SERVIÇO SERVIÇO Saúde Saúde Anorexia: de olho no perigo IZILDA FRNÇA oda mulher tem preocupação com o peso, e muitas, com apenas algumas dobrinhas a mais, dizem estar “gordas”. Só que em alguns casos a preocupação excessiva pode ser sinal de um distúrbio alimentar, seja ele anorexia ou bulimia. “Muita gente acha que é a mesma coisa, mas há diferença entre um distúrbio e o outro. Na anorexia, a pessoa se olha no espelho e, embora esteja extremamente magra, se vê obesa. Já a bulimia é um sintoma de pessoas que não estão abaixo do peso. Então elas limitam o que comem e em alguns momentos têm ataques compulsivos, seguidos de grande sentimento de culpa. Aí o paciente vomita ou toma laxantes”, explica Fábio Salzano, médico do Ambulim, ambulatório do Hospital das Clínicas de São Paulo responsável pelo tratamento de distúrbios alimentares e que atende, por mês, cerca de 700 pessoas. A anorexia nervosa é dividida em dois tipos: restritiva, quando o paciente faz um jejum prolongado por medo de engordar, e purgativa, quando, mesmo sem comer, vomita o pouco que ingeriu. O transtorno se manifesta principalmente entre as mulheres jovens, embora sua incidência esteja aumentando também entre os homens. “Às vezes, os pacientes anoréxicos (ou anoréticos) chegam rapidamente à caquexia, um grau extremo da desnutrição, e o índice de mortalidade chega a atingir de 15% a 20% dos casos”, esclarece Salzano. A psicóloga Denise Bellotto de Moraes, da disciplina de Nutrição e Metabolismo da Universidade Federal de São Paulo/Escola Paulista de Medicina (Unifesp/EPM), foi responsável por uma pesquisa que avaliou o comportamento de 316 adolescentes de uma escola particular da capital paulista, com idade de 10 a 19 anos. Constatou que metade das 178 meninas estava insatisfeita com seu corpo, contra 30% dos meninos. Das garotas, 30% faziam dieta sem precisar. “Para nutricionistas, fisiologistas e pediatras, o resultado dessa obsessão com dieta é preocupante e pode comprometer o desenvolvimento, evoluindo, inclusive, para distúrbios alimentares graves, como a bulimia e a anorexia”, afirma Eliana Raposo Tenório MenFábio Salzano, psiquiatra des, psicóloga e diretora da do Ambulim, no Hospital Associação Reluzir, uma ordas Clínicas de São Paulo ganização não-governamen- PANZ T ICA Desinformação em torno da doença e o medo de enfrentá-la facilitam a incidência desse distúrbio, que não escolhe sexo, idade ou classe social tal que dá orientação a pessoas com esse tipo de problema. A entidade também realizou uma pesquisa em escolas públicas e constatou que 20% das meninas realizam práticas inadequadas de controle de peso. “Quem tem esse tipo de comportamento é considerado clinicamente apto a contrair uma doença como a anorexia”, avalia Eliana. SEM PREFERÊNCIA DE SEXO OU CLASSE No Brasil, segundo a Associação Reluzir, de 0,5% a 1% da população tem anorexia. Embora de incidência baixa, seu índice de mortalidade é alto: cerca de 20% dos pacientes morrem sem conseguir resultado com o tratamento. E a anorexia mata 12 vezes mais do que outras doenças entre as mulheres de 15 a 24 anos. A Reluzir constatou também que 60% dos doentes são pessoas de poder aquisitivo baixo. “Essa é uma doença que há muito tempo não pode ser rotulada como doença de modelo ou manequim. Ela atinge, em 90% dos casos, as mulheres entre 14 e 18 anos e são meninas, na maioria das vezes, que possuem um padrão de beleza que elas vêem na mídia e acreditam ser o ideal”, conclui Eliana. A psicóloga também avaliou, durante o tempo em que participou do Ambulim, que o índice de recaída dos pacientes chega a ser de 80%, e, por isso, concluiu que apenas um tratamento médico com vitaminas e remédios não é suficiente. Olga Inês Tessari é psicóloga e psicoterapeuta há 20 anos em São Paulo, e atende muitas pacientes anoréxicas. Ela avalia, pelo fato de a doença ter mais causas psicológicas do que fisiológicas, que “a psicoterapia aliada com o tratamento médico é essencial para evitar as possíveis recaídas”. “Uma das grandes dificuldades em tratar a doença é que o anoréxico acredita que o médico e o psicólogo estão de complô para que ele engorde, e por isso sente-se ameaçado e desiste do tratamento”, explica Eliana, da Reluzir. Dados do Núcleo de Transtornos Alimentares e Obesidade (Nuttra), da Santa Casa de Misericórdia do Rio de Janeiro, apontam que a quantidade de homens que procuram tratamento para problemas como anorexia aumentou cinco vezes de 2002 para 2003. O maior número de casos está entre os homens na faixa dos 18 aos 26 anos. “A necessidade de ser aceito faz com que muitos homens também exagerem em suas dietas”, observa Inês Tessari. Geralmente, os meninos que desenvolvem a anorexia já foram obesos e, por medo de engordar novamente, tornam-se radicais com relação à alimentação. Outra característica que diferencia é a idade. Enquanto nas meninas o problema acontece com freqüência a partir dos 13 anos, nos garotos a doença vem mais tarde, por volta dos 18 anos. Outra pesquisa, realizada na Uni- versidade de Sydney (Austrália), descobriu que um em cada cinco homens que estão na faculdade se preocupa com o peso e com a forma física, e por isso limita a ingestão de alimentos. Para o estudo foram entrevistados 93 universitários, que falaram sobre hábitos de dieta e de prática de exercícios, além de serem questionados sobre sua auto-imagem. Os entrevistados receberam diagnósticos clínicos de compulsão alimentar (3%), vômito auto-induzido (3%), bulimia nervosa (2%), e distúrbios da prática de exercícios (8%), informa a pesquisa. Outros resultados mostraram que de 9% a 12% dos universitários estavam insatisfeitos com a forma física, sentiam-se gordos e queriam muito perder peso. Serviço ● Olga Inês Tessari, psicóloga em São Paulo Tel: (11) 6215-3846 E-mail: [email protected] ● Ambulim – Hospital das Clínicas de São Paulo – Tel: (11) 3069-6000 Site: www.ambulim.com.br ● Associação Reluzir – Tel: (11) 3814-0379 Saiba mais sobre a anorexia Sintomas — Perda exagerada de peso em pouco tempo, sem nenhuma justificativa; recusa em participar das refeições familiares; preocupação exagerada com o valor calórico dos alimentos; interrupção do ciclo menstrual (amenorréia) por três meses seguidos; atividade física intensa e exagerada; depressão; síndrome do pânico, comportamentos obsessivo-compulsivos; visão distorcida do próprio corpo; pele extremamente seca e coberta por lanugo (pêlos parecidos com a barba do milho). Causas — Diversos fatores favorecem o aparecimento da doença: predisposição genética, o conceito atual de moda, que faz da magreza absoluta símbolo de beleza e elegância, a pressão da família e do grupo social e a existência de alterações neuroquímicas cerebrais, especialmente nas concentrações de serotonina e noradrenalina. As anoréxicas se imaginam tolhidas, sem liberdade, sem autonomia, controladas demais pela família; os familiares das anoréxicas podem sofrer de distúrbio obsessivo compulsivo, depressão, bulimia, pânico, tricotilomania (o tratamento é eficaz com medicamentos que também agem nessas patologias); a obsessão pelo peso ideal acaba extrapolando e se transforma em doença. Tratamento — Uma das primeiras dificuldades é o paciente aderir ao tratamento, pois a negação da doença é muitas vezes parte integrante do quadro. A reintrodução dos alimentos deve ser gradativa. Caso contrário, provoca grande sobrecarga cardíaca. Às vezes, é necessária a internação hospitalar para que essa oferta gradual de calorias seja controlada por nutricionistas. Fonte: www.mentalhelp.com.br Revista do Idec | Março 2005 31