UNIJUI- UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL LUANA NASCIMENTO PERIN MOVIMENTOS SOCIAIS URBANOS E A CONSOLIDAÇÃO DA DEMOCRACIA Ijuí (RS) 2015 LUANA NASCIMENTO PERIN MOVIMENTOS SOCIAIS URBANOS E A CONSOLIDAÇÃO DA DEMOCRACIA Trabalho de Conclusão do Curso de Graduação em Direito objetivando a aprovação no componente curricular Trabalho de Curso - TC. UNIJUÍ - Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul. DCJSDepartamento de Ciências Jurídicas e Sociais. Orientadora: MSc Eloísa Nair de Andrade Argerich Ijuí (RS) 2015 Dedico o presente trabalho aos meus avós João Perin (In Memoriam), Inácio Nascimento (In Memoriam), Elvira Perin e Ludegéria Nascimento, bem como aos meus pais, irmão, namorado e a todos os familiares que, com muito carinho e apoio, não mediram esforços para que eu chegasse até esta etapa da minha vida. AGRADECIMENTOS Primeiramente, agradeço ao meu eterno amigo e avô João Perin (In Memoriam) por ter sido um exemplo de pessoa, eis que não mediu esforços para me ensinar a necessidade de se passar por obstáculos, com humildade, para assim alcançar o que almejo. Mas não se preocupe, você deixou um legado e uma história para eu contar aos seus bisnetos. Sinto saudades! Como também, agradeço a minha avó Elvira Perin, por ser uma pessoa maravilhosa e uma guerreira, que ama todos os seus e faz com que nos sintamos bem com sua presença. Te amo vó! Agradeço ao meu querido avô Inácio Nascimento, que partiu tão cedo, mas que sua história de vida e presença sempre estará presente em meu coração. E sei que aí de cima, ao lado de Deus, está muito orgulhoso da sua primeira neta se formando. Saudades! Não posso deixar de falar da minha segunda mãe, minha avó Ludegéria Nascimento, aquela que se faz presente em todas as fases da minha vida, me apoiando nas minhas escolhas, me aconselhando e principalmente torcendo pelo meu sucesso. Amo você! Pai e Mãe, vocês são a minha base, aqueles que me deram a vida e o prazer de ser sua filha. Abdicaram de muitas coisas para poderem me ver feliz, estudando e alcançando os meus objetivos. Se me tornei esta pessoa que sou hoje, devo isso a vocês. Sei que sempre estarão ao meu lado, podendo contar com vocês em todas as horas. Obrigada por serem meus pais, pessoas maravilhosas que eu amo muito. Ao meu irmão Vinicius Perin, que sempre me incomodou, torrou minha paciência, mas que sempre esteve ao meu lado quando precisei. E que agora, junto com sua esposa Bibiana Perin, me tornou uma pessoa mais especial ainda, me deu o prazer de ser tia e madrinha da minha pequena, preciosa e princesa Beatriz. Obrigada! Agradeço também a uma pessoa que apareceu em minha vida na hora exata, que mais precisava, e, além de colega, hoje ele é meu parceiro e companheiro, que pretendo levar comigo nessa longa jornada da vida. Meu amor Juarez Junior. Te amo! Conte sempre comigo. Não posso deixar de agradecer a todos os demais familiares, tios, tias, primos, primas, afilhados, afilhadas, padrinhos e madrinhas (Claurivan, Jociane, Cleonice e Leonardo) e aqueles amigos que já considero da família, né família Kozloski (dinda Rosane, dindo Gilberto, irmão Pedro e irmã Cássia)? Que me apoiam em todas as minhas decisões, choram comigo, e compartilham dos meus sonhos. Obrigada por tudo pessoal! Por fim, não posso deixar de agradecer a minha querida orientadora, Professora Eloísa Argerich, que me ajudou e dedicou muito de seu tempo para que eu pudesse concretizar meu sonho de realizar o presente trabalho, um pouco diferente do habitual. Um tema que não é muito discutido no Curso de Direito, mas de suma importância para que fosse reconhecida a Democracia e Liberdade de Expressão em nosso país pós Golpe Militar. Obrigada pelo apoio. Grande abraço a todos. ―O sucesso nasce do querer, da determinação e persistência em se chegar a um objetivo. Mesmo não atingindo o alvo, quem busca e vence obstáculos, no mínimo fará coisas admiráveis.‖ (José de Alencar). RESUMO O presente trabalho de conclusão de curso faz uma abordagem sobre a questão da democracia e a liberdade de expressão em nosso país. Busca-se conceituar, sob constante auxílio doutrinário, o que se compreende pelos termos democracia e liberdade de expressão, eis que são termos muito utilizados após o advento da Constituição da República Federativa do Brasil (CF). Faz-se necessário entender se de fato o Brasil é um país democrático e que respeita o direito de liberdade de expressão. Igualmente, tomando-se como base a democracia e a liberdade de expressão, analisam-se os movimentos sociais com enfoque para os movimentos sociais urbanos, que vêm tomando força na atual conjuntura social, devido a propagação das redes sociais cada vez mais presentes nas relações da sociedade. O advento da internet, nesse viés, muito contribuiu para que as informações se propaguem de maneira imediata em todo globo. Contudo, deve-se atentar que nem sempre as informações prestadas são seguras, e, além disso, podem ter sua interpretação distorcida pelos leitores, que, ao mesmo tempo, tornam-se propagadores da distorção informacional. Por fim, finaliza-se mencionando as principais lutas pela redemocratização do país, demostradas através de um mapeamento histórico. Palavras-Chave: Democracia. Liberdade de Expressão. Movimentos Sociais Urbanos. Meios de Comunicação. ABSTRACT The present study analyzes both issues the democracy and the right to freedom of expression in our country. It intends to conceptualize, under the doctrinal aid, what is the meaning of the democracy and freedom of expression terms, which have been frequently used after the Constitution of the Federative Republic of Brazil (CF) advent. It is necessary to understand whether Brazil is really a democratic country, where the right to freedom of expression is respected. Likewise, based on democracy and freedom of expression concepts, the social movements, focusing on urban movements which have gained strength in the current context due the increased social network relationships, are analyzed. In this way, the internet advent has contributed to the immediate information spread throughout the globe. However, we must be alert on the security of the provided information which might be misleading understood by the readers who, in turn, are potential propagators of distorted information. Finally, the most important struggles for the country democratization are highlighted using a historical mapping approach. Key words: Democracy. Freedom of expression. Urban Social Movements. Media SUMÁRIO INTRODUÇÃO ......................................................................................................................... 10 1 A QUESTÃO DA DEMOCRACIA E A LIBERDADE DE EXPRESSÃO .................... 12 1.1 Conceito e tipos de democracia ........................................................................................ 13 1.1.1 Democracia Participativa no Brasil ............................................................................. 17 1.2 Princípio da liberdade de expressão e de liberdade de informação ......................... 21 1.3 A exclusão dos cidadãos do espaço público e as diversas formas de opressão ...... 27 1.3.1 A burocracia com entrave para a consolidação da cidadania .................................. 30 1.3.2 A crise da representatividade e os movimentos sociais urbanos .............................. 31 2 A DEMOCRACIA E MOVIMENTOS SOCAIS URBANOS ........................................ 33 2.1 Origem e conceito dos movimentos sociais ................................................................... 33 2.1.1 Características gerais e fundamentos dos movimentos sociais ................................ 38 2.2 A influência dos meios de comunicação nos movimentos sociais urbanos ............ 41 2.2.1 Do jornal ao Facebook ..................................................................................................... 44 2.3 Mapeamento do cenário dos movimentos sociais no Brasil....................................... 48 2.3.1 Lutas pela redemocratização do país............................................................................ 50 2.3.2 Emergência de novos atores e desmobilização dos movimentos populares urbanos ........................................................................................................................................ 52 CONCLUSÃO ........................................................................................................................... 55 REFERÊNCIAS.......................................................................................................................... 58 ANEXOS ..................................................................................................................................... 61 10 INTRODUÇÃO O presente trabalho tem como objetivo propiciar aos leitores o entendimento sobre democracia e liberdade de expressão em nosso país, e, principalmente, sobre a democracia participativa, da qual desencadeia os movimentos sociais, tanto urbanos quanto rurais. Porém, serão aprofundados somente os movimentos sociais urbanos, pois estes ganharam maior força no atual cenário, devido aos novos meios de comunicação, tal como a Internet, que deu margem à criação do Facebook, Twitter, e demais redes sociais. Para a realização deste trabalho serão efetuadas pesquisas bibliográficas e por meio eletrônico, analisando-se também as propostas legislativas em andamento, a fim de enriquecer a coleta de informações e permitir um aprofundamento no estudo dos movimentos sociais urbanos, eis que são de suma importância para a consolidação da democracia e liberdade de expressão. Inicialmente, no primeiro capítulo, será abordado, sob a ótica de alguns doutrinadores, acerca do entendimento do termo democracia e seu aspecto histórico, bem como, sobre o conceito de liberdade de expressão e de informação e suas diversas formas de opressão. Levando-se em conta que estes termos são defendidos pela atual Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Finalizado o primeiro capítulo, após entendido o sentido inicial acerca da democracia, inicia-se o segundo, o qual tratará diretamente sobre os movimentos sociais urbanos, conceituando-os, caracterizando-os e os inserindo no atual cenário em que o nosso país vive, ou seja, a Era da Informatização, em que as informações são rapidamente proliferadas em todo o globo. 11 Igualmente, o presente trabalho, não destacará tão somente os pontos favoráveis dessa nova Era, como também, será destacado acerca dos cuidados que precisamos ter quando se tratam do sistema informacional na internet, pois que estas passam por diversos leitores e são transmitidas, muitas vezes, de maneira equivocada e contraditória aos fatos reais. Tratando-se de movimentos sociais, os quais, na atualidade, na maioria das vezes, são organizados nas redes sociais, precisa-se atentar-se à realidade do movimento social, pois para ser entendido como tal deve-se possuir um objetivo com uma causa comum, reivindicando, por exemplo, reforma agrária, casas populares, pavimentação asfáltica, iluminação, etc. Um dos maiores exemplos que podemos citar foi o caso das Diretas Já realizadas em 1983/1984, que possuíam como objetivo a restauração da democracia no Brasil, por eleições presidenciais, eis que a Presidência da República era comandada por Militares desde o Golpe Militar de 1964, sem que houvesse novas eleições presidenciais. A partir do presente estudo pretende-se verificar a importância dos movimentos sociais urbanos para a consolidação da democracia, em razão de várias pessoas se unirem e reivindicarem por um mesmo fim, com o objetivo de trazer benefícios para os cidadãos brasileiros. 12 1 A QUESTÃO DA DEMOCRACIA E A LIBERDADE DE EXPRESSÃO: As mudanças ocorridas atualmente com a mobilização social urbana e a influência das redes sociais nessas mobilizações, é um tema que foge dos paradigmas da área jurídica e comunicativa ante o crescente uso das novas tecnologias, que tem causado impacto nas variadas áreas do conhecimento e proporcionado a articulação dos cidadãos que buscam alertar a sociedade dos reais problemas sociais, econômicos, políticos que fazem parte da agenda nacional. Para contextualizar as questões dos movimentos sociais urbanos, da democracia e liberdade de expressão, há necessidade de se desenvolver uma pesquisa que denote a interrelação existente entre esses aspectos. Considerando estas observações, neste capítulo, procura-se primeiramente abordar sobre o conceito e tipos de democracia. A importância deste tema perpassa todas as áreas do conhecimento, porque não há democracia sem liberdade de expressão e sem a participação popular nos movimentos sociais. A compreensão das implicações advindas destas questões exige um constante repensar do processo de articulação, tendo em vista as interações existentes nas redes sociais como instrumento que potencializa a prática democrática. Observa-se que há uma nova forma de ação política dos cidadãos que resulta no exercício e na efetivação da liberdade de expressão e na participação dos movimentos sociais rumo à cidadania e isso se dá por meio das redes sociais. Embora o Poder possua mecanismos de repressão aos movimentos sociais, não há como impedir sua ação, até porque é um direito garantido constitucionalmente, pois se vive em um Estado Democrático de Direito. A partir disto emerge a necessidade de realizar uma abordagem do conceito e tipos de democracia para analisar a importância das relações democráticas para a participação popular nos movimentos sociais. Dando continuidade à análise sobre o tema se faz necessário também abordar aspectos referentes à liberdade de expressão como um princípio constitucional fundamental 13 autorizador dos movimentos sociais. Também se faz importante refletir sobre o desenvolvimento dos processos democráticos, nos quais os movimentos e ações de grupos organizados lutam pela conquista do espaço público, na perspectiva de maior inclusão social e melhores condições de vida relacionadas com a terra, moradia, alimentação, emprego, lazer, como também as diversas manifestações culturais. Destaca-se ainda que nesta pesquisa pontuam-se de forma objetiva os entraves que a burocracia insere no novo cenário das políticas públicas e que muitas vezes impossibilita a emancipação dos grupos sociais e que lutam para não ficar à margem da história. 1.1 Conceito e tipos de democracia Diante da realidade que ora se apresenta relativamente aos movimentos sociais urbanos, e tendo como intuito demonstrar que o cidadão brasileiro a cada dia que passa tem se envolvido politicamente para reivindicar, não apenas os seus direitos, mas também a implantação de políticas públicas que assegurem a obtenção de condições para viver e sobreviver com dignidade. Faz-se necessário abordar a questão da democracia para compreender o fenômeno dos movimentos sociais, a partir da participação dos cidadãos nestes, analisando o princípio da liberdade de expressão e manifestação. Neste sentido, pode-se dizer que a palavra democracia se origina da unidade da palavra demos e kratos, que significa a arte do bem comum. E também significa governo do povo. Alejandro Serrano Caldera (2005, p.17, grifo do autor) ressalta que o processo democrático tem sua origem na Grécia: A Grécia é a origem da democracia, do Estado-Cidade, da unidade do demos e kratos da política entendida como a arte do bem comum. É a Atenas de Péricles no século V antes de Jesus Cristo, e de Sócrates com seu método maiêutico, e de sua ideia de ética como fundamento da política. Isso denota uma conquista para a sociedade daquela época, e até hoje se estende esse tipo de sistema para a real participação da comunidade. 14 Da mesma forma, o site Wikipédia (DEMOCRACIA, 2014), conceitua democracia de uma forma bem simples: É uma forma de governo em que todos os cidadãos elegíveis participam igualmente — diretamente ou através de representantes eleitos — na proposta, no desenvolvimento e na criação de leis. Ela abrange as condições sociais, econômicas e culturais que permitem o exercício livre e igual da autodeterminação política. Considerando a citação acima, na verdade o que se observa é um tipo de organização na qual os cidadãos participam por meio da escolha de seus representantes. O que se constitui em um mecanismo que possibilita a participação direta por intermédio de um processo, onde exercita a sua soberania popular instrumentalizada através do plebiscito, referendo e iniciativa popular. A complexidade em torno da democracia participativa nos permite inferir que, na atualidade justifica-se este sistema político, porque não se admite mais que apenas haja representação política e não se reconheça a importância da participação para a potencialização da transparência nas ações e instituições que atuam para assegurar o cumprimento dos fundamentos constitucionais. Boaventura de Sousa Santos (2002, p. 47) ressalta que: [...] o fenômeno da complexidade criava problemas para o funcionamento da democracia, na medida em que criava uma tensão entre soberania crescente, no caso o controle dos governos pelos governados, e soberania decrescente, no caso o controle dos governados pela democracia. Isso significa que a burocracia, muitas vezes é um entrave para a redemocratização e a reconstrução da cidadania, haja vista o crescimento das funções do Estado, inevitavelmente, fortalece o crescimento da burocracia para alcançar o bem estar social e a qualidade de vida. Continua o autor supracitado: ―com o crescimento das funções do Estado, ligados ao bem estar social, a discussão sobre o interesse no crescimento da burocracia foi mudando de tom e adquirindo uma conotação positiva.‖ (SANTOS, 2002, p. 47). 15 Ainda, com relação à democracia, destaca-se o entendimento de Paulo Bonavides (1995, p. 349) acerca do assunto: Mais do que um sistema de governo, uma modalidade de Estado, um regime político, ou uma forma de vida, tende a se converter, ou já se converteu, no mais novo direito dos povos e dos cidadãos. É direito de qualidade distinta, direito que eu diria da quarta geração. Percebe-se que, democracia é, antes de tudo, uma modalidade onde o povo exerce os seus direitos e participa do governo, eis que este é eleito para representá-lo. Segundo Caldera (2005, p. 31): A democracia é, antes, mais que um sistema político, é a filosofia dos limites e a legislação do poder, e todo resto vem por acréscimo: a lei, as instituições, a separação de poderes, as formas processuais legalmente estabelecidas para exercer o poder, os sistemas políticos e demais formas jurídicas e institucionais que regulam o comportamento do Estado. O ideal da democracia e do Estado de Direito é, então, a coincidência entre legalidade, que é o apego às formas jurídicas e ao mandato da lei, e a legitimidade que é a subordinação da lei, fonte do poder, a vontade geral da qual falava Rousseau. Considerando esta afirmação, pode-se observar que para que a democracia atinja a sua plenitude, todas as formas comportamentais do Estado de Direito estão relacionadas concomitantemente entre as ações do executivo e o controle jurídico a partir da regulação do Judiciário. Não se pode deixar de mencionar, que a democracia como sistema de governo, pode ser classificada em democracia liberal, democracia social e democracia participativa, conceitos que serão apresentados a seguir. Sustenta Bonavides (2001, p. 71), democracia liberal pode ser considerada da seguinte maneira: Antes, o político (o poder do rei) tinha ascendência sobre o econômico (o feudo). Depois, dá-se o inverso: é o econômico (a burguesia, o industrialismo) que inicialmente controla e dirige o político (a democracia), gerando uma das mais furiosas contradições do século XIX: a liberaldemocracia. 16 Observa-se a partir desta afirmação, que à medida em que o poder econômico avança, a sociedade se sobrepõe, passa a dominar, controlar o poder do Estado. É imprescindível abordar sobre a democracia social, mas não restam dúvidas de que para falar sobre esse tema, há necessidade de enfocar o estado social. Continua Bonavides (2001, p. 71), argumentando que: O Estado social representa efetivamente uma transformação superestrutural por que passou o antigo Estado liberal. Seus matizes são riquíssimos e diversos. Mas algo, no Ocidente, o distingue, desde as bases, do Estado proletário, que o socialismo marxista intenta implantar: é que ele conserva sua adesão à ordem capitalista, princípio cardeal a que não renuncia. Esta afirmação pode ser subentendida, relativa, uma vez que quando os proletários buscam o poder também enfrentam dificuldades, porque quando se assume uma tentativa de mudança, o poder que se encontra ativo se reorganiza de maneira a impedir esta nova alternativa. No entanto, afirma-se que o Estado Social busca atender as demandas que se apresentam na sociedade de forma que os conflitos sociais sejam superados, na medida em que existe uma desigualdade entre o capital e o trabalho. A transformação da sociedade só ocorrerá a partir dos movimentos sociais e das reivindicações, com a pressão popular, fazendo com que o Estado passe a ser o responsável pelas políticas de atendimento ao cidadão. Esse Estado é mais conhecido como Estado-Providência, que segundo Bonavides (1980, p. 208): Quando o Estado, coagido pela pressão das massas, reivindicações que a impaciência do quarto estado faz ao poder político, confere, no Estado constitucional ou fora deste, os direitos do trabalho, da previdência, da educação, intervém economia como distribuidor, dito salário, manipula a moeda, regula os preços, combate o desemprego [...]. O Estado passa a empregar meios de intervenção para possibilitar que os excluídos possam ser atendidos nas suas necessidades e possam usufruir dos direitos fundamentais consagrados nos textos constitucionais modernos, se estabelecendo, portanto, uma relação mais igualitária e justa em uma sociedade de concepção democrática. Quando se aborda a democracia participativa não se pode deixar de mencionar que a simples participação representativa, qual seja a eleição de representantes para exercer o 17 mandato parlamentar, não é mais suficiente para atendimento das necessidades e demandas exigidas pelos cidadãos. O povo brasileiro, a cada dia que passa, exige a sua participação de forma efetiva no processo de decisão, inclusive quando isto diz respeito às questões referentes às condições de vida mais digna. Sobre esse tema, no próximo item, se propõe a discutir e contextualizar no cenário brasileiro a democracia participativa. 1.1.1 Democracia participativa no Brasil Observa-se que a participação do cidadão nos espaços públicos não é uma realidade recente, pois sua evolução foi gradativa e ocorreu em Atenas quando a maioria da população, que mesmo formada por escravos, não considerados cidadãos e sim objetos, já se percebia um mero esboço de participação. (COMPARATO, 1989, p. 126) Essa evolução pode ser verificada quando Fábio Comparato (1989, p. 126) explica que: [...] a idéia de participação popular nas funções públicas é uma superação da velha dicotomia Estado-sociedade civil, típica da filosofia política do século XX e vigente até hoje, entre liberais e antiliberais. Há, por assim dizer, uma volta parcial ao sentido de liberdade política dos antigos. A verdadeira liberdade consiste, efetivamente, na participação dos mecanismos do poder, como pensavam gregos e romanos. Mas essa participação – e aí vai o grande elemento de novidade – já não se limita à elite ou aos mais ricos, nem se cinge, tão-só, à esfera política em sentido estrito, mas abarca todas as áreas de poder, notadamente o econômico e o cultural. Percebe-se assim que essa participação se aperfeiçoa na medida em que as relações e o desenvolvimento político e cultural do povo daquela época rompendo gradativamente com as ordens advindas do sistema. Para corroborar o exposto as lições de Paulo Bonavides (2001b, p. 29) possibilitam um melhor entendimento sobre a democracia participativa. Afirma que: [...] o constitucionalismo da democracia participativa é o mesmo constitucionalismo de luta que prevaleceu no ocidente quando os países do Primeiro Mundo proclamavam repúblicas, promulgavam Constituições ou, em evasivas conservadoras de apego e afeição ao passado, instalavam 18 monarquias constitucionais, afiançando a sobrevivência política dos tronos e das dinastias ameaçadas. É por igual, doravante, o constitucionalismo dos países da periferia onde o espírito da Constituição tem o mesmo sentido histórico que teve o espírito das leis no século da revolução, quando a França liquidou o absolutismo. Com isto observa-se que a democracia participativa caminha junto com a evolução dos textos constitucionais do mundo todo, que passam a introduzir em seus textos a possibilidade de participação dos cidadãos no espaço público. Neste sentido, Comparato (1989, p. 127), sustenta que ―a ideia de participação do povo no exercício das funções tradicionalmente deferidas ao Estado, ou seja, a transformação da soberania popular de assentimento passivo a verdadeiro poder criador e transformador‖ possibilita que os indivíduos exijam participação ativa no processo democrático. Nessa linha de entendimento manifesta-se Bonavides (2001b, p. 34) que: A democracia participativa combate a conspiração desagregadora do neoliberalismo e forma a nova corrente de idéias que se empenham em organizar o povo para apor um dique à penetração da ideologia colonialista; ideologia de submissão e fatalismo, de autores que professam a tese derrotista da impossibilidade de manter de pé o conceito de soberania. Dessa forma a participação popular é o caminho que conduz ao aperfeiçoamento da democracia participativa. Conforme Randolph Lucas (1985, p. 109), a participação se constitui muitas vezes em apenas tomadas de decisões motivadas por questões políticas, sendo esse processo muito complexo que se depara com muitas dificuldades na promoção ativa e efetiva de mais de cem milhões de eleitores tornado essa insatisfatória. Acrescenta o referido autor que: Nenhuma forma de participação é totalmente satisfatória. Existem sempre desvantagens e vantagens. É característica da participação o fato dela ser apenas parcial. Com efeito, é inerente ao conceito de que devo ter razões para insatisfação. Embora participe totalmente e possa opinar sobre a decisão a respeito do que faremos, outras também participam e podem dar sua opinião; e como minha opinião não é completa, ela pode ocasionalmente ser contrariada e sobrepujada pelas opiniões daqueles. O problema da participação é que ela é essencialmente incompleta, e o velho Adão que existe em mim nunca ficará satisfeito com menos do que o controle completo. 19 Isso apresenta a possibilidade de se entender que a participação não será plena em todos os seus aspectos e as opiniões emitidas pelos grupos sociais são determinantes para a democracia, mas quando se observa a participação dos movimentos sociais, surge um paradoxo. De um lado, observa-se, a desigualdade, na qual se verificam camadas sociais vulneráveis ou excluídas, sem condições socioeconômicas mínimas para a manutenção de uma vida digna, que lutam por melhores condições por meio dos movimentos sociais. Por outro lado, se encontra o Estado Regulador que ―assumiu novos compromissos sociais e novas características destinadas a melhor capacitá-lo a promover o interesse público e fazer avançar o bem-estar social‖ (CRUZ, 2012, p. 75). E assim, priorizam o processo de inclusão social, mas às vezes, entram em conflito com as mobilizações da sociedade. Segundo Maria da Glória Gohn (2013, p. 23) ―O tratamento das desigualdades deve ter como horizonte a igualdade. Como isto é muito difícil numa sociedade tão desigual como a brasileira, desloca-se o foco para outro tema: o das diferenças.‖ Significa dizer que não se pode tratar a desigualdade como diferença. São coisas diferentes, por isso deve-se verificar que ―a equidade é a disposição de reconhecer igualmente o direito de cada um (Dicionário Aurélio), que é outra coisa que dizer: o direito de todos devem ser igualitários‖. Continua a mesma autora apud Telles, V.S. & Cabanes, R. (2006, p. 217-219) acentuando que: [...] para aparar os efeitos nocivos da desigualdade social, uma estratégia de inclusão, de democratização da esfera pública, ou seja, comporta em si mesmo o estabelecimento de critérios normativos que permitiram atenuar os resultados/e ou a diminuição dos efeitos da não inclusão social, ampliando espectro de participação social pela possibilidade de redistribuição [...]. Decerto que medidas que possibilitem a redistribuição de renda e trabalho podem amenizar os problemas sociais existentes em nossa sociedade, propiciando que a justiça social, objetivo central do Estado brasileiro se efetive, inclusive por meio da articulação dos movimentos sociais. Assim, surgem os movimentos sociais que para não ficarem à margem da história, atuam, em muitos casos, condicionados pelas políticas públicas e sociais que impõem limites 20 à participação política, reduzindo em grande parte a mobilização da sociedade. Conforme Gohn apud Ranciére J. (2013, p. 30-31): Nota-se que as restrições à democracia participativa não decorrem apenas dos limites interpostos à participação política, mas em grande parte pela redução dos temas de deliberação na cena pública. A participação política é confundida com o consenso e a política deixa de ser ―a reivindicação da parte dos que não têm parte a uma intervenção de expedientes.‖ De outra banda também não se pode deixar de mencionar que os movimentos sociais por meio das mobilizações, seja por redes sociais, chamadas na TV, jornais, distribuição de panfletos, passeatas, encontram um novo cenário na realidade nacional. Ou seja, a regulação normativa da Internet, Lei 12.965, publicada no Diário Oficial da União (DOU) em 24 de abril de 2014, entrará em vigor no final de junho e tem por finalidade estabelecer os ―princípios, garantias, direitos e deveres para o uso da internet no Brasil‖, denominado de Marco Civil da Internet. O objetivo dessas regras, sem dúvida, necessárias para ―proteger a liberdade de tráfego de informações e que se mostra como uma das mais radicais transformações tecnológicas, sociais e econômicas que o mundo conheceu‖. Segundo alguns especialistas em Direito Civil, destacando-se Paulo Roberto Narezi (2014, s.l.), cuja citação acima, em reportagem a Gazeta do Povo em 02 de maio do corrente ano. Cabe lembrar que os fundamentos da Lei 12.965/2014- Marco Civil da Internet tem como um dos seus fundamentos "os direitos humanos e o exercício da cidadania em meios digitais. Um dos princípios é a liberdade de expressão, já previsto constitucionalmente, além da liberdade de comunicação e manifestação de pensamento.‖ (NAREZI, 2014, s.l.). Cumpre registrar que essa legislação vem ao encontro da liberdade de informação e liberdade de expressão e o direito de informação. Haja vista que a LAI- Lei de Acesso a Informação, Lei nº 12 527 de 18/11/2011, que dispõe sobre os procedimentos a serem observados pela União, Estados, Distrito Federal e Municípios, com o fim de garantir o acesso a informações previsto no inciso XXXIII do art. 5o, no inciso II do § 3º do art. 37 e no § 2º do art. 216 da Constituição Federal , mas que não regula o uso da internet. (grifo nosso). 21 Acredita-se que as redes sociais são uma categoria muito utilizada por todos os cidadãos que estão conectados à Internet. Que ela é de suma importância para as relações sociais e para as mobilizações dos movimentos sociais urbanos e rurais na medida em que é um instrumento, até certo ponto, um modismo, mas que vincula indivíduo sem uma sociedade globalizada a articulação é célere e organizada. Pode-se dizer que a ―Rede social passa a ter, na atualidade, para vários pesquisadores, um papel até mais importante que o movimento social [...]‖ (Gohn, 2013, p. 32). Embora se entenda que as redes possibilitam uma interação entre pessoas, organizações, no setor de gestão e planejamento e com mais intensidade auxiliam na mobilização dos movimentos sociais. Por meio das redes sociais a participação da sociedade civil ocorre não apenas como ocupação de espaços nas novas esferas públicas, mas sua importância conforme Gohn (2013, p. 37) ―se faz para democratizar a gestão da coisa pública, para se ter controle social e inverter as prioridades das administrações no sentido de políticas que atendam não apenas as questões emergenciais, mas políticas que contemplem o crescimento econômico e autossustentável.‖ Com isso se quer questionar que o uso das redes não é mero instrumento para resolver problemas da má gestão pública, mas principalmente para promover com efetividade a inclusão social dos grupos majoritariamente excluídos de uma sociedade desigual que reduzem o cidadão a mero espectador. Cumpre destacar que não se pode tratar dos movimentos sociais e das redes sociais sem conceituar liberdade de expressão e liberdade de informação, considerados princípios fundamentais para a sustentação da democracia participativa. 1.2 Princípio da liberdade de expressão e de liberdade de informação Partindo do pressuposto de que a articulação dos movimentos sociais ganharam destaque a partir das mobilizações via redes sociais. Considerando que isso vem transformando o que antes era tido como parâmetro para a manutenção do status quo, passa a sofrer alterações em função dos novos meios de comunicação, principalmente a mídia, como o Facebook, a televisão e os jornais da grande imprensa. São eles, juntamente, com os movimentos sociais urbanos, agentes de pressão social que atestam a importância da liberdade de expressão e informação. 22 Por isso é necessário analisar o conceito de liberdade de expressão, que ―inclui a compreensão de que em todos os âmbitos da vida social, notadamente em países de democracia recente, há uma questão que não pode ser ignorada‖. Portanto, as considerações apresentadas pela Intervozes – Coletivo Brasil de Comunicação Social é pertinente e se encaixa perfeitamente neste trabalho. (LIBERDADE DE..., p. 1, s.d.). O documento apresenta de maneira bem elucidativa que: [...] a liberdade de expressão não se restringe apenas a um direito individual frente à censura de Estado ou frente a situações de guerra, violência ou conflitos, mas sim como um direito difuso e coletivo que inclui o acesso aos meios de produção e difusão midiática, de maneira a abarcar a representação da diversidade cultural, social e política da sociedade e as políticas públicas de Estado que garantam a participação e representação desses grupos. Em outras palavras, a liberdade de expressão deve ser encarada como um direito que não é absoluto, sendo passível de restrições quando em colisão com outros direitos fundamentais. Portanto, há necessidade de se entender o significado de liberdade de expressão a partir da ótica constitucional, reconhecendo-se que está ligada à liberdade de informação, pois ambas servem de fundamento para o exercício de outras liberdades. Registre-se que Luís Roberto Barroso (2007, p. 80) afirma que ―a liberdade de expressão, destina-se a tutelar o direito de externar ideias, opiniões, juízos de valor; em suma, qualquer manifestação do pensamento humano‖ e que por isso é uma garantia da manutenção e do desenvolvimento da sociedade democrática. Não se pode deixar de ressaltar que a Constituição Federal Brasileira de 1988, no capítulo DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS, determina no inciso IX do artigo 5º, que ―é livre a expressão da atividade intelectual, artística, científica e de comunicação, independentemente de censura ou licença.‖ (grifo do texto). O entendimento de Rodrigo Meyer Bornholdt (2010, p. 81) sobre e liberdade de expressão contribui para a compreensão do seu significativo. Ressalta que: 23 ―Liberdade de expressão‖ é um termo genérico. Remonta, como se verá, ao contexto de libertação do absolutismo, sendo intimamente ligada à liberdade de imprensa, e dependente das liberdades de pensamento e opinião. Sua consagração como direito fundamental ganha ainda maior significado num Estado Democrático de Direito. Num primeiro sentido, constitui a liberdade de expressão um significativo direito de personalidade; depois, como é corrente em inúmeras obras doutrinárias e decisões judiciais (brasileiras ou alienígenas), a liberdade de expressão é constitutiva da ideia e prática da democracia. Nosso texto constitucional consagra inúmeras disposições, ora semelhantes ora idênticas a pré – compreensão da liberdade de expressão. Assim sendo, constata-se que a liberdade de expressão faz parte de um conjunto maior de liberdades e não restam dúvidas que não há liberdade de expressão sem informação e comunicação e a distinção entre ambas se faz imperioso até para se entender melhor os movimentos socais. A liberdade de informação ―diz respeito ao direito individual de comunicar livremente fatos, e ao direito difuso de ser deles informado‖ (BARROSO, 2007, p. 82) e isso ocorre através dos meios de comunicação, que não se restringem ao rádio, jornal ou televisão. De fato, no mundo atual, no qual se exige que a informação circule cada vez mais rapidamente, se encontram as redes sociais. Essas contribuem para a divulgação de fatos, dados, informações e para a articulação e mobilização dos movimentos sociais. É evidente que ―tanto a liberdade de informação, como a de expressão, não são direitos absolutos, encontrando limites na própria Constituição‖ (BARROSO, 2007, p 84). Quando se faz referência a utilização das redes sociais para chamar a sociedade para a mobilização nas ruas e praças, não se está dizendo que isso é vedado, mas, sim que há mecanismos institucionais que impõem o cumprimento de regras para evitar o uso abusivo da liberdade de expressão e de informação. Diante disso, relevante questionar: a liberdade de expressão é um suporte ou ela é uma ameaça à democracia? Sustenta Frank I. Michelman (2007, p. 49) ―que tanto a democracia quanto a liberdade de expressão são práticas salutares. Nós valoramos estas práticas e buscamos 24 preservá-las em nossas próprias sociedades‖. Portanto, estes dois tipos de práticas sociais estão interligadas e segundo o supracitado autor (2007, p. 59) demandam seja observada: [...] a proporcionalidade entre a proteção das liberdades subjetivas dos indivíduos de se expressarem como desejam e a promoção de uma igualdade básica entre as pessoas no que concerne a ter uma justa oportunidade de ter suas percepções, opiniões e vontades ouvidas e avaliadas nos canais e fóruns de discussão da sociedade. Na verdade, a liberdade de expressão e a liberdade de informação funcionam como meios para a consolidação do espaço democrático e ―atendem ao inegável interesse público da livre circulação de ideias, corolário e base de funcionamento do regime democrático‖ (MICHELMAN, 2007, p. 82). De um modo geral, o exercício da liberdade de informação está relacionado à difusão de ideias, ao acesso às notícias e informações que precisam ser divulgadas, e no caso desta pesquisa, tem a ver com a necessidade de os cidadãos terem assegurado o direito coletivo à informação, seja por meio das redes sociais ou dos meios de comunicação social. Jose Afonso da Silva, (2011, p. 246) manifesta-se sobre o assunto ressaltando que: É nesta que se centra a liberdade de informação, que assume características modernas, superadoras da velha liberdade de imprensa. Nela se concentra a liberdade de informar e é nela ou através dela que se realiza o direito coletivo à informação, isto é, a liberdade de ser informado. Por isso é que a ordem jurídica lhe confere um regime específico, que lhe garanta a atuação e lhe coíba os abusos. Isso significa que na atualidade, e em face dos acontecimentos ligados aos movimentos sociais e manifestações populares não se pode dispensar o acesso à informação e o recebimento destas, sob a pena de se ficar afastado da sociedade e não conseguir acompanhar a evolução dos acontecimentos. Continua o mesmo autor (2011, p. 247) informando que a liberdade de informação: [...] informação não é simplesmente a liberdade do dono da empresa jornalística ou o jornalista. A liberdade destes é reflexa no sentido de que ela só existe e se justifica na medida do direito dos indivíduos a uma informação 25 correta e imparcial. A liberdade dominante é a de ser informado, a de ter acesso às fontes de informação, a de obtê-la. Salienta-se que a liberdade de informação não pode dissociar-se da função social que exerce, assumindo um papel relevante na sociedade, na medida em que se verifica uma conexão entre as práticas sociais e as oportunidades e capacidades comunicativas de alguns membros. Destaca Ingo Wolfang Sarlet e Carlos Alberto Molinaro (2014, p. 128-129) que: Assim como a liberdade de expressão e manifestação do pensamento encontra um dos seus principais fundamentos (e objetivos) na dignidade da pessoa humana, naquilo que diz respeito à autonomia e livre desenvolvimento da personalidade do indivíduo, ela também guarda relação, numa dimensão social e política, com as condições e a garantia da democracia e do pluralismo político, assumindo, nesse sentido, a qualidade de um direito político e revelando uma dimensão nitidamente transindividual, pois a liberdade de expressão e os seus respectivos limites operam essencialmente na esfera das relações de comunicação e da vida social. Porém, destaca-se que, se de um lado encontram-se os direitos à liberdade de expressão e à liberdade de informação como aliados da democracia participativa. Por outro, é oportuno lembrar que há um novo espaço de comunicação que tem ocasionando profundas mudanças nos modos e meios de expressividade da divulgação de dados, opiniões, atitudes e compartilhamento de seus conhecimentos. Ou seja, a utilização das redes sociais que podem acarretar riscos para a democracia. (NASCIMENTO; RODRIGUES, 2014) Diante das lutas pelos seus direitos, os atores/agentes desse processo de novas formas de comunicação, que por muitos anos se sentiram excluídos do sistema, às vezes se excedem nas manifestações, e o Estado age repressivamente e com violência, provocando condutas antissociais e ilícitas. Sobre o ponto de vista de Celos (2005, p. 129) esses atores/agentes: [...] durante muito tempo se viram órfãos de qualquer perspectiva jurídica, a não ser, em alguns casos, daquele proveniente do braço repressivo do Estado‖ [...] Esses agentes mencionados, são mulheres e homens de carne e osso, que devido a série de fatores – conseqüência direta da hegemonia do capitalismo enquanto sistema e modo de produção - são colocados à margem 26 da sociedade, sendo historicamente excluídos, dominados, explorados, perseguidos. O que se observa é que o Estado, por meio do Direito ou da lei, procura resolver os conflitos sociais, e autoriza que os órgãos responsáveis pela segurança ajam com repressão, quando na realidade deveria ser encarado como instrumento de promoção das transformações da sociedade. Levando em consideração estes aspectos, observa-se que os movimentos sociais revelam uma pluralidade de dimensões, podendo-se citar a sociológica, cultural, política, econômica, jurídica e entre outras. E estão atrelados à participação dos cidadãos e a divulgação pelos meios de comunicação, observando-se a importância da liberdade de informação e manifestação. Nesse sentido, as palavras de Teresa Costa Alves apud Pinto (2013, p. 126) são esclarecedoras: ―Quanto mais se democratiza um país, mais haverá cidadãos falando de seus problemas em locais não tradicionais da política. Portanto, no regime democrático, tende a haver uma democratização dos espaços, onde o discurso político é enunciado‖, e a liberdade de manifestação, seja por meio de movimentos sociais, passeatas, ou através da internet, não pode ser tolhida com violência ou mesmo com o endurecimento da lei penal. Baseado nos princípios da liberdade de informação e manifestação que deve viabilizar a participação do cidadão no espaço público, muitas vezes se observa o contrário. Ou seja, a exclusão do cidadão por meio da opressão exercida pelo Estado, que regulamente e controla o direito de expressão e manifestação cívica nas suas variadas formas. Alves (2013, p. 131) anota que é possível dizer que: Nas manifestações cívicas, os cartazes constituem uma expressão de cidadania que se reflete em exposição mediática. A manifestação é uma das principais atividades da maioria dos movimentos sociais enquanto grupos organizados. A prática discursiva das mensagens políticas destas formas de expressão das massas tornam coletivo o individual, numa expressão conjunta de valores, ideais comuns ou apenas de indignações partilhadas, já que é frequente a motivação para a realização de uma manifestação ser uma situação que se deseja contrariar. 27 Observa-se que as manifestações cívicas dos cidadãos assumem um duplo papel, ou seja, ―poderá engrandecer a sua participação na democracia, ao mesmo tempo, que estará a reduzir a sua participação democrática à informação que lhe é fornecida‖ (ALVES, 2013, p. 134) e assim sem perceber, ser excluído do espaço público. 1.3 A exclusão dos cidadãos do espaço público e as diversas formas de opressão Acentua-se a importância do exercício da liberdade de expressão e manifestação em uma sociedade democrática, fraterna e pluralista, embora muitas vezes isso é inviabilizado por meio da regulamentação do Estado que cria mecanismos institucionalizados para impor limites, restringindo o avanço da cidadania participativa. Na realidade, o objetivo do Estado é a garantia dos direitos fundamentais, porém Maria Magdala Vasconcelos de Araujo Silva (2012, p. 21) afirma que: Assim, o objetivo primordial do Estado liberal é garantir o direito à liberdade individual e à propriedade privada dos cidadãos pelos mecanismos constitucionais do estado de direito. Porém, essa liberdade, representada nas entranhas do Estado absoluto, é, como vimos anteriormente, aprisionada na medida em que é formalmente normatizada. A liberdade é substituída por instrumentos de regulamentação e controle que terminaram por perpetuar a desigualdade de classe. Desta forma, o controle instituído sobre a liberdade feriu um princípio básico da igualdade como condição essencial à liberdade. Neste universo, a evocação do princípio básico da igualdade, como condição essencial à liberdade, apresenta-se como limitador da própria cidadania política, social e econômica, haja vista a regulamentação imposta pelo Estado referente à participação nos movimentos sociais e manifestações cívicas. Ainda, com relação à exclusão do cidadão do espaço público, Araujo Silva (2012, p. 22) sublinha que ―a prática democrática da cidadania republicana parte do pressuposto que ser cidadão é participar ativamente da vida cívica‖. Na realidade tem se observado que o Estado, por meio de aparatos legais, se contrapõe ao direito de expressão e liberdade excluindo o cidadão do espaço público. Nesse sentido, o Projeto de Lei encaminhado em 21 de fevereiro do corrente ano, pelo Governo Federal ―para conter a onda de violência nas ruas em atos de protestos, 28 proibindo o suo de máscaras durante as manifestações e aumentando as punições em caso de dano ao patrimônio público‖ demonstra uma forma de opressão exercida pelo Estado. Embora possa ser entendido pelo aspecto da segurança pública de todos os cidadãos, aparentando ser a mais adequada para nossa proteção. (CORRUPÇÃO E..., s.n.: s.l., s.d.) Essa proposta, no entanto, já provoca polêmica, haja vista que restringe a liberdade de expressão, sendo considerado antidemocrático e contrário aos princípios constitucionais. Conforme o Ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo (ROSA, 2014, s.l.) esse projeto de lei quer evitar o anonimato e fazer com que os responsáveis assumam as consequências dos seus atos, dizendo que ―ninguém pode se infiltrar em manifestações para depredar o patrimônio, agredir, matar e não ser punido.‖ Sabe-se que no Código Penal a pena existente hoje para danos ao patrimônio público, sendo de seis meses a um ano de reclusão, e que isso não impede que pessoas mal intencionadas cubram o rosto para, no anonimato, promover desordem e quebra-quebra do patrimônio público e privado. Mesmo com críticas contrárias, Cardozo (ROSA, 2014, s.l.) ―negou que o projeto de lei tenha objetivo de coibir atos públicos e protestos contra o governo. Queremos garantir a liberdade de manifestação, mas vamos atuar com rigor contra a violência e prática de crimes.‖ Ainda relacionado às críticas contrárias ao projeto, a Presidenta Dilma (DILMA CRITICA..., 2014, s.l.) manifesta-se quando questionada sobre as ações discutidas pelo governo para combater atos de vandalismo nas ruas. Dizendo que: Repudio completamente o uso da violência em manifestações e acho inadmissível em país democrático ato de vandalismo. Pessoas que usam da violência, pessoas que escondem o rosto para se manifestar não são democratas. Pessoas que matam, que ferem ou destroem patrimônio público são criminosos e devem ser punidos como tal. Para mim, democratas são aqueles que exercem pacificamente seu direito e a liberdade de questionar, de propor e exigir mudanças. Essa manifestação vem ao encontro do que se observa no texto constitucional, qual seja, a garantia da liberdade de manifestação de forma ordeira sem anonimato, buscando-se coibir atos que gerem violência e evitem o confronto com as forças públicas, que nessa 29 qualidade necessitam agir para proteger a incolumidade física das pessoas e a propriedade pública e privada. Nesse sentido, comenta a Presidenta Dilma (DILMA CRITICA, 2014, s.l.): Que a Constituição garante a liberdade de manifestação, a liberdade de manifestação de pensamento, enfim ela garante todas as liberdades. Mas ela veda o anonimato, ela proíbe o anonimato. Então, nós estamos trabalhando numa legislação para coibir toda a forma de violência em manifestações. Observa-se, portanto, que mesmo com a garantia constitucional da liberdade de expressão e manifestação o Projeto de Lei nº 5964/2013, (2013, p. 02) apresenta como justificativa o seu encaminhamento, argumentando que: O Brasil tem vivenciado um momento delicado politicamente e ministrado preciosas lições de cidadania, quando exerce seu direito constitucional de manifestação de pensamento e luta por melhorias na saúde, na educação, no transporte, na segurança pública, dentre outras. Embora nossa Constituição, no capítulo referente aos Direitos e Deveres Individuais e Coletivos, assegure que é livre a manifestação do pensamento, sendo vedado o anonimato, este esteve presente nos protestos, atrás de máscaras, lenços, toucas e outras formas utilizadas por manifestantes para omitir a própria identidade. Essa atitude está no centro de discussões de governos e ativistas, enquanto a polícia diminui a tolerância na tentativa de coibir a violência. Por um lado, não se pode admitir mesmo em um país como o nosso, com liberdade de expressão e manifestação asseguradas pelo texto constitucional, que pessoas inescrupulosas, vândalos, ativistas, utilizem de expedientes escusos e se escondam atrás de máscaras, lenços, toucas para realizar ―badernas‖ ―quebra-quebra‖, do patrimônio público e privado e não sejam identificados e responsabilizados por seus atos. Mas, por outro, há uma preocupação crescente com esse tipo de proibição, pois poderá trazer em seu bojo um avanço para ―a ditadura‖ dos meios de comunicação. Denota-se nesta conjuntura que mais uma vez a regulamentação e a burocratização das participações em movimentos sociais apresentam-se como entraves para a consolidação da democratização do espaço público e consequentemente da cidadania. 30 1.3.1 A burocracia com entrave para a consolidação da cidadania A burocratização é um fenômeno que afeta a vida de todos nós e gera altos custos ao cidadão, que ocorre nos três níveis de governo: federal, estadual ou municipal, embora sendo necessário muitas vezes o instrumental necessário para a defesa de interesses. Nem sempre a burocratização facilita a vida do cidadão, viabilizando e promovendo o seu bem estar, pois é um entrave à consolidação da cidadania quando impõem diretrizes e exigências que cada vez mais centralizam a administração. É imprescindível que se conheça o significado do termo burocracia, para no contexto desta pesquisa, se entenda porque é um entrave para a consolidação da democracia. Segundo SEBRAE (s.l., p. 13, 2004) ―há um significado técnico para o termo burocracia, ou seja, aquele que associa o termo à ideia de papelório, excesso de exigências e formalidades.‖ De fato, o cidadão ao ouvir a palavra burocracia imediatamente associa a filas em cartórios, processos, montes de exigências, demora na prestação do serviço, informações desconectadas, gastos, perda de tempo, entre outros. Isso é uma verdade, pois muitas vezes a burocratização das atividades administrativas ou aquelas impostas pelo Estado aos particulares engessa a democracia, o exercício da cidadania e principalmente uma administração pública voltada aos interesses do cidadão. É uma cultura que perpassa a história da administração pública brasileira. Precisa-se reverter esse quadro e fazer com que a burocratização deixe de ser empecilho à consolidação da democracia e a confiança que deve existir entre o Estado e a sociedade. Nesse sentido Jose Carlos Kraemer Bortoloti e Fernando Tonet (s.n., s.d.) apontam que: [...], a burocracia contemporânea tem aspectos claros: rege-se por meio de leis e normas administrativas e nessas atividades contínuas são distribuídas como deveres oficiais, além disso, os deveres oficiais são disseminados e controlados por uma autoridade, a qual, com rigor, estabelecem e aplicam os meios de coerção que são colocados à disposição dos funcionários ou autoridades vinculados à pratica. Por fim, concebem-se as medidas meticulosas para o cumprimento regular e contínuo dos deveres, as quais são efetivadas por membros da autoridade. 31 Com efeito, exige-se um comprometimento de todos os envolvidos no processo de democratização cuidando para que a burocratização não se torne um entrave ao desenvolvimento e construção da cidadania, tendo em vista o controle exercido pelo Estado sobre as pessoas e movimentos sociais. Conforme o texto do SEBRAE (s.l., p. 14, 2004) urge que medidas sejam tomadas para desburocratização de alguns setores da vida pública a privada e se promova a ―revisão de práticas administrativas que estimulam a burocratização e que remontam aos primórdios da administração colonial.‖ O cidadão precisa ser tratado como o ―destinatário do serviço público e não como ―súdito‖ do governo‖. Haja vista que a centralização de decisões impede a valorização não só do cidadão como do servidor. Isso implica certamente em uma crise de representatividade, pois nossos representantes no Congresso Nacional se omitem com relação às necessidades dos cidadãos brasileiros. Sendo muito comum a falta de convergência dos interesses e conhecimento das reais demandas para a elaboração de uma legislação que viabilize a inserção social. E isso gera as manifestações sociais urbanas e rurais. 1.3.2 A crise da representatividade e os movimentos sociais urbanos Não resta menor dúvida de que a democratização do Brasil é o maior responsável pela reconstrução do processo da cidadania e dos valores democráticos, conduzindo o cidadão a tornar-se um agente interlocutor com seus representantes e intervir no espaço público. Ora, ―a capacidade de intervir e construir uma esfera pública foi um dos grandes saldos da redemocratização do país‖ e deve-se mencionar que os movimentos sociais ganham força a partir do momento em que surge uma crise de representatividade. Essa crise relacionase com a falta de compromisso dos parlamentares, que ao invés de atuar respeitando os interesses do cidadão passa a agir em seu próprio interesse. (GOHN, 2011, p. 321). Há necessidade de se construir uma nova cultura política, ou seja, a emergência dos movimentos sociais denotam que em havendo omissão dos agentes políticos na esfera pública, àqueles passaram a operar de forma destacada em todos os setores. Buscando a superação da desigualdade e da falta de participação e militância em prol dos interesses 32 coletivos. Ou seja, essa nova cultura política diz respeito a necessidade de se ampliar o envolvimento da participação dos agentes políticos nas questões que envolvam a cultura, a educação, a saúde, a moradia, a segurança pública, dentre outras. Sustenta Gohn apud F. de Oliveira (2011, p. 322) ―que não há crise nos movimentos sociais, mas processo de democratização‖. Significa dizer que as lideranças políticas necessitam aliar-se aos novos interlocutores dos movimentos, pois está em jogo um novo modelo de governar e por isso ―o Estado vem perdendo sua eficiência e eficácia. E os movimentos sociais são espaço, por excelência, da inovação, da criatividade.‖ Observa-se que a complexidade existente nas relações entre representantes e representados é também o gerador dessa crise e novos valores devem ser agregados nessa relação para que essa crise de representatividade não seja um entrave ao desenvolvimento e construção da cidadania. Pois os movimentos sociais trazem para o seu próprio ambiente as exigências dos imperativos da democracia. Ou seja, ―a superação da exploração, da opressão, o desejo de liberdade e igualdade não se esgotam no imaginário e nos sonhos das pessoas à dimensão da participação e militância na política partidária.‖ (GOHN, 2011, p. 96). Assinala-se que quanto mais interlocutores fizerem parte da esfera pública, ocorrerão mudanças nos valores e orientações que fundamentam a ação social, política e cultural. Desta forma os movimentos sociais poderão agir impulsionados pelo desejo de mudanças e inovações dentro de uma realidade condizente com os parâmetros democráticos. Por último, destaca-se que a inovação do próprio sistema político é fundamental para uma ―rápida difusão da ação coletiva dos setores mais mobilizados para os menos mobilizados. Pode ser o passo estimulante de inovações nas formas de disputa, combinando novas formas de participação organizada‖ (GOHN, 2011, p. 96), pois se a democracia não atende as expectativas do cidadão, por óbvio que a participação popular, por meio dos movimentos sociais, aperfeiçoa o processo democrático. A partir deste contexto, no segundo capítulo, abordar-se-á especificamente a democracia e os movimentos sociais. 33 2 A DEMOCRACIA E MOVIMENTOS SOCIAIS URBANOS: Para melhor entendimento acerca dessa temática faz-se necessário uma abordagem sobre os aspectos que sustentam a democracia para posteriormente contextualizar os movimentos sociais urbanos. Também é fundamental para o estudo entender a origem e o conceito dos movimentos sociais, suas características e fundamentos. Haja visto que as lutas pela redemocratização do país são originárias de movimentos sociais, sejam eles através dos meios de comunicação em redes ou fomentados por grupos sociais, pelo excluídos ou por aqueles que tem suas demandas não atendidas pelo governo. 2.1 Origem e conceito dos movimentos sociais Os movimentos sociais, segundo Gohn (2013, p. 40) ―constituem-se como um dos sujeitos sociopolíticos presentes no associativismo no Brasil, porque eles foram, e ainda são, as bases de muitas ações coletivas no país a partir de 1970‖. Transitam pelos espaços não consolidados pelo poder político quando este, em suas relações, não conseguem efetivar o atendimento das demandas dos atores sociais que lutam para verem seus pleitos atendidos por meio de políticas públicas estatais, ou que simplesmente desejam expressar sua desconformidade com a ação política e/ou social. Estes atores sociais surgiram na sociedade civil brasileira pós anos 1970 sem a autorização do Estado e, num primeiro momento, contra o próprio Estado. Constitui-se, assim, uma participação à revelia dos interesses estatais, mas consolidando-se como um novo espaço de participação democrática e das relações sócio-políticas e sociais. Sobre esse tema Gohn (2011, p. 303) assevera que: [...] os novos atores sociais que emergiram na sociedade civil brasileira, após 1970, à revelia do Estado, e contra ele num primeiro momento, configuraram novos espaços e formatos de participação e de relações públicas. Estes novos espaços foram construídos basicamente pelos movimentos sociais, populares ou não, nos anos 70-80 (Gohn, 1991); e nos anos 90 por um tipo especial de ONGs que denominamos anteriormente de cidadãs, ou seja, entidades sem fins lucrativos que se orientam para a promoção e o para o desenvolvimento de comunidades carentes a partir das relações baseadas em direitos e deveres da cidadania (Gohn, 1994). 34 Observa-se que os movimentos sociais podem ser definidos como ―fenômenos históricos, decorrentes de lutas sociais e se transformam [...]‖ a partir das lutas de classes com enfoque nas necessidades dos atores sociais que buscam com suas ações diretas e discursos, organizados ou não, obter visibilidade e chamar atenção para as dificuldades que estão condicionadas aos problemas enfrentados no cotidiano na busca de melhores condições de vida e de trabalho. Existem variadas teorias sobre os movimentos sociais, porém, sustenta Gohn (2004, p. 343) que: [...] Nunca haverá uma teoria completamente pronta e acabada sobre eles (movimentos sociais). Trata-se de uma característica do próprio objeto de estudos. Os movimentos são fluídos, fragmentados, perpassados por outros processos sociais. (grifo da autora) Paulo Silvino Ribeiro (s.d., s.l.), apresenta como conceito para movimentos sociais à ação coletiva de um grupo organizado ―[...] que objetiva alcançar mudanças sociais por meio do embate político, conforme seus valores e ideologias dentro de uma determinada sociedade e dentro de contextos específicos, permeados por tensões sociais‖. Isso possibilita considerar que os movimentos sociais lutam por melhorias em suas condições de vida e trabalho, mas, principalmente, buscar a realização de seus anseios, a construção de uma identidade que visa, também, a transformação da sociedade. Desta forma, para a compreensão dos movimentos sociais, é importante que se faça uma abordagem sobre a sua origem no Brasil, a partir da era da participação, anos 70 e 80 e o modelo de desenvolvimento nos anos 90. Desde logo, destaca-se que a abordagem vai se atem apenas à história dos movimentos sociais urbanos dos últimos vinte anos, o que significa que de um universo dos estudos sobre os movimentos a preocupação está em mapear apenas uma faceta destas mobilizações. Percebe-se que nos estudos sobre os movimentos sociais realizados por Gohn (2011, p. 279) que: 35 [...] algumas influências difusas presentes ao final dos anos 70 se esclareceram. Isto graças, também, a um crescimento da influência de filósofos e estudiosos europeus, defensores de propostas tidas como novas: Foucault, Castoriadis, Deleuze, Guattari, E. P. Thompson, Thoreau, ClausOffe etc. Pesquisar a identidade dos movimentos, ouvir suas falas, captar suas práticas cotidianas foram se tornando os objetivos centrais nas preocupações dos analistas, e não mais o estudo das determinações estruturais da economia sobre as ações coletivas em andamento. Neste contexto começam a ser demarcadas as diferenças entre os movimentos sociais, conferindo-lhes identidade própria, destacando-se que ―O repertório de lutas construídos por eles demarcam interesses, identidades, subjetividades e projetos de grupos sociais" que não só mobilizam as pessoas, mas mobilizam ideias e valores que contribuem para impulsionar mudanças sociais.‖ (Gohn, 2013, p. 40/41) Cumpre registrar que no final dos anos 70, segundo Gohn (2011, p. 281): [...] no Brasil, quando se falava em novos movimentos sociais, em encontros, seminários e colóquios acadêmicos, tinha-se bem claro de que fenômeno se estava tratando. Era sobre os movimentos sociais populares urbanos, particularmente aqueles que se vinculavam às práticas da Igreja católica, na ala articulada à Teologia da Libertação. A denominação buscava contrapor os novos movimentos sociais aos ditos já velhos, expressos no modelo clássico das sociedades amigos de bairros ou associações de moradores. O que estava no cerne da diferenciação eram práticas sociais e um estilo de organizar a comunidade local de maneira totalmente distinta. Enfatiza-se que a relação dos movimentos sociais urbanos com o Estado era vista como uma rebelião ou oposição, embora, isto seja um equívoco, pois na realidade esses buscavam mudanças sociais nos projetos políticos sociais e econômicos apresentados pelo governo. Analistas e consultores de organizações internacionais consideram os movimentos sociais como elementos e fontes de inovações e mudanças sociais e não se pode olvidar que estes movimentos ―[...] detêm um saber, decorrentes de suas práticas cotidianas, passíveis de serem apropriadas e transformadas em força produtiva.‖ (GOHN, 2013, p. 41). Os movimentos sociais populares urbanos sempre ocuparam um papel de destaque na sociedade, e Gohn (2011, p. 282) assevera que: 36 [...], embora tenham ocorrido alguns equívocos nas análises, dados pelas próprias contradições que traziam em seu interior, no plano da ação concreta elas contribuíram para subsidiar um projeto de mudança social em que os movimentos sociais populares urbanos tinham papel de destaque. Eles eram vistos como fontes de poder social. A relação dos movimentos com o Estado era vista em termos de antagonismo e oposição. Não se pode deixar de mencionar o papel exercido pela Igreja na estruturação dos movimentos sociais urbanos, principalmente como formadora de opinião, pois ―a relação da Igreja era usualmente tratada apenas em termos de apoio ou de matriz formadora/constituidora das novas forças sociais‖ (Sader, apud GOHN, 2011, p. 283), o que se modificou a partir dos anos 80. Progressivamente os movimentos sociais passaram a ter outro referencial e ser fortemente influenciado pela política estatal e destaca-se que a história e a sociedade são mostram que pela articulação dos grupos é que se pode perceber as mudanças no cenário sociopolítico, econômico e cultural. Com efeito é notável o que a autora supracitada apresenta sobre essas mudanças (2011, p. 283) quando observa que: As mudanças na conjuntura política no início dos anos 80 vieram a alterar o cenário. No campo popular começou-se a indagar, e a questionar, o caráter novo dos movimentos populares. No campo das práticas não exclusivamente populares, iniciou-se o interesse, por parte dos pesquisadores, por outros tipos de movimentos sociais, tais como o das mulheres, os ecológicos, os dos negros, índios, etc. Foram movimentos que ganharam expressão naquela década, embora fossem lutas já antigas que ressurgiram no Brasil no final dos anos 70. Em alguns casos, estiveram articulados à luta popular, como no caso das creches e de algumas alas do movimento feminista. As mudanças na conjuntura política e social brasileira e as políticas participativas possibilitam a compreensão de que os movimentos sociais urbanos no Brasil sempre estiveram presentes e atuantes, mas ganharam força neste período, quando uma grande parcela de desempregados do setor produtivo privado saíram às ruas para reivindicar que a agenda pública e governamental contemplasse políticas públicas de desenvolvimento. Também contribuíam para o avanço quantitativo das mobilizações da década de 80 o 37 surgimento de grandes centrais sindicais e o aparecimento de entidades que qualificamos como movimentos sociais e realizam as articulações para implementarem seus objetivos. Nesse sentido, Gohn (2011, p. 285/286) afirma que: No decorrer dos anos 80 os movimentos sociais no Brasil passaram, no plano da atuação concreta e no plano das análises deles feitas, da fase do otimismo para a perplexidade e, depois, para a descrença. Vários fatores contribuíram para essas mudanças, com destaque para as alterações nas políticas públicas e na composição dos agentes e atores que participam de sua implementação, gestão e avaliação; o consenso, a generalização, e o posterior desgaste das chamadas práticas participativas em diferentes setores da vida social; o crescimento enorme do associativismo institucional, particularmente nas entidades e órgãos públicos, os quais cresceram muito em termos numéricos ao longo dos anos 80, absorvendo grande parte da parcela dos desempregados do setor produtivo privado; o surgimento de grandes centrais sindicais; o aparecimento de entidades aglutinadoras dos movimentos sociais populares, especialmente no setor da moradia; e, fundamentalmente, o surgimento e o crescimento, ou a expansão, da forma que viria a ser quase que uma substituta dos movimentos sociais nos anos 90: as ONGs – Organizações Não -governamentais. O Estado nem sempre foi adversário dos movimentos sociais, mas seu principal interlocutor, notadamente quando, nos anos 90, ocorreu ―o aprofundamento do processo de transição democrática, com a ascensão de líderes da oposição, de vários matizes, a cargos no parlamento e na administração de postos governamentais [...]‖, enfatizando a cidadania e a exclusão social como categorias básicas para a sustentação dos movimentos sociais (Gohn, 2011, p. 288). Os elementos básicos que sustentam os movimentos sociais urbanos na década de 90 foram direcionados para as ações que envolvem a cidadania coletiva e a exclusão social. Desta forma, é imprescindível verificar a análise efetuada por Gohn (2011, p. 288) sobre o tema, observando que: No plano das análises, os anos 90 enfatizarão duas categorias básicas: a cidadania coletiva e a exclusão social. A primeira, já presente na década anterior, apresentará como novidade pensar o exercício da cidadania em termos coletivos, de grupos e instituições que se legitimaram juridicamente a partir de 88, e que têm de desenvolver um novo aprendizado, pois não se trata apenas de reivindicar, pressionar ou demandar. Trata-se agora de fazer, de propor, de ter uma participação qualificada, já que o lugar da participação está inscrito em leis, é uma realidade virtual. A segunda, relativa à exclusão, decorre das condições socioeconômicas que passam a ser imperativas, 38 causadoras de restrições e situações que Durkheim certamente caracterizaria como anomia social: violência generalizada, desagregação da autoridade estatal, surgimento de estruturas de poder paralelas etc. Ao dar ênfase às categorias dos excluídos da cidadania coletiva, cientistas políticos, dentre eles Touraine, Marshall e Dahrendorf, afirmam que a qualidade do conflito existente nos movimentos sociais se modificaram, não ocorrendo mais em torno das diferenças e desigualdade sociais, mas sim restringindo-se à participação cívica nas decisões políticas, econômicas ou sociais, tomada pelos governantes, quando envolvem direitos e obrigações e a precariedade de serviços essenciais prestados à população (apud Gohn, 2011, p. 289). Neste cenário, Dahrendorf (apud Gohn, 2011, p. 289), destaca que: [...] a luta para se ter direitos de cidadania para todos os seres humanos implica a construção da sociedade civil geral sob o governo da lei. Atualmente as barreiras de privilégios continuam a ser a questão fundamental, e os ―cidadãos‖ meramente ganharam uma nova posição, mais vantajosa, na luta por maiores chances na vida. Diante das lutas realizadas pelos movimentos sociais urbanos visando a construção de uma sociedade mais justa e solidária, é inegável que o Estado é o grande elemento responsável pela coesão social, e segundo Castells apud Gohn (2011, p. 295) ―Ele tem a capacidade de regular as relações políticas de classe, desempenhando um papel de árbitro [...]‖ confirmando desta forma que os movimentos sociais organizam-se com a finalidade de lutar pelos seus ideais e exigir o cumprimento das políticas governamentais relativas aos direitos fundamentais. Os movimentos sociais apresentam características gerais e fundamentos que variam de tempos em tempos como se observou na análise dos anos 70 a 90 e apresentam uma trajetória que ultrapassa as questões sociais e envolve questões políticas e econômicas. 2.1.1 Características gerais e fundamentos dos movimentos sociais É interessante observar que a trajetória dos movimentos sociais no Brasil nos últimos vinte anos tem como paradigma as teorias não só norte-americana e europeia, mas latinoamericana, concentrando-se principalmente nos movimentos sociais libertários ou 39 emancipatórios, nas lutas populares, nas lutas pela terra, dando-se atenção às possibilidades de conscientização, mobilização e organizações de grupos e movimentos. Para Gohn (2011, p. 14): [...] o paradigma norte-americano possui, em suas diferentes versões, explicações centradas mais nas estruturas das organizações dos chamados sistemas sociopolítico e econômico; as categorias básicas de suas análises são: sistema, organização, ação coletiva, comportamentos organizacionais, integração social, etc. [...]. Não resta dúvida que na Europa, os movimentos sociais apresentavam como paradigmas abordagem teóricas bem diferenciadas e que a abordagem marxista e a dos Novos Movimentos Sociais são consideradas como um espelho para explicar a identidade dos atores sociais. Sobre as teorias a autora supracitada (2011, p. 14/15) ressalta que: A marxista centra-se no estudo dos processos históricos globais, nas contradições existentes e nas lutas entre as diferentes classes sociais. As categorias básicas construídas por seus analistas são: classes sociais, contradições, lutas, experiências, consciência, conflitos, interesses de classes, reprodução da força de trabalho, Estado etc. As nações e conceitos desenvolvidos são: experiência coletiva, campo de forças, organização popular, projeto político, cultura política, contradições urbanas, movimentos sociais urbanos, meios coletivos de consumo etc. O paradigma dos Novos Movimentos Sociais parte de explicações mais conjunturais, localizadas em âmbito político ou dos micro processos da vida cotidiana, fazendo recortes na realidade para observar a política dos novos atores sociais. As categorias básicas deste paradigma são: cultura, identidade, autonomia, subjetividade, atores sociais, cotidiano, representações, interação política etc. Os conceitos e noções analíticas criadas são: identidade coletiva, representações coletivas, micropolítica do poder, política de grupos sociais, solidariedade, redes sociais, impactos das interações políticas etc. Destaca-se que o paradigma latino-americano, mais próximo da nossa realidade, apresenta em seus estudos aspectos fundamentais relacionados aos movimentos sociais libertários ou emancipatórios. Ou seja, movimentos nos quais índios, negros, mulheres, lutam para a sua libertação e emancipação social com o intuito de obterem maior espaço na sociedade, consolidando a cidadania participativa. Nota-se que esse paradigma leva à reflexão de que em países como Bolívia, Venezuela, Argentina, Paraguai, os novos sujeitos históricos que lutam por uma cidadania coletiva ainda não conseguiram manter uma estratégia de 40 mobilização, organização e conscientização para a obtenção de um mínimo para sobreviver com dignidade. (Gohn, 2011, p. 15) A contribuição de Gohn para a análise da evolução dos movimentos sociais urbanos nos países latino-americanos é de suma importância para o entendimento das características e seus fundamentos, haja vista que, segundo ela (2011, p. 16): Na América Latina a controvérsia se deu quanto à opção paradigmática, colocando de um lado estruturalista e de outro interacionistas. Os primeiros postulavam ser necessário antes mapear as condições estruturais, causas, conseqüências e influências dos movimentos, a partir de uma análise que enfocasse as desigualdades sociais, as discriminações, a repressão e a exploração, dando-se atenção também às ideologias, frustrações, queixas, reclamações e demandas, assim como às possibilidades de conscientização e organização dos grupos e movimentos. Este tipo de análise enfatiza o potencial de transformação dos movimentos sociais. Os segundos enfatizam os conflitos políticos, as estratégias de mobilização, as relações de poder, o papel das lideranças, as alianças, a função das ações estratégicas etc. Por oportuno é fundamental adentrar no paradigma dos movimentos sociais no Brasil, em virtude da evolução que tem apresentado nestes vintes anos e as consequências que tem acarretado no cenário da organização da população em geral. Gohn (2011, p. 17) acentua com muita propriedade que: Situar os problemas gerados pela globalização da economia na discussão do paradigma latino-americano e dos movimentos sociais no Brasil se faz necessário em virtude das conseqüências, que tem acarretado no cenário da organização da população em geral. O estímulo que as políticas econômicas neoliberais têm dado ao setor informal da economia levou ao surgimento de extensas redes produtivas comunitárias nos países latino-americanos, onde a mão-de-obra é farta mas tem alto custo social (quando utilizada na economia formal). A economia informal provoca a redução deste custo por vários fatores, destacando-se a quase completa eliminação dos custos sociais. Ela opera com um grande conjunto de trabalhadores que não têm seus direitos sociais respeitados. Opera ainda com trabalhadores não-sindicalizados, por isso está livre das pressões sindicais. Mas este setor terciário, tão contraditório, tem tido também grande presença de ONGs – Organizações Não-Governamentais. Elas desenvolvem projetos com as populações demandatárias de bens e serviços, organizando-as em movimentos sociais. O que se observa com os movimentos sociais urbanos no Brasil é que esses têm se transformado em um fenômeno sócio-político com muita força, pois nunca se viu na história brasileira tantas manifestações coletivas com cidadãos de todas as classes sociais engajados 41 na luta por transformação social em direção a uma sociedade mais justa e livre. Grupos sociais que se unem não para reivindicar direitos, mas para demonstrar sua inconformidade com a corrupção e desvio de verbas públicas. Como ponto decisivo para essa transformação, qual seja o engajamento de trabalhadores informais, formais, intelectuais, professores, caminhoneiros, comerciários, agricultores, indígenas, etc., em movimentos sociais urbanos ou rurais. Destaca-se a intermediação dos meios de comunicação, considerando principalmente as redes sociais, que em poucos minutos conseguem articular milhares de pessoas em torno de uma causa comum, propiciando uma mobilização veloz e ilimitada. 2.2 A influência dos meios de comunicação nos movimentos sociais urbanos: Inevitavelmente os meios de comunicação de massa, na atualidade, têm se apresentado como um dos instrumentos mais eficazes para mobilizar pessoas, articular movimentos e na visão de Teresa Costa Alves (2013, p. 124): O século XX caracterizou-se por uma transformação acelerada do paradigma da comunicação, que deixou de evoluir ao ritmo do desenvolvimento humano, biológico, para se aproximar do ritmo dos acontecimentos e sua mediatização. Ademais, o desenvolvimento de uma sociedade em rede e informacional tem provocado profundas transformações nas comunicações e na troca de informações, acelerando o processo de divulgação, bem como, de chamamento aos movimentos sociais para agirem em favor de uma causa comum. Se por um lado, em decorrência dessa revolução, pode-se afirmar que a liberdade de expressão garantida pela democracia na Constituição Federal, tem se mostrado transparente e global. Tanto que proporciona aos indivíduos, que estão conectados o compartilhamento de ideias e conhecimentos, por outro lado, não se pode deixar de ressaltar que muitas vezes a relação dos movimentos sociais urbanos com as redes sociais não tem sido isenta de polemização, quando se observa que o poder institucionalizado se opõe a estes com a força pública (policial). 42 Observa-se, assim, que ―Neste contexto a mídia possui um papel relevante como fonte de interpretação da realidade, modificando e expandindo áreas de experiência individual, intervindo na formação da opinião pública e contribuindo para a definição de identidades individuais e coletivas.‖ (Della Porta apud PEREIRA, p. 3, 2011). O autor retro (p. 3, 2011) destaca que os meios de comunicação de massa fazem parte do nosso dia-a-dia, e constituem-se em formadores de opinião, contribuindo como elemento fundamental na ―disputa pela definição de identidades individuais e coletivas, que perpassam tanto a esfera privada quanto pública. Isto porque a esfera privada tornou-se também um espaço de disputa e mobilização de conflitos‖, traduzindo os anseios da sociedade civil e possibilitando ao cidadão a sua participação democrática na vida política do Estado brasileiro. Na verdade a mídia exerce um papel de destaque na era informacional e contribui para a intermediação das relações sociais entre grupos distintos, bem como, para a organização de interesses, mesmo quando se percebe uma crise no sistema representativo e nas organizações governamentais e não governamentais. É na mesma linha de entendimento que Valéria Ribas do Nascimento e Márcio Schorn Rodrigues (2014, p. 163) trabalham essa questão, quando ressaltam que: A sociedade informacional é fruto, portanto, da referida inteligência coletiva, que proporciona ao indivíduo a reflexão e compartilhamento de seus conhecimentos com os seus semelhantes, utilizando recursos mecânicos, por exemplo, a Internet. Nela os próprios usuários geram os seus conteúdos mediante a interatividade como website. O desenvolvimento dessa sociedade ocasiona um novo espaço para a comunicação, de forma que ela se torna cada vez mais transparente e universalizada, redefinindo a atuação das instituições públicas, aumentando cada vez mais a sua responsabilidade social. Isso engendra rapidez inédita em campos de ação como a Internet; modificando sobremaneira a atuação e poder de alcance das mídias tradicionais:“...O digital autoriza a fabricação de mensagens, sua modificação e mesmo a interação com elas, átomo de informação por átomo de informação, bit por bit (...)‖ (Levy, 2011, p. 55). (grifo autor) Nesse sentido, cumpre destacar que influenciados pela sociedade em rede as pessoas têm modificado o seu modo de pensar, agir e sentir, difundindo-se, assim, outros meios de expressão e manifestação social, cultural, política, entre outras. Citando-se, por exemplo, a internet que tem sido usada de forma muito acentuada e o ―[...] uso cada vez mais desenfreado das tecnologias de informação, entendida como todas as atividades e soluções providas por 43 recursos de computação que visam permitir o seu armazenamento, acesso e o utilização‖ provocam uma revolução nas relações sociais. (Castells apud NASCIMENTO E RODRIGUES, p. 160, 2014). Sabe-se que, na atualidade, ―A internet tem sido o grande meio/veículo articulador de ações coletivas e movimentos sociais. Ela possibilitou a criação de redes virtuais que viabilizam conexões de grupos que nunca se encontraram fisicamente de fato‖ e se reconhece que é por meio da internet que os eventos são organizados e divulgados e se consegue mobilizar milhares de seguidores. (GOHN, 2013, p. 150) Portanto, é importante referir que os mecanismos de comunicação entre os sujeitos na era informacional não se reduz apenas à imprensa, mas vai do Jornal à Internet/Facebook, não desmerecendo os demais sites de divulgação e informação, como o Twitter, Blog, etc., caracterizando, desta forma, o mundo contemporâneo com a participação cada vez mais intensa e em tempos recordes. Inclusive, Nascimento e Rodrigues (2014, p. 169) asseveram que: As novas tecnologias da informação, propulsoras da Sociedade em rede, constituem o fio condutor para que os meios de comunicação se aprimorem e consigam atender às demandas sociais. Ocorre que, na mesma medida em que cresce o número de usuários e de informações lançadas na Internet, por exemplo, aparecem os conflitos gerados por esse manancial de dados que, em última análise, poder servir de instrumento de invasão na privacidade das pessoas. Registra-se que a utilização da internet, ao longo dos anos vem crescendo assustadoramente e os meios de comunicação impressos, por exemplo, Jornais e Revistas, considerados tradicionais, embora ainda persistam em nosso meio, pode-se afirmar que estão perdendo espaço para os meios virtuais, como Twitter, Blogs, website e Facebook. Anote-se que para esse trabalho monográfico será abordado apenas aspectos relativos ao Facebook, que é considerado como um dos ―[...] meios das novas tecnologias informações que possibilitam não apenas a conexão e estruturação das ações, mas eles têm sido os grandes divulgadores das informações e alimentadores das ações e reações em cadeia‖ e, em tempos recordes, mobilizam milhões de seguidores, pelo mundo todo (GOHN, 2013, p. 150). 44 Rafael Santos de Oliveira e Letícia Bodanes e Rodegheri (p. 2, s.d.) relatam que: A internet surge, assim, como um mecanismo apto a reviver e a revigorar a cidadania que habita os cidadãos, na vontade de melhorar a qualidade de vida, organizar as comunidades locais e facilitar a troca de informações, de modo que os indivíduos, conectados em Rede, possam discutir e apresentar, aos governantes, soluções para problemas cotidianamente vividos e esquecidos pelos parlamentares que, em muitos momentos, tratam apenas de interesses e vantagens particulares. É inconteste que a internet é um mecanismo que surgiu para alterar a lógica de comunicação entre as pessoas, aproximando-as e possibilitando discussões e debates de temas dos mais variados, principalmente quando se refere a interesses relativos à cidadania e democracia e não apenas com relação aos direitos e garantias fundamentais. Pode-se afirmar que as informações que circulam de forma livre nas redes sociais revolucionou a liberdade de expressão e manifestação, alicerces da democracia, principalmente se for considerada a dimensão de igualdade dos média, na qual se verifica que a conexão em rede facilita a ação e interação entre as pessoas, e a participação cidadã no espaço público. Ao longo dos anos os média têm contribuído para alterar as formas de expressão da opinião pública, haja vista que as novas tecnologias são grandes facilitadores dos processos de distribuição de informação em prol de uma democracia mais participativa. Portanto, necessário se faz explicitar a importância dos meios de comunicação, partindo-se da ideia que existe liberdade de expressão quando há a publicação de notícias, informações e entretenimento que vão desde os Jornais até o Facebook. Não se pode deixar de mencionar que ―os fóruns de discussão on-line utilizadas pelos membros dos movimentos sociais para comunicarem entre si propiciam a discussão sobre os mais variados temas de índole social.‖ (ALVES, 2013, p. 03). Assim, se faz imprescindível analisar as formas de manifestação e informação para compreender a influência que exercem sobre os movimentos sociais. 45 2.2.1 Do Jornal ao Facebook Ao analisar estas formas de manifestação e informação é importante analisar qual a função que exerce o jornal na atualidade, já que ele concorre com o meio virtual que tem custo zero, enquanto o impresso exige um pagamento muitas vezes acima daquilo que a pessoa pode dispor. Contudo, dependendo da observação e do ponto de vista de cada um, o Facebook também é uma empresa e se faz valer da publicidade para cobrir os custos, que, de certa forma, está embutido da publicidade/markentig e patrocinadores. Pois, ao usarmos as informações do Facebook, tanto as enviando quanto as recebendo, fazemos uso das redes de telecomunicações, realizando, seja por via privada ou pública, pagamento de mensalidades contratadas com operadoras de serviços, tais como a Oi, Net, Vivo, Claro, aparelhos utilizados para recebimento do sinal, outros equipamentos, etc. Mesmo que os meios virtuais sejam utilizados por mais de 89.000 milhões de brasileiros, conforme dados divulgados pelo site Facebook, para Ana Paula de Araújo (s.l., s.d.): A função do jornal é basicamente a comunicação. É um dos meios mais rápidos de ficarmos informados a respeito do que acontece no mundo. Dentro do jornal há várias sessões, que por sua vez abrigam vários tipos de textos. Há algumas características que são comuns a todos estes textos, enquanto há outras que servem para individualizá-los. (grifo da autora) Geralmente os jornais apresentam editorial no qual as matérias que são veiculadas são apresentadas por ordem de relevância e importância, e trazem em seu texto além de notícias sobre fatos ocorridos no mundo e na sociedade, apresentam a opinião do editor, que muitas vezes contraria o que o leitor pensa sobre a matéria. Para tanto, é imperioso que se diga que os veículos de comunicação impressos são tão importantes quanto os meios virtuais. (ARAÚJO, s.l., s.d.). Observa-se que no momento em que o cidadão, sem pertencer a partidos políticos ou mesmo grupos ativistas, participa de passeatas ou se engaja em movimentos sociais para reivindicar seus direitos, ou apenas para demonstrar sua inconformidade com acontecimentos sociais ou políticos de seu Estado, está exercendo seu direito de cidadania, por isso observa Alves (2013, p. 128) que: 46 Quanto mais se democratiza um país, mais haverá cidadãos falando de seus problemas em locais não tradicionais da política. Portanto, no regime democrático tende a haver uma democratização dos espaços, onde o discurso político é enunciado. (Pinto apud Alves, 2013, p. 126). As manifestações cidadãs são um exemplo inequívoco da democratização de espaços referida pelo autor. É através dos cartazes, empunhados por alguns dos cidadãos mais empenhados em demonstrar a sua revolta, que a mensagem política de um conjunto de indivíduos, reunidos num coletivo materializado numa massa humana, se assume como expressão da opinião pública. No que diz respeito à comunicação pelos meios virtuais, destaca-se o Facebook, pela velocidade instantânea das informações, e pelo grande número de acessos, e que vem inaugurando uma nova forma de liberdade de expressão, pois se assiste todos os dias registros feitos em rede se propagando e se convertendo em movimentos sociais. Assim, Adriana de Araujo Guzzi (2014, p. 228/229) assevera que: Na mesma medida em que as redes sociais e de compartilhamento de altíssima densidade – como Orkut, Facebook, Twitter, You Tube, Flickr, entre outras – propiciaram a abertura para encontros, conversações e comentários por meio de suas comunidades, além dos sites e blogs pessoais com interatividade, vemos o quanto essa mídia vem assumindo uma importante função educativa para os jovens. Ainda que a grande maioria use as redes apenas para se expor e encontrar amigos, são muitos os que já sabem usá-las para compartilhar interesses comuns e encontrar informações que vão além do que a escola ou a comunidade dos quais fazem parte podem oferecer. Com efeito, em relação ao Facebook, não é de espantar que cada vez mais a prática está disseminada, aumentando progressivamente o número de pessoas que o acessam e utilizam este meio virtual para formação de opiniões, pois ―as pesquisas também mostram que cerca de 75% dos(as) jovens de 16 a 24 anos e 90% das pessoas com escolaridade acima de superior completo se conectam à internet‖. Mas é fundamental que o usuário das redes sociais tenham cautela em relação a utilização destes sites, pois se reconhece que nem todas as fontes de referência são confiáveis. (GOHN, 2013, p 151) Ressalta Guzzi (2014, p. 230/231) que o Facebook e as redes sociais: [...] tornam-se parte importante das mídias sociais e funcionam como uma autêntica pesquisa de mercado, bem segmentada e a custo baixíssimo. A informação na rede com o novo Jornalismo, conforme observa Dimantas (2003), é a dupla perfeita para o marketing nesses tempos de mídia digital, porque o termo ―informação‖ é algo muito vago. Para informar é preciso 47 conversar. É nas conversas que as pessoas se comunicam, se entendem se reconhece pelo ―tom‖ das vozes. A noção dos seguidores (follower), em que se baseia o sucesso do Twitter, por exemplo, não está em responder à pergunta ―O que você está fazendo agora?‖, mas ―Com quem você está conversando?‖ ―Quem você está rastreando?‖, ―Por onde anda a realidade afinada com seus interesses?‖. A reputação do ―quem‖ passa a ter muita importância, pois o ambiente registra com mais rigor nossas ações, ideias, pensamentos e capacidade inventiva. É possível dizer que hoje as redes sociais, notadamente o Facebook, é o mecanismo mais utilizado para a articulação dos movimentos sociais urbanos que afeta as ações empreendidas pelos manifestantes, legitimando-as, seja na área política, social, econômica, contrapondo-se muitas vezes as necessidades geradas pelo Estado. A internet assume um papel fundamental para a articulação dos movimentos sociais, pois no Brasil, o número de acessos cresce de forma assustadora, sendo que o Facebook divulgou dados relativos aos usuários da plataforma no Brasil. Ou seja, [...] a rede social possui 89 milhões de brasileiros que acessam o site todos os meses. ―O número corresponde a oito de cada dez internautas, sendo que o número total no país chega a 107,7 milhões" Isso significa que "os internautas que acessam o Facebook diariamente totalizam cerca de 59 milhões.‖ Os dados são referentes ao segundo trimestre de 2014. Destaca-se que as articulações dos manifestantes em movimentos sociais urbanos ocorrem por meio do Facebook porque é, como já salientado acima, um dos meios mais velozes para mobilizar, articular e engajar pessoas, difundindo ideias que envolvem a luta pela democracia e a liberdade de expressão (BORJA apud Gohn, 2011, p. 196), sendo que ―o número de acessos de dispositivos móveis cresceu 55%, o que representa 68 milhões de pessoas. No último ano, a base de pessoas ativas na rede aumentou 105%, atingindo 41 milhões de pessoas.‖ Constata-se que a internet, ou seja, a utilização do Facebook, possibilita ao cidadão participar ativamente da vida política e social do país, não havendo necessidade de gastos com materiais impressos, pois basta um chamado pela rede e em poucos minutos, milhares de pessoas em todos os cantos do país saem às ruas para protestar pelos seus direitos ou apenas para manifestar sua indignação com a classe política do país. 48 Oliveira e Rodegheri (p. 2, s.d.), afirmam que: A grande vantagem decorrente da utilização da Internet é a possibilidade de diversificação das fontes de informação, porque permite a emissão de conteúdo por todo aquele que detém acesso à Rede e deseja expressar-se. Esta ampla liberdade de comunicação condiz com a ciberdemocracia, pois os cidadãos têm um espaço para a troca e difusão de ideais, argumentos e, também, a discussão de projetos de lei, como proposto pelo Portal eDemocracia. Por isso, interessa referir que a luta pela redemocratização do país passa necessariamente pelo mapeamento do cenário dos movimentos sociais no Brasil. Essa mobilização de pessoas de todos os Estados, em torno de um objetivo comum, é fundamental para a compreensão do que está acontecendo atualmente com a mobilização dos movimentos sociais urbanos. 2.3 Mapeamento do cenário dos movimentos sociais no Brasil: Certamente, que o mapeamento do cenário dos movimentos sociais no Brasil, vai possibilitar aos leitores uma visão progressiva das lutas pela democratização de nosso país, desde a década de 1972 até 2010 (Anexo I). Partindo da análise dos movimentos sociais no Brasil, destaca-se que a breve abordagem se refere à Era da Participação, ou seja, de 1978 a 1989, que proporcionará a compreensão sobre a temática. Observa-se que os movimentos ocorridos nesta época aconteceram de forma isolada, principalmente na zona rural e estes tiveram pouco contato com a zona urbana, mas é inegável que sempre houve um diálogo e debates acadêmicos que visavam acima de tudo compreender a importância da luta pela liberdade de expressão, manifestação e reunião, haja vista a ausência do Estado no cumprimento das demandas sociais. Manifesta-se Gohn (2011, p. 275) enfatizando que ―Assim, ao chamar a atenção para o papel do Estado na dinâmica dos movimentos sociais‖, não se está apenas apontando para a ausência de um dado importante nos estudos, mas também fazendo uma leitura dos fatos segundo uma matriz teórica de abordagem. 49 Reconhece-se que os movimentos sociais urbanos surgem em vários segmentos da sociedade, mas sua culminância, nos anos 80, se dá em torno das questões urbanas que se acentuou com o aumento populacional, ante o deslocamento de grandes contingentes de pessoas da área rural para as cidades, que sujeitas a várias formas de exclusão social, passaram a organizar-se em torno de um objetivo comum, ou seja, a luta pela moradia. (GOHN, 2011, p. 276/277) De fato, dentre os movimentos populares urbanos, Gohn (2011, p. 278) reconhece que: Os anos 80 trarão um panorama novo na prática e na teoria sobre os movimentos sociais populares urbanos. Na prática, surgem novas lutas como pelo acesso à terra e por sua posse, pela moradia, expressas nas invasões, ocupações de casas e prédios abandonados; articulação do movimento dos transportes; surgimento de organizações macro entre as associações de moradores; movimentos de favelados ou novos movimentos de luta pela moradia; movimentos de desempregados; movimentos pela saúde. É interessante observar que esta análise realizada se constitui num esboço da trajetória dos movimentos sociais urbanos no Brasil que sempre atuaram em prol da democratização do país, mais acentuadamente, na área dos movimentos sociais urbanos. Destaca-se que o entendimento de Gohn (2011, p. 296), sobre a articulação dos movimentos sociais urbanos, apresenta-se como uma saída ante a mudança de paradigma das relações trabalhistas, pois: A economia informal, ao ganhar proeminência sobre a economia formal, transfigura o que antes era tido como alternativo, e usualmente descartado, em algo bom e preconizado como saudável e recomendável. As relações de trabalho deixam de ser o principal foco das lutas dos trabalhadores. A luta básica passa a ser pela manutenção de um emprego, qualquer que seja, e não mais pelas condições de trabalho dentro de uma categoria. O tempo se alerta em função dos novos meios de comunicação. A mídia, principalmente a TV e os jornais da grande imprensa, passam a ser um grande agente de pressão social, uma espécie de quarto poder, que funciona como termômetro do poder de pressão dos grupos que têm acesso àqueles meios. A exclusão que se origina do padrão de desenvolvimento econômico adotado pelo país gera a emergência de novos atores, que passam a exigir não mais apenas mudanças dos 50 rumos da política, mas sim passam a exigir o cumprimento das políticas públicas divulgadas nas campanhas políticas e nos planos governamentais dos políticos. Necessário ressaltar que com o padrão de desenvolvimento que gera a exclusão não pode persistir e a sociedade civil precisa mobilizar-se para reverter este cenário. Admite Gohn, (2011, p. 296) que: [...] o padrão de desenvolvimento que se instaura legitima a exclusão como forma de integração. Passa a ser exclusão integradora, modelo perverso de gestão da crise, que recupera a legitimidade política e cria condições para um novo ciclo de crescimento econômico com a redefinição dos atores sociopolíticos em cena. O reverso desse cenário é a construção de uma economia popular em que, segundo Coraggio (1992), existe a possibilidade de um campo alternativo de desenvolvimento e transformação social, desde que essa economia ganhe autonomia relativa em sua reprodução material e cultural, capaz de auto-sustentar-se e autodesenvolver-se. Sublinhe-se que a tendência atual é a estruturação de grupos sociais, que com a emergência de novos atores, tais como, cidadãos que participam de associações, entidades do Terceiro Setor, Organizações Não Governamentais - ONGS que, se articulados em redes, podem modificar o cenário das relações sociais, trabalhistas e políticas e assim, exigir um projeto social voltado à inclusão social. A emergência de novos atores ganham força nesse século e mostram que podem mobilizar-se em torno de temas que dizem respeito a todos, tais como saúde, educação, moradia, enfim, direitos de cidadania. 2.3.1 Lutas pela redemocratização do país Vários foram os movimentos nacionais pela redemocratização do país e acesso aos serviços públicos. Tendo como marco histórico, o movimento nacional pelas ――Diretas Já‖, movimento nacional de reivindicação de eleição direta para presidente da República, em 1984.‖ (GOHN, 2011, p. 379) O papel dos movimentos sociais nesta época são fenômenos que transformaram as relações sociais, sendo agentes do processo de transformação. Pode-se afirmar que os movimentos sociais populares urbanos, entre eles ―Custo de Vida – Carestia‖ foi um 51 movimento contra os altos preços dos alimentos em 1980. Além deste, destacam-se ainda os movimentos pelos transportes públicos e pela saúde em 1982, demonstrando que o povo brasileiro já estava atento aos problemas referentes à falta de políticas públicas e sociais do governo para o atendimento das demandas da sociedade. É imprescindível que se observe que além dos movimentos nacionais populares urbanos, outros movimentos tais como: sindical, estudantil, rural, ecológico, dentre outros, a partir de 1984 até a presente data, apresentam a emergência de novos atores sociais que lutam por melhoria de condições de vida, bem como pela manutenção da democracia. Ainda destacam-se os movimentos intitulados ―Ética na política‖ – Movimento nacional contra a corrupção (responsável pela articulação que depôs o ex-presidente Collor de Mello em 1992), bem como os Caras-pintadas, movimento estudantil em 1992, que surgiram pós ―Diretas Já‖. Assim se verifica que há uma nova prática de organização, interlocução e articulação para a concretização da democracia e liberdade de expressão. Referidos movimentos urbanos e nacionais deixaram como herança para a nova geração a militância e abrindo-lhes a possibilidade de uma participação ―[...] com um controle social mais efetivo, menos cooptada e menos caudatária às redes de clientelismo.‖ (GOHN, 2013, p. 171). Caracterizando novas formas de organização social, articuladas pelos meios de comunicação e através de fóruns específicos, os movimentos sociais urbanos reconhecem no plano dos valores ou da moral que estes processos de mobilização giram em torno de projetos sociais mais amplos do que apenas a reivindicação sem objetivos, apenas para tumultuar o processo democrático. Portanto, com as mudanças sociais e políticas ocorridas no século XXI, emergem novos atores sociais, mobilizando-se em movimentos sociais urbanos como um mecanismo de inclusão social e oposição aos obstáculos à construção da democracia, segundo os princípios da cidadania. Registra-se ainda, que a mobilização das massas no cenário político nacional é uma forma de pressão ou de manifestação para fazer o chamamento da sociedade, apresentando uma nova agenda, com novos atores, que querem ser partícipes do projeto de consolidação do espaço democrático. 52 2.3.2 Emergência de novos atores e (des) mobilização dos movimentos populares urbanos É evidente que os movimentos sociais urbanos ganharam novos contornos no século XXI e não podem ser pensados fora do contexto histórico e conjuntural do momento, no qual os novos interlocutores, não apenas aqueles representados pelas ONGs, associações, Terceiro Setor, mas aqueles cidadãos que mesmo não pertencendo a um ou outro, mobilizam-se e tem uma identidade modelada a partir das novas agendas de ideias e demandas (GOHN, 2013, p 173). Qual seja, tornarem-se protagonistas da história em curso. Segundo Gohn, (2011, p. 296) aos poucos: Os movimentos sociais populares perdem sua força mobilizadora, pois as políticas integradoras exigem a interlocução com organizações institucionalizadas. Ganham importância as OGNs por meio de políticas de parceria estruturadas com o poder público, que, na grande maioria dos casos, mantém o controle dos processos deflagrados enquanto avalista dos recursos econômico-monetários. Contudo, há um processo de reformulação de novas políticas que vai alterando a identidade dos movimentos sociais populares, e não apenas os cidadãos de uma determinada categoria socioeconômica e cultural passa a reivindicar. Novas categorias passam a integrar e participar dos movimentos sociais, seja por meio de passeatas e fóruns, ou por debates nas redes sociais. Observa Gohn (2011, p. 298) que ―Na ordem político-econômica, a reformulação trazida pela globalização está levando a novas formas de gerir os sistemas socioeconômicos nacionais e internacionais‖, provocando um redimensionamento do Estado. Partindo dessa constatação, qual seja, de que novos interlocutores estão surgindo e se e mobilizando, a autora supracitada (2011, p. 301) acredita que: A construção de uma nova concepção de sociedade civil é resultado das lutas sociais empreendidas por movimentos e organizações sociais nas décadas anteriores, que reivindicaram direitos e espaços de participação social. Essa nova concepção construiu uma visão ampliada da relação Estado-sociedade, que reconhece como legítima a existência de um espaço ocupado por uma série de instituições situadas entre o mercado e o Estado, exercendo o papel de mediação entre coletivos de indivíduos organizados e as instituições do sistema governamental. 53 Nesta perspectiva, alguns elementos são necessários para a participação de sujeitos que antes eram meros espectadores e agora se inserem nos movimentos sociais como protagonistas. Ou seja, suas ações devem ser permeadas pela ética e solidariedade, pois conforme palavras de Gohn (2013, p. 173) elas precisam aprender a ―[...]identificar projetos diferentes ou convergentes, gerados com respostas às pressões e demandas socioeconômicas que elas fazem.‖ Então, de tudo isso se abstrai seguindo os ensinamentos de Gohn, (2011, p. 301) que ―Este espaço é trabalhado segundo princípios da ética e da solidariedade, enquanto valores motores de suas ações, resgatando as relações pessoais, diretas, e as estruturas comunitárias da sociedade [...]‖, ao mesmo tempo que: Resgatam-se regras de civilidade e de reciprocidade ao se reconhecer como detentores de diretos legítimos os novos interlocutores: grupos de favelados, de mulheres discriminadas, de crianças maltratadas, de ecologistas militantes, de sem-terra e/ou sem-teto, entre outros. Em síntese, assiste-se, na sociedade brasileira, à recriação da esfera pública – o que leva alguns analistas a falarem em reinvenção da república. Diante das considerações acima, pode-se afirmar que com a emergência de novos atores há uma (des) mobilização dos movimentos populares urbanos, haja vista porque às demandas deslocaram-se da agenda dos excluídos de uma determinada classe social, como acima referido, e passaram a fazer parte da agenda de todos os brasileiros que vivem uma nova democracia participativa, nova para muitos, mas não desconhecida. O que se modifica com esses deslocamentos de pautas são as identidades múltiplas dos sujeitos e dos interlocutores que agem em redes, com demandas e problemas sociais diferentes dos grupos sociais que lutam para ter um mínimo existencial para uma sobrevivência com a dignidade e, por isso, se reconhece ―[...] que nem todas as ações coletivas desenvolvem laços de pertencimento, assim como não desenvolvem a consciência de resistência ou o desejo de emancipação social.‖ (GOHN, 2013, p. 169). Por derradeiro, deve-se mencionar que não há a desmobilização dos movimentos populares urbanos e que esses não desapareceram, mas, serviram de modelo e possibilitaram que outros interlocutores aprendessem que em um país que tem bases democráticas, todos podem, de forma pacífica participar da vida política. Seja por meio do sufrágio universal, 54 escolhendo seus representantes, seja por meio da participação em movimentos sociais, em fóruns, em redes sociais, em associações, tornando-se protagonistas de novas políticas sociais no Brasil. E, assim, se faz necessária a presença de novos atores para demonstrar que a articulação destes movimentos não se dá por contraposição ao Estado e a ideologia vigente, mas à favor de um Brasil menos corrupto, com políticas públicas voltadas ao cidadão hipossuficiente, bem como acredita-se na necessidade de redefinição do papel do Estado, ―restaurando a esperança e a crença que vale a pena lutar por uma sociedade mais justa e igualitária‖ (GOHN, 2011, p. 342), pois, o que se observa é que não mais atende as necessidades e demandas da população. Em síntese, os novos atores sociais que emergiram na sociedade brasileira configuram novos espaços e formatos de participação e de relações sociais e, inevitavelmente estes vão se integrando por meio das redes sociais e comunidades e ocupando um espaço que antes não lhes interessava. A tendência disso é aumentar a participação em questões políticas e sociais, evidenciando -se que ―[...] a capilarização do acesso às redes eletrônicas, incluindo os celulares e os dispositivos móveis[...]‖ (Guzzi, 2014, p. 240) estão possibilitando que esses novos atores reconheçam que podem contribuir para o fortalecimento da democracia e da cidadania. 55 CONCLUSÃO A pretensão do presente trabalho não foi um estudo de caso, e sim um referencial teórico sob a perspectiva de vários doutrinadores sobre movimentos sociais urbanos em relação aos atuais meios de comunicação, para a consolidação da democracia e liberdade de expressão, garantias previstas constitucionalmente. Considerando as delineações teóricas utilizadas, os autores, em sua grande maioria, entendem que os movimentos sociais, tanto urbanos quanto rurais, em suas diversas formas e objetivos, possuem uma finalidade em comum, qual seja, a manutenção da democracia e liberdade de expressão. Com essa pesquisa, destaca-se alguns exemplos acerca da necessidade da existência dos movimentos sociais, tais como o ocorrido no final dos anos 70, início de 80, quando os metalúrgicos, não aceitando as condições mínimas de trabalho em que viviam, mobilizaram sindicatos de trabalhadores e foram à luta em busca dos seus direitos trabalhistas. Outro exemplo muito marcante, inclusive pela sua extensão, foi o ocorrido durante o período militar, que é conhecido até o presente momento como o principal marco histórico destes últimos séculos. Isto ocorre pelo fato de o Brasil vivenciar, naquele momento histórico, forte censura governamental, quase que total restrição dos direitos às manifestações, à pluralidade de pensamentos e expressões. Durante referido período, as pessoas, não aceitando a repressão, começaram a se manifestar de diversas maneiras, com músicas, poesias, teatro, grafismo, e outros meios, fomentando o resto da sociedade a também não aceitar a coibição de seus direitos. Exemplo de grupo que encabeçou diversas batalhas sociais naquele período foi a UNE (União Nacional dos Estudantes), que viveu às sombras da ditadura, em firme oposição ao regime, mantendo- 56 se forte, lutando pelos direitos de todos, não só em prol de estudantes, resistindo à violência, para a democratização do país e o reconhecimento da liberdade de expressão. Hoje, o movimento estudantil sai às ruas em busca de melhoria na educação pública e o fortalecimento do ProUni e do Fies. Percebe-se que através das lutas ocorridas durante a Ditadura Militar, principalmente o movimento social conhecido como Diretas Já, que teve total apoio da UNE, conseguiu-se a derrubada do governo militar, permitindo a pluralidade de partidos políticos, promulgando-se em 1988 a atual Constituição da República Federativa do Brasil, na qual, mais precisamente em seu artigo 5º, inciso XVI, reconheceu o direito de todos manifestarem-se, de forma pacífica e em locais públicos, quando se entender necessário. Assim, é perceptível igualmente, que os movimentos sociais existem há anos, e que até hoje são utilizados, para que a democracia só ―caminhe para frente‖, pois é uma das formas de controlar e ajudar o governo a gerir o Brasil. Eis que, quando o povo não é ouvido por seus representantes políticos, saem às ruas para lutarem por seus direitos. Contudo, antes de finalizar o trabalho, deve ser observado um ponto crítico: nem toda movimentação da sociedade é um movimento social reconhecido, não bastando o intento de sair às ruas descontroladamente sem ao menos possuir um objetivo/finalidade em comum. Não se pode reconhecer como tal, se pessoas saem de maneira desordenada para batalhar por direitos que sequer reconhecem como seus, apenas pela participação e popularidade, possibilitando, ainda, a infiltração de sujeitos com objetivos diversos daqueles por ventura defendidos, com a marginalização de condutas e o cometimento de crimes. Portanto, quando se trata de movimentos criados em redes sociais, tema também debatido no trabalho, precisa-se ter em mente do que ele se trata e se realmente está de acordo com o que a sociedade necessita. Muitos são criados com o fito de legalizar a participação de ―baderneiros‖, incitando confusões e a violência na manifestação, sem olvidar ainda o aproveitamento do momento para a consecução de roubos, furtos, depredação de patrimônios, etc. E, ante a exposição acima, não se pode deixar de mencionar que também se constatou que, a consolidação da democracia e a exteriorização da liberdade de expressão 57 surgem, também, com a emergência de novos atores sociais que fazem parte de várias classes sociais, e as manifestações passaram a fazer parte da agenda de todos os brasileiros que vivem uma nova democracia participativa, nova para muitos, mas não desconhecida. Portanto, constata-se, ainda que com o deslocamento de pautas emergiram identidades múltiplas dos sujeitos e dos interlocutores que agem em redes, com demandas e problemas sociais diferentes dos grupos sociais que lutam para ter um mínimo existencial para uma sobrevivência com a dignidade. Em síntese, os novos atores sociais que emergiram na sociedade brasileira configuram novos espaços e formatos de participação e de relações sociais e, inevitavelmente estes vão se integrando por meio das redes sociais e comunidades e ocupando um espaço que antes não lhes interessava. A tendência disso é aumentar a participação em questões políticas e sociais, evidenciando-se, a necessidade da presença de novos atores para demonstrar que a articulação destes movimentos não se dá por contraposição ao Estado e a ideologia vigente, mas a favor de um Brasil com políticas públicas voltadas não só ao cidadão hipossuficiente, mas a todos que lutam por um país melhor. Acredita-se, portanto, na necessidade de redefinição do papel do Estado, ou seja, um Estado comprometido com a justiça social e, o bem-estar de todos e não de apenas uma determinada classe social. Para finalizar, o principal foco do presente trabalho foi demonstrar aos leitores que os movimentos sociais precisam estar presentes em nossa sociedade para a consolidação da democracia, em especial por ser através deles que exteriorizamos o direito à liberdade de expressão. 58 REFERÊNCIAS ALVES, Teresa Costa. Média, movimentos sociais e democracia participativa: As mensagens políticas nos cartazes da manifestação de 15 de setembro de 2012. Centro de Estudos de Comunicação e Sociedade (CECS), Universidade do Minho, Portugal. Estudos em Comunicação nº 14, Dezembro de 2013. ARAUJO, Ana Paula de. Textos Jornalísticos. Disponível em: <http://www.infoescola.com/redacao/textos-jornalisticos/>. Acesso em 13 de mar. de 2015. BARROSO, Luis Roberto. A Liberdade de expressão versus direitos de personalidade. Colisão de direitos fundamentais e critérios de ponderação. In: Direitos Fundamentais, Informática e Comunicação. Algumas aproximações. Org. Ingo Wolfang Sarlet. 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Disponível em: <http://www.pstu.org.br/conteudo/oper%C3%A1rios-contra-ditadura> 71 Cartunista Henfil, que teve seu irmão Betinho exilado durante a Ditadura Militar. Expunha seu drama familiar através de desenhos. Disponível em: <http://www.tvsinopse.kinghost.net/art/h/henfil2.htm> Durante a Ditadura Militar foram censuradas músicas, peças teatrais, poesias, etc. Disponível em: <http://www.documentosrevelados.com.br/midias/imagem/imagens-da-resistencia/> 72 Movimento Social LGBT em 2011 – RJ Disponível em: <http://www.memoriaemovimentossociais.com.br/bancodeimagens/displayimage.php?album=8&pos= 91> Movimento dos Caras Pintadas em 1992, objetivando o Impeachment do Presidente Collor. Disponível em: <http://historiabruno.blogspot.com.br/2014/01/caras-pintadas.html>