E tratando a autonomia como um direito humano universal:
O livre desenvolvimento da personalidade humana está intrinsecamente
ligado à idéia de autonomia do sujeito, de âmbito de autodeterminação
jurídica, pois a liberdade é imprescindível para a materialização dos
direitos de personalidade, para o livre desenvolvimento da pessoa, para
sua dignidade [...] É necessário refletir sobre o grau de autonomia jurídica
que a pessoa tem quanto ao processo de morte. Afastando-se a eutanásia,
a idéia de morte digna permite à pessoa a autodeterminação a respeito
dos últimos momentos de sua vida, com poderes, inclusive, para elaborar
documentos que vinculem terceiros, como no caso do testamento vital. O
41
reconhecimento da autonomia da pessoa quanto a esses momentos é
imprescindível para a garantia de sua dignidade [...] Deve-se compreender
que a dignidade da pessoa humana não é um conceito objetivo, absoluto,
geral, possível de ser abstraído em padrões morais de conduta e a serem
impostos a todas as pessoas. Sem a consideração da alteridade e da
tolerância, ignorando-se a pluralidade e a complexidade da sociedade
atual, o uso do princípio da dignidade humana pode ser usado para a
negação da pessoa, para a homogeneização dos indivíduos e para a
negação da dignidade (BORGES, 2005, s.p.).
Algumas vezes a família não quer que o doente saiba da sua doença e, ao
esconder informações sobre a evolução da mesma, lhe nega a condição de
indivíduo autônomo, capaz de tomar decisões. Portanto, a autonomia só é possível
com a colaboração da família e da equipe paliativista.
Exemplo da perda de autonomia:
O caso de um paciente de 84 anos, semelhante ao que observamos em
centros de tratamento intensivo. Consciente, pediu que não se tentasse
nenhuma intervenção, sentia que “já tinha vivido o suficiente e gostaria de
morrer em paz”.
Entretanto:
Havia tubos por todos os orifícios do seu corpo, todas as atividades vitais
eram realizadas por máquinas, as mãos estavam amarradas, da sua boca
torta saía o tubo do respirador, com seu ruído constante. O único meio de
comunicação que lhe restava eram os olhos, que expressavam profunda
tristeza, e dos quais rolavam lágrimas. Neste caso o processo de morte
não pertence mais à pessoa, tira-se a sua autonomia e sua consciência. O
paciente encontra-se muitas vezes só, porque os horários de visita são
estabelecidos segundo a conveniência do hospital. Perde a noção do dia e
da noite porque a iluminação é sempre igual. Os seus companheiros são
tubos e ruídos de monitores, e não a voz e a imagem dos familiares
(KOVÁCS apud Oliveira, 2007, p.56).
Ainda acontecem situações em que os pacientes na fase final da vida são
isolados numa ala do hospital ou em casa pela família. Esse isolamento faz com
que se sintam inferiores, sem valor e inúteis. Estar doente, na sociedade atual, é o
mesmo que não produzir, sendo isso considerado como vergonhoso e por isso o
doente deve ser escondido, fazendo com que não interfira também na produção
dos familiares e amigos (PITTA, 1999).
O trabalho é uma das dimensões das sociedades contemporâneas que mais
sofre mutações, e se configura como um dos grandes desafios na atualidade. As
repercussões da doença na vida do paciente trabalhador devem ser abordadas
42
com o intuito de tentar traçar estratégias para minimizar seus efeitos. O paciente
pode ter o afastamento, a restrição ou a interrupção do trabalho em consequência
da doença e ainda as limitações do desenvolvimento de diversas atividades do
cotidiano. Na medida em que o corpo fica vulnerável, que é sua força de trabalho,
e, portanto, fonte de subsistência e única estratégia de sobrevivência, retira a
utilidade e o papel social do paciente nesta sociedade. Essa realidade social
espolia expectativas dignas de vida, ao retirar a possibilidade desses sujeitos
pensarem projetos de vida diferentes.
O sofrimento também surge com a evolução da doença, deixa a pessoa cada
vez mais fragilizada e dependente de outras, diminuindo a sua autonomia e ferindo
a sua dignidade. O sentimento de desvalor é uma das principais fontes de
sofrimento.
O prevalecimento da autonomia leva a um novo tipo de relação
médico/paciente, na qual a tomada de decisões passa a ser compartilhada,
deixando de ser exclusiva do médico que, até então, decidia e informava o paciente
sobre as etapas do tratamento, em uma posição paternalista e autoritária,
legitimada pelo saber técnico.
Essa fase era marcada pela perda da autonomia do paciente e sua
submissão ao poder médico. Por se tratar de uma mudança no modelo de tomada
de decisão, os profissionais, os pacientes e os familiares podem ter dificuldades em
assumir os novos papeis atribuídos pela filosofia dos Cuidados Paliativos que
podem ser sanadas dia–a–dia, sendo um desafio a enfrentar. Apesar de parecer
simples, estabelecer esse tipo de relação é de grande complexidade por envolver
relações de poder e por demandar uma relação sujeito-sujeito17.
Assim, quando o quadro clínico permitir, incentiva-se o paciente a realizar o
que ele deseja no momento. Entre as inúmeras histórias de pacientes em Unidades
de Cuidados Paliativos conta-se que casamentos e batizados foram realizados,
além de desejos como comer algo que há muito tempo lhe fora proibido pelo
17
Para Merhy, quando um trabalhador dos serviços encontra-se com o usuário, no interior de um
processo de trabalho, estabelece-se entre eles um espaço mediador que sempre existirá nos seus
encontros, mas só nos seus encontros em ato. No caso dos serviços de saúde, essa mediação é
compartilhada, porque o usuário não é apenas consumidor dos efeitos úteis do trabalho e/ou de
insumos, medicamentos etc., mas é co-participante do processo de trabalho, na medida em que
dele dependem o fornecimento de informações sobre seu estado de saúde e o
cumprimento/aplicação das prescrições médicas e indicações terapêuticas (apud Costa, s.d., 6).
43
médico por ocasião do tratamento. O importante é que esses desejos tenham
significado para o paciente e que reflitam na sua qualidade de vida. De forma que
valorizar a sua autonomia possibilita ao paciente planejar a vida que lhe resta e a
este não perder a sua identidade. Mas tudo isso não acontece sem o apoio e
colaboração da família.
1.8 A Família como Cuidadora Informal
1. 8.1 A família e a equipe de Cuidados Paliativos
A família, independente da sua composição, é a primeira e a mais importante
agência socializadora. É entre as pessoas que as constituem que se estabelecem
vínculos afetivos profundos, positivos ou negativos. A família é fundamental para o
desenvolvimento psíquico do indivíduo e é uma das responsáveis pela transmissão
de normas e valores de caráter mais geral. Ela insere e situa o indivíduo na
sociedade.
Desse modo, quando se cuida de um paciente sem possibilidades de cura
torna-se tão importante olhar para o entorno deste paciente e assistir à sua família,
porque ela faz parte do mesmo. A maneira como o paciente e seus familiares
encaram o tratamento e todos os acontecimentos do processo evolutivo da doença
até a morte, depende da maneira como ele viveu e se relacionou com seus
familiares. Quando ele recebe o diagnóstico de uma doença em estágio avançado e
sem possibilidade de cura, muitas vezes os sentimentos e os comportamentos das
pessoas mudam entre si. No entanto, “nossas atitudes são modificadas a partir de
novas informações, novos afetos ou novos comportamentos ou situações” (BOCK,
FURTADO e TEIXEIRA, 1988, p.112).
O primeiro contato dos familiares com a equipe de saúde molda a forma
como se dará esse relacionamento. A partir daí todo o relacionamento, até o
período de luto será: ótimo, bom, médio ou ruim, podendo até ocorrer, em casos
extremos, o abandono total do hospital, ambulatório ou consultório. Para a equipe o
“cuidador ideal” é aquele que incorpora o ideário dos Cuidados Paliativos.
A assistência aos familiares está associada ao reconhecimento de suas
necessidades, pois a doença crônica afeta a família ao provocar: mudanças na
44
rotina diária; compartilhar responsabilidade por cuidados; experiência de fortes
emoções (culpa, raiva, tristeza, medo, ansiedade e depressão); manter um senso
de vida “normal”, permitindo a integração do paciente na vida familiar sem se sentir
culpado por estar doente. Outro ponto fundamental é a comunicação. É preciso
observar como os membros da família se integram, comunicam, exteriorizam seus
sentimentos tanto entre si como com o doente e a equipe de saúde. Observar
gestos, frases soltas, a divisão da responsabilidade no interesse pelo doente e os
sinais de estresse.
Considerando
a
premissa
dos
Cuidados
Paliativos
sobre
a
desinstitucionalização da morte, a garantia de que o paciente tenha condições de
permanecer em
domicílio
depende
da presença
constante
daquele
que
denominamos “cuidador”, tratando-se na maioria das vezes de um familiar. Entre as
tarefas do cuidador estão: dar banho (às vezes no leito); ministrar medicação na
dose e horários corretos; preparar e dar alimentação adequada; fazer curativos, etc.
Essa pessoa precisa ter estrutura emocional e seguir as orientações dadas pela
equipe de Cuidados Paliativos.
O cotidiano dos familiares é invadido por sentimentos de angústia e pelo
cansaço que devem ser minorados a partir dos resultados do trabalho realizado
pela equipe.
Alguns elementos do trabalho da equipe que dão segurança à família: a
forma delicada de tratar o doente; grau de controle dos sintomas; informação e
educação para melhorar o cuidado; informações sobre a doença e suas
complicações; acessibilidade à equipe de saúde; poder participar de sua
assistência; conhecer como agir em caso de urgência; poder consultar outros
especialistas; saber como acionar os diversos recursos; reconhecimento de seu
trabalho.
Os objetivos da ajuda aos familiares são: satisfazer suas necessidades de
informação; melhorar a comunicação; oferecer segurança; facilitar sua participação
no cuidado; ajudá-los a entender o doente; dar apoio emocional e físico; reduzir
seus medos; facilitar a tomada de decisões; ajudá-los a cuidar de si mesmos e
acompanhá-los na dor e durante o luto.
Entre os pressupostos desse trabalho estão o bom senso, respeito pela
família e o resgate dos seus valores para que a mesma se descubra detentora do
poder e do direito de mudar.
45
Se a tão pregada neutralidade no entendimento da questão que nos é
proposta e no atendimento do paciente é quase utópica em algumas
situações, é imprescindível que toda a equipe conheça e reconheça a
família com quem manterá contato no trato com o paciente. É
imprescindível que a perceba como exatamente é – família real – e não
como gostaríamos que fosse – família ideal. Nem sempre os vínculos
foram formados de maneira satisfatória, nem sempre aquele que está
morrendo “é amado por todos”, nem sempre a família tem condições
adequadas de cuidar, (sejam essas condições financeiras, emocionais,
organizacionais) e nem sempre o paciente quer ser cuidado da forma
como avaliamos como necessária e ideal (ANDRADE, 2008, p.70).
A família de um paciente sem possibilidades de cura procura ajuda dos
serviços de saúde e de seus profissionais com as mais variadas demandas. Entre
as demandas é possível citar o sentimento de culpa, a dificuldade para lidar com
conflitos familiares gerados pela situação vivida em decorrência da doença, a falta
de perspectiva em relação ao futuro, o isolamento social a que ficam sujeitos e
dificuldades de se relacionar e cuidar do seu familiar. Um problema a ser
enfrentado pela família está relacionado à interrupção da capacidade laborativa do
paciente e, consequentemente, alteração na dinâmica familiar com a possibilidade
de mudanças de papéis no âmbito doméstico e do trabalho.
Ante esse complexo cotidiano, acredita-se que as ações direcionadas ao
paciente e sua família devam estruturar-se de modo a favorecer e potencializar as
relações
familiares,
criando
estratégias
mais
eficientes
para
administrar
dificuldades, superando os sentimentos contraditórios e reduzindo o isolamento
social.
A família assume um papel de grande responsabilidade quando o paciente
adere ao programa de Cuidados Paliativos, a responsabilidade de ser cuidadora.
Papel este que exige atenção da equipe de Cuidados Paliativos na medida em que
precisa ser construído e desconstruído mesmo quando há afetividade, pois a perda
da identidade de cuidador vem com o luto quando chega o momento dele
reconstruir sua própria vida.
46
1.8.2 O cuidado: legado familiar?
O cuidar não é um legado familiar na sociedade contemporânea ocidental,
ou seja, as famílias não se organizam para serem cuidadoras. Portanto, é preciso
prestar assistência e equipar seus membros para tal tarefa.
Pois se a convivência familiar e comunitária é tão importante durante toda a
vida, por que não seria no seu fim? Assim, o que impede o cuidado são as relações
que os pacientes estabeleceram com outras pessoas ao longo da vida, ou seja, o
que determina o cuidado é a afetividade, a reciprocidade e a preocupação de
familiares no contexto atual do paciente.
O “cuidar do outro” representa o cerne da cidadania, da solidariedade, do
desprendimento, da doação e do amor como diz um dos mandamentos da Bíblia:
“Amar ao próximo como a ti mesmo.” No entanto, nem sempre é fácil encontrar
essa pessoa, pois são as relações familiares que dão o tom do cuidado e elas nem
sempre são harmônicas. Se o paciente teve bons relacionamentos, ele terá mais
pessoas mobilizadas em torno do seu cuidado. Enfim, depende em boa medida do
legado familiar: você cuida porque viu seus pais cuidarem de seus avós. Quanto
maior a afetividade positiva entre os membros da família, maior será a rede de
apoio. Deve-se trabalhar o afeto entre os membros da família, sem forçá-los.
Trabalhar afeto não é exigir uma alegria ininterrupta. O sentimento é mau
quando impede as pessoas de pensar, de afetar e ser afetado por outros
corpos, mesmo quando seja um afeto alegre. Stuart Mills (1984) já falou
que mais vale um Sócrates triste do que mil suínos alegres. A alegria e o
sofrimento são bons quando corrigem o intelecto e não obscurecem a
crítica social aos adestramentos, bem como as limitações impostas pela
situação de exclusão (SAWAIA, 2007, p.47).
O Serviço Social se preocupa com o cuidador e sua rede de suporte. Os
cuidadores quando bem orientados passam a fazer parte da equipe. No cotidiano,
os cuidadores convivem com expressivo aumento de sobrecarga física (acúmulo de
funções), emocional (sentimentos de medo, culpa e frustração), social (isolamento),
material, financeira e existencial (enfrentamento da própria finitude humana),
notadamente quando a doença do paciente está em estágio avançado
apresentando, portanto, necessidades específicas que devem ser enfocadas e
47
encaminhadas de forma correta. O cansaço do cuidador, familiar leigo ou
profissional de saúde, é uma ocorrência comum e o rodízio de tarefas pode ser
uma estratégia para não sobrecarregar um único membro da família. Por vezes,
acontece com o cuidador, assim como com o paciente, o isolamento social. Diante
de suas atribuições os cuidadores não podem ou não têm ânimo para frequentar
festas, comemorações familiares ou passeios.
Assim, o cuidador não pode modificar a sua vida, porque a vida do doente
não pode ser modificada, pois se trata de cuidar sem a perspectiva de quando esse
cuidado vai terminar. Não pode, muitas vezes: planejar viagens; voltar a estudar;
comprar algo novo. Por outro lado, o cuidador não pode cair na armadilha de
adotar uma postura super protetora diante do paciente, tendendo inclusive a
infantilizá-lo. Algumas orientações podem e devem ser dadas ao cuidador, como: a
necessidade de estabelecer um tempo para si; evitar assumir todos os cuidados,
dividir atribuições; manter-se saudável física e emocionalmente; e, principalmente,
não hesitar em pedir ajuda se algo não estiver bem.
Quando o cuidador apresenta um alto nível de estresse, ele pode ter
atitudes negativas, como descarregá-lo no paciente, e cuidados precisam ser
tomados: reconhecer e não ultrapassar os próprios limites; respeitar a dor do
paciente; estabelecer limites com o paciente; manter o paciente integrado ao
mundo; sair; ouvir música etc.
Essas novas responsabilidades junto com as antigas podem levá-los a
pensar que o que estão fazendo não é suficiente para proporcionar o conforto que o
paciente merece (pode se culpar), sentimentos de impotência e de perda ao
acompanhar o processo de morte de um ente querido, além da reflexão sobre sua
própria finitude, levam o cuidador a vivenciar alto grau estresse. A equipe não deve
exigir a presença constante de qualquer um dos membros da família, pois é muito
desgastante.
1.9 Notas sobre legislação em Cuidados Paliativos
No que se refere à legislação na área da saúde, são várias as leis,
normatizações e decretos que mesmo não sendo específicas em Cuidados
48
Paliativos, abrangem pacientes sem possibilidades de cura; contudo, sua
aplicabilidade ainda é ineficaz.
A publicação do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo de
2008 traz na Parte 5, sobre aspectos contextuais, um item referente à legislação
em Cuidados Paliativos. O texto aponta o temor de sanções legais por parte dos
médicos, que se sentem inseguros a respeito do seu amparo legal no caso de uma
ação judicial resultante de conflitos surgidos no exercício de seu trabalho, na
prestação de Cuidados Paliativos e de uma forma geral com pacientes sem
possibilidade de cura. Uma boa comunicação pode prevenir esse tipo de
ocorrência. De qualquer maneira, o temor do médico baseia-se nos seguintes
aspectos: receio da acusação da prática de eutanásia18 e responsabilidade civil e
penal do médico19.
O novo Código de Ética Médica de 2009 atualizou algumas questões
referentes ao tratamento do paciente com doença em estágio terminal, e pela
primeira vez os Cuidados Paliativos foram incluídos como um princípio
fundamental. É importante para o profissional de saúde, neste caso mais
especificamente para o médico, contar com um respaldo legal para a sua ação
profissional. Definições éticas são importantes quando se precisa lidar com o
processo da morte e do morrer. Portanto, os médicos brasileiros passaram a ter
uma proteção dando a possibilidade de assumir um posicionamento legal no que se
refere a uma abordagem humana efetiva e ética quando se trata da terminalidade.
Destaca-se o Capítulo I, Princípios Fundamentais, que no Item XXII diz: “nas
situações clínicas irreversíveis e terminais, o médico evitará a realização de
procedimentos diagnósticos e terapêuticos desnecessários e propiciará aos
pacientes sob sua atenção todos os cuidados paliativos apropriados”. Ou seja, esse
novo código passa a dizer não também à distanásia20 que é, em poucas palavras, o
não prolongamento do processo de morrer.
18
Ver capítulo 2.
A responsabilidade médica implica risco de dano físico, patrimonial ou moral, com a possibilidade
de configurar-se a presença de culpa. Juridicamente, a culpa se caracteriza por uma ação ou
omissão envolvendo negligência, imprudência ou imperícia, a presença de nexo causal e o dano. No
contexto de Cuidados Paliativos o risco é que se considere, principalmente, a presença de
negligência. Pelo Novo Código Civil, um indivíduo é condenado por ferir os direitos inalienáveis do
ser humano: vida, felicidade e liberdade, devendo compensar a vítima por um eventual erro
cometido (CARVALHO in CREMESP, 2008, p.617).
20
Ver capítulo 2.
19
49
O Capítulo V define a relação médico/paciente/familiares em seu artigo 41,
quando diz ser vedado ao médico abreviar a vida do paciente, ainda que a pedido
deste ou do seu representante legal, sendo destacado no parágrafo único que nos
casos de doença incurável e terminal, o médico deve oferecer todos os Cuidados
Paliativos disponíveis sem empreender ações diagnósticas ou terapêuticas inúteis
ou obstinadas, levando sempre em consideração a vontade do paciente, ou na sua
impossibilidade, a de seu representante legal, reforçando ainda a proibição da
eutanásia.
Tratando-se das portarias que abordam o tema, citam-se as seguintes:
•
Portaria 19/GM (3.1.2002) - institui o Programa Nacional de Assistência à
Dor e Cuidados Paliativos;
•
Portaria 1.318/GM, (23.07.2002) - questão do controle da dor (com a
inclusão de medicamentos adequados para a dispensação pelo Sistema
Único de Saúde;
•
Portaria 472 (24.07.2002) - criação dos Centros de Referência em
Tratamento da Dor Crônica;
•
Portaria SAS/MS 741 (19.12.2005) - criação dos Centros de Assistência de
Alta Complexidade em Oncologia – CACON;
•
Portaria Nº 2.439/GM (08.12.2005) - institui a Política Nacional de Atenção
Oncológica: Promoção, Prevenção, Diagnóstico, Tratamento, Reabilitação e
Cuidados Paliativos de 2005, em processo de implementação.
50
Capítulo 2 - A Sociedade e o Morrer
“A morte pertence à vida, como pertence o nascimento.
O caminhar tanto está em levantar o pé como em
pousá-lo no chão”.
(Tagore)
2. 1 A Representação Social da Morte no Ocidente
Apesar de ser tão certa quanto o nascimento, a morte - a finitude humana - é
a forma pela qual o homem toma consciência de si mesmo, e por consequência se
distingue dos outros animais. “Porém, morrer, é sempre em toda a história da
humanidade, uma experiência radical, assim como nascer” (BURLÁ e PY in
Bertachini e Pessini, 2004, p.126). A dialética vida-morte tem sido uma
preocupação da reflexão humana. Como experiência universal, questões sobre a
morte, seu significado e o que acontece depois são inquietações inerentes a todos
os povos de todas as culturas.
Muitos autores colaboram para o estudo e aprofundamento da filosofia dos
Cuidados Paliativos ao escreverem sobre o enfrentamento da morte, como Philip
Ariès (1977), que ao trazer a História para a discussão da morte no ocidente,
desvela como a sociedade contemporânea evita o pensamento sobre a própria
finitude. Segundo ele, a sociedade assim o faz por dois motivos: um, seria por sua
presença excessiva na vida cotidiana, e outro, a atitude moderna da civilização
tecnicista que recusa a morte (apud Rinaldi, 1996, p.101). Evidencia que a
sociedade moderna pode ter avançado no controle da dor nos doentes, mas recuou
em relação ao isolamento do doente e a família.
Nesse sentido o texto A solidão dos Moribundos (2001), de Nobert Elias21,
trata da questão e diz que essa característica do chamado processo civilizador da
sociedade capitalista (industrial) é reflexo do crescimento do individualismo em que
vigora a atitude de isolar os doentes da vida social, pois a morte é cercada por
sentimentos de constrangimento e tabu. De forma que retrata o comportamento dos
homens diante do fim eminente, homens que ao nascerem já foram sentenciados
21
Sociólogo alemão.
51
com a morte. Refere que as sociedades ditas mais desenvolvidas, em nome de
uma higienização biológica, afastam o doente da família e o alocam em hospitais, e
que a partir deste momento o Estado e todos seus empregados serão
encarregados dos cuidados necessários para com o doente que logo se tornará um
cadáver. A morte deixa de ser pública e é encerrada dentro de instituições,
higienizadas nos Centros de Terapia Intensiva (CTIs), mas vazias de sentimentos e
isoladas.
Elias (2001) ressalta ainda que diante das diferentes formas de lidar com o
fim da vida, a crença de que “os outros podem morrer, menos eu” seria uma forma
de negação da finitude. Negação da transitoriedade humana. Faz uma crítica a
Ariès, pois para ele o historiador entende a história descritivamente e a
interpretação dos fatos não é profunda. Refere ainda que muitas fontes literárias
são os poemas medievais que possivelmente relatavam uma visão idealizada da
vida cortesã e não necessariamente a realidade. Embora não entendesse que na
época medieval a morte fosse um momento tranquilo e calmo, todavia não era
encarada como um absurdo e era mais discutida entre as pessoas.
O modo como a pessoa morre depende em boa medida de que ela tenha
sido capaz de formular objetivos e alcançá-los, de imaginar tarefas e
realizá-las. Depende do quanto a pessoa sente que sua vida foi realizada
e significativa – ou frustrada e sem sentido. As razões desses sentimentos
nem sempre são claras – essa também é uma área também aberta à
pesquisa. Mas quaisquer que sejam as razões, podemos talvez supor que
morrer é mais fácil para aqueles que acredita terem feito a sua parte, mais
difícil para os que sentem terem fracassado na busca de seus objetivos, e
especialmente difícil para aqueles, por mais que sua vida tenha sido bem
sucedida, sentem que sua maneira de morrer é em si mesma sem sentido
(ELIAS, 2001, p.72).
Assim, através dos tempos, a representação social da morte vem sofrendo
alterações. Nas sociedades tradicionais as epidemias eram fatores que
determinavam a morte de crianças por doenças infecciosas, de mulheres por parto
ou mesmo de homens pelas guerras e doenças, como o tétano. As crianças eram
consideradas “anjos”; as mulheres “nobres” por terem lutado pela sobrevivência dos
seus filhos, mesmo sacrificando a sua vida; e o “morto de guerra” um “glorioso”
(SODRÉ, 2005).
52
Naquela época o significado da morte era o da salvação, e a passagem da
vida para a morte deveria ter como autoridade a figura religiosa para abençoar
aquele que estava para morrer. As doenças marcavam a pele do “moribundo” como
sinal da aproximação de sua morte. Ao reconhecer os sinais de sua própria morte,
os amigos e os parentes eram avisados, era o momento de arrependimentos,
despedidas e perdão (SODRÉ, 2005). A morte se dava em casa, na maioria das
vezes com a família ao lado. A casa ficava aberta para que o corpo fosse velado
por todos. O corpo era então velado pela comunidade e as crianças participavam
da cena (ELIAS, 2001). Tudo se dava em torno do “moribundo”, protagonista de
sua despedida da vida (MENEZES, 2004).
A partir do final do século XIX, o desenvolvimento tecnicocientífico propiciado
pelo avanço da medicina contribuiu para a melhoria da qualidade de vida e da
saúde humanas, mas também para estigmatizar a morte, que deixou de ser
encarada como algo natural e passou a ser vista como inimiga a ser vencida a
qualquer custo. Com este avanço foi possível diagnosticar mais precocemente, e
com maior precisão, as doenças existentes e tratá-las adequadamente, pois estão
disponíveis novas e potentes medicações e tecnologias22, aumentando a sobrevida
e a expectativa de vida das pessoas. No entanto, todo este aparato e conhecimento
não tornaram a morte mais digna e sequer menos sofrida (SILVA e SCHRAMM,
2002).
A modernidade transferiu para o hospital o lugar por excelência da espera
da morte. Lugar frio e controlado. A morte no CTI ou no leito hospitalar
transformou-se no emblema da segurança e do controle da sociedade
sobre a vida. A tecnologia médica (a ciência e os aparelhos em geral) é o
principal componente do ambiente social que vigia a morte. Vigiada pela
medicina, a expectativa da morte acontece fora do ambiente cotidiano do
paciente, distante dos símbolos culturais e afetivos com os quais conviveu
durante toda sua vida. O cenário do CTI de um hospital, com as
características de presença intensa da tecnologia/ciência médica, de frieza
das relações sociais – onde as normas são o silêncio, o não incomodar –
tornou-se o ‘tipo ideal’ da morte na sociedade moderna (DRUMMOND,
2004, s.p.).
22
Para citar apenas alguns, temos os medicamentos como anestesia, penicilina, antibióticos,
insulina, levodopa (doença de Parkinson) e imunossupressores (controle da rejeição de
transplantes). Além de aparelhos para exames dos mais simples (raio-x) aos mais sofisticados
(respirador artificial, ressonância magnética e radioterapia).
53
Desse momento em diante, a família passa a delegar os cuidados de seu
moribundo ao médico, o que leva a transferência do mesmo para o hospital. No
entanto, no cotidiano do hospital não são os médicos que lidam com ele, mas os
escalões ditos inferiores, enfermeiros e técnicos de enfermagem, que enfrentam a
situação concreta da morte. Para os médicos, ela é encarada como um fracasso,
que sempre os surpreende. A prática médica é marcada por uma intensa recusa da
morte na sua luta pelo prolongamento da vida.
A morte na sociedade contemporânea, construída sobre o binômio
produção/consumo, passa a significar o fracasso dessa mesma sociedade. Na
medida em que a sociedade contemporânea atribui à saúde o status de bem
econômico e social, atinge a subjetividade e o imaginário do indivíduo ao exaltar o
sucesso de pessoas com corpos esculturais e supostamente saudáveis em
outdoors espalhados por todos os lados. Para os pacientes sem possibilidade de
cura resta, muitas vezes, a convivência com o preconceito e a discriminação de
uma sociedade cujos valores levam ao abandono e ao isolamento do convívio
social desses pacientes, principalmente quando a doença acarreta dificuldades na
vida diária das pessoas. A morte anuncia o fim do consumo do indivíduo morto,
mas ainda no fim derradeiro é transformada em mercadoria de consumo nos
diversos serviços funerários e de sepultamento oferecidos.
A medicalização da morte vem acompanhada de uma profissionalização e
industrialização da prática fúnebre, em que as empresas funerárias,
juntamente com os hospitais, transformam a morte em um negócio
lucrativo. A indústria da morte cobra caro para fazer um trabalho perfeito,
encarregando-se de tudo, desde o fim da agonia até a inumação no
cemitério. Os ritos funerários se tornam discretos e reservados, e os
cemitérios modernos, concebidos como parque, onde o repouso dos
mortos se confunde como retorno à natureza, representam a versão
contemporânea da imposição do silêncio a morte (RINALDI, 1996, p.109).
Essa mesma sociedade industrial não tem lugar para os mortos: são
seres que não produzem, não consomem, não respondem aos seus
condicionantes: não competem, não correm, não ligam para o tempo e
nem para o dinheiro. Os mortos são marginais do sistema a nos lembrar
que, por mais que nos empenhemos no processo competitivo de lutar por
ter, possuir, vencer, um dia seremos um marginal, um despojado...Só há
que negá-los (SANTOS in Martins, 1983, p.23).
O afastamento dos vivos em relação aos moribundos e o silêncio que
gradualmente os envolve continuam depois que chega o fim. Isso pode ser
visto, por exemplo, no tratamento dos cadáveres e no cuidado com as
54
sepulturas. As duas atividades saíram das mãos da família, parentes e
amigos e passaram para especialistas remunerados. A memória da
pessoa morta pode continuar acesa, os corpos mortos e as sepulturas
perderam significação (ELIAS, 2001, p.37).
A discussão do tema no Brasil é mais recente e a coletânea organizada por
José de Souza Martins23, A morte e os mortos na sociedade brasileira (1983), surge
da urgência de tratar a questão da morte e do morrer. Os textos que compõem o
livro foram trabalhos apresentados no Seminário Interdisciplinar (1982) realizado
pelo departamento de Ciências Sociais da Faculdade de Filosofia, Letras e
Ciências Humanas da Universidade de São Paulo (USP). Para ele “o tema da
morte é um tema interditado, banido, nos centros urbanos e nas regiões “mais
cultas” e desenvolvidas da sociedade brasileira” (1983, p.9). Coloca ainda que a
incapacidade de lidar com os doentes que podem morrer fazem com que para alívio
da própria consciência, estes sejam internados em hospitais onde pelo menos a
agonia e a morte serão limpas, higiênicas e técnicas, embora solitárias e
desumanas.
Todos os avanços conquistados levaram a sociedade a uma espécie de
delírio de imortalidade que se quer associar ainda à possibilidade da juventude
eterna. Hoje é tabu falar sobre a morte, como era tabu falar sobre sexo há algumas
décadas.
O pensamento de um mundo onde a organização artificial asseguraria o
prolongamento da vida humana evoca a possibilidade de um pesadelo,
sem deixar entrever nada além de uma pequena demora. No fim, a morte
estará lá, convocada pela multiplicação, pelo excesso da vida (BATAILLE
apud Rinaldi, 1996, p.119).
Trata-se de um fato irrefutável perante nossos sentidos imediatos: todos
os seres vivos, inclusive os humanos, morrem. Morrem porque são vivos,
porque como sistemas irreversíveis são “programados” biologicamente
para morrer e, talvez, devam morrer para que outros seres da mesma
espécie possam vir a ser (SCHRAMM, 2002, p.17).
23
Escritor e sociólogo brasileiro. Professor Emérito (2008) e Professor Titular aposentado do
Departamento de Sociologia da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da Universidade
de São Paulo (FFLCH-USP).
55
Para o oncologista clínico do Hospital Brigadeiro em São Paulo, e atual
presidente da ABCP, Ricardo Camponero:
O diagnóstico de uma doença grave quebra a idéia de invulnerabilidade
que criamos para afastar o medo natural da morte. O que era velado,
reprimido, torna-se explícito. A morte certa, mas “interdita”, torna-se
revelada, prenunciada. Neste contexto, o diagnóstico de uma só torna
explícito, embora antecipado, o que ocorreria normalmente (2008, p.12).
Assim, os Cuidados Paliativos tem como proposta provocar uma mudança
na forma dos profissionais da saúde e da sociedade em geral lidarem com a morte.
Emergem em contraposição à “morte moderna”, caracterizada pela negação, pela
irritação e pelo medo. Esse tipo de morte leva, muitas vezes, à chamada “morte
social”, que antecede a morte biológica e ocorre quando os profissionais de saúde
e/ou familiares tratam o doente como se ele já estivesse morto. Como disse o velho
professor a seu aluno: “Todo mundo vai morrer – disse Morrie -, mas ninguém
acredita (...). Saber que se vai morrer e preparar-se para receber a morte a
qualquer momento. Assim é melhor. Assim podemos ficar mais envolvidos com a
vida que vivemos” (ALBOM, 1998, p.83-84).
Surge, então, o modelo da “boa morte”, que valoriza a subjetividade, a
sensibilidade, a receptividade, a relação interpessoal e a expressão das emoções,
valores
tradicionalmente
associados
desaparecendo ao longo dos anos.
ao
universo
feminino,
e
que
vem
56
2.2 A Contribuição da Tanatologia para o Entendimento do Processo da Morte
e do Morrer
Uma figura humana extraordinária e referência na área foi a psiquiatra suíça
radicada nos EUA, Elizabeth Kübler-Ross, que junto com a inglesa Cecily Saunders
mudou o curso da medicina ao estabelecerem as bases da humanização do ato
médico, ainda nos anos de 1960.
O trabalho da psiquiatra nos EUA (SILVA apud Bertachini e Pessini, 2004,
p.265) facilitou a comunicação com os pacientes terminais, pois aproximou o
entendimento de como as pessoas agem diante de um processo de perda grande;
não só as pessoas, mas os seus familiares e a equipe de saúde. Kübler-Ross é
considerada fundadora da Tanatologia, ou seja, do estudo da morte. Ao escutar os
moribundos aprendeu com eles a conhecer a psicologia e a espiritualidade do
processo do morrer. Em 1969, escreveu seu livro mais importante e que causou
grande impacto na área dos cuidados de saúde, e ainda hoje tem grande
repercussão, “On Death and Dying” (Sobre a Morte e o Morrer), em que fala dos
estágios pelos quais as pessoas passam quando estão na fase final de vida. Ela
identificou 05 estágios do processo de morte e morrer: negação, raiva, barganha,
depressão e aceitação. Kübler-Ross, “talvez eu queira dizer o seguinte: podemos
ajudá-los a morrer, tentando ajudá-los a viver, em vez de deixar que vegetem de
forma desumana” (1987 p.33).
Em caso de morte súbita a pessoa, obviamente, não passa pelos estágios,
mas os familiares passam por eles, pois o luto será sentido após a morte do
paciente. Mas os pacientes que passam por um processo de morte até seus
derradeiros momentos finais apresentam, senão todos, alguns desses estágios.
Contudo, o comportamento de alguns doentes expressará a forma como a família
enfrentou a questão da morte durante a vida. Há os que fazem todo o processo de
maneira natural, outros se prendem a determinado estágio e lá ficam até o final,
alguns ainda após atravessar um estágio regridem a um estágio anterior e,
posteriormente, continuam no processo de evolução psíquica. A duração de cada
estágio é variável e eles podem aparecer simultaneamente. Os estágios são
mantidos por mecanismos de defesa e de luta que possibilitam ao doente o
enfrentamento de situações de extrema dor psíquica.
57
2.2.1 Estágio de Negação e Isolamento
A negação é característica da fase de primeiro contato do doente com a
doença. É seguida de falas como: “Não, não pode ser comigo” (PIERRE, 1998,
p.56). Esta fase demonstra o pouco preparo emocional do doente para a morte.
Raramente vemos a morte como um fechamento do ciclo vital, necessário, inclusive
à sobrevivência da espécie. A informações passadas ao doente podem ter, então,
maior ou menor aceitação, depende muito do modo de abordagem pelo
profissional. Para não assumir sua doença os pacientes podem usar como
estratégia a possibilidade de ter ocorrido a troca de exames e que estes com
resultados tão negativos não pertencem a ele. Assim, “a negação funciona como
um pára-choque depois de notícias inesperadas e chocantes, deixando que o
paciente se recupere com o tempo, mobilizando outras medidas menos radicais”
(KÜBLER-ROSS , 1987, p.50).
A negação é usada como um mecanismo de defesa por quase todos os
pacientes. Contudo, a própria doença mostrará a realidade fazendo com que o
doente possa, lentamente, a seu próprio tempo, perceber a verdade imutável.
Tentar convencê-lo racionalmente seria contraproducente neste momento.
A negação acontece com a família também, o que pode refletir no direito de
escolha do paciente, sem levar em conta que a própria doença já lhe traz vários
medos e privações.
É nesse estágio que o profissional deve estabelecer uma comunicação clara,
real e horizontal com o doente sobre o diagnóstico, de modo sereno e esperançoso
sem, contudo, negar a morte. A equipe de saúde precisa estar atenta aos sinais
emitidos pelo doente para ajudá-lo no confronto da realidade, o que pode ser
conseguido se o profissional tiver a capacidade de inverter seu papel com o doente
que está à sua frente.
Enquanto o paciente nega a doença, normalmente os profissionais de saúde
recorrem ao isolamento à medida que a doença progride. Evitam entrar no quarto
do paciente e justificam o afastamento dizendo que o paciente está muito confuso
para entender sua real situação, ou que não saberia o que dizer.
58
2.2.2 Estágio da Raiva
Surge no momento em que a negação não é mais possível de ser mantida e
o paciente admite que não foi engano e está doente. A raiva é caracterizada por
expressões como: “Por que eu?” (KÜBLER-ROSS, 1987, p.61).
Assim, à medida que a realidade vai se configurando, o doente passa a
experimentar novos sentimentos e, inconformado com a realidade, torna-se hostil e
agressivo ao meio que o cerca e a Deus. Nada está certo ou bom o suficiente, as
críticas se voltam a todos, profissionais e familiares, num processo de
transferência.
Sente-se impotente diante da produtividade e potencialidade de todos. Tudo
que emane vida será por ele atacado e invejado. Surge o ressentimento e a revolta,
pois acredita que sua morte é uma sentença de execução por culpas ocorridas
durante a vida.
2.2.3 Estágio da Barganha
É quando o doente tenta negociar a sua vida, para adiar de alguma maneira
o momento final. Estabelece acordos com as figuras que lhe representam
onipotência e supremacia, e que em sua imaginação tem o poder do bem sobre o
mal, da vida sobre a morte, como o médico, Deus, curandeiros, entre outros.
O paciente em fase terminal acredita na possibilidade de ser recompensado
por um bom comportamento e receber um prêmio. Por desejar mais tempo de vida
e dias sem dor está disposto a fazer o que não conseguiu até então. Faz toda sorte
de promessas com todos que puderem resolver seu problema de saúde.
Promessas estas que nunca serão cumpridas, pois a doença a cada dia deixará o
doente mais debilitado, avisando que a morte está chegando. Por exemplo, um
fumante diagnosticado com câncer de pulmão que promete parar com o vício na
expectativa de alcançar tais desejos.
Trata-se de um mecanismo de luta, esperança de cura e prolongamento da
vida. O comportamento do doente muda, ele torna-se aparentemente resignado,
esperando o restabelecimento da sua saúde.
É preciso trabalhar as culpas do doente e fazê-lo ver que não está sendo
punido por estar morrendo, uma vez que a morte faz parte da vida.
59
2.2.4 Estágio da Depressão
Neste estágio o agravamento da doença se faz mais presente. É um estágio
de percepção da perda iminente, a angústia e a introspecção aumentam, e a dor
psíquica é imensa. É o início do fim. Sentimentos de insegurança, tristeza e perda
retornam com maior intensidade. Este estágio estabelece-se após o doente
perceber que seu corpo está muito mais debilitado.
Pode ser observado em duas fases distintas: depressão relativa às
perdas reais, onde o doente está sentindo a perda iminente da vida e dos entes
queridos, passando a se preocupar com o que virá e isola-se. Nesta fase há
necessidade de continuar mostrando a utilidade do doente e que, independente da
doença que tem, ele precisa continuar produzindo o que for capaz. Já na fase de
depressão preparatória, em que a debilidade do doente é intensa e quase
paralisante, são ineficazes o encorajamento e o estímulo, pois ele necessita ser
ouvido, só ouvido, no que ainda não conseguiu expressar (KÜBLER-ROSS, 1987).
Geralmente neste momento aparecem os maiores encargos financeiros, pois
acontece a diminuição da capacidade laborativa e possivelmente a perda do
emprego, principalmente se não estiver inserido formalmente no mercado de
trabalho.
2.2.5 Estágio da Aceitação
O doente, nesse estágio, tem uma necessidade enorme de perdoar e ser
perdoado pelos outros e, até mais, por ele mesmo. Deve ter tido a oportunidade de
exteriorizar seus sentimentos e vontades, organizar a vida de maneira tal que
possa até partir com um certo grau de serenidade. Muitos esperam resolver
questões familiares, sociais, econômicas, espirituais.
“Um paciente que tiver tido o tempo necessário (isto é, que não tiver tido
uma morte súbita e inesperada) e tiver recebido alguma ajuda para
superar tudo conforme descrevemos anteriormente, atingirá um estágio
em que não mais sentirá depressão nem raiva quanto a seu “destino” terá
podido externar seus sentimentos, sua inveja pelos vivos e sadios e sua
raiva por aqueles que não são obrigados a enfrentar a morte tão cedo.
Terá lamentado a perda iminente de pessoas e lugares queridos e
contemplará seu fim próximo com um certo grau de tranquila expectativa.
Estará cansado e bastante fraco, na maioria dos casos” (KÜBLER-ROSS,
1987, p.119).
60
Como seu corpo está mais fraco e cansado, sente uma necessidade intensa
de dormir. Seu interesse pelas pessoas, objetos e assuntos diminui drasticamente.
Além disso, o corpo fragilizado pela doença se torna fonte de incerteza.
Contudo, não se pode confundir aceitação com felicidade, pois por mais que
haja aceitação não é da natureza humana aceitar a morte sem deixar uma ponta de
esperança. Ou seja, a aceitação da morte não significa perder a esperança de vida,
nem acomodação diante da morte. Significa, antes sim, não mais temer ou se
angustiar. É o aprendizado, o desinvestimento afetivo, aprender que é preciso
deixar as pessoas que se ama. O sentido de morrer é modificado e ao profissional
cabe fazer o doente sentir que está ao seu lado até o fim, que não será
abandonado. A pessoa que morre neste estágio morre sem grandes medos ou
desespero, reconhecendo que não podia resistir por mais tempo. Todavia,
independente do estágio a única coisa que está presente em todos os momentos é
a esperança.
2.2.6 Luto
No mundo contemporâneo, o apagamento do luto está relacionado à
tentativa de eliminar a dor; o comportamento do enlutado é marcado pela discrição
e pelo autocontrole. O luto é entendido como uma experiência de resposta ao
rompimento de um vínculo. É um processo individual que começa dias após a
partida do familiar ou amigo, pessoas com as quais mantém relações afetivas
significativas. No entanto, o luto é necessário como forma de reconhecimento da
perda, abrindo a possibilidade de estabelecimento de novos vínculos (RINALDI,
1996).
Como o diagnóstico, o luto também não começa de forma abrupta, com a
morte. O processo de luto se inicia com a imaginação, ou constatação, de
que a morte é uma potencialidade real. Nessas circunstâncias, não só as
pessoas próximas desenvolvem reações de enlutamento frente ao doente,
mas este também desenvolve uma reação de “luto invertido” composta
basicamente pela elaboração das suas próprias perdas, e pela elaboração
das mudanças no vínculo com o outro (CAPONERO, 2008, p.12).
Quando ocorre rompimento de um vínculo, o luto deve ser considerado um
processo natural e esperado. A pessoa que está vivenciando o luto passa por uma
61
fase de entorpecimento, saudade, alguns se desorganizam e se desesperam, mas
devem voltar a se reorganizar. O luto envolve tarefas como aceitar a realidade da
morte, vivenciar o pesar, ajustar-se a um meio no qual o falecido não mais se
encontra e retirar energia emocional e reinvesti-la em outra relação (FRANCO in
CREMESP, 2008).
2.3 A Questão da Morte e os Profissionais da Saúde
A morte coloca-nos diante do misterioso e ninguém gosta de não saber onde
está “pisando”. Para os profissionais da área de saúde, diferente das pessoas em
geral, a morte faz parte do trabalho diário. Considerando a representação que lhe é
atribuída e já tratada anteriormente, o que levaria um estudante escolher a saúde
como área profissional onde estaria em contato com um assunto considerado tabu?
Feifel, após realizar pesquisa com médicos, estudantes de medicina, pacientes e
indivíduos sadios, verificou que os médicos tem um medo maior da morte e que
poderiam estar buscando, na sua futura profissão, uma forma de controle e domínio
sobre ela (KOVÁCS, 1992).
Ao se deparar com o medo da morte, segundo Kastenbeum, é preciso
considerá-lo sobre duas concepções: a morte do outro – o medo do abandono,
envolvendo a consciência da ausência e da separação; e a própria morte – a
consciência da própria finitude, a fantasia de como será o fim e quando ocorrerá.
Pensar sobre sua morte está relacionado com: o medo da morte, o medo do que
vem após a morte e o medo da extinção (KOVÁCS, 1992).
Trabalhar com pacientes sem possibilidades de cura é um exercício diário de
coragem, mas também de autoconhecimento. Para Kübler-Ross atuar junto a esses
pacientes é um grande aprendizado:
A equipe hospitalar, os médicos, as enfermeiras, os assistentes sociais, os
capelães não sabem o que perdem evitando esses pacientes. Se estamos
interessados no comportamento humano, nas adaptações e nas defesas
de que os seres humanos lançam mão para enfrentar essas dificuldades,
não existe melhor lugar para aprender. Ficando lado a lado, ouvindo,
retornando mais vezes, mesmo que o paciente não tenha vontade de falar
no primeiro ou no segundo encontro, logo se desenvolve um sentimento de
confiança pelo fato de se encontrar ali alguém solícito, disponível e
assíduo (1987, p.50).
62
E para Montigny, “cuidar de doentes terminais pode ser uma aventura e
requerer dos profissionais novas forças, trabalho com o inesperado, com fantasias
de imortalidade, com o desejo de sobrevivência e com a sobrevivência dos desejos”
(apud Bifulco, 2006, p.165).
No Brasil, o grande incentivador e um dos precursores dos Cuidados
Paliativos, o Professor Dr. Marco Tullio de Assis Figueiredo, Ex-Chefe do
Ambulatório de Cuidados Paliativos da Universidade Federal de São Paulo
(UNIFESP) – Escola Paulista de Medicina - lutou pela implantação da disciplina de
Cuidados Paliativos na graduação dos profissionais de saúde, e junto com outros
profissionais ministrou cursos sobre o tema para alunos de diversas áreas. Ele
também motivou outros médicos a criarem unidades de Cuidados Paliativos.
Sempre eloquente, conclui um de seus artigos com a seguinte frase: “eu não nutro
a ilusão que os alunos irão trabalhar em Cuidados Paliativos, mas eu tenho certeza
de que eles serão melhores profissionais qualquer que seja a especialidade que
venham a abraçar, mas acima de tudo eu acredito que eles serão melhores seres
humanos” (s.d., p.35).
A visão do professor remete ao fato de que a questão da morte não é
assunto que deva ser abordado exclusivamente no meio acadêmico com o objetivo
de formar profissionais mais capacitados para enfrentar a finitude, mas que esta é
uma questão mais ampla devendo ser levada a toda sociedade, acreditando que a
educação para a morte contribuirá para a formação de seres humanos melhores.
Santos (in Martins, 1983) realizou uma pesquisa com 42 enfermeiras de um
Hospital-Escola para entender como os profissionais de saúde enfrentam/negam a
morte. Essa dualidade, segundo ela, é mais visível nos profissionais de saúde. No
estudo aponta que os sentimentos mais comuns são: a impotência, quando
ocorrem as mortes consideradas antinaturais (crianças e jovens adultos); culpa, por
“enganar” o paciente na medida em que não podem contar o que os médicos ainda
não contaram e precisam muitas vezes utilizar de saídas evasivas diante dos
questionamentos dos pacientes; e raiva em decorrência dos outros dois, pois não
podem prescrever medicação, por terem que permanecer com o paciente enquanto
o médico foge do local do luto.
Os dados também expressaram, sob a ótica das enfermeiras, que entre o
comportamento de evasão dos médicos diante da negação da morte estão: o
comunicado da morte, delegado ao serviço de controle de leitos, ao funcionário
63
administrativo ou ao Serviço Social; dificuldade de falar sobre quaisquer resultados
negativos, como diagnóstico de um câncer inoperável; afastamento do paciente.
Quando aborda o significado da morte, esta é vista sob dois aspectos: a morte
como ruptura do vínculo, pois para profissionais comprometidos com uma formação
humanista a morte de um paciente é o rompimento de um vínculo, e os
profissionais não estão preparados para isso, na medida em que o hospital não
interna pessoas, interna casos. O segundo aspecto trata a morte como fracasso,
pois a formação organicista da enfermeira é mais forte e a equipe de saúde da qual
faz parte tem por objetivo lutar contra a morte (SANTOS in Martins, 1983).
Já Consorte (in Martins, 1983) na mesma publicação discute a morte na
prática médica. A prática médica está voltada para a vida, sendo que esta e não a
morte se coloca no centro das preocupações dos médicos. Assim, o contato com o
paciente cessa quando cessa a vida. De forma que as únicas circunstâncias em
que os médicos admitem a morte são as salas de anatomia e de necropsia, porque
ali estão a serviço da vida. Como as enfermeiras, a reação dos médicos diante da
morte depende de algumas variáveis como a idade do morto, a circunstância da
morte e o grau de envolvimento com o paciente. A respeito da representação social
emblemática que possuem, diz que o médico é visto “como profissional capaz de
eludir a morte, salvando vidas, restituindo a saúde e aliviando sofrimento que, na
opinião dos médicos, a sua imagem se forma na mente dos que os procuram. Nós
diremos, na deles próprios também” (CONSORTE in Martins, 1983, p.44).
Para o profissional de saúde, o luto também pode ser sentido e vivido da
mesma forma como pela família, pois é sabido que por vezes há pacientes
especiais, entre os pacientes que acompanha, com os quais se estabelece uma
relação diferenciada. É um luto que precisa ser admitido, reconhecido e vivido em
sua totalidade, como um luto que tivesse ocorrido em outra situação. Caso
contrário, coloca o profissional no mesmo estado de estresse tanto quanto qualquer
outra pessoa que tenha sofrido um luto, fora do contexto hospitalar, e que tenha se
munido de mecanismos de defesa para se proteger da dor dessa perda. A
instituição hospitalar precisa oferecer recursos para o profissional contar com o
apoio dos pares e da instituição em situações de luto.
64
2.4 Obstinação Terapêutica: o Cuidado em seu Excesso
Talvez a pergunta mais angustiante para o médico seja: o que fazer quando
um paciente não tem mais possibilidade de cura? Num primeiro momento vem com
ímpeto o comprometimento em curar o doente custe o que custar, mas aí está o
problema, porque o “custe o que custar” nem sempre compensa o sofrimento.
Entram em questão os limites do poder humano sobre o próprio processo de morte
e morrer.
O avanço da tecnologia na área da saúde, tanto em relação ao avanço de
novos equipamentos hospitalares que contam cada vez mais com instrumentos
capazes de realizar diagnósticos mais precisos, quanto ao surgimento de novos
medicamentos desenvolvidos pela indústria farmacêutica impacta profundamente
na prática médica, principalmente na direção da obstinação terapêutica24, da
abordagem de um cuidado em excesso. O médico francês Jean-Robert Debray
conceituou a obstinação terapêutica como sendo "o comportamento médico que
consiste em utilizar processos terapêuticos cujo efeito é mais nocivo do que os
efeitos do mal a curar, ou inútil, porque a cura é impossível e o benefício esperado,
é menor que os inconvenientes previsíveis" (apud Pessini, sd, s.p.). Assim, refere à
oposição do uso continuado e a qualquer preço da tecnologia para a manutenção
da vida com o prolongamento dos sistemas vitais biológicos e o retardo da morte
em pacientes sem possibilidade de cura, negando o princípio ético de nãomaleficência.
Muitas vezes ações que remetem à obstinação terapêutica partem da própria
família que quer seu parente curado; e por mais que se explique que não há mais
possibilidade de cura, esta exige que o paciente seja submetido a todos os
tratamentos possíveis. Assim, a família acaba agindo como potencializadora de
tratamentos fúteis. Revelando também que no cotidiano das instituições de saúde o
entendimento de que o paciente deve ter autonomia sobre seu tratamento ainda
não é um consenso, pois ainda há pressão de médicos, familiares e da própria
24
Foram encontrados os termos distanásia e futilidade terapêutica como termos equivalentes à
obstinação terapêutica. Existe uma discussão com relação ao uso do termo obstinação terapêutica,
mas como este não é o foco deste estudo entende-se ser desnecessário entrar no mérito da
questão. De qualquer forma o uso do termo é relativamente recente e circunscrito ao meio
acadêmico científico e à área da saúde.
65
sociedade para que o paciente não tome a decisão de parar o tratamento, mesmo
que seu quadro clínico não apresente melhora.
A princípio talvez nunca se pensaria que o excesso de cuidado pudesse ser
um problema, tendo portanto um aspecto negativo. Ao longo dos anos, muitos
profissionais de saúde passaram a se questionar sobre a validade, ou melhor, a
efetividade do ato de submeter pacientes sem possibilidade de cura a todo tipo de
terapia disponível. A lógica é bem simples: nenhum tratamento pode ser mais
desconfortável para o doente do que a própria doença. Em consequência, cada vez
se amplia a discussão sobre a ortotanásia vista como uma possibilidade entre a
eutanásia e a obstinação terapêutica:
Palavra vinda do grego “orto” – correta – e “thanatos” – morte, que
significa a morte no tempo certo, sem abreviação nem prolongamentos
precários e penosos da vida, sem, contudo, interromper os cuidados
normais, ordinários aos doentes. Neste sentido a ortotanásia parece
estimular a humanização da morte e o alívio das dores, sem obrigar o uso
de medidas abusivas que levem a um aumento de sofrimentos adicionais
e inúteis (SCHRAMM e SILVA, 2002, p.23).
Enquanto a eutanásia se constitui em “um ato médico que tem como
finalidade eliminar a dor e a indignidade na doença crônica e no morrer eliminando
o portador da dor” (PESSINI apud Machado et alii., 2007, p.34), a ortotanásia não
abrevia a vida do paciente, mas o ajuda a vivê-la até o fim com a melhor qualidade
de vida possível. Ou seja,
Podemos inferir que os cuidados paliativos pretendem se constituir num
campo onde seja possível a conciliação entre os princípios da sacralidade
da vida e da qualidade da vida, ou seja, "os cuidados paliativos talvez
delineiam uma espécie de justo meio constituído pela preocupação de
responder ao chamamento do outro e ao mesmo tempo sem expropriá-lo
da experiência fundamental de seu morrer (SCHRAMM apud Floriani e
Schramm, 2008, p.2130).
Borges (2005, s.p) trata da questão ao abordar o biodireito brasileiro:
66
[...] o fundamento jurídico e ético do direito à morte digna é a dignidade da
pessoa humana. O prolongamento artificial do processo de morte é
alienante, retira a subjetividade da pessoa e atenta contra sua dignidade
enquanto sujeito de direito (...) O direito de morrer dignamente não deve
ser confundido com direito à morte. O direito de morrer dignamente é a
reivindicação por vários direitos e situações jurídicas, como a dignidade
da pessoa, a liberdade, a autonomia, a consciência, os direitos de
personalidade. Refere-se ao desejo de se ter uma morte natural,
humanizada, sem o prolongamento da agonia por parte de um tratamento
inútil.
Entre as primeiras discussões nessa direção estão as sucessivas alterações
do conceito de morte (clínica) que foram desvelando o limite da intervenção médica
nos pacientes, pois nem todos os pacientes se beneficiarão de qualquer
tratamento. Tradicionalmente, nos anos 1980 considerava-se morte clínica como
ausência das funções cardiorrespiratórias e, a partir do final da década de 1990,
passou-se a adotar o critério de morte cerebral, resultante da parada das funções
cerebrais; mais especificamente o de morte encefálica (cortical ou neocortical) por
cessação permanente da atividade do tronco cerebral (SILVA e SCHRAMM, 2007).
O questionamento acerca de até onde a vida deve ser prolongada artificialmente
tem provocado nos médicos novas reflexões sobre o valor ético da sua prática,
particularmente aquela sobre uma terapia que possa conduzir à questionável
obstinação terapêutica (SILVA e SCHRAMM, 2007).
Contudo, há que se questionar como é determinada a futilidade de uma
terapia médica. Silva e Schramm referem-se à existência de dois critérios aceitos: o
primeiro diz respeito ao tratamento que não altera as variáveis fisiológicas do
paciente; o segundo refere-se à aplicação de critérios estatísticos e considera que
um tratamento é fútil ao alcançar menos de 1% de chance de sucesso curativo
(2007).
2.5 Educação para a Morte
A questão da educação para a morte ainda é um tabu na sociedade; em
geral as pessoas relutam em discutir o tema. Para Maria Júlia Kovács, psicóloga autora de vários livros sobre o assunto e coordenadora do Instituto de Psicologia da
USP, que mantém o Laboratório de Estudos Sobre a Morte: “A morte está
67
escancarada em nossa sociedade, é uma realidade presente na vida de todos. Nos
telejornais, nas revistas, nas ruas. E, estranhamente, pouco se discute o assunto,
as pessoas têm dificuldade de falar disso (...). As pessoas querem ler sobre as
mortes quando elas estão bem longe, quando acontecem com o outro” (KOVÁCS
apud Klein, 2007, p.22).
Se as pessoas conversassem em casa, na escola e buscassem mais
informações sobre a morte, estariam mais preparadas para acompanhar um ente
querido no seu processo de morte e vivenciariam o luto plenamente para superar o
sofrimento. Apesar da postura dos pais de tentar afastar os filhos de qualquer tipo
de sofrimento mesmo quando esta vivência é necessária para o próprio
desenvolvimento humano. Não é saudável pular etapas no processo de luto porque
cedo ou tarde todos passarão pela experiência da morte de uma pessoa próxima e
terá que lidar com a situação.
A morte não é terrível. Passa-se ao sono e o mundo desaparece – se tudo
correr bem. Terrível pode ser a dor dos moribundos, terrível também a
perda sofrida pelos vivos quando morre uma pessoa amada. Não há cura
conhecida. Somos partes uns dos outros. Fantasias individuais e coletivas
em torno da morte são freqüentemente assustadoras. Como resultados,
muitas pessoas, especialmente ao envelhecerem, vivem secreta ou
abertamente em constante terror da morte. O sofrimento causado dessas
fantasias e pelo medo da morte que engendram pode ser tão intenso
quanto a dor física de um corpo em deterioração. Aplacar esses terrores,
opor-lhes a simples realidade de uma vida finita, é uma tarefa que ainda
temos pela frente (...) E o constrangimento social, o véu de desconforto
que freqüentemente cerca a esfera da morte em nossos dias é de pouca
ajuda. Talvez devêssemos falar mais aberta e claramente sobre a morte,
mesmo que seja deixando de apresentá-la como um mistério. A morte não
tem segredos. Não abre portas (ELIAS, 2001, p.76 – 77).
É preciso coragem por parte dos pais para enfrentar o medo que surge da
reflexão da própria finitude e falarem com naturalidade sobre a morte com seus
filhos, até para que a mesma seja vista como algo inerente ao ser humano porque
“não há nada de errado em morrer quando as causas amadurecem” (CÉSAR in
Figueiredo, s.d., p.7).
A educação para a morte começaria na escola, com crianças a partir dos 6
anos (idade em que se inicia a compreensão de que a morte é irreversível) e seria
discutida de forma interdisciplinar. Explicar que a pessoa não está mais entre nós,
68
que fará falta, que se pode sentir saudade e lembrar dela na memória, nas fotos.
Os pais podem ter como facilitadores para essa difícil e necessária tarefa estórias e
filmes infantis, assim como, estórias em quadrinhos que por vezes em seus
enredos abordam o tema (KOVÁCS apud Klein, 2007, p.22).
As escolas ocupam um papel importantíssimo sendo necessária, portanto, a
instrumentalização do seu corpo técnico-pedagógico e funcionários. Estes devem
estar preparados para falar sobre o tema e para facilitar a expressão e elaboração
no caso de vivência de uma perda e luto por um aluno. O papel neste caso é de
não contribuir para a negação e formação de indivíduos que não sabem lidar com
perdas e crises. Na civilização ocidental moderna as crianças não participam das
cerimônias de despedida (velórios) e a morte de um familiar é ocultada, sendo
normalmente utilizados para justificar o “desaparecimento” da pessoa termos como
“foi viajar para longe” ou “virou uma estrelinha no céu”. Porém, cedo ou tarde elas
perceberão que a ausência será permanente.
Moritz (2005) em seu artigo “Os profissionais de saúde diante da morte e do
morrer” escreve que os adultos, ao não falarem sobre a finitude humana com suas
crianças, perdem grande oportunidade, pois deixar que a morte penetre no mundo
infantil é uma preparação gradual, um incentivo para que a encarem como parte da
vida, ou seja, da condição humana - uma experiência que pode ajudá-las a crescer
e amadurecer.
Essa formação deve se estender aos educadores e aos profissionais da área
da saúde, na medida em que o hospital é o espaço “moderno” da doença e,
consequentemente, da morte.
Nas últimas décadas, em vários países do mundo, vem se expandindo os
Cuidados Paliativos onde a equipe paliativista lida primordialmente com pacientes
que estão num processo eminente do morrer, uma filosofia humanista do mais alto
grau, que, para se tornar uma realidade no Brasil, precisa que tanto a Tanatologia
como os Cuidados Paliativos façam parte da formação acadêmica desses
profissionais. Além de Kovács, Leo Pessini, Doutor em Teologia Moral, tem
investido na discussão e divulgação dos Cuidados Paliativos e outros temas ligados
ao assunto, como a Bioética. Na Revista Brasileira de Cuidados Paliativos ele
conclui o artigo “Cuidados Paliativos - Perspectivas Contemporâneas” afirmando
que:
69
Os cuidados paliativos se constituem hoje numa importante questão de
saúde pública. Lida com o sofrimento, a dignidade da pessoa, o cuidado
das necessidades humanas e a qualidade de vida das pessoas portadoras
de uma doença crônico – degenerativa, ou que estão na fase final de vida.
Preocupa – se também com o apoio às famílias e amigos como uma
unidade de cuidados, frente ao sofrimento potencial ou iminente de perda
de entes queridos, bem como no período do luto. Nosso sistema de saúde
é negligente em relação a essas necessidades humanas. O próximo
estágio será a introdução dos cuidados paliativos no curso principal da
medicina e em programas de educação na área da saúde, quer para os
profissionais, bem como para o público em geral (2008, p.28).
A comunicação é um dos processos básicos de todo o processo educativo e
um dos principais objetivos do trabalho do educador para a morte é a facilitação do
processo de comunicação, da expressão dos sentimentos e necessidades do
indivíduo, família e outros envolvidos.
70
Capítulo 3 – A pesquisa e o desafio do conhecimento no processo de
investigação
“Seja quando for que a vossa vida se acabe, fica inteira.
A utilidade da vida não está no prazo, mas no uso.
Tal houve que durou muito e viveu pouco.”
(Montaigne)
3.1 Metodologia: Caminhos Percorridos
A proposta teórico-metodológica deste estudo reflete diretamente os
procedimentos metodológicos para a coleta de dados utilizados na investigação do
objeto do estudo.
A metodologia aplicada em qualquer investigação é o resultado de uma
reflexão sobre possíveis caminhos a serem seguidos nos diferentes momentos,
tanto de sua elaboração como de sua realização, sustentado não por normas, mas
pela ação do pesquisador sobre a realidade (QUEIROZ, 1991).
O estudo aqui desenvolvido foi do tipo exploratório, cujo objetivo foi levantar
opiniões sobre assuntos pouco explorados e aprimorar ideias, sugerindo uma
investigação de natureza qualitativa que considera a relação dinâmica entre a
realidade social e o sujeito.
A pesquisa qualitativa responde a questões muito particulares. Ela se
preocupa, nas Ciências Sociais, com um nível de realidade que não pode
ser quantificado. Ou seja, ela trabalha com o universo de significados,
motivos, aspirações, valores e atitudes, o que corresponde a um espaço
mais profundo das relações, dos processos e dos fenômenos que não
podem ser reduzidos à operacionalização de variáveis. (MINAYO, 2001,
p.22).
Nas pesquisas de natureza qualitativa parte-se do reconhecimento da
singularidade do sujeito e, por consequência, da importância de se conhecer sua
experiência social e não apenas as suas circunstâncias de vida. É, pois, em direção
da captura da experiência social que as pesquisas qualitativas se valem da fonte
71
oral, na busca dos significados de vivências para os sujeitos que os esforços do
pesquisador devem se concentrar, buscando apreender a forma como eles são
atribuídos (MARTINELLI, 1999).
Assim, não é mais importante o número de sujeitos que vai oferecer
informações, mas o aprofundamento do conhecimento em relação àqueles sujeitos
com os quais se está dialogando.
Na pesquisa exploratória a intenção é esclarecer conceitos e ideias na
tentativa de obter uma visão de tipo aproximativo acerca da atuação dos
profissionais de saúde. Nas palavras de Gil (1996, p.45):
Estas pesquisas têm como objetivo proporcionar maior familiaridade com o
problema, com vistas a torná-lo mais explícitos ou a construir hipóteses.
Pode – se dizer que estas pesquisas têm como objetivo principal o
aprimoramento de idéias ou a descoberta de intuições [...]. Na maioria dos
casos essas pesquisas envolvem: a) levantamento bibliográfico; b)
entrevistas com pessoas que tiveram experiências práticas com o
problema pesquisado; e c) análise de exemplos que “estimulem a
compreensão”. (Selltiz et al., 1967, p.63).
A coleta de dados nesse tipo de investigação consiste na busca sistemática
de informações consideradas importantes para a compreensão e explicação do
fenômeno estudado.
Dentre os inúmeros instrumentos conhecidos para a coleta de dados, optouse, diante dos diferentes modelos de entrevista, pela entrevista com roteiro, por
meio da qual, conforme propõe Queiroz (1991), a captação dos dados é feita em
uma conversa entre o informante e o pesquisador, dirigida e sistematizada
previamente pelo segundo, na qual pesquisador e informante se relacionam
segundo determinadas condições.
Queiroz (1991) descreve assim a entrevista com roteiro, ou semi-orientada:
Na entrevista com roteiro, o conhecimento anterior sobre os problemas a
serem resolvidos pode ser menor, ou então o pesquisador deseja ao
mesmo tempo ter certo conhecimento de como o informante conduz seu
discurso. Deixa-lhe por isso certo grau de liberdade, trazendo-o novamente
aos problemas todas as vezes que percebe uma divagação por rumos
totalmente diversos; trata-se, pois, de dosar as intervenções. Por outro
lado, também nesse caso o pesquisador segue um caminho prédeterminado, e suas intervenções são no sentido de impor este caminho
ao informante (p.58).
72
Nesse tipo de entrevista, semi–estruturada, evitam-se perguntas que possam
dirigir respostas para o que se tem em mente, e tem por finalidade obter o máximo
de informações que o indivíduo entrevistado possa oferecer, utilizando um roteiro
contendo apenas tópicos.
Diante da definição do objeto que pretende compreender como se dá o
cuidado a pacientes terminais e/ ou sem possibilidades de cura na visão dos
profissionais de equipes de saúde, estabeleceu-se como objetivo geral entender o
significado que os profissionais de equipes de saúde atribuem aos Cuidados
Paliativos e a seus respectivos papeis nesse tipo de conduta. Para cumpri-lo, temse como objetivos específicos:
•
desvelar o significado atribuído à morte pelos profissionais de
equipes de saúde;
•
compreender como esses profissionais trabalham a questão da
morte nos Cuidados Paliativos;
•
investigar as dificuldades enfrentadas por eles em relação à
questão da morte e pacientes terminais e/ ou sem possibilidades
de cura no seu cotidiano de trabalho;
•
evidenciar o entendimento que tem sobre os Cuidados Paliativos.
Considerando-se que a proposta dos Cuidados Paliativos supõe um trabalho
interdisciplinar, entendeu-se a necessidade de realizar a pesquisa de campo com
profissionais de diferentes categorias que atuam na área da saúde.
3.2 Sobre a Coleta de Dados
3.2.1 Aspectos éticos
O projeto de pesquisa foi apresentado e aprovado pelo Comitê de Ética em
Pesquisa (COMET) da Universidade Católica de Santos (UNISANTOS), sob o nº de
protocolo 1420.8.2011. Foram seguidas as orientações constantes na Resolução
n.196/96 do Conselho Nacional de Saúde, tanto no que diz respeito aos aspectos
éticos com os serviços que autorizaram a realização da pesquisa, quanto com os
sujeitos que cederam as entrevistas, após assinatura do Termo de Consentimento
Livre e Esclarecido (TECLE) (Apêndice I). O TECLE foi assinado em duas vias,
73
após informações e esclarecimentos sobre os objetivos da pesquisa. As instituições
nas quais os sujeitos da pesquisa atuam concederam Termo de Autorização por
escrito.
3.2.2 Dificuldades e limitações
Entre as maiores limitações encontradas durante a pesquisa de campo
destacam-se: a complexidade do tema que visivelmente afastou alguns
profissionais; a incompreensão sobre o que vem a ser uma pesquisa científica, e
seu significado, o que impediu a entrada em alguns serviços de saúde, e o baixo
grau de mobilização dos sujeitos envolvidos. Os profissionais de saúde muitas
vezes apresentam vários tipos simultâneos de vínculo de trabalho, envolvendo mais
de uma instituição/ serviço, o que deixa pouco tempo para participarem de outras
atividades.
A maior dificuldade enfrentada foi a entrada no campo, principalmente em
relação ao hospital. Foram feitas tentativas em várias instituições que por
possuírem convênios com outras instituições de ensino não receberam sequer o
projeto para submissão do comitê de ética. Quando um serviço autorizou a entrada
para a realização das entrevistas outros fatores interferiram na realização das
mesmas como a troca de toda a superintendência e diretoria do hospital, que levou
a um novo pedido de apresentação do projeto e a pouca disponibilidade de tempo
dos profissionais para o agendamento das entrevistas.
3.2.3 Pesquisa de campo
Dadas as características da pesquisa, o número de indivíduos participantes
foi de 09 (nove) sujeitos, que abarcam 03 (três) diferentes categorias profissionais.
Foram buscados para entrevista e definidos como critérios de inclusão: enfermeiro
(a); médico (a); assistente social; que atuam em hospital, Instituição de Longa
Permanência para Idosos e que trabalham sob o sistema de Home Care
(Assistência
Domiciliar);
atuam
ou
tenham
atuado
com
pacientes
sem
possibilidades de cura e ou terminais. A escolha dos sujeitos dentro das instituições
74
se deu com a colaboração dos respectivos responsáveis para identificar os
profissionais que atendiam aos critérios do estudo.
O instrumental utilizado consistiu em entrevistas semi – estruturadas, não
dirigidas, evitando-se perguntas que pudessem dirigir respostas para o que se tem
em mente (inferir). Dialogou–se com o entrevistado dentro de um campo
descontraído, propiciando que tivesse a possibilidade do máximo de liberdade de
expressão. No roteiro utilizado (Apêndice II), os tópicos de interesse foram
ordenados e guardam certa relação entre si. Não foram feitas perguntas diretas
deixando o entrevistado falar livremente.
As entrevistas para a coleta de dados foram previamente agendadas e
realizadas em locais reservados, nas unidades de atuação dos profissionais. Para
orientar a entrevista, o roteiro final continha uma primeira parte com dados de
identificação dos sujeitos (nome, idade, sexo, religião/ crença, local de nascimento,
ocupação, local de trabalho, formação) e uma segunda parte com os tópicos
abordados (significado da morte, abordagem da questão da morte e sobre as
decisões diante do morrer no ambiente familiar, a morte no cotidiano de trabalho,
preparação para lidar com estas questões, organização do trabalho em relação aos
pacientes sem possibilidade de cura e/ ou pacientes terminais, lidar com a dor do
outro (usuários e familiares), relação profissional de saúde/paciente sem
possibilidade de cura/ terminais, pacientes sem possibilidades de cura e/ pacientes
terminais e qualidade de vida, trabalho em equipe, perfil de profissionais para atuar
com esta demanda, entendimento dos Cuidados Paliativos, relato de um caso ou
situação que marcou a trajetória profissional).
As entrevistas foram gravadas em áudio e posteriormente transcritas na
íntegra, utilizando-se de pseudônimos na análise para manter o sigilo. Todo
material obtido foi material de análise.
3.3 Os Cenários da Pesquisa
Como supracitado, a pesquisa foi realizada com profissionais de saúde de
três serviços distintos: Instituição de Longa Permanência para Idosos (ILPI); Home
Care (Assistência Domiciliar) e Hospital que estão localizadas em diferentes
municípios do Estado de São Paulo.
75
A escolha desses serviços de saúde deu-se pelo fato de o hospital ter se
tornado um espaço privilegiado para a morte na sociedade contemporânea; a
Instituição de Longa Permanência para Idosos cada vez mais ser uma opção para
os cuidados dos idosos que perderam sua independência; e o sistema de Home
Care (Assistência Domiciliar) por estar ganhando espaço no mercado dos serviços
de saúde privados e ter como característica o envolvimento da família no cuidado
do paciente.
3.3.1. Instituição de Longa Permanência para Idosos
A Instituição de Longa Permanência para Idosos25 diagnosticados com
doenças crônico-degenerativas está localizada no Município de Barueri na Região
Metropolitana de São Paulo. Trata-se de uma entidade civil sem fins lucrativos, com
atendimento gratuito, que tem como missão “promover a defesa dos direitos e o
exercício da cidadania do idoso, valorizando o envelhecimento e a qualidade de
vida”. A ILPI é um serviço inserido na proteção social especial de alta
complexidade, visa garantir proteção integral a indivíduos ou famílias em situação
de risco pessoal e social por meio de acolhimento institucional.
Fundada em 1997, presta serviços gratuitos às pessoas com idade igual ou
superior a 60 anos e possui duas unidades no município: Sede e Residência. O
programa de acolhimento na residência atende 40 idosos moradores desde 2003.
No local oferece atendimento global e multiprofissional nas áreas de Geriatria,
Enfermagem,
Psicologia,
Fonoaudiologia,
Nutrição,
Terapia
Ocupacional,
Fisioterapia, Odontologia, Serviço Social, Educação Física, Integração Comunitária,
Alfabetização e Artesanato. O quadro de funcionários fixos da instituição conta com
mais de 40 pessoas entre equipe técnica, de limpeza e administrativa.
A instituição tem como objetivo desmistificar junto à comunidade os
preconceitos relacionados ao envelhecimento, além de possibilitar aos idosos
avanços quanto à percepção dos seus próprios direitos e deveres, elementos
fundamentais para o exercício da cidadania. Os projetos desenvolvidos tem como
foco a saúde física e mental, assistência social, lazer recreativo, cultural e
25
Informações retiradas do endereço eletrônico da instituição.
76
esportivo, e ações socioeducativas. Além da residência existem outros projetos
destinados a familiares e cuidadores de idosos dependentes para as Atividades da
Vida Diária (AVDs) que visam tanto instrumentalizá-los quanto evitar a busca por
abrigamento asilar. Outros projetos ainda contribuem para um processo de
envelhecimento saudável e autônomo, fortalecendo os vínculos familiares e o
convívio comunitário, fomentando a causa do envelhecimento junto à sociedade.
3.3.2. Home Care (Assistência Domiciliar)
O Home Care26 é uma empresa privada, de capital nacional, e
primordialmente constituída para internação e atendimento domiciliar. Com a
aquisição de novas tecnologias, especializado no diagnóstico, planejamento,
desenvolvimento e consultoria de ações preventivas em saúde. Situado em Santos,
Região Metropolitana da Baixada Santista, a empresa possui outra unidade na
capital paulista. Em março de 2002, iniciou suas atividades através da união de
profissionais qualificados e treinados. Os pacientes assistidos por este sistema vão
desde os casos simples (como curativos e aplicação de medicamentos) até os mais
complexos (como ventilação mecânica e internação domiciliar).
A missão é atender e satisfazer plenamente o usuário do sistema Home
Care restabelecendo, sempre quando possível, as atividades da vida diária ou
apenas aliviando o estresse pessoal e familiar da doença descompensada.
De acordo com a empresa as vantagens no sistema de assistência domiciliar
são: possibilidade de interferir na terapêutica após visita domiciliar para melhor
entendimento das condições de vida/moradia do seu paciente; humanização do
tratamento; a melhoria da qualidade de vida do paciente e da família, evitando a
perda do vínculo familiar; permitir a redução do risco de infecções hospitalares
resistentes; melhor evolução clínica; auxílio na recuperação psicossocial do
paciente; vínculo afetivo imposto com toda a equipe.
O atendimento da assistência domiciliar é indicado quando: paciente tem
estabilidade clínica, mas com necessidades especiais (materiais, equipamentos e
medicamentos) e/ou atenção frequente de equipe especializada; anuência do
26
Informações retiradas do endereço eletrônico da instituição.
77
médico titular do caso; aceitação e colaboração da família; a família designa um
cuidador para o acompanhamento do paciente; estrutura física adequada no
domicilio para receber equipamentos e a equipe da assistência domiciliar.
Entende-se que nesta modalidade de atendimento encontra-se uma opção
segura e eficiente para pacientes portadores de doenças agudas ou crônicas que
outrora deveriam ser tratados em hospitais. Com o apoio da assistência domiciliar,
as
internações
hospitalares
prolongadas
podem
ser
reduzidas
e
novas
reinternações evitadas.
Os profissionais envolvidos nos atendimentos são: médicos, cirurgiõesdentistas, enfermeiros, técnicos de enfermagem, fisioterapeutas, nutricionistas,
farmacêutico,
psicólogos,
fonoaudiólogos,
assistentes
sociais,
terapeutas
ocupacionais e administradores.
O serviço possui uma Central de Atendimento 24 horas por dia, todos os
dias da semana, pois atendem as intercorrências clínicas dispondo de equipes
compostas por plantonistas para este fim. No domicílio, os programas para o
atendimento são individualizados a cada paciente, bem como todos os
equipamentos necessários para gerar o bem estar. O serviço é destinado à
pacientes particulares ou com plano de saúde conveniado à empresa.
3.3.3. Hospital
O Hospital de Clínicas27, localizado em Mauá, é referência regional e atende
a usuários dos municípios de Mauá, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra no ABC
paulista. Foi construído no final da década de 1970 para ser um hospital privado,
mas permaneceu fechado. Em 1985 foi encampado pelo governo estadual, passou
por reformas, e em 1986 iniciou o funcionamento. No ano de 1987 começou a
funcionar como unidade de internação hospitalar, e em 1990 é municipalizado pela
Prefeitura de Mauá.
As instalações físicas pertencem ao governo estadual e são cedidas ao
Município de Mauá. A administração é de uma Organização Social de Saúde
(OSS), mas na prática, o poder público é responsável pelas obras, compra de
27
Informações retiradas do endereço eletrônico da instituição.
78
equipamentos e a gerência cabe a OSS que deve cumprir metas de produção e
qualidade, além de gerir os recursos.
É um hospital de referência na realização de partos de alto risco. As
especialidades oferecidas no equipamento abrangem clínica médica e cirúrgica,
ginecologia e obstetrícia, pediatria, psiquiatria e ortopedia.
Conta com 161 leitos cadastrados no Ministério da Saúde. São 1.090
funcionários atendendo à população, dos quais 165 médicos, 48 enfermeiros, 326
auxiliares de enfermagem e 05 assistentes sociais. O hospital é mantido com
recursos municipais e repasses do Ministério da Saúde para cobertura de custeios
relacionados ao Sistema Único de Saúde (SUS).
Tem como missão constituir-se em referência para a atenção de média
complexidade, assegurando o atendimento hospitalar, ambulatorial e de urgência a
todos os cidadãos encaminhados pela rede pública de saúde. Assim, pretende ser
um equipamento de saúde integrante da rede hierarquizada e regionalizada de
saúde, com vistas à garantia de resolutividade e qualidade da atenção do Sistema
Único de Saúde, mantendo-se atualizado tecnologicamente e adotando estratégias
para um atendimento humanizado, um ambiente acolhedor e um modelo de gestão
participativa, além de estabilização duradoura do financiamento que o sustente
plenamente.
3.4 Reflexões a partir das entrevistas e observações: resultados e discussões
Em todo material obtido nas entrevistas foram observadas as associações
produzidas, a sequência dos assuntos abordados, a importância atribuída e o
tempo que demorou em cada item, a relação que estabeleceu com os
entrevistadores e o comportamento não verbal. De forma que não se buscou
regularidades, mas os significados que os sujeitos da pesquisa deram a esse
momento da vida (CHIZZOTTI, 1998).
Assim, não se procurou consenso nas falas, mas o significado diante de
cada contexto. Para a análise dos dados as informações foram agrupadas em eixos
de análise e dadas às características dessa investigação a construção dos eixos se
deram a partir do material empírico. Os eixos deram maior visibilidade à fala dos
79
sujeitos de tal modo que fragmentos dos seus relatos foram utilizados para ilustrar,
apresentar e subsidiar as discussões e análises dos eixos desenvolvidos, pois “a
fala é reveladora de condições estruturais, de sistemas de valores, normas e
símbolos, e ao mesmo tempo, tem a magia de transmitir, através de um porta-voz,
as representações de grupos determinados, em condições históricas, sócioeconômicas, e culturais específicas” (MINAYO, 2006, p. 109 – 110).
Os dados coletados foram organizados para proceder-se à sua análise e
interpretação articulando as reflexões teóricas e as categorias empíricas que
emergiram da realidade investigada para chegar-se à compreensão e explicação do
objeto deste estudo.
Após leitura minuciosa e exaustiva das entrevistas, foram encontrados eixos
que expressam sentidos e descrevem o fenômeno que está sendo estudado.
3.4.1 Eixos de análise
O quadro abaixo sintetiza algumas informações sobre os sujeitos do estudo.
DADOS DE IDENTIFICAÇÃO DOS SUJEITOS
SUJEITOS
SEXO
IDADE
LOCAL DE
RELIGIÃO
PROFISSÃO
NASCIMENTO
LOCAL DE
TRABALHO
AS1
Feminino
25 anos
Barueri - SP
Católica
Assistente Social
ILPI
AS2
Feminino
39 anos
Santos - SP
Católica
Assistente Social
Home Care
AS3
Feminino
32 anos
Mauá - SP
Católica
Assistente Social
Hospital
EF1
Feminino
36 anos
Osasco - SP
Espiritualizada
Enfermeira
ILPI
EF2
Feminino
33 anos
Santos - SP
Católica
Enfermeira
Home Care
EF3
Feminino
28 anos
SBC - SP
Espítita
Enfermeira
Hospital
MD1
Feminino
38 anos
Lins - SP
Católica
Médica
ILPI
MD2
Masculino
39 anos
Santos - SP
Católica
Médico
Home Care
MD3
Masculino
67 anos
_____
Mulçumano
Médico
Hospital
SBC = São Bernardo do Campo/ ILPI = Instituição de Longa Permanência para Idosos / Home Care = Assistência Domiciliar
4 – Quadro 1 – Dados de identificação dos sujeitos.
80
A partir da compreensão dos depoimentos dos sujeitos e da densificação
dos dados encontrados foram identificados 04 eixos de análise. Esses são
identificados como: sobre o significado da morte e do morrer; prática profissional e
sua relação com a morte; dificuldades em relação à questão da morte e pacientes
terminais e/ ou sem possibilidades de cura e identificação e compreensão dos
Cuidados Paliativos.
3.4.1.1 Sobre o significado da morte e do morrer
O significado atribuído à morte pelos profissionais de saúde tem relação com
a abordagem sobre a morte e as questões diante do morrer pela família no
processo de formação de cada um. A família como a primeira agência socializadora
é responsável por transmitir os valores e normas da sociedade da qual faz parte,
incluindo a cultura e a religião.
Foi consenso entre eles o entendimento de que a morte é um processo
natural e inerente à própria vida:
Entendo como um processo inerente à vida. (AS1)
A gente não tem como fugir disso. (EF1)
Os que se declararam católicos, mesmo não sendo mais praticantes da
religião, nas suas falas revelam sua influência ao relatarem a crença na existência
de uma “outra vida” num plano espiritual e como tal crença pode ajudar no
enfrentamento da morte:
A morte ela é uma fase da vida. Tem a gestação, o nascimento,
adolescência, infância, enfim, tem todo um processo do viver e a
morte é a parte final da vida. E aí a gente discute se isso continua
depois ou não, mas isso a gente não tem como saber, mas isso é
um ponto importante pra gente poder saber como lidar com a
própria morte, saber que pode não terminar por aí. É uma fase. A
morte pra mim é uma fase como qualquer outra fase da vida.
(MD1)
81
Bom, objetivamente pra gente é a falência dos órgãos.
Fisicamente é a parada de funcionalidade desses órgãos. E o
outro lado...é essa transição do plano físico pro plano espiritual.
(MD2)
É o fim de uma vida aqui e começo de uma outra. (AS2)
O significado só pode ser expressado de forma pessoal. Pra mim
é o desligamento do corpo físico mantendo após o corpo
espiritual. (EF3)
Do ponto de vista religioso, é que chegou a hora. Tá escrito isso.
Cientificamente cansaço, morte dos órgãos. (MD3)
A AS1 expôs também, a partir de sua experiência de trabalho na ILPI, a
importância que os idosos atribuem ao funeral como ritual de passagem no
processo de morte ao solicitarem a realização do velório no quarto de um idoso que
faleceu na instituição, mas em contrapartida a família desse idoso fez questão de
enterrá-lo o mais rápido possível. Para AS1 o significado que cada pessoa dá a
morte também depende da forma como a morte foi apresentada para ela pela
família e pela sociedade.
Dependendo da sua vivência, da sua cultura e da sua religião
você vai lidar com ela de uma forma, né. Dependendo pode
ser uma coisa dolorosa ou pode ser festa, um ritual de
passagem. (AS1)
Os profissionais do Home Care compartilham de uma mesma visão. Eles
separam o significado atribuído à morte em dois aspectos: um, relacionado ao
trabalho profissional e técnico que realizam, portanto à visão biológica da vida;
outro, ligado à religião que compartilham. Enquanto na ILPI apenas MD1 faz
referência à dimensão espiritual. Para MD3 a morte, de acordo com sua religião
(islâmica) é uma passagem do estágio natural para a próxima existência.
Ao serem questionados sobre a abordagem das decisões diante da morte e
o morrer na família as respostas foram variadas. Para AS1 como acontece em
datas comemorativas, o momento da morte na sua família é um evento social
capaz de reunir toda a família mais do que qualquer outro, fato que a incomoda. Já
para MD1 a abordagem do tema na família é feita por ela. EF1 coloca que mesmo
tendo o entendimento da morte como processo natural, não sabe qual seria sua
82
reação diante da morte de um familiar próximo, experiência que não viveu. Ela faz,
assim, uma relação com os vínculos estabelecidos entre as pessoas. Porém, fica
claro que o tema da morte não era abordado em casa com o objetivo de expressar
idéias ou desejos/ refletir, mas porque era cotidiano de trabalho da mãe, técnica de
enfermagem. AS3 afirma ter muito medo da morte que segundo Kastenbeum (apud
Kovács, 1992), pensar sobre sua morte está relacionado com: o medo da morte, o
medo do que vem após a morte e o medo da extinção.
Evidencia-se portanto que aqueles cuja religião faz parte da vida da família e
aqueles que parentes já eram profissionais de saúde tiveram mais contato com a
questão durante a vida.
Uma coisa na minha família que eu acho muito complicado é
que tem uma certa “mania” de só se reunir quando falece, né.
Fica 20 anos sem ver aquele familiar e quando morre chora e
fica desesperado. Aí é que você vai ver seus parentes
reunidos novamente, porque alguém morreu e todo mundo foi
no velório. Então em vida não te um contato e não tem um
convívio e na hora da morte fica aquela lamentação. Isso faz
com que eu sinta falta um pouco de que fosse discutido,
né...Isso a gente aprende mais no trabalho do que em casa.
(AS1)
É um tema que, na minha família inclusive sou eu até quem
levo mais a discussão, mas na infância isso não era tocado.
(MD1)
Minha mãe é técnica de enfermagem também, né? Eu nunca
tive um familiar muito próximo que já faleceu. Mas eu nunca
tive essa coisa de que não acontece... por isso que eu acho
que vai acontecer e não tem como fugir disso. Eu não sei se
quando chegar uma mãe ou um pai eu vou encarar de uma
forma natural, porque eu acho que a coisa pega, né? (EF1)
Na minha casa sempre foi tocado no assunto. Inclusive meu
pai já pagou (risos), quer ser cremado e já está tudo certo. Ele
mesmo já escolheu as músicas que ele quer. E não vai dar
trabalho nenhum. Sempre foi abordado em casa, e a gente já
passou por vários processos de morte também. Então, não
tem problemas não. (EF2)
Na minha casa nunca foi abordado. Na minha casa foi morrer
meu avô e eu já tinha 16 anos. Foi um choque pra mim, porque
até então eu nunca tinha passado por essa experiência. Mas
83
também não é nenhum tema proibido. Nem nada assim não,
né. Mas não se fala, deixa acontecer pra se falar ou tomar as
providências. (AS2)
No meu caso foi tocado sempre no assunto sim. A minha
família é bastante religiosa e sempre foi bastante abordado.
(MD2)
É difícil, às vezes a gente está conversando, eu, meu pai e
meu filho e surge o assunto. Ah, você tem medo de morrer?
Assim, nunca perdemos ninguém tão próximo a não ser minha
a avó e meu avô. Mas ninguém termina o assunto porque é
como te falei, eu tenho medo de necrotério, de caixão...dessas
coisas. (AS3)
Na minha família a questão era abordada, mas de acordo com
a religião católica. Com um entendimento da morte diferente
do meu, mas sempre foi abordado. (EF3)
A morte era discutida sim, pela religião. (MD3)
Na colocação desse eixo dois pontos se destacaram: a religião e a
experiência profissional de cada um na medida em que o cotidiano de trabalho foi
desvelando a morte como algo inevitável. Os profissionais reconhecem a religião
como um elemento importante para o enfrentamento da morte. A religião cristã para
os praticantes torna-se um fator positivo uma vez que realça o aspecto da
humanidade para com os que sofrem, sendo um fator positivo no cuidar. Todas as
religiões atribuem um significado à morte.
Talvez o entendimento da morte como um processo natural ajude a aceitá-la
na medida em que é inevitável.
3.4.1.2 Prática profissional e sua relação com a morte
A prática profissional e sua relação com a morte se apresenta no
entendimento: da morte no cotidiano de trabalho; da abordagem e o trato destas
questões; da relação profissional de saúde – paciente sem possibilidade de cura e/
ou pacientes terminais; da qualidade de vida; da preparação para lidar com a
morte, e do trabalho em equipe.
84
A morte é encarada como parte do cotidiano de trabalho desses
profissionais, o que não elimina ou diminui a repercussão desse evento tanto na
prática profissional como no aspecto pessoal de cada um.
No Home Care a questão da morte é trabalhada predominantemente do
ponto de vista técnico, visando o aspecto biológico. Existe um suporte na resolução
das questões burocráticas que envolvem o óbito, realizado pela assistente social.
De fato o controle dos sintomas e o alívio das dores físicas fazem parte da filosofia
dos Cuidados Paliativos como preconiza a OMS (2002); no entanto, é apenas uma
dimensão do trabalho sendo essencial a abordagem das demais dimensões. Neste
tipo de serviço existe um distanciamento na relação do profissional de saúde com o
paciente, por se tratar de um trabalho pontual que visa a resolução de uma
intercorrência.
Para os profissionais da ILPI, do Home Care e do Hospital a morte passa a
fazer parte do cotidiano de trabalho. Várias situações surgem desse contato
constante com a morte, entre as quais AS1 coloca o desafio de lidar com os seus
sentimentos e dos demais idosos que residem na instituição. Enquanto MD2 sente
falta do respaldo legal em determinados momentos e que pela natureza do serviço
de saúde onde atua entende ser necessário se apoiar na dimensão técnica do
trabalho. AS3 coloca que a morte no cotidiano de trabalho deixa o profissional de
saúde mais endurecido, passando a tratá-la como um evento banal. Todos os
profissionais se referem à necessidade de respeitar a vontade da família.
Já lidei com muitas mortes. Desde que eu estou aqui já
faleceram 09 idosos. Estou aqui há um ano e meio, foram
09 idosos e inclusive quando eu cheguei tinha um idoso em
CP e um em estágio terminal. Teve uma situação que pra
mim foi muito marcante que faleceram 3 idosos ao mesmo
tempo. No mesmo mês (espaço de 15 dias)... Então foi
muito em cima um do outro. (AS1)
O próprio médico não sabe alguns ainda e a gente não
sabia como lidar com a morte, como passar, como contar
isso pra família, enfim, então, e isso começa a entrar na
nossa rotina, né, a morte pro geriatra acaba sendo uma
rotina, e a gente tem que tentar o contrário agora, e não
ficar frio durante a situação. A gente também não pode se
envolver muito, sofrer do mesmo jeito que a família sofre,
mas a gente também não pode se tornar frio diante dessa
situação porque acaba sendo que tudo na vida é uma rotina
85
a gente se habitua com aquela situação. É assim, é de uma
forma tranqüila, conversando, mas não é algo assim,
porque senão é algo que acontece quase todos os dias,
porque sempre quase todos os dias têm um ou dois que
acaba falecendo. (MD1)
A maioria dos nossos pacientes eram pacientes paliativos.
Então muitos que passavam pela gente iam a óbito. Só que
assim, a gente não tinha um contato tão direto, a gente não
presenciava. A gente ficava sabendo que o paciente foi a
óbito, mas não presenciava o momento. É aquela coisa: eu
sei o que acontece, mas nunca tive tanta intimidade com o
momento da morte. (EF1)
Nós sempre passamos por processo de falecimento dos
pacientes e nunca teve um falecimento que não fosse
esperado. Idosos, câncer, outras doenças terminais. Nunca
teve esse processo de um jovem, né, que muitas vezes é
mais complicado e a morte é inesperada. (MD2)
E a gente tem que aceitar o que a família quer, não adianta
ir contra a vontade deles. (AS2)
Até porque a questão legal jurídica do processo de morrer
ainda é meio complicada, né. Se fala em ortotanásia,
distanásia e eutanásia ainda é juridicamente muito
complicada pra gente. (MD2)
No serviço é diferente, a gente fala que a vai ficando mais
fria e a gente vai se adaptando. (AS3)
Infelizmente, assim, eu acho que a morte no meu ambiente
de trabalho, talvez pela frequência e pela relação que a
gente tem com aquele que morre, ela é um pouco ...vamos
dizer assim, se torna comum. Eu acho que tem um valor
sentimental muito pequeno. A gente tem pouca relação
emocional, toda a equipe eu percebo, pelo fato de
acontecer frequentemente.(EF3)
Eu sou profissional e tenho que encarar com naturalidade.
(MD3)
De forma geral, os profissionais entrevistados no Home Care não lidam com
as dimensões espiritual, social e psíquica no processo de morte, focando a atuação
na manutenção do conforto físico. O trabalho visa a eliminação da dor física,
86
entendida como item fundamental para a manutenção da qualidade de vida dos
pacientes e para a qual existe um protocolo a ser seguido.
Com relação à qualidade de vida para os pacientes sem possibilidades de
cura e/ ou pacientes terminais, a visão predominante é o alívio do sofrimento por
meio do controle dos sintomas físicos.
Assim, a maioria dos profissionais compreende que a qualidade de vida para
pacientes sem possibilidades de cura e/ ou pacientes terminais está relacionada
basicamente ao alívio da dor física. Em nenhum momento apontam a possibilidade
do paciente e ou sua família terem uma concepção diferente, bem como a leitura do
termo considerando o aspecto subjetivo e a relação do mesmo com objetivos,
expectativas, padrões e preocupações de cada indivíduo conforme a conceituação
da OMS discutida por Minayo (2000).
É uma qualidade tanto de vida como uma qualidade de
morte, né? Que a gente fala, né? (MD1)
É, tirar todo o sofrimento, secreção, assim, a gente tem
todo um protocolo pra como dar medicação. Medicamentos,
usar só o que é necessário naquele momento. Adotar
medidas, é... tipo, vamos continuar tratando o colesterol de
um paciente... é um remédio a mais, que não vai ter
benefício, que não é o momento. Então a gente tenta
otimizar as medicações dele de uma forma de só aliviar o
sofrimento. E não é só cuidados paliativos, não vamos
fazer mais nada. Pelo contrário, nós vamos fazer tudo. Mas
medidas que não serão medidas que não vai ter mais a
cura, mas medidas de conforto mesmo. (MD1)
Porque nós somos chamados para tratar numa fase final.
Porque nós não trabalhos o... os cuidados paliativos
envolvem uma série de permeios aí, né? Tem a fase
curativo e paliativo... Nós pegamos na fase final. Na fase de
paliação mesmo, né? De entrar com medicação pra sedar,
pra não sentir dor. A gente não consegue trabalhar essa
fase antes. Nós não temos essa experiência, esse knowhow de se trabalhar antes. Essa fase foi trabalhada préinternação, internou, olha, agora é só cuidados terminais, aí
passa pra gente, entendeu? A parte da qualidade de vida
no Home Care, hoje, na nossa experiência de empresa a
gente não trabalha nisso. (MD2)
87
Por ter esses cuidados mais específicos, às vezes é um
pouco mais difícil, né? Tem que ter um cuidado um
pouquinho maior. Às vezes está acamado, tem que mudar
várias vezes de decúbito. Começa a formar uma feridinha,
fica vermelhinho, quando você vê já tá uma ferida enorme.
Então tem alguns cuidados e tem algumas coisas que a
gente tenta fazer, só que não consegue, acaba
acontecendo. (EF1)
Eu acho que o paciente e a família não têm compreensão
muito de qualidade de vida. A gente sabe que dá suporte
para um paciente terminal pra melhorar a qualidade de
vida. A família e o paciente acha que é pra cura. A gente
faz com que o paciente viva com menos dor e mais
conforto. (EF3)
A qualidade de vida aparece nas falas visando proporcionar o conforto
tirando a dor; trata- se contudo de conforto físico e seu aspecto técnico como a
mudança de decúbito, massagem para evitar feridas pelo corpo e o preparo e
administração da medicação. Para AS3 a qualidade de vida só é possível para
pacientes com quadro clínico menos grave.
Um ponto abordado foi a relação estabelecida entre o profissional de saúde
e o paciente sem possibilidade de cura e/ou paciente terminal.
O nível de consciência e lucidez do paciente sem possibilidade de cura e/ ou
paciente terminal determina o tipo de relação entre este e o profissional de saúde.
Apesar de relatarem não ter diferença no tratamento entre os pacientes, na medida
em que a doença avança praticamente não existe relação direta entre este e o
profissional de saúde a não ser para a realização de procedimentos técnicos na
maioria das vezes feitos pela equipe de enfermagem. Desse momento em diante a
família passa a ser responsável por essa mediação. Essa situação é mais explícita
no serviço oferecido pelo Home Care, pois quando a família recorre à assistência
domiciliar geralmente o paciente já perdeu a cognição.
A relação é a mesma de que com qualquer outro paciente.
Na verdade a relação vai depender da situação de saúde
de cada um, como a gente vai lidar com o que está
chegando agora. (AS1)
Nesse momento o principal é aliviar o sofrimento....E aí dar
todo o conforto para que ele evolua tranquilamente pra
88
morte, sem dor, sem abrir feridas. Tentar alimentar sem...
é... Em geral a gente procura conversar com a família e
evitar de usar dietas alternativas por sonda, tentar deixar o
mais normal possível até o morrer do paciente. (MD1)
Eu não faço diferença não. Eu pessoalmente não faço
diferença. Você sabe que tem cuidados mais específicos,
mas eu não faço diferença. (EF1)
O nosso contato é mais com os parentes, com os familiares
próximos que estão chegados aquele paciente. (EF2)
Não muda nada pra mim a assistência a um paciente que é
terminal que já tem o prognóstico fechado e o paciente que
na convalescência mesmo trata pra melhora e alta. Pra
mim não faz diferença nenhuma. (EF3)
A relação é a mesma, não tem distinção. Pra nós enquanto
o paciente tiver um fio de vida é a mesma coisa e não
importa a doença dele. (MD3)
Visto que não diferenciam o atendimento dos pacientes, foram questionados
sobre a preparação para lidar com essas questões. Com exceção de EF1 que teve
os Cuidados Paliativos abordado no curso de enfermagem, os demais sujeitos não
tiveram nenhum preparo para lidar com estas questões durante o curso de
graduação. Alguns tiveram poucas abordagens com relação ao tema morte. Ao
contrário disso, os médicos confirmam o que já é de conhecimento geral: de que os
cursos de medicina ensinam a curar. Por outro lado, as falas dos profissionais
deixam evidente que o conteúdo fornecido na graduação desses profissionais não
integra de forma significativa os conhecimentos necessários para os cuidados de
pacientes sem possibilidades de cura e/ou pacientes terminais. O que revela que os
currículos dos cursos da área de saúde não dão uma base expressiva para uma
formação que além de ser voltada para a cura também proporcione conhecimentos
voltados para o cuidado diante das situações de morte e morrer.
Assim, os profissionais adquiriram alguma bagagem para lidar com os
pacientes sem possibilidades de cura e pacientes terminais no cotidiano do
trabalho, por conta própria, em cursos de especialização e em cursos e palestras
promovidas pelos serviços onde trabalham. Ou seja, as ações que realizam são
principalmente resultados das experiências adquiridas na prática profissional seja
nos serviços onde atuam no momento ou em empregos anteriores.
89
Em medicina você aprende a salvar o doente e não ajudálo a morrer. De forma alguma eu tive esse treinamento.
(MD2)
Geralmente a gente participa de cursos e é incentivado
para que a gente vá pra congressos. Que a gente participe
de curso que atinja a temática do idoso. Que a gente se
instrumentalize para entender a demência, as doenças, a
finitude, o cuidado paliativo. Eu fui a algumas palestras e
alguns cursos que eles dão falando disso. Então aqui a
gente tem esse incentivo e aqui a gente procura trazer
profissionais pra falar com os funcionários, com os idosos e
desenvolver palestras, desenvolver curso, né, de várias
temáticas e inclusive essa. (AS1)
Na minha época de faculdade a gente ainda não abordava
esse tema de cuidados paliativos. Era falado muito pouco.
Hoje em dia eu sei que nas faculdades tá sendo colocado.
Nas residências a gente tem feito, tem colocado, discutido
muito esse tema, e agora isso vai virar um comum já, os
cuidados paliativos. (MD1)
Eu tive um pouco na faculdade porque eu estudei numa
faculdade católica, que foi na PUC. Então a gente tinha
aula de teologia e a gente discutia sobre morte, a gente
tinha livros pra ler pra gente sobre morte da Kübler-Ross
que é bem legal os livros dela são muito bons. Então a
gente teve um pouquinho, mas é muito pouco. Deveria ser
muito mais discutivo, mas... E aí a gente acaba, eu acabei
me preparando, assim, aprendendo, sozinha, né? No dia a
dia, indo atrás. E mesmo assim não é algo que a gente vai
estar totalmente preparado pra lidar. Porque cada morte,
cada família vai reagir de uma forma. (MD1)
A questão da morte é abordada na formação de
enfermagem, com certeza. E cuidados paliativos e tudo é
abordado. (EF1)
E eu fiz oncologia, então também abordado na
especialização. E eles visam bastante os cuidados
paliativos até chegar no momento da morte, né? (EF1)
Tive uma abordagem assim muito....muito superficial. Eu
tinha psicologia na faculdade e um dos temas era o
processo de morte, mas nada comparado a nossa
90
realidade hoje. Hoje em dia eu vejo que é totalmente
diferente. (EF2)
Mas eu aprendi muito mais no dia a dia e vivendo do que
teoricamente. (AS2)
Não fui preparada. Foi vindo e a gente foi aprendendo na
marra, né. Na hora a gente acaba dando um jeito. (AS3)
Muito pouco, eu acho que é realmente a vivência na
unidade...na faculdade a gente tem pouco preparo, eu
acho. Na prática eu acho que depende do setor que você
trabalha.(EF3)
O foco no curso de medicina é na cura e tem pouca
preparação. (MD3)
A gente tenta preparar, a gente começa, dependendo da
fase, né, porque não é só porque tem Alzheimer que a
gente já fecha, como paciente de cuidados paliativos. Ele
vai entrar numa fase de cuidados paliativos, o idoso com
Alzheimer, com demência em geral. E aí a gente chama a
família, marca uma reunião com a família e começa a
entrar já no tema, né? Como eles desejam... Porque o
próprio idoso não tem como se manifestar como ele quer a
morte dele. Mas hoje em dia a gente sabe também que
quando a gente atende um paciente, um idoso, com quadro
inicial de Alzheimer, a gente já pode começar a discutir com
esse idoso como ele quer a morte dele, né? Isso pode ser
uma escolha dele. Então a gente marca uma reunião com a
família, com enfermeiro, com assistente social e conversa
sobre o tema. (MD1)
A fala de MD1 traz duas importantes colocações acerca dos Cuidados
Paliativos; uma diz respeito à introdução dos Cuidados Paliativos a partir do
momento em que é feito o diagnóstico de uma doença incurável e progressiva,
conforme preconiza a OMS (2002). Os Cuidados Paliativos são compatíveis com
as terapias que prolongam a vida quando a doença ainda está em estágio inicial
podendo estar lado a lado. Outra se refere ao respeito à autonomia do paciente, ao
enxergá-lo como sujeito detentor da sua própria vida e capaz de fazer suas
próprias escolhas.
A partir do momento que se considera a complexidade do processo de morte
e morrer e as possibilidades de trabalho, surge a preocupação do trabalho dos
profissionais de saúde, em equipe.
91
Aqui é um trabalho bem integrado, né. A equipe toma as
decisões juntas e a gente percebe que realmente é um
trabalho em equipe. A gente percebe que um depende do
trabalho do outro, não acontece ações isoladas. Então a
coesão da equipe é fundamental. Para que o nosso
trabalho flua, a gente também precisa dos outros fluírem.
(AS1)
Mas aqui a gente toma as decisões juntos e faz o
procedimento juntos. (AS1)
Na geriatria, na gerontologia, os cuidados paliativos é
essencial. É uma dependência... um depende muito do
outro. Então a equipe tem sempre que estar bem unida,
coesa, discutir os casos. E todo mundo vai ter a sua
contribuição, né? (...) Enfim, todo mundo tem o seu papel,
todos os profissionais tem o seu papel, do mesmo jeito que
o médico, no mesmo nível, todo mundo tem o seu papel.
Então fazer os cuidados paliativos sem uma equipe não
consegue fazer. É impossível não ter equipe. (MD1)
Bem, os pacientes podem estar em internação ou
assistência. Em internação, ele normalmente tem todas as
visitas, ou seja, vai enfermeiro, vai médico, vai
fisioterapeuta, nutricionista. Assistente social trabalha nos
2, tanto na assistência como na internação. E a assistência
não. Na assistência ele tem só a visita do enfermeiro, ou só
a visita médica, ou ambos. Vai depender da necessidade
do paciente. Então é na internação que normalmente é
onde está esse paciente de cuidados paliativos, ele tem a
visita de todos os profissionais. (MD2)
A equipe de auxiliares (de enfermagem) são bem
orientados. A gente orienta bastante principalmente essa
parte psicológica, faz eles realizarem as funções técnicas
deles mesmos, mas eles são orientados a questão de
relacionamento principalmente com esses pacientes que
estão terminais. Eles têm essa orientação de que essas
famílias e os pacientes não têm essa consciência que a
equipe tem. (EF3)
No Home Care a equipe não é entrosada para um trabalho interdisciplinar,
mas para atender as necessidades objetivas dos pacientes. O serviço tem a
facilidade de acionar diferentes profissionais para atender o paciente, numa
perspectiva multiprofissional onde cada um realiza o seu trabalho isoladamente.
92
Quando a equipe é multiprofissional há uma fragmentação do atendimento nas
instituições de saúde porque nem sempre é composta por uma gama ampla de
profissionais, como a ação realizada não é interdisciplinar pode levar a práticas
reificadas de acordo com Lewgoy, Mendes e Silveira (2008).
Na ILPI os discursos de AS1 e MD1 evidenciaram que o trabalho na
instituição se aproxima da interdisciplinaridade. Os conhecimentos de cada
profissional são igualmente respeitados, e mesmo existindo duas equipes
atendendo os idosos (diurna e noturna) eles criaram um dispositivo de
comunicação interna bastante simples, pois se trata de um caderno onde o
profissional pode deixar recados para os colegas de trabalho do turno seguinte.
Outro meio de comunicação utilizado pela equipe é o e-mail28 institucional. Além
disso, existem reuniões gerais com toda a equipe e sempre que houver
necessidade outros encontros podem ser marcados para a discussão de casos
específicos. Observa-se que MD1 entende a importância de o trabalho em equipe
estar em sintonia com a interdisciplinaridade visto que como Goulart (apud Lima,
s.d., s.p.) compreende que “tudo repercute em tudo” e portanto, é necessário
englobar as diferentes áreas do saber. Por estar há pouco tempo trabalhando na
instituição EF1 não incorporou a metodologia de trabalho utilizada e seu referencial
de trabalho em equipe está ancorado em experiências profissionais anteriores em
unidade básica de saúde e hospital, onde a atuação de diferentes profissionais com
um mesmo paciente era fragmentada e se refere ainda à “colaboração” de outros
profissionais para a realização mais rápida de suas próprias tarefas e não num
grupo de profissionais focado no melhor atendimento ao paciente.
De acordo com AS3 o trabalho em equipe no hospital é quase impossível em
virtude do tempo e pela necessidade de manter a rotina do serviço. O trabalho é
muito corrido e quando solicitados vão até o local e nas suas palavras “o serviço é
passado corrido”. Relata que com a equipe do Serviço Social existe um
entrosamento maior, pois aumentou o número de profissionais e conseguem se
reunir para discutir casos, e quando necessário se apoiarem mutuamente e
desabafar quando alguém fica abalado com determinado caso. Esse apontamento
revela a falta que faz nos serviços de saúde em geral de um atendimento para os
próprios profissionais que durante o dia de trabalho estão expostos a inúmeras
28
Endereço eletrônico.
93
situações limites que causam angustia. Mas também pode revelar a dificuldade que
as profissionais de saúde tem de sair de sua zona de conforto e confrontarem os
demais profissionais.
3.4.1.3 Dificuldades em relação à questão da morte e pacientes terminais e/ ou
sem possibilidades de cura.
De acordo com as falas emergiram quatro pontos referentes às dificuldades
em relação à morte e aos pacientes sem possibilidades de cura e/ ou pacientes
terminais: família do paciente; ideologização do hospital como lugar de cura; lidar
com a dor do outro (pacientes e familiares); perfil profissional para atuar com a
demanda.
Desses pontos, os dois primeiros se destacam e aparecem quase como
consenso entre os profissionais entrevistados. Na visão deles, a maior dificuldade
no trabalho é lidar com a família. Especificamente no Home Care, onde na maioria
das vezes a abordagem ao paciente é mínima e o foco é direcionado à família e/ou
cuidador. Os profissionais do Home Care entendem que fazem orientação e
preparação da família para a morte do paciente. Contudo, a abordagem não
prepara de fato o familiar para o desapego e no geral são orientações, embora
necessárias, meramente burocráticas sobre as técnicas de cuidado e orientações
relacionadas aos trâmites do velório e do sepultamento.
No Hospital, os profissionais entrevistados se referem à dificuldade de lidar
com as mortes consideradas antinaturais, de crianças e jovens adultos, o que está
em consonância com os resultados dos estudos de Santos (in Martins, 1983). Ou
seja, há uma associação da morte à velhice avançada, quando é mais fácil a
aceitação na medida em que se acredita que essa pessoa cumpriu sua jornada.
Na ILPI a carga para o cuidador familiar informal é significativamente
reduzida na medida em que os pacientes possuem o respaldo de técnicos
especializados e os idosos recebem cuidados integrais da equipe na própria
instituição. Para os familiares de pacientes em Home Care a carga é maior, embora
também haja suporte de diversos profissionais, a não ser que o paciente tenha a
equipe de enfermagem 24 horas por dia no domicílio, muitas vezes o cuidador
informal (familiar) é responsável pelo cuidado diário.
94
Uma das situações mais difíceis é você lidar com as
pessoas, pois por mais que você oriente e explique porque
está sendo feio aquele procedimento, às vezes até os
funcionários mesmo falam “nossa porque que não entubam
essa pessoa?” A maior dificuldade é fazer as pessoas
entenderem porque nós estamos fazendo isso. Eles acham
que ao invés da gente ta cuidando, nós estamos judiando.
(AS1)
AS3 e MD3 relatam que por vezes sentem a necessidade de se esconder
atrás da técnica para não lidarem com a dor do outro, e para enfrentar as
dificuldades no cotidiano de trabalho no Hospital. AS3 fala ainda que uma
dificuldade pessoal é enfrentar o próprio medo da morte, pois o tema a paralisa.
Aponta ainda a dificuldade de lidar com a situação de uma morte inesperada, pois
todos ficam abalados tanto familiares quanto a equipe. Além disso, AS3 revela que
por vezes o médico informa o óbito para um único membro da família e à medida
que os demais familiares chegam ao hospital são encaminhados para o Serviço
Social dar a notícia.
EF1 vê a dificuldade quando não conseguem obter a
participação do acompanhante familiar nos cuidados com o paciente.
Relatam que mesmo estando cientes do diagnóstico, há uma negação da
proximidade da morte por parte dos familiares que acabam exigindo, por exemplo
no caso do Home Care e da ILPI, quando o familiar está quase morrendo a tomada
de medidas extraordinárias para “salvar o paciente” como a transferência e
internação no hospital. Por outro lado na ILPI enfrentam também o problema da
falta de entendimento da filosofia dos Cuidados Paliativos pela equipe de limpeza
da instituição, que estabelece vínculos com os idosos e por vezes questionam as
ações da equipe técnica. O que leva ao ponto abordado por AS1 trata da
idealização do hospital como lugar de cura. Logo, para a AS1 a dificuldade de lidar
com a morte dentro da ILPI também é reflexo dos vínculos estabelecidos entre as
pessoas durante o tempo em que conviveram. MD1 aponta que um fator que reflete
essa dificuldade é que nem sempre existe uma relação por tempo suficiente para
que se estabeleça vínculo entre paciente, família e equipe, dificultando a total
adesão ao modelo preconizado pelos Cuidados Paliativos.
Entre os idosos tem muito isso, né, de que se não for pro
hospital não vai melhorar, que não pode deixar morrer
95
assim. Então quando eles vêm um idoso debilitado , eles
não entendem o que é o CP e a gente tenta explicar numa
linguagem mais simples pra que eles entendam, mas eles
não entendem o que é o paliativo. (AS1)
Porque as pessoas têm esse mito de que o hospital vai
curar. Que internou e o médico vai olhar., vai tratar e depois
ela vai ficar boa, né. Isso é uma construção social. Então
eles também têm essa visão, visão cotidiana de que o
hospital é pra curar. (AS1)
A gente sempre tinha aquela dificuldade que nenhum
familiar queria cuidar. (EF1)
Na nossa formação técnica é extremamente objetivo. A
gente sabe o prognostico, sabe mais ou menos a hora que
vai acontecer o óbito. Pra nós aqui não é complicado
enxergar isso. Muitas vezes a barreira realmente é a cultura
daquela casa daquela família de não aceitar. Pra gente
esse processo de morrer no dia a dia de trabalho, ele é
muito objetivo. Ele é claro. Resta – nos tentar convencer,
talvez esse não seja o melhor verbo convencimento, mas
explicar esse processo de morrer. Sente que ainda falta
cultura nesse sentido. (MD2)
Não existe barreira de material, de medicamento, na hora
de entrar com essas condutas, não existe. A barreira é o
familiar. (MD2)
Em partes porque no hospital, esse treinamento não é feito
com a família. E onde a família vai aprender a trocar uma
fralda, trocar uma dieta, ou faz um curativo? Ela chega em
casa e vai ter que fazer todos os cuidados que estavam
sendo feitos até então pelo hospital. E sem recurso
nenhum. (EF2)
A dificuldade maior é com a família. A consciência que a
gente tem do estágio terminal e a família quase nunca tem.
Então assim, é como se a gente tratasse de duas pessoas
diferentes. A família vê uma coisa, ela sempre acha que dá.
Ela sempre nega o óbito ou sempre vê uma esperança e a
gente sabe o curso, que não tem mais volta. Por exemplo,
quando ta passando mal a família quer que a gente vá
imediatamente porque acha que a gente vai salvar. (EF3)
A maior dificuldade é falar com a família...A gente muito
também quando é um paciente jovem. (MD3)
96
A falta de conhecimento dos Cuidados Paliativos aliada a falta de suporte faz
com que os familiares num primeiro momento os familiares aceitem a adoção de
medidas que visam apenas o cuidado e não mais a cura, porém a aproximação da
morte tem um impacto tão grande que recorrem ao hospital como estância máxima
de cura. No caso do paciente que permanece no domicílio e não possui um
cuidador profissional, os cuidados diários como o curativo, mudar e mover o
paciente de posição para não criar feridas e a administração da medicação, tornam
– se responsabilidade da família que passa a executar tarefas e procedimentos
técnicos para os quais não está preparada seja emocionalmente ou tecnicamente,
reconhecida por EF2. Entretanto, EF1 expressa a vontade de ser cuidada no seu
próprio domicílio por um cuidador (a) profissional por reconhecer o desgaste de tais
cuidados para a família, mas se contradiz num outro momento ao colocar a falta de
colaboração da família nos cuidados com o paciente como um dificuldade para o
seu trabalho.
Andrade (2008) aponta a necessidade da equipe de saúde perceber como a
família realmente é, não um modelo idealizado de família, pois nem sempre ela tem
condições adequadas de cuidar do paciente.
O enfrentamento da dor vivida tanto pelo paciente quanto pela família gera
angústia na equipe de saúde. De tal modo que para lidar com a dor do outro,
manter a postura profissional é a principal estratégia utilizada por todos os
profissionais entrevistados.
Eu acho que também de uma certa maneira tentando
entender, tentando se basear no que está sendo feito é o
melhor pra ele. Ter isso em mente ajuda bastante a gente
fixar nessa idéia. Ajuda a gente a entender o que é possível
e que tem coisa que não está ao nosso alcance. (AS1)
Você tem que compartilhar, mas você também tem que
colocar um pouco de barreira dentro de você pra você ser
um profissional também, senão você não consegue, você
começa a se envolver de tal forma que você perde a linha
da parte profissional. (MD1)
É aquele momento que a gente vê se consegue separar o
profissional do pessoal. É difícil porque você trabalhando
aqui um tempo, você cria vínculos também com os idosos.
Você tem que continuar na sua postura profissional e não
97
perder seu lado humano porque a pessoa ta precisando de
um consolo, uma força, né. (AS1)
Eu acho que está incluído na assistência da enfermagem
esse apoio emocional. Independente do quadro e do
prognóstico, tanto ao paciente quanto à família. (EF3)
Com relação à necessidade do profissional ter um perfil para atuar com
estes pacientes, três concordam que o profissional precisa ter perfil. Ou seja, o
profissional precisa se identificar com a demanda, entender a sua complexidade e
ter estrutura emocional para lidar com a morte. No entanto, EF3 pensa que só é
possível identificar a afinidade ou não com determinado segmento (população
idosa, deficientes, saúde mental etc.) na prática profissional, onde cada profissional
descobre seus limites, em conformidade com a fala de EF1, e entende que os
cursos de graduação em enfermagem deveriam oferecer o mínimo de preparo a
respeito dos Cuidados Paliativos e da morte. Aqueles que não souberem lidar com
essa questão não conseguirão trabalhar com pacientes sem possibilidade de cura e
ou terminais, restando-lhes desistir do trabalho ou a realização de um trabalho
incompleto em virtude de não aguentarem as circunstâncias. É importante, mesmo
que brevemente, destacar as condições de trabalho dos profissionais nos serviços
onde atuam. Tanto o Home Care quanto a ILPI, por diferentes razões, possibilitam
à equipe boas condições de trabalho, ao oferecer espaço para discussão de
equipe,
ambiente
com
privacidade
para
atendimento,
disponibilidade
de
equipamentos com maior facilidade. Enquanto no hospital a enorme demanda, falta
de espaço, de profissionais e recursos financeiros reduzidos, dificultam e limitam a
intervenção do profissional de saúde.
O profissional tem que ter perfil, é indispensável ter o perfil.
Se você é uma pessoa, que você não tem organização,
você não tem uma paciência, você não sabe lidar com
situações de não ter o amanhã. (AS1)
Tem que ter o perfil de aceitar que a gente não vai
conseguir resolver tudo, porque a gente é formado pra
curar, né? A formação do médico é curar, e a gente tem
que ter mais sensibilidade, tem mais paciência, saber
conversar, saber lidar com a equipe. Tratar no mesmo nível
a equipe. O médico sai achando que é o deus e o resto tem
que obedecer a ele. (...) Quem não tem esse perfil, não
98
consegue trabalhar em equipe, em cuidados paliativos, em
geriatria. (MD1)
Claro, tem que ter. Com certeza absoluta. Tem que gostar
de cuidar de idoso. Eu, me coloca pra cuidar de criança que
eu não gosto de criança. Você tem que gostar de idoso,
você tem que ter paciência pra cuidar de idoso, senão... Ele
sofre na verdade, né? (EF1)
Perfil, não sei. Talvez um curso, com algumas orientações
e alguma preparação. Mas a gente vai aprendendo com o
dia a dia. (AS3)
Eu acho que essa orientação tem que vir da faculdade
porque o profissional tem que sair formado sabendo. Até
porque no geral a gente não escolhe o setor de trabalho
inicialmente. Então, ele tem que vir preparado e já
esperando que ele tenha que lidar com essas situações. Aí
se ele se desenvolve mais ou menos depende de cada um,
mas às vezes você não tem escolha. É como todos os
outros procedimentos mesmo os técnicos, você tem que
saber com o que você vai lidar pra saber se você tem
condição ou não, né. (EF3)
Tem que ter perfil senão ele não agüenta e não faz o
serviço adequado. (MD3)
A negação da morte pela família expressa somente a ideia passada pelo
capitalismo através do aparato tecnológico desenvolvido de que há sempre uma
intervenção hospitalar que pode evitar ou adiar a morte.
Outras dificuldades foram relatadas pelos profissionais do Home Care e que
tocam numa questão fundamental na atualidade e reflete os valores da sociedade
contemporânea. De acordo com as falas é possível identificar a concepção de
saúde como bem econômico e como tal evidencia as diferenças entre classes
sociais refletidas tanto no atendimento técnico como na relação profissional de
saúde e paciente. Parece possível fazer uma relação com a transformação da
saúde em bem econômico, ou seja, a saúde assume nos dias atuais características
de mercadoria.
Mas aí isso nunca é muito explícito. Você percebe que o
profissional dá um jeitinho, fala que foi outra coisa e sai. Ao
mesmo tempo que ele lida com famílias de alta renda, ele
lida com famílias de baixa renda, e a conversa tem que ser
completamente diferente. Lida com quem é emergente, lida
99
com quem já tá na decadência. A gente vê isso muito mais
na equipe de São Paulo. Um perfil muito diferente,
socioeconômico, de paciente. (MD2)
Nessa hora cabe-nos a orientação. Então, a assistente
social faz isso, né. A enfermeira acerta toda essa logística
de material, medicamento... porque o familiar está
morrendo ou morreu a gente tem que tratar da nossa parte,
né. Muitas vezes o lado de lá ta em luta e o lado de cá ta
querendo retirar material e medicamento. Parece nós não
pensamos, não nos interamos do luto. Não é isso.
Realmente é meio complicado essa situação próximo do
óbito e depois do óbito. (MD2)
To com 99,9% dos atendimentos é custeado pela
operadora de saúde e tal, porque particular ainda é um
custo alto. Tanto que os pacientes particulares não tem
queixa. Porque eles recebem tudo o que eles pedem,
porque eles pagam. No caso da fonte pagadora, não vai
gaze, não vai luva, não vai dieta, aquela dieta por sonda,
então isso gera um descontentamento. Então a gente tem
até isso, não de forma estatística, mas já tem isso com
certeza que, se eles recebessem tudo, a gente teria
insatisfação 0%. Porque aí dependeria do nosso auxiliar
faltar na visita, ou o nosso profissional não ser o adequado
de vista técnica. Isso aí a gente não tem problema. E
quando tem, aí tem a empatia, e a gente se acerta. Porque
nessa fase terminal, usa-se fralda, usa-se gaze. A equipe
usa dieta, dieta industrializada. Material de seringa,
curativo, isso há um custo alto, né? Isso gera um
descontentamento... (MD2)
Aí encara o custo todo, não só da gaze, até a pomada, até
a dieta, que é caro, que é um custo bem... (AS2)
O poder público ajuda bastante, porque hoje a gente
consegue fralda, dieta, curativo. Principalmente se for
idoso, né? Porque se for idoso o Estado é obrigado a dar
qualquer coisa, qualquer medicamento, cuidado integral.
Então se a gente faz um relatório, as famílias conseguem
com certa facilidade. Consegue fácil. Qualquer prefeitura.
Oxigênio também eles conseguem fácil. (MD2)
A despeito do que foi colocado, é preciso desmistificar a ideia equivocada de
que os Cuidados Paliativos demanda “baixa tecnologia” por valorizarem o contato
humano, não precisando de investimentos. Os Cuidados Paliativos não confrontam
100
os conhecimentos terapêuticos e a tecnologia existente que colabora sobremaneira
com o alívio dos sintomas, mas procura abranger todas as necessidades do
paciente (MARCUCCI, 2009).
De fato todas as dificuldades apontadas tem consequência direta na forma
como os profissionais de saúde realizam sua prática profissional.
3.4.1.4 Identificação e compreensão dos Cuidados Paliativos
Solicitados a definirem o que são Cuidados Paliativos, MD1 respondeu que
são cuidados dados a pacientes sem possibilidades de cura ou na fase terminal,
visando à melhor qualidade de vida ao aliviar o sofrimento. AS1 vê os Cuidados
Paliativos como uma importante estratégia para o trabalho com o idoso portador de
doença crônica, oferecendo mais dignidade e individualidade no atendimento ao
paciente. Apesar de MD2 realizar algumas reflexões importantes, sua prática e seu
olhar estão focados na conduta médica sob o ponto de vista biológico. Já EF1
entende o sentido geral, mas não a abrangência dos cuidados paliativos na medida
em que toda sua fala permeia os cuidados objetivos com os pacientes. AS2 é muito
objetiva e não mostrou profundidade no conhecimento do tema e restringiu-se à
qualidade de vida. Enquanto EF2 demonstra uma compreensão um pouco mais
completa dos Cuidados Paliativos ao considerar além da qualidade de vida a
importância da família estar incluída no atendimento. No Hospital, EF3 dominam o
conceito e a filosofia dos Cuidados Paliativos e dentro dos limites da instituição
tenta possibilitar a realização de alguns desejos dos pacientes e familiares como
visitas mais frequentes e em horários diferenciados, além de incentivar a presença
da figura religiosa. Já MD3 e AS3 revelam não possuir nenhum conhecimento, nem
mesmo superficial sobre os Cuidados Paliativos.
É assim que eu vejo, que você vai dar um conforto pra
pessoa no processo dela de finitude. Quando a gente sabe
que não tem o que fazer por essa pessoa e que nenhuma
intervenção vai dar pra ela uma sobrevida uma
possibilidade de cura ou uma melhora significativa. (AS1)
101
São cuidados específicos que não é aquele cuidado de
cura. É um cuidado que você tem que tentar dar o maior
conforto possível, amenizar a dor do paciente, e conforto e
alimentação. Isso que eu entendo por cuidados paliativos.
A pessoa tem que ter uma boa hidratação, uma boa
alimentação, muitas vezes por sonda, a pessoa quer por
tempero na comida. O paciente tem que estar nutrido,
hidratado, sem dor e limpo. Pra mim isso é cuidado
paliativo (EF2).
O que a gente já entendeu os últimos 3, 4 anos é que se
pensava que era só paciente com câncer terminal, e não,
são paciente com doenças, e as doenças são terminais.
Doença cardíaca, doença pulmonar, a própria neoplasia, o
câncer. Então a situação é terminal. Saiu da perspectiva
terapêutica, passa aos cuidados paliativos. Como eu tinha
falado antes, mesmo durante os cuidados paliativos, eu
posso ter um emprego curativo, ou seja, eu posso tratar
uma pneumonia, que tem um câncer terminal, e não tem
mais perspectiva praquele câncer. Ele merece tratar
pneumonia, ele merece tratar infecção urinária. Ou, o que a
gente entende. Não fiz curso. Só de ler. Uma mescla, de
cuidados curativos e paliativos num paciente que não tem
perspectiva de sobrevida longa. (MD2)
Que aí você vai tentar melhorar a qualidade de vida. Se
quase a totalidade deles evoluem com dor no final, trata a
dor, tratar infecção, tratar aquela dispnéia, aquela falta de
ar... (MD2)
Então lá no domicilio, como é que a gente vai tratar. A
gente também pra esses pacientes também tem o
atendimento
psicológico,
então
também
faz
o
acompanhamento, também entra no acompanhamento
desse processo de morte, né? Esses cuidados paliativos,
né? O seu conhecimento técnico, os cuidados técnicos,
mas também sempre visando à qualidade de vida do
paciente, englobando os familiares próximos, participando
desse processo. A gente se baseia nisso. (EF2)
Não conheço, não. Quer dizer já ouvi dizer algumas coisas,
mas muito vago. (AS3)
Então aqui geralmente o que a gente proporciona são os
cuidados mais físicos. O lado psicológico e emocional a
gente percebe que fica mais a cargo da família. Por
exemplo, a família traz um representante da religião da qual
a pessoa pertencia pra acompanhar... a gente, quando é
102
um caso bem terminal mesmo abre exceções pra visitantes,
pra acompanhantes pra que tenha esse espaço. A gente
costuma colocar o paciente num quarto sozinha pra dar
essa abertura pra visitação diferenciada e que não
incomode os outros pacientes. (EF3)
A fala abaixo de AS1 evidencia a contradição entre o modelo biomédico que
na maioria das vezes segue o caminho da obstinação terapêutica e os Cuidados
Paliativos. Reconhece que quando um tratamento não traz mais benefícios e só
torna a vida do paciente mais dolorosa, não faz sentido. O entendimento está em
conformidade com DEBRAY (apud Pessini, sd, s.p.).
Então para evitar que se entube, passe sonda ou algum
outro procedimento invasivo que vai trazer mais sofrimento
para essa pessoa e vá fazer que ela tenha uma morte mais
dolorosa. Então usar os Cuidados Paliativos nesse sentido
de dar um conforto melhor para que ele tenha um processo
mais tranquilo. (AS1)
O fim é inevitável. Então se a gente já tá fechado o
prognóstico dele que é caminhar para a finitude tem dois
caminhos, fazer com que esse processo seja mais
tranqüilo, mais digno, menos doloroso e que a pessoa
possa correr o processo de uma forma natural, né, entre
aspas ou a gente pode usar de métodos invasivos que
pode dar uma sobrevida momentânea que pode acabar
trazendo mais sofrimento ou que de repente pode até
acelerar o processo, né. (AS1)
Foi perceptível que a compreensão da filosofia dos Cuidados Paliativos não
se dá de forma homogênea pelos profissionais sujeitos deste estudo. Alguns
demonstram entendimento mais profundo, outros apenas um entendimento
superficial, e outros ainda não tomaram conhecimento desse novo modelo de
cuidar.
Os discursos mostram que os sujeitos não realizam os cuidados paliativos
integralmente conforme conceituado pela OMS (2002) objetivando também o apoio
psicológico, social e espiritual, ou seja, além do modelo assistencial curativo onde
predomina a dimensão técnica, pensando num modelo que atenda o paciente nas
suas necessidades globais.
103
CONSIDERAÇÕES FINAIS
“Todo o interesse na doença e na morte é, em verdade,
apenas uma outra expressão do nosso interesse na vida.”
(Thomas Mann)
Este estudo pretendeu compreender como se dá o cuidado a pacientes
terminais e/ ou sem possibilidades de cura na visão dos profissionais de equipes de
saúde, tendo como objetivo geral entender o significado que os profissionais de
equipes de saúde atribuem aos Cuidados Paliativos e a seus respectivos papeis
nesse tipo de conduta.
Considerando os fenômenos do envelhecimento populacional e do aumento
das doenças crônicas, entendeu-se a necessidade de discutir as questões da morte
e do morrer com os profissionais de equipes de saúde. Por ser um tema
desconfortável e cuja abordagem causa estranhamento nos profissionais de saúde
que trabalham em instituições de saúde e serviços de abrigamento institucional de
idosos aonde inevitavelmente em algum momento irão se deparar com morte,
revelam toda a complexidade do enfrentamento da questão no cotidiano de
trabalho.
Os dados revelaram que o significado que os profissionais de equipes de
saúde atribuem à morte tem relação com a abordagem sobre a morte e as
questões diante do morrer pela família no processo de formação de cada um. No
que compete à família destaca-se a religião que entende a morte como uma
passagem do estágio natural para a próxima existência, para o plano espiritual. A
religião conforta na medida em que há esperança numa “outra vida”, ou seja, na
crença de que a morte não é o fim de tudo. Para eles a religiosidade ou
espiritualidade também dá suporte e apoio aos pacientes e familiares, podendo
ajudar no desapego e inclusive facilitar os cuidados com o paciente e
posteriormente a família na fase do luto.
A experiência profissional explicita, quase que diariamente, a finitude
humana. O trabalho profissional e técnico que realizam enfatiza a visão biológica da
vida para a qual a morte é a falência dos órgãos. Assim, seja pelos valores
104
passados pela religião ou pelo trabalho que tratam da morte, ela é encarada como
processo natural e inerente à vida.
Contudo, tal entendimento não elimina o medo da morte e o pensamento
sobre sua própria morte, relacionado com o medo do que vem após a morte e o
medo da extinção, conforme KASTENBEUM (apud Kovàcs, 1992) e declarado
abertamente apenas por AS3.
A relação da prática profissional na área da saúde com a morte se apresenta
no entendimento da morte como parte do cotidiano de trabalho, na abordagem e no
trato destas questões, na relação entre profissional de saúde – paciente sem
possibilidades de cura e/ ou pacientes terminais, na qualidade de vida, na
preparação para lidar com a morte e no trabalho em equipe.
Para esses profissionais, a morte é encarada como parte do cotidiano de
trabalho embora a sua abordagem seja difícil de lidar. Os Cuidados Paliativos é um
modelo de atenção que pressupõe o estabelecimento de um vínculo profissional –
paciente; no entanto, a natureza e as condições de trabalho principalmente nos
serviços de saúde só levam a desvinculação em contraposição ao discurso da
humanização que se tem escutado nos últimos anos.
Assim, o sentimento da perda e o luto que estão diretamente relacionados ao
tipo de vínculo estabelecido entre profissional de saúde e paciente, pouco atingem
os profissionais do Home Care e do Hospital. Dentre os profissionais de saúde
entrevistados, os que estabelecem maior vínculo com os pacientes atuam na ILPI,
o que só é possível diante da natureza do serviço.
O discurso dos médicos entrevistados corrobora os resultados encontrados
por Consorte (in Martins, 1983) segundo os quais a discussão da morte na prática
médica revela estar voltada para a vida, sendo que esta e não a morte se coloca no
centro das preocupações dos médicos. No caso das enfermeiras, e aqui se
acrescentam as assistentes sociais, a reação diante da morte depende de algumas
variáveis: circunstância da morte, o grau de envolvimento com o paciente e a idade
do morto. A morte de uma criança ou uma pessoa jovem é considerada antinatural.
O nível de consciência e lucidez do paciente sem possibilidade de cura e/ ou
paciente terminal determina o tipo de relação entre este e o profissional de saúde.
Apesar de relatarem não ter diferença no tratamento entre os pacientes, na medida
em que a doença avança praticamente não existe relação direta entre este e o
profissional de saúde que acaba direcionando sua atenção para o familiar/
105
cuidador, a não ser quando realiza os procedimentos técnicos, na maioria das
vezes desempenhados pela equipe de enfermagem. Desse momento em diante a
família passa a ser responsável por essa mediação. Para os enfermeiros a atenção
ao cuidado é mais próxima porque são os profissionais que mantém contato direto
com os pacientes. Pelas falas desses profissionais durante as entrevistas também
foi possível identificá-los como os profissionais mais atarefados.
Com relação à preparação para lidar com a morte, os profissionais referem
que a formação no curso de graduação não fornece os conhecimentos necessários
para os cuidados de pacientes sem possibilidades de cura e/ou pacientes terminais
de forma significativa. Aqueles que possuem algum conhecimento, adquiriram-no
por meio de em cursos de especialização e em cursos e palestras promovidas
pelos serviços onde trabalham.
Com relação à qualidade de vida para os pacientes sem possibilidades de
cura e/ou pacientes terminais a visão predominante é o alívio do sofrimento por
meio do controle dos sintomas físicos. E mesmo no aspecto físico, na maioria das
vezes manter um familiar com conforto e possibilitar a melhor qualidade de vida
possível está além das possibilidades de intervenção dos profissionais de saúde.
As condições objetivas de vida sob o capital são incompatíveis com os custos
necessários para proporcionar qualidade de vida para o paciente como, por
exemplo, atendimento domiciliar, medicamentos produzidos com alta tecnologia,
equipamentos, cuidadores profissionais e alimentação especial.
A complexidade dos problemas de saúde de pacientes sem possibilidades
de cura e/ ou pacientes terminais requer para o seu enfrentamento a utilização de
múltiplos saberes e práticas.
Outro assunto bastante discutido e abordado foi o trabalho em equipe.
Contar com o respaldo de uma equipe acompanhando o paciente dá mais
tranquilidade tanto para a família quanto para os próprios profissionais lidarem com
a situação da morte, pois quando esta acontecer saberão que fizeram tudo o que
podia ser feito e que o paciente não foi abandonado.
Porém, o fato de reunir diferentes categorias profissionais para a realização
de um mesmo trabalho não significa que os profissionais estarão “livres” de suas
instituições. Num trabalho em equipe, eles trarão consigo a bagagem e a
representação de cada profissão. Todavia, compor uma equipe multiprofissonal não
precisa ser uma atividade onerosa, se as habilidades dos profissionais forem
106
operacionalmente utilizadas. . A chave está em fazer convergir as habilidades para
o atendimento de um mesmo objetivo. A relação estabelecida entre os profissionais
de diferentes áreas é determinante para o alcance de resultados frente às questões
que exigem sua intervenção em distintos níveis.
O trabalho multiprofissional e interdisciplinar é um desafio, mas quando
realizado multiplica os resultados. A multidisciplinaridade como relação harmônica
de diferentes profissionais, num mesmo ambiente de trabalho, já é prática comum.
A interdisciplinaridade, no entanto, implica relação entre sujeitos, reciprocidade de
trocas, discussão, complementações, respeito pela visão de mundo do outro,
intensidade de trocas entre especialistas, disciplinas, profissões. A ampliação da
consciência crítica do conjunto ainda está aquém da discussão do tema no campo
da teoria, onde em princípio a interdisciplinaridade é perfeitamente possível. De
forma que na realidade da prática por meio da relação entre sujeitos concretos,
enfrentando problemas também concretos com diferentes perspectivas de análise
da realidade e de ação sobre ela, torna – se um enorme desafio para os
profissionais e as instituições. Para os profissionais da ILPI, quando o trabalho é
realizado em equipe, tornam-se possíveis a divisão de responsabilidade e a
possibilidade de compartilhar com todos os profissionais e a família o cuidado do
doente.
As maiores dificuldades apontadas pelos profissionais em relação à questão
da morte e pacientes terminais e/ou sem possibilidades de cura no cotidiano de
trabalho são a ideologização do hospital como lugar de cura, a relação com a
família do paciente, lidar com a dor do outro (pacientes e familiares) e a falta de
perfil profissional para atuar com a demanda.
Nem todos os profissionais terão “facilidade” em lidar com a terminalidade.
Dificuldade para lidar com o sentimento de impotência, porque independente do
seu trabalho, o paciente vai morrer. Os limites de cada um vão aparecer diante do
preparo e a experiência profissional. Entretanto, o perfil para atuar com a demanda
como qualquer outra é uma descoberta do profissional a partir da sua experiência e
vivência.
Desses pontos, os dois primeiros se destacam e aparecem quase como
consenso entre os profissionais entrevistados. Na visão deles, a maior dificuldade
no trabalho é lidar com a família. Especificamente no Home Care, onde na maioria
das vezes a abordagem ao paciente é mínima e o foco é direcionado à família e/ou
107
o cuidador. Os profissionais do Home Care entendem que fazem orientação e
preparação da família para a morte do paciente. Contudo, a abordagem não
prepara de fato o familiar para o desapego e no geral são orientações, embora
necessárias, meramente burocráticas sobre as técnicas de cuidado e orientações
relacionadas aos trâmites do velório e do sepultamento. Já a ideologização do
hospital como lugar de cura é tão forte que nos momentos finais a família sempre
exige que o paciente seja removido para o hospital e medidas extraordinárias sejam
tomadas.
No geral o entendimento dos profissionais entrevistados sobre os Cuidados
Paliativos é bastante superficial e em alguns casos não há entendimento algum. Os
Cuidados Paliativos não são entendidos por todos os profissionais como uma nova
forma de cuidados na saúde. Os discursos mostram que os sujeitos não realizam
os Cuidados Paliativos integralmente conforme conceituado pela OMS (2002)
objetivando também o apoio psicológico, social e espiritual, ou seja, num modelo
que atenda o paciente nas suas necessidades globalmente, indo além do modelo
assistencial curativo onde predomina a dimensão técnica.
Os três serviços, com características diferentes, atendem a mesma
demanda; e a natureza distinta de cada um acaba refletindo na forma de
atendimento aos pacientes. A ILPI é uma instituição diferenciada, sem dúvida, ao
primar
por
um
atendimento
global
onde
os
profissionais
de
diferentes
especializações se dedicam ao atendimento dos idosos. Além de discutirem entre a
equipe e com a família o caminho a ser seguido no atendimento do paciente. Esse
tem sido o caminho percorrido pelos profissionais do serviço que buscam ampliar o
olhar para essa nova realidade que vem se desenhando. Embora na ILPI seja visto
como uma importante estratégia para o trabalho com o idoso portador de doença
crônica, oferecendo mais dignidade e individualidade no atendimento do paciente.
No Home Care trata-se de um trabalho técnico e altamente especializado no
tratamento da dor física e controle dos sintomas, cujo processo de trabalho acaba
por permitir certo distanciamento entre o profissional e o paciente. As
desigualdades sociais e a dificuldade de lidar com as mesmas são sentidas pelos
profissionais no Home Care, pois beneficia desigualmente os usuários dos seus
serviços dependendo da cobertura do plano de saúde que possuem. A assistente
social do serviço (AS2) recorre quando necessário aos órgãos públicos, na tentativa
108
de sanar algumas necessidades que a família não tem recursos para arcar, sendo
mais comum com os idosos (Estatuto do Idoso).
No hospital, apesar de ser o espaço delegado para a morte na sociedade
contemporânea, a prática profissional “engole” os profissionais, cada dia mais
atarefados, e consequentemente sem tempo para refletirem as ações no cotidiano
de trabalho, entre as quais a morte de um paciente. Nada que escape à rotina e a
disciplina cabe na instituição.
Os Cuidados Paliativos de uma forma geral é uma ideia ainda subversiva na
área de saúde no Brasil. Na medida em que perturba o cotidiano das práticas
dentro das instituições ao contrapor o que se aprendeu nos cursos de formação,
bem como o referencial técnico-científico hegemônico ao considerar o componente
mais subjetivo dos pacientes. Embora localizadas próximas ao maior capital do
país, a cidade de São Paulo, os profissionais não dispõem da mesma quantidade e
qualidade de informações sobre os Cuidados Paliativos. Talvez seja explicado pelo
fato de o Sistema Único de Saúde no Brasil ainda buscar a concretização de uma
atenção básica de qualidade. A própria ideologização do hospital como espaço de
cura dificulta a disseminação e a incorporação dos Cuidados Paliativos.
Ainda é difícil para as equipes médicas aceitarem que um paciente sem
possibilidades de cura e/ou sua família não queira que sejam utilizadas medidas
invasivas porque aceitaram o processo natural da morte. A obstinação terapêutica
está presente no cotidiano de trabalho dos profissionais de saúde, principalmente
do médico, que às vezes são abordados por familiares solicitando intervenção.
Portanto, a ideologização do hospital tem relação direta com a obstinação
terapêutica.
Talvez neste momento os CP não se configurem como uma necessidade de
saúde da população, mas na medida em que as necessidades são dinâmicas, além
de social e historicamente construídas, é preciso estar preparado para incluí-los
nos serviços de saúde como um modelo de cuidado como qualquer outro. Sem
dúvida os serviços existentes ousaram na implantação de unidades especializadas
em CP e ainda enfrentam inúmeras dificuldades.
A aceitação dos CP como um
modelo de assistência à saúde requer, entre outras coisas, o amadurecimento na
formação de recursos humanos na área.
Cada profissional deve procurar um ponto de equilíbrio no envolvimento e no
trato da dor do outro, sendo o principal objetivo o acolhimento e não banalização da
109
morte. Na medida em que não é possível oferecer aos pacientes tratamentos que
propiciem a cura de sua doença, é possível ajudá-lo nesse momento tão difícil. A
questão é de que forma ele morreu.
Precisa ficar claro que o cuidado não se opõe ao trabalho, mas lhe confere
uma tonalidade diferente, o que não se quer dizer que cuidar seja uma tarefa fácil
em nenhum momento, mas definitivamente é necessária. Para atuar com pacientes
sem possibilidades de cura e/ou pacientes terminais é preciso sair de sua zona de
conforto. Cuidado e cura não são incompatíveis como se quer convencer. O
cuidado precisa fazer parte do cotidiano de trabalho dos profissionais de saúde seja
com pacientes que tenham perspectiva de cura ou não. Porém, requer o
estabelecimento maior de vínculos e mais tempo dedicado aos pacientes.
Morrer acompanhado pela família assegura que uma determinada sociedade
cultiva esse valor como primordial. Todavia, a sociedade contemporânea incentiva
a busca individual pelo bem estar absoluto, pela juventude eterna e tenta exorcizar
a morte da vida das pessoas. Deste modo, a sociedade como um todo não
consegue lidar com a concretude do sofrimento. Há um despreparo para lidar com
os que estão morrendo e com a morte. É evidente que as pessoas não refletem
sobre a finitude humana. É como se as pessoas não morressem, mas
simplesmente desaparecessem.
Assim, a implantação dos CP, na forma prevista na sua filosofia, pressupõe
uma mudança nos valores que são adotados por esta sociedade que ao exaltar a
forma física, enaltece o hedonismo, o consumismo, a competitividade e o
utilitarismo das coisas e das pessoas.
É possível deduzir que os pacientes com doenças incuráveis não tem
recebido um tratamento humanizado, ou seja, um tratamento que alivie a sua dor e
seu sofrimento em todas as suas dimensões. Ainda falta à equipe de saúde preparo
e um olhar mais abrangente que dê suporte ao paciente e à família dando conta de
suas necessidades em diferentes dimensões.
Por fim, a busca de respostas para este estudo evidenciou a necessidade de
superação do modelo biomédico de atenção à saúde, meramente curativo; esperase que este trabalho venha a contribuir com informações que possibilitem novos
olhares para o enfrentamento das necessidades dos pacientes sem possibilidades
de cura e/ ou terminais.
110
Os discursos, no entanto, revelam que para esses profissionais de saúde os
papeis que vem desempenhando na assistência aos pacientes sem possibilidades
de cura e/ou terminais está direcionado basicamente à dimensão física do cuidado.
O mais importante, no entanto, não é a ampliação de unidades ou serviços
de Cuidados Paliativos, mas a expansão do entendimento da sua filosofia visto que
pacientes terminais ou sem possibilidades de cura buscam os mais variados
serviços de saúde. Se os profissionais de saúde entenderem a morte como um
processo natural, o paciente será melhor cuidado sem a necessidade de sofrer com
tratamentos fúteis. Os Cuidados Paliativos vem contribuir para a abrangência e
aprofundamento dos cuidados de saúde na tentativa de adequar o sistema de
saúde ao atendimento das necessidades desses pacientes estejam onde
estiverem. Nas palavras de KÜBLER-ROSS (1987, p.33), “a nossa meta não
deveria ser dispor de especialistas para pacientes moribundos, mas treinar pessoal
hospitalar para enfrentar serenamente tais dificuldades e procurar soluções”, e
acrescente-se, não se afastar do paciente.
Em tempos de lutas pelo direito de viver e envelhecer com dignidade, nada
mais natural e concreto de estender essa luta ao direito de morrer com dignidade.
Quando o paciente se depara no limite entre a vida e a morte, não deixa de ser
humano e detém os mesmos direitos que qualquer outra pessoa. Deve ser visto em
sua totalidade respeitando-se suas vontades, suas angústias e seu direito ao
acesso à saúde pública. Mesmo que o seu tempo de vida seja breve, deve ser
ouvido, atendido e respeitado.
111
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APÊNDICE I – Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (TECLE)
Eu, Paula Fernanda Xavier Medeiros estou realizando um estudo intitulado o
“PENSAR O CUIDAR NO MORRER: ENTRE A OBSTINAÇÃO E A
ESPERANÇA”. O objetivo deste estudo é entender o significado que os
profissionais das equipes de saúde atribuem ao cuidado paliativo e a seus
respectivos papéis nesse tipo de conduta. Trata-se de uma pesquisa realizada
para dissertação como exigência para obtenção do título de Mestre em Saúde
Coletiva, sob orientação da Profª Drª Amélia Cohn do Programa de Mestrado
em Saúde Coletiva da Universidade Católica de Santos. O estudo consta de
uma entrevista semi–estruturada onde não serão feitas perguntas diretas, sendo
solicitado ao entrevistado que fale abertamente sobre os tópicos. A entrevista
será gravada e transcrita.
•
•
•
•
•
•
Concordando em participar desta pesquisa, irei colaborar como entrevistado(a)
em entrevista realizada no meu local de trabalho ou em local que eu melhor
escolher (se eu concordar).
Mesmo sabendo que não há risco neste estudo, estará livre para não responder
alguma questão que me trouxer desconforto e sei que posso, a qualquer
momento, interromper meu depoimento.
O acesso às respostas será reservado à Paula Fernanda Xavier Medeiros e à
Profª. Drª Amélia Cohn. Em nenhum relatório, artigo ou apresentação dos
resultados da pesquisa será usada a sua identificação, nem sua voz gravada.
A vantagem em participar deste estudo é a contribuição para uma melhor
compreensão dos aspectos que envolvem o cotidiano de trabalho das equipes
de saúde diante de pacientes sem possibilidades de cura e/ ou pacientes
terminais.
Tem o direito de receber informações atualizadas durante qualquer fase desta
pesquisa. No caso de haver dúvidas quanto à sua participação neste estudo,
poderá entrar em contato com as responsáveis na Universidade Católica de
Santos, Rua Drº Carvalho de Mendonça, n°144, Vila M athias – Santos, telefone
(13) 9174-2007 e pelo email [email protected]. Se você tiver alguma
consideração ou dúvida sobre a ética da pesquisa, entre em contato com o
Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) - Prédio Administrativo. Avenida
Conselheiro Nébias, 300 – Sala 202, (13) 3205-5555, ramal 1419 – E-mail:
[email protected].
Não terá nenhum gasto ou ganho financeiro por participar da pesquisa.
Pelo presente instrumento que atende às exigências legais, o
Sr.(a)_________________________________________________________,
portador(a) da cédula de identidade__________________________, declara
que, após leitura minuciosa do TECLE, teve oportunidade de fazer perguntas,
esclarecer dúvidas que foram devidamente explicadas pelos pesquisadores,
ciente dos serviços e procedimentos aos quais será submetido e, não restando
quaisquer dúvidas a respeito do lido e explicado, firma seu CONSENTIMENTO
LIVRE E ESCLARECIDO em participar voluntariamente desta pesquisa estudo
e poderei retirar meu consentimento a qualquer momento, antes ou durante o
mesmo, sem penalidades ou prejuízos.
.
E, por estar de acordo, assina o presente termo.
Assinatura do (a) entrevistado (a)
Data: _______/_______/________.
Declaro que obtive de forma apropriada e voluntária o Consentimento Livre e
Esclarecido desta pessoa para a participação neste estudo.
Assinatura do responsável pelo estudo
Data: ________/_______/_________.
APÊNDICE II – Roteiro de entrevistas
Roteiro de entrevistas
1) Identificação
- Nome:
- Idade:
- Sexo:
- Religião/ Espiritualizado:
- Local de nascimento:
- Ocupação:
- Local de trabalho:
- Formação:
2) Pontos
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Significado da morte.
No ambiente familiar – abordagem da questão da morte e sobre as decisões
diante do morrer
A morte no cotidiano de trabalho.
Preparação para lidar com estas questões.
Organização do trabalho em relação aos pacientes sem possibilidade de
cura e/ ou pacientes terminais.
Lidar com a dor do outro (usuários e familiares).
Trabalho em equipe.
Relação profissional de saúde – paciente sem possibilidades de cura e/
pacientes terminais.
Pacientes sem possibilidades de cura e/ pacientes terminais e qualidade de
vida.
Perfil de profissionais para atuar com esta demanda.
Entendimento dos Cuidados Paliativos.
Relacionado ao tema, relate um caso, uma situação que marcou sua
trajetória profissional.
OBSERVAÇÃO: outras questões poderão ser formuladas pelo pesquisador para
completar a coleta dos dados, tendo em vista os objetivos da pesquisa,
respeitando-se o ritmo, a disponibilidade e clima de cada entrevista.
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