Toulose (França) - Thales de Azevedo

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Jornal A Tarde, ________, __/__/1963
Assunto:
JUNTO AO TÚMULO DE SÃO TOMÁS DE AQUINO
Toulose (França)
Uma excursão à procura dos centros universitários interessados nos estudos brasileiros não
poderia esquecer Toulouse. Depois de visitar os grandes núcleos de Hamburgo, de Berlim, de
Colônia e Bonn, na Alemanha, em que cursos e bibliotecas irradiam, sob a direção de lusobrasilianistas eminente o conhecimento da literatura, da história da sociedade brasileira, era
indispensável conhecer o mais importante desses institutos, exatamente o da universitária
cidade de Toulouse. Abra-se um parêntese para registrar que Brasil, nesses vários institutos, é
representado não apenas por especialistas europeus que dedicam suas investigações a nosso
país, mas também por jovens brasileiros, alguns fazendo trabalho digno de nota como ocorre
com a série de antigas alunas da Universidade da Bahia agregadas ao seminário de estudos
brasileiros da U. de Colônia: ocupa atualmente esse posto a bacharela Maria Helena Duarte
que, ao lado de suas tarefas de ensino, inicia seu doutorado em línguas românicas naquela
universidade após vencer exigentes exames de ingresso. Noutras universidades estão - na
França como na Alemanha - diversos leitores brasileiros, cedidos por várias Faculdades de
Filosofia tanto da Bahia, quanto de B. Horizonte, de São Paulo, do Ceará. O principal é que,
enquanto ensinam e ganham experiência nos métodos europeus de trabalho acadêmico,
empreendem, na maioria dos casos, seu aperfeiçoamento em proveito das universidades
brasileiras que os souberem aproveitar.
Toulouse tem em sua Faculdade de Letras um Instituto de Estudos Hispânicos, HispanoAmericanos e Luso-Brasileiros, bastante conhecido e prestigioso por seu ensino e por suas
publicações. Em relação ao Brasil o que vale registrar é que, além de uma valiosa biblioteca
tem certamente a mais completa equipe de docentes entre os vários centros europeus
similares sob a direção do Prof, Jean Roche essa equipe empreende um espaço que merece a
atenção das universidades e das autoridades educacionais brasileiras por sua qualidade e
particularmente possua excepcional compreensão das nossas coisas. Jean Roche é o autor da
substanciosa obra “A colonização alemã e o Rio Grande do Sul”, recentemente publicada pela
U. de Paris e a ser brevemente lançada em português por uma editora riograndense. Esse é o
fruto de nove anos de investigações diretas, feitas durante o período em que aquele eminente
mestre lecionou na U. do Rio Grande do Sul. Seus interesses por nossa sociedade e por
nossas letras e, mais que isto, sem sentimentos para com o Brasil, o fizeram um brasilianista
de rara qualidade intelectual e emocional. A seu lado, dois jovens leitores, brasileiros e vários
outros catedráticos, inclusive o Prof F. Mauro, autor de investigações, sobre a história
econômica do Atlântico sul, desenvolvem cursos, seminários e pesquisas que atualmente são
seguidas por meia centena de estudantes. Foram esses o grupo, acrescido de diversos
elementos da seção de Sociologia, que tive o privilégio de fazer uma exposição sobre a
atividade econômica e a influência civilizadora da Petrobrás, recebido com compensador
entusiasmo.
Viu a Toulouse, a velha urbe medieval, ainda cheia de sinais de seu passado romano e celta,
inclusive uns magníficos templos românicos, justificava-se por outras razões. Este foi um dos
mais importantes núcleos da cristandade medieval: era, por exemplo, o ponto de partida de
grande romarias para o famoso santuário de Santiago de Compostela, na Espanha, de tal
modo a ser sua rua principal orientada para o sul, era o primitivo caminho daquelas
peregrinações. A vida ficou marcada também pelo martírio de cristãos, sob a dominação
romana - o principal deles sendo S. Saturnino, seu primeiro bispo, Agostinhos, dominicanos, e
hoje jesuítas aqui tiveram e ainda mantém prestigiosos núcleos de apostolado e de estudos.
Ainda agora é a sede de famosa universidade dos padres pregadores. Foram esses títulos que
fizeram com que Toulosse fosse escolhida para guardar os despojos de S. Tomás de Aquino
em sua catedral, ao lado dos restos de outros santos da era românica e do medioevo. Esse
privilégio ímpar, faz desta cidade um lugar de peregrinação constante de intelectuais católicos
de todo o mundo. E como se não bastasse tal glória, é aqui que se encontra, em sua velhice de
viúvo, de regresso do voluntário exílio dos E. Unidos, esse novo aquinatense que é Jacques
Maritan, recolhido à casa dos Irmãosinhos de Jesus, a congregação apostólica do Pe.
Toucauld.
Dobrar os joelhos num templo de Toulouse é, compreensivelmente, um motivo de comoção e
um ato de comunhão com um povo, como o francês, em que à medida que se sabe na escola
intelectual mais católicos se encontram, de um catolicismo ao mesmo tempo profundamente
interior e afoitamente ativo e esclarecido.
Não fique sem registro nesta viagem a passagem pela Cidade Eterna, mais que nunca a capital
do mundo cristão com o Concílio Ecumênico, indubitavelmente o maior acontecimento
espiritual do século e talvez de vários séculos da era moderna. Dificilmente poderia traduzir as
emoções dessa visita, marcada pela presença ao solene ato de posse do S. P. Paulo VI na
cátedra episcopal de Roma em cerimônia imponentíssima na basílica de S. João de Latrão.
Rodeado de centenas de prelados de todas as raças e todos os continentes, o Papa desfilou
entre o povo romano, ovacionado e aplaudido com entusiasmo e naquele domingo deu a sua
benção urbe et orbe do balcão do venerando templo loteranense, depois de pronunciar uma
oração em que, mais uma vez, sublinhou as responsabilidades do primado apostólico e a
necessidade da intensificação dos esforços pelas necessidades sobrenaturais e políticas da
humanidade tão conturbada e ansiosa de nossos dias. O contrato com numerosos bispos
brasileiros, aviva e sublinha as esperanças do renascimento católico e da reaproximação
ecumênica que o Concílio promete e já promove. Roma fica em nossa memória, até por seus
monumentos e suas obras urbanas como a cidade dos papas, que do ponto de vista, estético
culmina nos museus do Vaticano, repositório inigualado de arte e tradição onde não faltam os
estilos e os autores mais modernos a testemunharem, todos, o desvelo da Igreja pela cultura.
Milão, Florença, Gênova desfilam, com suas grandezas passadas e sua vibração atual, como
outros testemunhos da vitalidade latina e cristã apesar das contradições políticas que o espírito
de liberdade, felizmente permite e enseja, grego-romano e judeo-cristão.
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