Eimeriose em bezerros no Rio Grande do Sul Giaretta, P.R.; Bassotto, L.; Wiethan, I.S.; Vielmo, A.; Hammerschmitt, M.E.; Fischborn, N.T. e Barros, C.S.L. Autor para correspondência: [email protected]. (Barros, C.S.L.). Laboratório de Patologia Veterinária, Hospital Veterinário Universitário, prédio 97B, UFSM - Av. Roraima, 1.000, Camobi, Santa Maria/RS, CEP:97105900. PALAVRAS-CHAVE: Coccidiose, Eimeria, bovino. INTRODUÇÃO: Coccidiose é uma condição de animais manejados intensivamente, especialmente jovens expostos a uma alta carga infectante. As perdas econômicas relacionadas com a doença são consideráveis e ocorrem em termos de mortalidade, morbidade, doença subclínica e custos com a prevenção e tratamento [2]. A coccidiose em bovinos é causada por protozoários do gênero Eimeria, que induzem diarreia ou disenteria [1]. O objetivo deste relato é documentar um surto de eimeriose em bezerros no Rio Grande do Sul. MATERIAIS E MÉTODOS: Na propriedade leiteira de origem da bezerra deste relato, três bezerros, de um total de vinte, adoeceram. Os bovinos eram criados extensivamente em um piquete com pastagem cultivada. Uma bezerra SRD, de 6 meses de idade, proveniente da propriedade deste surto foi encaminhada para a Clínica de Ruminantes da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Realizou-se contagem de ovos por grama de fezes (OPG) e administrou-se tratamento com antibióticos e fluidoterapia, mas não houve melhora do quadro clínico. Com a morte do animal, o cadáver foi recebido para necropsia no Laboratório de Patologia Veterinária da UFSM. Diversos órgãos foram coletados durante a necropsia e fixados em formol tamponado a 10%. Os tecidos fixados foram clivados e processados rotineiramente para histopatologia e as lâminas foram coradas pela técnica de hematoxilina e eosina. RESULTADOS: Os sinais clínicos observados nos bezerros que adoeceram eram caracterizados por diarreia profusa, com estrias de sangue e fibrina. Durante a realização da contagem de OPGobservou-se abundante quantidade de oocistos de Eimeria spp. Na necropsia, a bezerra estava emaciada, com os olhos profundos nas órbitas e com as mucosas pálidas. A serosa do cólon estava difusamente hiperêmica. A mucosa do cólon e do reto estava opaca, recoberta difusamente por fibrina e com áreas multifocais de hemorragia. Havia múltiplas áreas de ulceração. O conteúdo fecal no cólon e no reto era líquido e fétido, com grande quantidade de muco. Histologicamente, havia congestão multifocal dos vasos sanguíneos da mucosa. Algumas das células das glândulas mucosas estavam infectadas por pequenos esquizontes, gamontes ou oocistos em desenvolvimento. Esses organismos tinham morfologia consistente com Eimeria spp. Em algumas porções do intestino, havia glândulas preenchidas por células epiteliais descamadas. O epitélio glandular remanescente estava atenuado ou havia colapso glandular. Porções da mucosa apresentavam áreas de erosão e ulceração que eram recobertas por detritos celulares, fibrina, eritrócitos e neutrófilos. A lâmina própria era infiltrada por neutrófilos, eosinófilos, linfócitos, plasmócitos e macrófagos. Havia focos hemorrágicos na lâmina própria. DISCUSSÃO E CONCLUSÃO: Os sinais clínicos, a epidemiologia, os achados macroscópicos e histológicos na bezerra necropsiada levaram ao diagnóstico de eimeriose nos bovinos deste surto. A eimeriose ou coccidiose bovina é conhecida também como diarreia de sangue ou curso vermelho, sendo causada por protozoários do gênero Eimeria que se multiplicam nas células epiteliais do intestino grosso e delgado [1]. Estes parasitos são espécie-específicos e possuem distribuição mundial [3]. Os bovinos podem ser parasitados por aproximadamente 20 espécies, sendo E. zuernii, E. bovis e E. alabamensis as mais importantes quanto à prevalência e patogenicidade, sendo que E. alabamensis pode causar sinais clínicos mas raramente leva o animal a morte [1, 2, 4]. A doença ocorre em bovinos com até um ano de idade, como os bezerros deste surto, embora possa ocorrer em animais adultos [4]. A infecção com ocorrência de sinais clínicos pode ser causada por uma ou mais espécies de Eimeria [2]. Nem todos os bovinos do grupo são igualmente afetados, sendo que infecções leves são auto-limitantes e as infecções severas, como nesta bezerra, podem culminar com a morte do animal [4]. Condições epidemiológicas que levam a ocorrência de surtos incluem o estresse do transporte, clima frio, mistura de diferentes lotes, levando ao consumo de água ou alimento contaminados com oocistos [4]. A coccidiose em bovinos é caracterizada por diarreia, que pode progredir para disenteria com muco, tenesmo e às vezes leva à ocorrência de prolapso retal. A morbidade pode ser alta, mas a mortalidade é baixa. O ciclo de vida de E. zuernni e E. bovis é semelhante, com duas gerações de esquizogonia seguidas por gametogonia [2]. Depois da ingestão, o oocisto é rompido, liberando oito esporozoítos cada, que penetram as células intestinais e se transformam em trofozoítos. As divisões múltiplas do trofozoíto produzem um esquizonte, que depois de alguns dias se rompe, liberando uma grande quantidade de merozoítos que por sua vez invadem outras células epiteliais. Ocorrem até quatro gerações de esquizogonia, dependendo da espécie envolvida. A localização das células-alvo é importante para a patogenicidade das espécies; por exemplo, E. zuernii e E. bovis invadem células do íleo distal e depois passam por esquizogonia e gametogonia nas células epiteliais do ceco e do cólon. Os gametócitos são formados profundamente no epitélio e sua ruptura causa lesão grave na mucosa do ceco, resultando em hemorragia para o lúmen. Os oocistos são formados após a gametogonia e são eliminados nas fezes. Eles não são infectantes até que passem por esporulação [4]. A observação de grande quantidade de oocistos nas fezes é uma forma importante de diagnóstico em bovinos com eimeriose, como o caso desta bezerra. Um pequeno número de oocistos nas fezes pode ocorrer em bovinos normais [4]. Em animais severamente infectados, a morte pode ocorrer antes de haver a liberação de grande quantidade de oocistos nas fezes [2]. Uma neurotoxina tem sido associada com o desenvolvimento de sinais neurológicos em bovinos com coccidiose [2]. Bovinos acentuadamente acometidos requerem tratamento individual com anticoccidianos, fluidoterapia e antibióticos para combater infecções bacterianas secundárias. O tratamento com anticoccidianos inclui a administração de sulfadimidina na dose de 140mg/kg por três dias ou administração de amprólio na dose de 10mg/kg por quatro ou cinco dias [4]. O controle eficiente da doença depende da redução da superlotação de animais enquanto eles desenvolvem imunidade às espécies de coccídeos presentes no ambiente. As instalações devem ser mantidas secas e limpas, de forma que os oocistos não tenham tempo de esporular e se tornarem infectantes [3]. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: 1. Berne, M.E.A.; Vieira, L.S. Eimeriose bovina. In: Riet-Correa et al. Doenças de ruminantes e equinos. 3 ed. Vol. 2. Santa Maria: Pallotti, 2007. p.661-665. 2. Brown et al. In: Maxie, M.G. (Ed.) Jubb, Kennedy and Palmer’s Pathology of Domestic Animals. 5 ed. Vol. 2. Philadelphia: Elsevier Saunders, 2007. p. 260-264. 3. Radostits O.M. et al. Veterinary Medicine: A textbook of diseases of cattle, sheep, goats, pigs and horses. 10 ed. Philadelphia: Elsevier Saunders, 2006. p.1505. 4. Taylor, S.M.; Andrews, A.H. Endoparasites. In: Andrews, A.H (Ed.) Bovine Medicine Diseases and Husbandry of Cattle. 2 ed. Iowa: Blackwell Science, 2004. p.282-283.