Análise das Condições Objetivas dos CRASs para

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ANÁLISE DAS CONDIÇÕES OBJETIVAS DOS CRASs PARA EFETIVAÇÃO DO
PROJETO ÉTICO-POLÍTICO DO SERVIÇO SOCIAL
Alecsonia Pereira Araujo1
1
Universidade Federal da Paraíba/Departamento de Serviço Social, Endereço: Avenida São Rafael, Nº. 745
– Castelo Branco I – João Pessoa/Pb, e-mail: [email protected]
Resumo- O presente estudo centrou-se na análise das Condições Objetivas para efetivação do Projeto
Ético-político do Serviço Social no espaço dos Centros de Referência da Assistência Social - CRASs em
João Pessoa/Pb. Estas condições objetivas estão relacionadas às determinações sócio-históricas. O estudo
processa-se por meio de uma pesquisa de campo, de caráter quanti-qualitativa, realizada nos CRASs. O
referencial teórico-metodológico adotado inspirou-se no método dialético marxista, cuja perspectiva apóiase no princípio da totalidade, permeada de contradições, as quais geram um movimento de transformação,
exigindo um exercício de investigação que busca as determinações históricas e a lógica de racionalidade
dos movimentos da sociedade e do pensamento. Mediante análises dos dados, constatou-se que a forma
como vem se configurando e desenvolvendo-se a intervenção profissional do assistente social frente às
condições objetivas presentes nos CRASs, inviabiliza a possibilidade de efetivação de seu Projeto Éticopolítico.
Palavras-chave: Projeto Ético-Político profissional do Serviço Social. Política de Assistência Social.
Condições Objetivas.
Área do Conhecimento: Ciências Sociais Aplicada
Introdução
O panorama de transformações societárias tem
se originado nas relações sociais desenvolvidas
no
cerne
da
acumulação
capitalista
–
redimensionado pelo amplo processo de
reestruturação produtiva – que afetam diretamente
“(...) o conjunto da vida social e incidem
fortemente sobre as profissões, suas áreas de
intervenção, seus suportes de conhecimentos e de
implementação, suas funcionalidades, etc”.
(NETTO, 1996, p.87). Conseqüentemente, tudo
isso tem posto em questão o conjunto de
princípios éticos e políticos que orientam o projeto
societário defendido pela classe trabalhadora, bem
como os projetos profissionais, que a este se
articulam, como é o caso do Projeto ético-político
do Serviço Social, posicionando-se em favor dos
interesses da classe trabalhadora e segmentos
subalternos da sociedade.
Este projeto indica uma clara direção social
para a profissão ao defender princípios como
justiça e eqüidade social, ampliação dos direitos e
da cidadania, além do aprofundamento da
democracia,
de
modo
a
fortalecer
as
possibilidades de atendimento aos interesses da
classe trabalhadora e segmentos oprimidos da
sociedade. Mas como efetivar esses princípios
diante da lógica neoliberal, que provoca o
agudizamento da questão social e por
conseqüente amplia a demanda por políticas
sociais, em especial da Assistência Social?
Essa efetivação passa também pela forma de
relação entre Estado e sociedade. Nesse sentido,
vale ressaltar que embora a Política de
Assistência Social esteja legalmente assegurada
com o advento da Constituição Federal de 1988,
incluída no âmbito da Seguridade Social e
regulamentada pela Lei Orgânica da Assistência
Social (LOAS) desde dezembro de 1993, ela não
tem se efetivado na prática real dos programas,
responsáveis pelo desenvolvimento dessa política.
Nesse contexto, encontra-se o presente
estudo, que intentou analisar as condições
objetivas para efetivação do projeto ético-político
do Serviço Social, no exercício profissional dos
assistentes sociais, no espaço dos Centros de
Referência da Assistência Social (CRASs), em
João Pessoa/Pb, aos quais estão vinculados à
Política de Assistência Social e cuja motivação
para o desenvolvimento desse estudo surgiu, da
admiração que a pesquisadora nutre pelo Serviço
Social, principalmente no que se refere a
entender/compreender e desvendar os desafios
postos no cotidiano de trabalho do assistente
social, assim como, das reflexões e conclusões
obtidas no meu Trabalho de Conclusão de Curso
de graduação em Serviço Social, vez que analisei
a prática profissional à luz do seu projeto éticopolítico no âmbito da Política de Saúde.
Metodologia
XIII Encontro Latino Americano de Iniciação Científica e
IX Encontro Latino Americano de Pós-Graduação – Universidade do Vale do Paraíba
1
Tratou-se de uma pesquisa de campo, de
cunho quanti-qualitativa, tendo como referencial
teórico-metodológico, o método dialético marxista,
adotando o princípio de totalidade, no qual a
sociedade burguesa não se constitui um conjunto
de partes que se integram funcionalmente (o
todo), mas um sistema dinâmico e contraditório de
relações articuladas que se implicam e se
explicam estruturalmente. Segundo Pontes (2002),
na relação entre as partes e o todo, as partes,
além de se condicionarem reciprocamente,
também
constituem
totalidades
parciais
mutuamente determinadas e articuladas, pois a
realidade não é um amálgama rígido de partes em
um todo.
Conformaram o universo desta pesquisa, os
assistentes sociais que atuam nas cinco unidades
de CRAS em João Pessoa/Pb. Nessa perspectiva,
coletamos os dados através da entrevista semiestruturada, junto a 100% das Assistentes Sociais.
Já para a interpretação dos dados utilizamos
como instrumentos: a análise de conteúdo e de
conjuntura.
Resultados
No tocante aos resultados, a pesquisa revelou
que as condições de precariedade dos CRASs se
expressam, não somente nas condições de
atendimento à população usuária, mas também na
sua funcionalidade. E isto, deve-se ao fato de que
no Brasil, as políticas sociais são focalistas,
setorizadas, fragmentadas, assistencialistas e
abstraídas de conteúdos concretos. Ainda que,
apresentando
características
particulares
inerentes a sociedade brasileira, a precariedade e
as limitações desses Centros são decorrentes de
todo um conjunto de transformações societárias,
os quais negam os princípios fundamentais de
garantia de direitos e de cidadania plena
defendidos pelo projeto ético-político profissional
do Serviço Social.
Para as assistentes sociais inseridas nos
espaços dos CRASs de João Pessoa/Pb, as
condições objetivas determinantes do seu
exercício
profissional
são
elementos
de
preocupação fundamental, já que, elas se revelam
na prática cotidiana de maneira que problematiza
a sua intencionalidade.
Tal preocupação é constatada, quando a
maioria das assistentes sociais entrevistadas
(45%) sinalizaram que os CRASs não conseguem
atender aos princípios propostos pela PNAS e
pelo SUAS, colocando para tanto, as condições
objetivas como sendo as responsáveis por essa
não efetivação da política de assistência social.
Para essas assistentes sociais, há uma
incompatibilidade entre o ideal, inscrito na
PNAS/SUAS e o real, que são as condições
objetivas nas quais se processa o trabalho nos
CRASs de João Pessoa/Pb.
Já para 33% das assistentes sociais
entrevistadas, os CRASs conseguem atender aos
princípios da PNAS e SUAS. Tal afirmação se
configura da seguinte forma:
Os CRASs conseguem atingir os
objetivos da PNAS e do SUAS, pois,
nós orientamos as famílias para que
elas busquem os seus direitos e sua
cidadania. Além de incluirmos essas
famílias em programas sociais
através do CRAS, como por exemplo,
no agente jovem e no Bolsa Família
(...). (Fala de Assistente Social
entrevistada)
Como pode ser observado no relato acima,
essas
assistentes
sociais
desconhecem
efetivamente os objetivos da PNAS, porque
entendem que a inclusão emergencial e
temporária em um programa, expressa a
magnitude do que representa a autonomia
necessária às famílias atendidas.
Para Paiva (2006) essa noção de inclusão é
bastante tendente a interpretações díspares,
inclusive com significativa capacidade de
aderência pelo pensamento conservador, no que
moderniza, superando, todos os conceitos que
remetiam a desigualdade social, a pobreza e a luta
de classes.
Outros
22%
das
assistentes
sociais
entrevistadas
revelaram
que
os
CRASs
conseguem em parte atender aos princípios da
PNAS.
Os dados revelaram ainda que os maiores
desafios estão relacionados as condições de
trabalho, pois há comprometimento por parte dos
técnicos que fazem parte da equipe, como
constatado na fala da assistente social
entrevistada abaixo:
Apesar de termos muitas dificuldades,
principalmente as relacionadas às
próprias condições de trabalho, - pois
atender um usuário numa sala de
meia parede, que todo mundo escuta,
é um desrespeito e fere os princípios
do código de ética - na medida em
que não temos condições mínimas de
atender os usuários. (...) Mesmo
assim, isso não atrapalha meu
comprometimento com os direitos dos
usuários e tento todas as formas para
viabilizar o solicitado por eles, mesmo
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que necessite de maiores mediações.
Desta forma, acredito que minha
prática
está
pautada
nos
pressupostos ético-políticos, o que
significa buscar atender o direito
demandado por aquele usuário
utilizando estratégias mediadora de
intervenção, e isso depende da
criticidade e o conhecimento acerca
da profissão e de seu projeto éticopolítico.
Esse posicionamento circunscreve uma leitura
do real, que reforça um discurso de profissionais
conhecedores do projeto ético-político do serviço
social. Portanto, reconhecem que os desafios ao
nosso projeto consistem justamente nos limites
que existem no seu exercício profissional,
lembrando que o cotidiano de trabalho “(...) são
essencialmente mutáveis, relativos, provisórios, se
suprimem, se deslocam e se suprimem
novamente, em função de suas contradições
internas que devem ser exploradas”. (BEHRING,
2006, p. 198)
Discussão
Direito do cidadão e dever do Estado, a
Assistência Social é definida como política pública
no campo do direito e de cidadania social,
integrando a Seguridade Social, juntamente com a
Saúde e a Previdência Social.
A sua inserção na seguridade sinaliza também
para o seu caráter de política de proteção social
articulada a outras políticas, do campo social,
voltadas para garantia de direitos e de condições
dignas de vida. Desse modo, a Assistência Social
configura-se
como
possibilidade
de
reconhecimento público da legitimidade das
demandas de seus usuários e espaço de
ampliação de seu protagonismo.
Nesse contexto, se por um lado os avanços
constitucionais apontam para o reconhecimento de
direitos e permitem trazer para esfera pública a
questão da pobreza e da exclusão, por outro, a
inserção do Estado brasileiro na contraditória
dinâmica das políticas econômicas neoliberais e
dos seus impactos, coloca em andamento
processos desarticuladores e de desmontagem
das instâncias públicas estatais de realização
destes, com a retração de direitos e de
investimentos públicos no campo social.
Tudo isso se dá sob a forte pressão dos
interesses financeiros internacionais, que acaba
por controlar a economia e a sociedade, impondo
suas perversas práticas de desmonte dos direitos,
das políticas sociais, desordenamento dos
serviços públicos, entre outros desdobramentos.
A Política Nacional de Assistência Social
(2004) sugere a construção de uma nova forma de
relação entre Estado e sociedade civil como eixo
estruturante do Sistema Único de Assistência
Social – SUAS. Nesta dinâmica, ganham impulso
às estratégias que preconizam parcerias vis-à-vis
à organização de redes sócio-assistenciais,
erguidas sob a necessidade prático-operativa de
estabelecer parcerias com instituições de todas as
esferas, como forma de garantir o funcionamento
e a prestação dos serviços públicos. Essa
articulação de redes sócio-assistenciais fica sobre
a responsabilidade dos CRASs, os quais,
articulam, por sua vez “(...) um conjunto integrado
de ações de iniciativa pública e privada, que
desenvolvam serviços, benefícios, programas e
projetos assistenciais”. (NOB/SUAS, 2005).
Sob tais condições e inserido nestes espaços
da política de assistência social, encontra-se o
assistente social, cuja prática profissional, não
decorre exclusivamente das intenções dos
mesmos, sendo condicionada por determinantes
sócio-históricos e conjunturais.
Portanto, apreendemos que as condições
objetivas institucionais no âmbito da Política de
Assistência
Social
produzem
condições
precarizadas à prática cotidiana do Serviço Social,
o que representa desafios para consolidação do
seu projeto ético-político profissional. Entendemos,
portanto, que a atual conjuntura políticoeconômica da sociedade brasileira se contrapõe
aos princípios norteadores do referido projeto
profissional que se pautam na “(...) defesa dos
direitos sociais, da cidadania, da esfera pública no
horizonte
da
ampliação
progressiva
da
democratização da política e da economia na
sociedade (...)”. (IAMAMOTO, 2001, p.113)
Assim, pensar a efetivação do Projeto éticopolítico profissional do Serviço Social requer uma
leitura consciente e crítica das mudanças mais
significativas ocorridas na sociedade capitalista,
sobretudo, no que concerne ao processo de
reestruturação produtiva na edição de um novo
padrão de produção e organização do trabalho,
processo este que impõe entre outros aspectos a
reforma do Estado dentro de uma perspectiva
neoliberal.
Portanto, tratar do projeto ético-político
profissional implica em sintonizar o Serviço Social
com todas essas transformações que se
expressam enquanto mecanismo do capital diante
de sua necessidade de saída da crise. Todas
essas mudanças constituem-se desafios para
consolidação do referido projeto, sinalizando a
necessidade da categoria debruçar-se sobre sua
compreensão.
Desse modo, o referido projeto expressa
claramente princípios e valores que direcionam a
prática profissional no sentido de enfrentamento
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do projeto neoliberal e fortalecimento do projeto da
classe trabalhadora. Nessa direção é que um dos
princípios fundamentais do Código de Ética do
Assistente Social é a “opção por um projeto
profissional vinculado ao processo de construção
de uma nova ordem societária, sem dominaçãoexploração de classe, etnia e gênero” (CFESS,
2002).
Conclusão
A análise das condições objetivas para
efetivação do Projeto ético-político do Serviço
Social, no espaço dos CRASs nos permitiu
verificar que um conjunto de diversos fatores de
ordem objetiva – os efeitos da política neoliberal,
o trato dispensado à questão social, as condições
estabelecidas pela instituição, entre outras - nos
espaços dos CRASs, tem problematizado a
efetivação do projeto ético-político profissional do
serviço social, pois, a tendência de opinião
majoritária, dentre as assistentes sociais é aquela
de que os profissionais têm o conhecimento e o
propósito de direcionar sua prática na perspectiva
de viabilizar o projeto ético-político da profissão,
porém, todas as dificuldades no âmbito das
condições objetivas existentes nos CRASs,
perpassam a prática profissional e prejudicam a
condição destes efetivarem o proposto pelo
referido projeto profissional.
Nesse sentido, conclui-se que mesmo
hegemônica no interior da categoria nas
dimensões da formação profissional, da produção
de conhecimentos e da organização política, a
direção conferida pelo projeto ético-político não
consegue efetivação plena na realidade da
intervenção prática dos assistentes sociais,
inseridos nos CRASs de João Pessoa/Pb, ainda
que haja um esforço, nesse sentido, por parte dos
assistentes sociais.
Importa reafirmar, que os CRASs de João
Pessoa/Pb estão comportando, em sua grande
maioria, profissionais que estão sintonizados com
o projeto ético-político, reconhecendo os desafios
e limites, que impostos à sua prática, acabam por
desmotivá-los e gerar desâmino na luta pela
consolidação do referido projeto.
Entretanto, como pesquisadora e engajada no
esforço de implementação desse projeto no
campo acadêmico, acredito que o debate sobre
esses desafios fortalece a luta pela afirmação dos
direitos sociais nos marcos do sistema capitalista.
Segundo Behring (2006) esse reconhecimento
sinaliza que a conquista dos direitos integra uma
agenda estratégica de luta democrática e popular,
visando à construção de uma sociedade mais
justa e igualitária. Isso significa que, mesmo que
não se consiga mudar o todo no imediato, as
mudanças
estratégicas
cotidianas
terão
implicações na totalidade, pois as conexões que
existem entre realidades diferentes criam
unidades contraditórias.
Faz-se urgente ao serviço social, para
materializar seu projeto ético-político, investir no
fortalecimento dos movimentos sociais e das
instituições democráticas, vez que fazer história
requer lutas coletivas, o que exige situar o
indivíduo e a atuação profissional nas lutas mais
gerais de defesa dos interesses das classes
trabalhadoras. Nesse sentido, para alargar as
possibilidades de condução do trabalho no
horizonte do projeto ético-político exigi-nos
segundo Iamamoto (2008) “(...) estratégias
político-profissionais que ampliem as bases de
apoio no interior do espaço ocupacional e somem
forças
com
segmentos
organizativos
da
sociedade civil, que se movem pelos mesmos
princípios éticos e políticos”.
Na verdade, o grande desafio dos assistentes
sociais é afirmar uma profissão voltada à defesa
dos direitos e das conquistas acumuladas ao
longo da história da luta dos trabalhadores no
Brasil, e assim, desenvolver uma atuação
comprometida com a radical democratização da
vida social no horizonte da emancipação humana.
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