Marchesan IQ. Introdução. In: Krakauer HL, Francesco R. Marchesan IQ. (Org.) Respiração Oral. Coleção CEFAC. São José dos Campos. Ed. Pulso. 2003. p.9-12. INTRODUÇÃO Respiração Oral Dra. Irene Queiroz Marchesan Diretora do CEFAC – Centro de Especialização em Fonoaudiologia Clínica Titulação: Doutor em Educação pela UNICAMP Universidade de Campinas Endereço: Rua Cayowaá, 664 CEP 05018-000 São Paulo – SP Brasil. Telefone: 55- 11 – 36751677 E-mail: [email protected] www.cefac.br A respiração oral tem sido um tema bastante discutido entre os fonoaudiólogos, dentistas e médicos das diferentes especialidades. Observamos que o atendimento aos pacientes portadores de alterações de respiração aumentou muito e a importância que pacientes e familiares têm dado a este assunto é muito maior do que antigamente. Por que isto está ocorrendo? Será que temos mais respiradores orais hoje do que antes? Será que as alterações hoje são maiores do que antigamente? Ou será que estamos mais aptos a identificar o problema e a tratá-lo? Muito provavelmente a resposta correta é a última. Hoje os profissionais que lidam com a respiração oral estão mais aptos a reconhecer o problema e também sabem melhor como lidar com esta problemática. Este livro é o reflexo desta situação. Médicos, fonoaudiólogos, dentistas, todos juntos têm pensado soluções para o respirador oral. Para que possamos tratar da respiração oral é necessário saber exatamente o que é isto, quais são as conseqüências deste fato, ou seja, respirar pela boca e não pelo nariz, como se pode diagnosticar corretamente e a partir do diagnóstico quais as possibilidades de tratamento sejam elas médicas, odontológicas, fonoaudiológicas ou fisioterápicas. Outro conhecimento fundamental é prestar atenção nas prioridades, por exemplo, quem começa o tratamento. Devemos, dentre outros aspectos, estar atentos para as alterações morfológicas, pois muitas vezes se torna impossível, ou muito difícil, selar os lábios para poder manter a respiração pelo nariz. As vias aéreas podem até estar desobstruídas, mas se existe uma discrepância grande entre a maxila e a mandíbula no sentido horizontal ou mesmo vertical, o simples ato de encostar um lábio no outro pode se tornar inviável. Neste caso, tem que estar claro para todos os profissionais que lidam nesta área, que o dentista, ou é o primeiro profissional a trabalhar com este paciente melhorando sua oclusão, ou pelo menos deverá estar agindo concomitantemente com os outros membros da equipe. Outro fato ao qual devemos dar importância, já que estamos trabalhando em equipe com esta problemática, é o uso dos termos corretos para identificar a mesma alteração. Então vem a dúvida sobre o nome correto, respirador oral ou bucal? Ou melhor dizendo, por que respirador oral e não bucal? Na verdade a terminologia não vai mudar o quadro evidentemente e muita literatura já foi produzida usando ou um, ou outro nome. O que encontramos com mais freqüência é respirador bucal. Seria mais ou menos como usar derrame ou acidente vascular encefálico (AVE). Claro que os dois termos significam (quase) a mesma coisa. Porém quem usa um e quem usa outro? Ou melhor dizendo, quando se deve usar um ou outro? A terminologia da área da saúde têm sido discutida mundialmente, e regularmente em muitas reuniões realizadas pela Sociedade Internacional de Anatomia. Um dos produtos destas reuniões foi a edição de um livro sobre a terminologia anatômica que foi uma criação conjunta da Comissão Federativa da Terminologia Anatômica e de 56 associações, que são os Membros da Federação Internacional de Associações de Anatomista, sendo esta a única entidade internacional que representa todos os aspectos da anatomia e as associações anatômicas(1). O objetivo principal deste livro foi apresentar a terminologia oficial das ciências anatômicas após consultar todos os membros da International Federation of Associations of Anatomists, para assegurar sua participação democrática na terminologia. Sabemos que falar e escrever corretamente a nômina correta, ajuda muito na compreensão daquilo que estamos discutindo. O fato de sabermos usar termos referendados por uma publicação oficial única, faz com que os nomes utilizados em um artigo publicado no norte ou no sul de um país, ou mesmo em diferentes países, tenha sempre o mesmo significado para todos que o lerem. Todas as profissões que pertencem à área da saúde devem utilizar sempre os mesmos termos para que possam ter uma comunicação efetiva entre si. Por esta razão, e como havia muita discrepância, quanto ao termo mais adequado respiração oral ou bucal, foi realizada uma consulta formal à Sociedade Brasileira de Anatomia (SBA) sobre qual termo utilizar. Esta consulta foi realizada pelo Comitê de Motricidade Oral da Sociedade Brasileira de Fonoaudiologia em 2001. A resposta foi que o correto seria respiração oral já que bucal se refere às bochechas. Além da resposta oficial da SBA, podemos consultar o referido livro, de Terminologia Anatômica, e lá poderemos encontrar alguns nomes de músculos e outras estruturas que podem nos auxiliar a clarificar esta dúvida, respiração oral ou bucal. O Sistema Digestório, composto pela boca, fauces, faringe, esôfago, estômago dentre outros, é um bom começo para nossa consulta. Vejamos o que diz o referido capítulo sobre os nomes das partes da boca: região oral, cavidade oral, vestíbulo da boca, rima da boca, lábios da boca, ângulo da boca, cavidade própria da boca, entre outros. E sobre os músculos diz-se: músculo abaixador do ângulo da boca e orbicular da boca, por exemplo. Por que tudo é “da boca” e não “bucal”? Por que a região é oral e não bucal? Na verdade existem os dois termos, oral e bucal, porém significando diferentes partes do corpo humano. Portanto, encontramos também no mesmo livro a expressão bucal. Quando? No momento onde a referência está sendo feita para as bochechas. Ao continuar a consulta podemos ver que quando lemos sobre a estrutura “dentes”, encontramos cúspide mesio-bucal, cúspide disto-bucal, face vestibular e face bucal. Ou seja, aquilo que esta se referindo, ou está voltado para as bochechas, é bucal. Desta forma podemos dizer que apesar de ser mais usual e, portanto, mais fácil se referir ao indivíduo que respira pela boca como respirador bucal, entendemos que ao escrever um livro que vai contribuir com o clínico que trabalha na área deveríamos optar pelo nome correto e oficial da nomenclatura internacional de anatomia, que é respirador oral. Apesar desta discussão ser mais afeita à medicina, esperamos que os outros profissionais que lidam com a saúde também passem a se interessar por termos corretos ao escrever, para que possam ser compreendidos e até valorizados em todos os âmbitos. Finalizando esta introdução, gostaria de relatar um caso que muito me chamou a atenção pela possibilidade de aprendizado e reflexão. Certa vez, atendendo a uma criança respiradora oral, na reavaliação bimensal que fazemos com os pais, durante a fase da terapia, a mãe me fez uma pergunta bastante curiosa. Ela me pediu desculpas por perguntar algo que lhe parecia muito simples, mas que ela ignorava a resposta. Disse ainda, que teve vergonha de expor esta sua dúvida ao ortodontista que também atendia a criança. Sua dúvida, era por que insistíamos tanto para que a criança respirasse pelo nariz e não mais pela boca, já que a distância que separa um do outro não passava de um “dedo deitado”. Por alguns segundo fiquei olhando para o casal sem saber como começar a responder a esta pergunta, aparentemente tão simples. Pensando um pouco antes de responder observei que aquilo que nos parece tão óbvio não o é para a maioria dos seres humanos. Nestes segundo de reflexão que parei para saber como responder a esta questão, a mãe continuou com suas observações. De fato se eu posso viver respirando pela boca, porque deveria respirar pelo nariz se o ar chega aos pulmões de maneira igual? Já que é tão difícil mudar este hábito para que tanta insistência e até, uma certa “perda de tempo”, em ficar treinando este aspecto? A criança não viveria igual respirando por um “buraco” ou pelo outro? Este caso me fez ser, daí para frente, muito mais cuidadosa nas minhas explicações para a importância da respiração nasal e não oral. Sabemos que um dos componentes para a terapia dar certo, é quanto de adesão à terapia ocorre no caso tratado. A adesão à terapia deve ser do paciente e de seus familiares e esta adesão, só vai ocorrer, se o que estamos tratando faz sentido para eles. Acredito que faz sentido para qualquer ser humano aquilo que compreendemos, pois caso contrário, eu continuaria perguntando. “Qual a diferença entre um buraco e outro já que eles estão tão próximos?”. A leitura dos capítulos deste livro ajudará a todos nós a compreendermos mais e melhor os respiradores orais e toda a sua problemática, fazendo com que possamos responder a perguntas tão simples como estas, de forma mais simples e concreta, envolvendo mais e melhor, o paciente e sua família no tratamento. Referência 1. Sociedade Brasileira de Anatomia. Terminologia Anatômica Internacional. São Paulo - SP: Manole; 2001. Endereço para contato: Irene Queiroz Marchesan Rua Cayowaá, 664 CEP – 05018-000 São Paulo – Brasil [email protected] www.cefac.br