Teoria Geral do Direito e o fato jurídico processual

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Teoria Geral do Direito e o fato jurídico processual.
Uma proposta preliminar
Cristiane Szynwelski*
RESUMO
A Ciência do Direito carece de epistemologia e teorias gerais, cuja função cognitiva é
fundamental para a coerência do sistema jurídico, que inclui normas e valorações. A
falta de clareza e organização da retórica dos juristas contribui para as incoerências
sistemáticas. A Teoria do Fato Jurídico é um bom exemplo de uma teoria geral
aplicável. O Direito Processual Civil é confuso em determinar os seus planos de
existência, validade e eficácia, o que gera aporias em seu sistema. Uma alternativa a
esse problema é a construção de uma Teoria do Fato Jurídico adaptada à dogmática e à
teleologia do processo.
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INTRODUÇÃO
O Direito é ou não é uma ciência? Para sermos precisos, semântica e
terminologicamente, formulemos melhor a questão: existe ou não existe uma Ciência
do Direito? Sem adentrar numa definição conceitual do que é ciência ou do que seria
uma Ciência do Direito, ou de uma identificação de paradigmas que esse problema
envolve, apelemos ao senso comum teórico e à intuição do leitor. Pergunta-se: que
diferença faz saber se há ou não ciência no que se refere à compreensão dos
fenômenos jurídicos?
A teoria, em todas as áreas do conhecimento, tem servido como diretriz da práxis, ou
no mínimo, uma fonte inspiradora de seus valores. Senão assim, não é considerada
teoria, e sim, um conjunto de idéias obsoletas.
Especulemos ainda, dentro de nosso senso comum, que diferença faz haver algo de
científico envolvendo a querela de nosso contrato de financiamento da casa própria?
Talvez o leitor mais incrédulo, "amaciado" pelas experiências da vida, diga que tal
pergunta pertence ao mundo dos românticos sonhadores, mas eu que vos falo, nem tão
jovem mas ainda otimista, prefiro apostar que existe uma ordem que permeia (ou
deveria permear) todas as coisas, e que meu contrato de financiamento não ficará
entregue às mãos do puro acaso. Em nosso mundo jurídico concreto (no processo), o
"acaso" tem nome e número, isto é, o nome do juiz e o número da Vara. Continuando
na linguagem do bom (ou mau) senso comum, sabemos que as coisas de humanidades
nunca funcionarão, e nem deveriam funcionar, como as matemáticas, experimentais e
outras do tipo de alta precisão. Mas tenho certeza de que, mesmo os juristas de longa
data e já adaptados ao mundo real, no fundo de sua honestidade não estão felizes com
o "estado em que as coisas andam" na Justiça. Por sorte, nem todos pensam
igualmente, e cada um contribui para melhorar a situação de acordo com o seu ponto
de vista, inclusive aquela que aqui vos fala.
Portanto, esse trabalho baseia-se numa aposta e argumentação de que uma abordagem
"mais científica" do Direito, sob a forma de uma Teoria Geral, contribuirá ao
aperfeiçoamento da técnica e prática do Direito, facilitando uma interpretação e
aplicação das normas jurídicas de forma mais sistemática e inteligente-ível, tomando,
posteriormente, como exemplo, as aporias sistemáticas (ou assistemáticas) de nosso
Direito Processual Civil.
A primeira parte envolve uma pesquisa teórico-crítica sobre os problemas
concernentes à elaboração de teorias jurídicas na contemporaneidade, e a segunda,
uma análise da dogmática, legislação e jurisprudência do Processo Civil Brasileiro,
demonstrando como este é carente de uma Teoria Geral de Existência e Validade nos
moldes da eficaz Teoria do Fato Jurídico do Direito Privado.
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CAPÍTULO 1
O Direito como uma ciência do "dever ser feito"
Partindo da máxima de Protágoras, "o homem é a medida de todas as coisas", evitando
a discussão sobre referenciais onto, gnose ou fenomenológicos, mas, simplesmente,
aceitando o fato de que o conjunto de normas chamado Direito e todas as questões que
envolvem sua complexidade foram criadas por cérebros humanos, evidencia-se, sem
maiores problemas, sua diferenciação das ciências que têm por objeto fatos produzidos
pela natureza.
É possível sondar e detectar um mito que permeia o inconsciente coletivo e até o senso
comum teórico dos juristas, onde o status de ciência só é adquirido por aqueles
conhecimentos envolvidos por uma epistemologia descritiva, e não mais que
descritiva, pois assim é e sempre foi nas ciências naturais, que são "ciências por
excelência". Talvez falte ainda um pouco mais de coragem para o Direito abandonar o
ranço de inferioridade em relação às ciências exatas e naturais e até, por que não dizer,
das sociais que já definiram sua individualidade metodológica, e assumir a busca de
seus próprios métodos.
Então, apesar da tolerada identificação como ciência do "dever ser", por ser um
conjunto normativo, a ciência jurídica adquiriu a gloriosa reputação de ciência do
"ser", no momento em que descreve a si própria, isto é, num momento auto-reflexivo.
Após rupturas e rupturas de paradigmas, os quais nem todos talvez tenham sido bem
identificados, encontramo-nos num momento de uma nova (ou velha) crise de
identidade, onde é disputado o troféu para a descrição mais exata deste fenômeno.
Talvez seja mais inspiradora a honesta confissão do grande jurista Karl Larenz sobre a
incompreensão desse algo que é a Jurisprudência (Ciência do Direito):
"No entanto, há ainda um outro caminho para garantir a especificidade da ciência do
Direito e o seu carácter de autêntica "ciência". Em vez de se arrancar de um conceito
de ciência como o exposto, ou seja do conceito positivista, pode começar por
reconhecer-se imparcialmente que algo "existe" como um conhecimento
metodicamente conduzido do Direito que, embora nem sempre com resultados
convincentes, se pratica e praticou durante séculos nos países de cultura jurídica
europeia. Assim como Kant fundou a sua ética sobre o "factum da razão pura", que ele
considerava dada na experiência da lei moral, assim como se pode tomar o factum de
que existe ciência do Direito e existem ciências do espírito como base de uma teoria da
ciência que pergunte pelas "condições de possibilidade" desse factum e arranque dessa
pergunta para uma elucidação "crítica" dos métodos da ciência".
Assim também Canaris cita Binder, sobre o caráter científico da Jurisprudência:
"Assim como Kant não perguntou se existe uma Ciência da Natureza, mas antes o
pressupôs, tendo procurado, compreendê-lo, também se deve, primeiro, partir de "que
existe uma Ciência do Direito" e, então, perguntar qual o seu sentido e o que
fundamenta a sua pretensão de cientificidade".De facto, ganhar-se-ia muito para a
moderna discussão metodológica na Ciência do Direito (e, em geral, nas ciências do
Espírito) quando se adoptasse este ponto de partida de Binder - infelizmente pouco
observado - e, em vez de pôr permanentemente em dúvida a cientificidade dos modos
de trabalhar específicos das ciências do Espírito, em especial do pensamento
hermenêutico e teleológico, se procurassem entender as especialidades destes métodos
e apenas no final se colocasse a questão da natureza científica."
Pode parecer de pouca importância a alguns, mas, o conceito, ou melhor, o
entendimento do que seja a ciência jurídica é tão prático e determinante a ponto de
condicionar o investimento e a produção de milhares de cérebros nas universidades e
gabinetes, fundamentar toda argumentação na aplicação do direito, enquanto o "algo"
de Larenz existe.
Porém, nem tudo são pedras no caminho do Direito, pois existem os pensadores
críticos. O pensamento jurídico crítico, por sua vez, além de diagnosticar a situação,
tem se ocupado em destruir, acertadamente, o que não presta. No entanto,
infelizmente, poucos têm se aventurado a, além de descrever e criticar, construir ou
propor a construção de modelos jurídicos que, em tese, seriam mais adequados às
necessidades identificadas. Não há, nem houve uma cultura de aperfeiçoamento
sucessivo (construtiva) de modelos jurídicos normativos, e quem quiser contestar,
tente identificar algum episódio relevante. Há dois grandes exemplos a respeito,
tomemos Hans Kelsen e Pontes de Miranda. Podemos contar nos dedos quantos se
aventuraram a aprimorar e continuar a obra dos dois grandes mestres. Os modelos
teóricos de ambos foram, em geral, ou venerados como criação divina, ou criticados
como dogmática reacionária obtusa, até o retorno da terceira geração crítica "ao lado
original da mesma moeda com uma nova roupa". O desenvolvimento das teorias
jurídicas, não contrariando as demais temáticas humanas e a moda do vestuário,
transcorreu, em linhas gerais, num ziguezague de afirmação e negação, forma e
conteúdo, ordem rígida e "chute ao balde". É bem verdade, como diz Bergel:
"O erro dos juristas é em geral o de se contentar com a simples técnica jurídica,
reduzindo o direito a uma regulamentação especializada ou, inversamente, denegrindo
o positivismo, o de desprezar a técnica e as exigências concretas. Quanto ao raciocínio
jurídico, aqueles que o estudam dividem-se entre os partidários de uma lógica da
argumentação mesclada de romantismo e os seguidores incondicionais da lógica".
Se esse fenômeno chama-se dialética ou estrutura das revoluções científicas, fica ao
gosto do leitor. Resta, apenas, uma pergunta: aonde isso vai levar?
Se a síntese dialética existe, já teve o tempo suficiente para crescer e aparecer, mas não
há registro de tal fato. Toda tentativa de síntese teve sua contra-síntese para aniquilar
sua natureza. Resta, apenas, uma outra pergunta: para que serviria esse "produto
maravilhoso" chamado síntese?
Sobre essa ilusão de um processo evolutivo, Franz Wieacker ressalva:
"Pelo contrário, o sistema, princípios doutrinais e conceitos (i. e., a dogmática) de uma
ordem jurídica sucessivamente vigente não são, em sentido restrito, objectos de uma
exposição "ideográfica" (no sentido de Rickert): eles têm, enquanto tais, tão pouca
história como as leis da natureza ou os princípios lógicos - embora o seu surgir na
consciência dos juristas dogmáticos e dos compartícipes do direito (Rechtsgenossen)
se subordine às mutações históricas. A sua evolução é, na verdade, constituída apenas
por mutações na consciência, nas convicções e nas regras de comportamento dos
"corpos"(Stände) históricos de juristas. Só a conexão da actual dogmática com as
anteriores, operada através da tradição, provoca a ilusão de que a dogmática teria uma
história".
De fato, temos que admitir que não há, na ciência jurídica, um estudo histórico a
respeito do desenvolvimento das estruturas e componentes sistemáticos. Isto é, na
verdade, não temos conhecimento, mas apenas vagas intuições do quanto de evolução
real as teorias jurídicas sofreram em um milênio de história. Isso porque a História do
Direito ocupou-se sempre da narrativa de fatos sucessivos e, lamentavelmente,
desprezou a necessidade de estudos histórico-epistemológicos das teorias e modelos.
Não se pode afirmar, cientificamente, o quanto houve de mudança substancial em
relação à arbitrariedade e totalitarismo do positivismo jurídico estatal e a arbitrariedade
e totalitarismo do sistema feudal de Justiça, ou do direito eclesiástico ou até mesmo do
romano. Hobbes que nos perdoe, mas antes do surgimento do Estado moderno, o
direito já existia e talvez com as mesmas características que possui hoje. Também não
se pode negar à Common Law o status de direito positivo. Não se sabe até que ponto
as críticas ao absolutismo do Estado moderno não são exatamente as mesmas, em
essência, que as do sistema feudal. Qual é o referencial de legitimidade, proporção e
concentração de poder ao se comparar ambos os sistemas? Em que difere a aplicação
da Lei das XII Tábuas e do Código Napoleônico? Em que difere, em termos de
estrutura teórica, o marxismo do positivismo? A alternância das ideologias que se
mesclaram a suportes teóricos seguiram uma evolução de valores? Quais valores foram
esses?
O antropólogo Lévi-Strauss, precursor do estruturalismo histórico, argumenta que é
ilusório o julgamento de que nossas idéias são mais "evoluídas" que as dos povos
primitivos, e que elas não passam de variantes temáticas entre as escolhas possíveis
que nos são propostas pelos mitos e práticas daquelas sociedades injustamente
chamadas "primitivas":
"Se, como o cremos, a atividade inconsciente do espírito consiste em impor formas a
um conteúdo, e se essas formas são fundamentalmente as mesmas para todos os
espíritos, antigos e modernos, primitivos ou civilizados [...] é preciso e basta atingir a
estrutura inconsciente subjacente a cada instituição [...] para obter um princípio de
interpretação válido para outras instituições e outros costumes, sob condição,
naturalmente, de levar mais longe a análise".
Hélène Védrine, em As filosofias da história expõe o pensamento do antropólogo:
"Entre a magia e a ciência não há essa oposição decantada pelos racionalistas do
século XVIII; não há dois estágios da evolução da humanidade, mas um mesmo modo
de conhecimento atuando segundo regras de transformação diferentes: um faz qualquer
coisa e às vezes tem êxito; o outro, mais eficaz, cria seus próprios meios. Dois modos
de acesso ao mundo, do qual um utiliza resíduos de fatos, ao passo que o outro fabrica
seus próprios fatos. Mas nada permite concluir, como o faz a filosofia, que tenha
havido fases do pensamento, com "cortes" epistemológicos, rupturas e reconstruções.
Lévi-Strauss bane o postulado do historicismo ao recusar a idéia de uma gênese do
espírito humano que implique estágios de desenvolvimento e modos originais e
radicalmente novos de apreender o real".
Sobre a pesquisa histórica-estrutural do Direito, André-Jean Arnaud explica:
"Acompanhar as transformações do direito de maneira estrutural equivale a praticar
cortes sincrônicos a etapas diversas, a fim de comparar, em seguida, os sistemas. Cada
elemento aí ocupa uma função, e é a mudança de função que deve permitir concluir
pela transformação dos sistemas. Um elemento pode desaparecer deixando sua função
para um outro; mas ele pode também se manter mudando sua função. Só o método
estrutural permite tal análise. A história torna-se então a de um sistema: a evolução dos
elementos é menos significativa do que a transformação das funções. A história
estrutural nasce do estabelecimento sobre um eixo diacrônico de uma série de estudos
sincrônicos. Isso é dizer quanto é tentador, uma vez determinadas as funções, examinar
a gênese e a evolução dos sistemas".
Também é importante ver com olhos críticos o problema "atual" da crise do Direito,
não só em relação à realidade de seu caráter histórico, mas também às suas
implicâncias sociológicas. André-Jean Arnaud não nega a existência de uma crise real,
mas critica a virtualidade do seu discurso:
"Se a existência de uma crise contemporânea de nossas sociedades é bem real, e se o
impacto que ela pode ter sobre o direito é inegável, fica também claro que o mal-estar
sentido por um certo número de juristas assenta-se, na verdade, sobre uma simulação
de crise".
"A fronteira entre o real e o jurídico só pode, por outro lado, ser transpassada por
intermédio de um discurso. De tal forma que a crise da sociedade não é mais, em
matéria jurídica, do que o discurso da crise. No final de contas, podemos perguntar se,
no momento de ser examinada pelo jurista, a crise real não se viu substituída por um
certo arranjo de signos que transpunham a crise em um modelo jurídico".
"Uma das armas prediletas do poder consiste na utilização de uma doutrina pronta a
persuadir que o discurso que ela mantém é real e apelar para a noção de crise para
manter sua sobrevivência. Bastaria, portanto, que a crítica denunciasse a simulação e a
aparência hiper-realista desta última para que, através da sugestão a uma volta ao real e
sua aceitação, pusesse termo a constante regeneração da ordem estabelecida pelo que a
maioria considera como a crise e que não é mais, nesta fase, do que um modelo de
crise. Assim, ao mesmo tempo, desapareceria toda a causa do mal-estar".
A quem reverte o ganho secundário do discurso da "crise do Direito" ou, mais
especificamente, a "crise do Judiciário"? Assim como o mecanismo da neurose, a
representação psicológica da alta complexidade da crise, que a determina como um
monstro real ininteligível, favorece o estado de "não fazer", ou seja, de prostrar-se sob
os pés do inevitável. Daí é que surge o ganho secundário, que é a perpetuação do
estado das coisas, a manutenção da repetição, o que reforça e justifica a neurose. A
necessidade da aceitação do real como remédio para a crise requer uma postura ativa,
uma atitude do fazer - do Direito que deve ser feito. Essa postura deve partir da crise
real e construir alternativas aos problemas concretos, sempre atenta ao discurso
neurótico do perfeccionismo paralisante.
Se houve ou não evolução na Ciência do Direito, não se sabe ao certo pois,
concordando com Wiacker, a ilusão da evolução histórica da dogmática pode ser
ilusória, mudando as aparências, permanecendo a essência. É perfeitamente possível
presenciar uma audiência, hoje, em qualquer instância do Judiciário, e ter-se a
impressão de se estar em Constantinopla na época de Justiniano. Bergel lembra a
distinção do deão Cornu "entre as definições que incidem sobre o grão das coisas e
aquelas que incidem sobre a palha das palavras [...], entre a definição direta das coisas
e aquela das palavras" Até que ponto a nossa amada Jurisprudência não é como uma
serpente que troca de casca em cada fim de ciclo, ou como Prometeu que tem seu
fígado diariamente devorado e regenerado na forma inicial? Por que dizemos que o
Direito, hoje, atravessa uma crise de auto-compreensão; será que algum dia ele se
auto-compreendeu?
O frenesi das críticas sobre uma teoria recém-publicada que são, normalmente,
anteriores ao amadurecimento dos seus frutos, talvez encontrem uma razão no
pensamento de Franz Wieacker, que, ao referir-se à distância temporal entre os fatos
embrionários e suas respectivas transformações sociais, explica: " [...] a partir da
resistência das atitudes mentais em relação ao tecido tenaz das realidades externas e da
consciência colectiva, resistência que tão freqüentemente detém a eficácia social das
mutações do pensamento, que as amortece ou que as esvazia antes do tempo". Ou seja,
como as novas idéias demoram a concretizar-se, são tidas como inoperantes e
destruídas antes de completarem seu ciclo. Não há paciência para observar e estudar a
semente virar planta. Mais uma vez, assim que a idéia surge, ela é imediatamente
rebatida ou colocada em um pedestal de marfim.
A partir disso, só nos resta uma prece: Bem-aventurados os corajosos que se expõem à
possibilidade do fracasso e do ridículo ao tentarem criar algo independente da linha
condicionante desse devir histórico, que atrela umas teorias às outras numa corrida
cega, impedindo o homem de ver aquilo que mais precisa, aquilo que sirva para
orientar a sua prática contemporânea. Que esses homens nasçam, manifestem-se e
trabalhem conjuntamente, livres de toda mitificação da genialidade, pois segundo o
epistemólogo Feyerabend "O único princípio que não inibe o progresso é: qualquer
coisa serve"
Essa liberdade exige uma rebelião consciente, que não seja meramente um discurso ou
um contra-discurso, e de que o sujeito assuma a insegurança de pensar a partir de um
"nada" científico. Ou melhor, essa revolta não é um simples "ir contra", e sim, uma
árdua disciplina intelectual, pois, ainda Feyerabend:
"Tal como um cachorro bem ensinado obedecerá seu dono por mais confuso que se
sinta e por mais urgente que seja a adopção de novos critérios de comportamento, do
mesmo modo um racionalista bem ensinado obedecerá à imagem mental de seu
mestre, observará os modelos de argumentação que aprendeu, aderirá a esses modelos
por muito confuso que se sinta, e será incapaz de se dar conta de que aquilo que
considera como a "voz da razão" é apenas um efeito causal posterior do ensino que lhe
foi ministrado. Será incapaz de descobrir que o apelo da razão a que cede tão
prontamente não passa de uma manobra política".
"(É muito difícil, ou talvez inteiramente impossível, combater por meio de argumentos
os efeitos da lavagem ao cérebro). Até mesmo o mais puritano dos racionalistas será
forçado a deixar de raciocinar e a utilizar a propaganda e a coerção, não por as suas
razões terem deixado de ser válidas, mas porque desapareceram as condições
psicológicas que as tornavam eficazes e capazes de exercer influência sobre os outros.
E o que é a utilização de um argumento que deixa as pessoas na mesma?"
Portanto, quando as disputas teóricas se tornam demasiado arraigadas, pode-se sentir o
cheiro da cegueira instalada nos cérebros devido a processos afetivos inconscientes.
Isso é bem claro na intolerância de alguns adeptos fanáticos com tendências extremas
idealistas ou positivistas. Sobre isso, vejamos o que diz Bergel:
"O antagonismo via de regra demonstrado entre essas abordagens parece inexato e
nefasto, a menos que se pretenda impor uma determinada escolha ideológica com fins
puramente militantes, independentemente de qualquer preocupação científica. Por isso
só, nenhuma das teses, idealista ou positivista, traz resposta suficiente à questão da
definição do direito. Em vez de opô-las para rejeitar uma ou outra, cumpre tentar
conciliar idealismo e positivismo. Sua complementaridade prevalece sobre sua
pretensa incompatibilidade. Para além de qualquer exclusão, a definição do direito se
abebera nas duas fontes a um só tempo".
Por isso, acautelai-vos contra as pseudo-soluções dos que se apóiam confortavelmente
em um desses referencias (positivismo ou naturalismo) como se a questão fosse de
simples escolha entre dois axiomas irrefutáveis e cabíveis, apesar de opostos, seguida
de uma simples dedução. "Julgo assim porque sou positivista", e vice-versa. É a
perfeita solução para quem quer pensar pouco, esse método fácil e barato. Bergel
lembra bem que "O raciocínio jurídico não se reduz a uma mera dedução formal e
lógica, mas é um constante confronto entre o valor de uma solução e sua coerência
com o sistema jurídico". O incômodo e o embaraço causado por esse confronto denota
o respeito que se tem pela busca da justiça. Sem o incômodo, que é o trabalho, não há
comprometimento, e sim, pura indiferença. Ninguém melhor que o célebre filósofo
Pascal para falar sobre isso:
"O respeito significa: "Incomodai-vos". Embora inútil em aparência, isso é muito
justo, quer dizer: "Eu me incomodaria se tivésseis necessidade, pois o faço sem que
isso vos valha". De resto, o respeito consiste em distinguir os grandes. Ora, se o
respeito consistisse em estar numa poltrona, respeitaríamos toda a gente, e, dessa
maneira, não distinguiríamos; mas, sendo incomodados, distinguimos muito bem".
José Ingenieros comenta o papel social da passividade do ser humano:
"La continuidad de la vida social sería posible sin esa compacta masa de hombres
puramente imitativos, capaces de conservar los hábitos rutinarios que la sociedad les
trasfunde mediante la educación? El mediocre no inventa nada, no cria, no empuja, no
rompe, no egendra, pero, en cambio, custodia celosamente la armazón de
automatismos, prejuicios y dogmas acumulados durante siglos, defendiendo ese capital
común contra la asechanza de los inadaptables. Su rencor a los creadores compensase
por su resistencia a los destructores. Los hombres sin ideales desempeñan en la historia
humana el mismo papel que la herencia en la evolución biológica: conservan y
transmiten las variaciones útiles para la continuidad del grupo social. Constituyen una
fuerza destinada a contrastar el poder disolvente de los inferiores y a contener las
anticipaciones atrevidas de los visionarios".
Ou seja, a mediocridade é útil à manutenção de um certo nível de estabilidade social.
Porém, não é isso que é esperado de um jurista, ainda que, ou melhor, principalmente
se orientado à prática jurídica. É justamente desse que se espera coragem e gênio
criativo, pois é ali que se opera a justiça.
No final de sua obra, Ingenieros faz uma consideração importante a respeito do caráter
do "homem de personalidade", prevenindo sobre a arrogância que só se manifesta no
falso gênio:
"Los genios amplían su sensibilidad en la proporción que elevan su inteligencia;
pueden subordinar los pequeños sentimientos a los grandes, los cercanos a los remotos,
los concretos a los abstractos. Entonces los hombres de miras estrechas los suponen
desamorizados, apáticos, escépticos. Y se equivocan. Sienten, mejor que todos, lo
humano. El mediocre limita su horizonte afectivo a sí mismo, a su familia, a su
camarilla, a su facción; pero no sabe extenderlo hasta la Verdad o la Humanidad, que
sólo pueden apasionar al genio. Muchos hombres darían su vida por defender a su
secta; son raros los que se han inmolado conscientemente por una doctrina o por un
ideal".
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CAPÍTULO 2
Teorias e historicidade
Pode parecer paradoxal ao incauto leitor uma proposta de sistematização, continuação
e ordenação em construções teóricas concomitante a uma crítica à ordem (ou
desordem) estabelecida no mundo jurídico. Porém, há que se livrar da superstição de
que a crítica só pode ser oriunda das reações manifestadas como contra-discursos da
sistematização. O que aqui se propõe é uma criação sistematizada a partir de um ponto
de vista independente do devir e que não se confunde com uma síntese. É uma criação
a partir de um lugar novo, da pura observação dos fatos. Não há que se romper ou se
opor às tendências, e sim, transcendê-las. Esse lugar pode ser considerado meta ou
infrateórico, ou até dogmático, não importa, o que importa é que não seja
condicionado, nem às tendências dominantes, nem às críticas que certamente virão.
Aliás, o próprio significado da expressão "lugar novo" é facilmente e perfeitamente
"massacrável" do ponto de vista intelectual, mas eu vos pergunto se houve algum dia
alguma idéia que não tenha sido sujeita a críticas convincentes e imediatas. O que se
critica aqui é a necessidade premente de se construir algo imune às críticas ou que pelo
menos possa rebatê-las bem. Esse esforço filosófico por uma teoria perfeita, ou seja,
essa utopia defensiva, tem desviado grandes juristas da produção de algo que sirva à
demanda do mundo real, mesmo que imperfeito. Chamem isso de pragmatismo, mas
eu chamaria de bom senso.
É evidente que não se trata aqui do pseudo-pragmatismo inerente àqueles que se
negam a estudar qualquer coisa que não sirva para fundamentar, de imediato e
obviamente, uma peça processual. O que quero dizer é que uma teoria, com toda sua
complexidade, sistematicidade e refinamento, deve orientar uma práxis, para que esta
não funcione, em sua essência, de maneira caótica. Uma teoria que seria um cérebro
para uma práxis que seria um corpo. Diz o professor Jean-Louis Bergel, ao defender a
importância da Teoria Geral do Direito:
"Ora, o jurista deve ser um regente de orquestra, apto a dominar e coordenar todos os
instrumentos do direito: a solução jurídica não pode provir do som, por vezes
discordante, de uma disposição isolada, mas depende para sua compreensão para sua
aplicação e sua execução dos princípios, das instituições, dos conceitos e dos
procedimentos técnicos de ordem geral. O jurista não pode ser nem um mero
autômato, condenado à aplicação servil de uma regulamentação exageradamente
meticulosa, nem um aprendiz de feiticeiro que desencadeia conseqüências
desordenadas e imprevistas por ignorar a dependência e a inserção da regra de direito
em seu contexto".
"Uma boa formação dos estudantes deveria ser mais bem nutrida de teoria geral e
menos entulhada de meros conhecimentos acumulados. A elaboração legislativa
precisaria ser dominada graças a mais método e reflexão jurídica. Os profissionais do
direito sairiam ganhando com uma melhor utilização dos instrumentos que a técnica
jurídica comporta. As decisões jurisdicionais poderiam apoiar-se em geral em escolhas
mais bem esclarecidas e em uma redação mais límpida se se abeberassem mais nos
recursos da teoria geral do direito".
Como argumenta o professor Claus-Wilhelm Canaris "En la ciencia del Derecho, la
función das teorías consiste, ante todo, en hacer más comprensibles las normas con
ayuda de conceptos específicamente jurídicos, es decir dogmáticos, y/o a través de su
vinculación con los principios generales del Derecho".
Ao resumir as funções de uma teoria jurídica Canaris indica: a classificação conceitual
e/ou dogmática das correspondentes soluções dos problemas, a compatibilidade das
soluções com o sistema de Direito vigente e o esclarecimento de seu conteúdo material
de justiça, um balizamento para a solução de problemas práticos e, conseqüentemente,
a apresentação de critérios para a valoração de sua eficácia enquanto teoria. O mesmo
autor rebate as críticas dos "antiteóricos" contando a seguinte anedota:
"Platón ha hecho inmortal, en "Teeto", la risa de la criada tracia burlándose de Tales,
que (según cuentam) contemplando las estrellas se cayó a un pozo, [...] La especial
gracia de esto estriba en que, en realidad, Tales no se había caído al pozo, sino que
había descendido voluntariamente al mismo, al objeto de utilizar la superficie del agua
para observaciones astronómicas. Este es el signo del auténtico teórico o, como
nosotros los juristas acostumbramos a decir, del dogmático: él está por buenas razones
dentro de su pozo y no se deja confundir por la incomprensión y la burla de vulgares
criadas".
Ainda sobre as críticas e as disputas teóricas, Georges Kalinowski, na introdução a Le
problème de la vérité en morale et en droit, apresenta algumas questões interessantes:
"Mais évidemment cela ne change rien au fait que quelque problème qu’on soulève et
quelque solution qu’on avance, on sera toujours critiqué par quelqu’un, voire
incompris. C’est pourquoi il s’agit moins de polémiquer en essayant de convaincre que
de dialoguer en tâchant de se comprendre. Ceci exige que chacun précise ses positions,
détermine son point de vue, révèle sa base de départ. Car non seulement la solution,
mais aussi la manière de poser le problème dépendant des principes philosophiques
admis au début. Il est par conséquent évident que, n’ayant d’autre intention que de
proposer à la réflexion du lecteur une certaine manière de voir les choses, ce n’est pas
pour lui imposer un pont de vue déterminé que nous l’expliciterons, mais simplement
pour essayer de le rendre intelligible".
O que não se pode admitir é que bloqueios psicológicos, como a insegurança e
conseqüente necessidade de aprovação social, impeçam o trabalho de criação do
cientista, pois, como se sabe, as críticas sempre virão, e de todos os lados.
Outro erro, sobre o aparentemente óbvio, porém (infelizmente) freqüente nas mentes
desatentas é o atrelamento de teorias a momentos históricos e seus respectivos embates
ideológicos.
Por exemplo, as reações psicológicas ao positivismo jurídico científico são
provenientes da associação do mesmo com as ditaduras e ideologias reacionárias,
enquanto que as abordagens mais informais e ontológicas, às democracias e defesa dos
direitos individuais. O que passa despercebido, e que prova a independência entre
ideologia e teoria, são fatos como o do nazismo ter combatido o positivismo jurídico,
pois sua prática do terror foi contra toda ordem estabelecida pelo Direito do Estado da
época. Para tal, os nazistas apoiaram-se no Movimento do Direito Livre, e foram
buscar o direito no espírito do povo - o Volksgeist. Só que o espírito do povo foi o do
povo nazista. Vemos isso em vários textos sobre a história do nazismo:
"Desde as primeiras semanas de 1933, quando começaram as prisões arbitrárias e em
massa, espancamentos e assassinatos pelos que estavam no poder, que a Alemanha,
sob a dominação do Nacional-Socialismo deixou de ser uma sociedade regida pela lei.
"Hitler é a lei!", proclamavam orgulhosamente os luminosos juristas da Alemanha
Nazista, e Goering sublinhava a frase ao dizer aos promotores prussianos a 12 de julho
de 1934, que a lei e a vontade do Führer são o mesmo".
"Em face do Nacional-Socialismo não há lei independente. Ante qualquer decisão que
tomardes, perguntai a vós mesmos: "Como decidiria o Führer em meu lugar?" Em tôda
decisão, perguntai: "Será esta decisão compatível com a consciência nacionalsocialista do povo alemão?"
"Alguns juízes, apesar de anti-republicanos, não se entregaram pressurosamente à
linha do partido. Na realidade, alguns dêles pelo menos procuraram basear seus
julgamentos na lei [...]. A decisão tanto irritou a Hitler e a Goering que dentro de um
Mês, a 24 de abril de 1934, o direito de julgar casos de traição, que até então havia
sido da jurisdição exclusiva da Suprema Côrte, lhe foi retirado e transferido para outra,
nova, a Volksgerischtshof, a Côrte Popular, que logo se tornou o tribunal mais temido
da terra. Compunha-se ela de dois juízes profissionais e de cinco outros escolhidos
dentre os funcionários do partido, das S. S. e das fôrças armadas, constituindo êstes
últimos a maioria. Não havia apelação de suas decisões ou sentenças e comumente
suas sessões eram realizadas em gabinete privado".
"Como resultado, Hitler foi pressionado, por volta do final de outubro de 1939, a
fornecer uma autorização escrita. Isso foi providenciado, não sob a forma de um
decreto ou uma lei, que ele se recusou a emitir, mas de uma autorização geral de
poucas linhas, redigida no seu papel timbrado pessoal - e antedatada,
significativamente, para o primeiro dia de guerra. Tamanha era a incontestabilidade da
incorporação da lei na pessoa do Führer, que até mesmo essa autorização vaga e
informal foi tida como dotada de poder legal obrigatório".
Dentro do contexto pós-guerra, a positivação das leis do nacional-socialismo gerou, na
consciência democrática, a urgência a um retorno aos velhos modelos de direito
natural, os mesmos utilizados no início da ditadura. De acordo com Arthur Kaufmann,
"La Corte Federal de Justicia de Alemania evocó, aun en 1954, una ley moral objetiva
e inmodificable con ayuda de la cual adaptaba la ley positiva a la "cosmovissión
cristiano-occidental"que consideraba normativa".
Outra ilustração sobre a mudança vínculo ideológico: o Movimento do Direito Livre
fomenta hoje uma ideologia, pode-se dizer oposta à do nazismo, atrelada ao
Movimento do Direito Alternativo brasileiro.
Em suma, pode-se fazer o mesmo mal ou bem apoiando-se no positivismo, no
naturalismo, no marxismo, ou seja qual for. Se as perspectivas teóricas forem
utilizadas acriticamente elas podem, ilusoriamente, eximir o sujeito das
responsabilidades decorrentes de suas atitudes, transferindo os méritos e as culpas para
os paradigmas eleitos. Em paz com sua consciência está apenas o sujeito que ponderou
e agiu a partir de um grande esforço crítico, e assim fez, realmente, o seu melhor
possível, pois a mais vil de todas é a hermenêutica da preguiça. Assim também diz
Kaufmann, comentando Radbruch:
"Si se lee con exactitud, se advierte que en él, "derecho correcto" o "derecho no
incorrecto" (sic) no tienen una existencia presente, sino que sólo puede determinarse in
concreto que es algo nunca completo, sino un constante devenir. La fórmula
radbruchiana describe - de forma semejante al imperativo categórico kantiano - un
proceso, por así decirlo, una caminata hacia la cima, para la cual hay puntos
directrices, pero ninguna garantía. Radbruch siempre se refirió con mucho énfasis al
peso de la decisión y de la responsabilidad".
A resistência ao positivismo utilizado pelo nazismo, também gerou efeitos:
"Após um período de desenvolvimento, principalmente no universo cultural alemão,
marcado principalmente pelas obras de Hans Kelsen e o lançamento, em 1926, da
Revista Internacional da Teoria do Direito (editada até 1938 por Léon Duguit, Hans
Kelsen e François Weyr) a teoria geral do direito sofreu um forte declínio, nas décadas
de 40 e 50 (em função principalmente da Segunda Guerra Mundial e da reação
antipositivista que ela provocou)".
"Segundo alguns autores, inspirados na reação antipositivista da época, somente
deveria ser buscada uma filosofia do direito de inspiração crítica, já que a teoria geral
positivista só poderia conduzir à eutanásia da filosofia do direito".
Talvez Kelsen, tão duramente criticado, teria apenas, bem-intencionadamente e em
função do seu momento histórico, criado um direito independente das ideologias, que
não fosse vinculável ao bem ou ao mal, especialmente ao mal, cremos. O problema é
que isso resultou em um belo castelo inutilizável. pois não há, na produção humana,
qualquer coisa que prescinda de razão e valoração. Pode ser que o brilhante jurista não
tenha entendido que a valoração inexistisse, e sim apenas criado um reduto
epistemológico onde ela não interferisse. Pode-se entender isso a partir do próprio
texto de Kelsen, em Teoria Pura do Direito, onde ele deixa claro que a moral no
Direito existe, porém não faz parte da Ciência Jurídica; e também expõe o risco de se
reconhecer o direito estatal como legitimado aprioristicamente. Essa última dá a
entender uma preocupação com ideologias enraizadas fora do Estado, ou seja, o Estado
é a segurança e o que está fora dele pode ser despótico.
Consta em Teoria Pura do Direito:
"Assim como o caos das sensações só através do conhecimento ordenador da ciência
se transforma em cosmos, isto é, em natureza como um sistema unitário, assim
também a pluralidade das normas jurídicas gerais e individuais postas pelos órgãos
jurídicos, isto é, o material dado à ciência do Direito, só através do conhecimento da
ciência jurídica se transforma num sistema unitário isento de contradições, ou seja,
numa ordem jurídica. Esta "produção", porém, tem um puro caráter teorético ou
gnoseológico".
"A tese de que o Direito é, segundo sua própria essência, moral, isto é, de que somente
uma ordem social moral é Direito, é rejeitada pela Teoria Pura do Direito, não apenas
porque pressupõe uma Moral absoluta, mas ainda porque ela na sua efetiva aplicação
pela jurisprudência dominante numa determinada comunidade jurídica, conduz a uma
legitimação acrítica da ordem coercitiva estadual que constitui tal comunidade. [...]
Como, porém, a nossa própria ordem coercitiva é Direito, ela tem de ser, de acordo
com a dita tese, também moral. Uma tal legitimação do Direito positivo pode, apesar
da sua insuficiência lógica, prestar politicamente bons serviços. Do ponto de vista da
ciência jurídica ela é insustentável. Com efeito, a ciência jurídica não tem de legitimar
o Direito, não tem por forma alguma de justificar - quer através de uma Moral
absoluta, quer através de uma moral relativa - a ordem normativa que lhe compete tão somente - conhecer e descrever".
Além disso, não nos esqueçamos de que a primeira edição da Teoria Pura do Direito
foi publicada em 1934, no apogeu do poderio nazista, que se negou a cumprir a lei
estatal, e a lei tornou-se a vontade do Führer. Aquele que, por ignorância, ler Kelsen
fora do seu contexto histórico, atribuirá, inevitavelmente, ao grande jurista a pecha de
ignorante.
O erro de Kelsen foi que, falando nos termos da psicologia jungiana, ao não prever um
espaço para a valoração na consciência, ela transformou-se em sombra e devorou-o
pelas costas.
Karl Larenz parece ter tido essa compreensão, como demonstra em Metodologia da
Ciência do Direito:
"Nas últimas citações vê-se nitidamente o que preocupa, em última instância,
KELSEN: impedir que se abuse da ciência do Direito, utilizando-a como capa de
opiniões puramente pessoais e tendências ideológicas. Do ponto de vista do ethos
científico, não se pode negar justificação a esta preocupação de Kelsen. É certo que,
como poucas outras ciências, a ciência jurídica se encontra à mercê de tal abuso,
necessitando, por isso, de uma contínua autoreflexão crítica como aquela para que em
grande medida contribuiu a "teoria pura do Direito". Porém, quando Kelsen, para se
manter longe de tais juízos de valor, declara que a ciência do Direito é incapaz de
atingir, através da "interpretação" de uma norma, juízos "certos", "deita a criança fora
com a água do banho".
"Sem dúvida que a decisão judicial constitui sempre um acto de vontade, enquanto se
propõe conduzir a uma situação jurídica que seja inatacável pelas partes. Sem dúvida
ainda que tanto a interpretação como a aplicação de uma norma a um caso concreto
requerem mais do que uma dedução e uma subsunção logicamente não controvertíveis.
Requerem, antes de tudo, actos de julgamento, que se fundam, entre outras coisas, na
experiência social, na compreensão dos valores e em uma concepção correcta dos
nexos significativos. Nos casos-limite o decisivo pode ser mesmo a concepção pessoal
de quem julga. De todo o modo, trata-se aí, em larga medida, de processos de
pensamento objectiváveis e comprováveis por outrem, não de simples actos, "actos de
vontade", ou de simples "posições".
"Quando o intérprete, a partir da sua posição valorativa pessoal, recomenda uma das
possíveis interpretações, não o deve fazer, como muitas vezes acontece, em nome da
ciência. A ciência do Direito, que só se orienta pelo valor da verdade, deve distinguirse rigorosamente da "política jurídica", que, como conformação intencional da ordem
social, se dirige à realização de outros valores, especialmente da justiça".
O próprio Kelsen, no final de sua vida, volta atrás e admite os valores como
componentes da ciência jurídica: Paulo Dourado Gusmão ilustra bem esse fato em sua
obra O Pensamento Jurídico Contemporâneo.
"Por último, Kelsen, em seus escritos jurídicos publicados na Europa, excluiu da
Teoria Pura do Direito os "juízos de valor". Mas, em trabalhos publicados nos Estados
Unidos, modificou, profundamente, sua opinião, acolhendo esses juízos, admitindo,
ainda, ser a paz um dos valores jurídicos. Além da justiça, como juízo de valor
totalmente emocional, que não pode ser objeto da ciência do direito, acolheu Kelsen os
"valores de direito", que se distinguem dos "valores de justiça". Os "valores de direito"
são os acolhidos pelo direito positivo, em função dos quais julgamos uma conduta
como lícita ou ilícita, enquanto os "valores de justiça", sendo totalmente emocionais,
variam com os grupos, com as classes, com as épocas, julgando, em vez da conduta
dos indivíduos, a própria norma. Os "valores de justiça são, no entender de Kelsen,
subjetivos, não podendo ser objetos da Teoria Pura do Direito, enquanto os "valores de
legalidade"ou "valores de direito" são objetivos, incorporados ao direito positivo,
podendo ser investigados pela jurisprudência pura. Mas, Kelsen admitiu, ainda, a
possibilidade de tratar a ciência pura do direito da justiça, quando, por exemplo, cogita
da aplicação justa da norma. Aplica-se com justiça uma norma, segundo Kelsen,
quando a aplicamos aos casos em que, "de acôrdo com o seu conteúdo, ela deveria ser
aplicada". Nesta hipótese trata-se da "justiça de direito". "Êste - diz Kelsen - é o único
sentido com o qual o conceito de justiça pode ter cabimento em uma ciência do
direito". Organizando o direito a fôrça em benefício da pacífica relação entre os
homens, tem êle por fim a paz. Mas - diz Kelsen - "se a paz é um valor, um
fundamental valor social", é a paz, também, o valor fundamental do direito".
Wiacker tenta explicar o fracasso do positivismo:
"Na medida, porém, em que a produção legislativa de uma burocracia assoberbada
pelas tarefas do dia-a-dia ou mesmo de uma ditadura, se desembaraçou da última
consciência jurídica vinculativa, o direito positivo perdeu a sua credibilidade mesmo
perante a consciência social. Conseqüentemente, novas fundamentações ideológicas da
ordem jurídica procuravam constituir-se em substitutos para a justiça. Elas encontramnos, nomeadamente, nos interesses ou nas necessidades, quer dos indivíduos, quer da
sociedade ou comunidade, ou em outros objectivos extra-jurídicos. Então, após o fim
das antigas metafísica e autoridades do direito, o direito passa a ser explicado
causalmente como produto da vida social; compreendido, do ponto de vista finalista,
como meio para as necessidades da vida, finalidades que se situam fora do direito e da
justiça. Este naturalismo jurídico só manifestou totalmente a sua força explosiva
quando se transformou em arma das lutas sociais e políticas do nosso século,
proclamando como fim último do direito quer as aspirações e a segurança das classes
vitoriosas, quer as aspirações e o domínio dos povos e das raças. Mas como um
naturalismo não pode reconhecer qualquer concepção axiológica válida em geral, quer
em virtude do seu agnosticismo axiológico, quer em virtude de exigência de rigor
intelectual, a crise dos fundamentos do direito torna-se então também evidente mesmo
onde catástrofes políticas não tinham conduzido a um aberto nihilismo jurídico. A
tentativa de dominar esta crise, quer através de uma filosofia dos valores conservadora,
quer através de uma ética racional humanista, quer através de uma reflexão teológica,
quer, finalmente, através de uma filosofia radical da existência, não foram até hoje
encerradas e terão até constituído remédios presumidos ou irreflectidos, pouco menos
perigosos do que a enfermidade de que queriam ser cura".
É importante ressalvar que, quando aqui se fala em independência entre teorias sobre o
Direito e o tempo, não se quer dizer, absolutamente, independência sobre a
historicidade e os conteúdos do Direito, isto é, as normas. As normas jurídicas sempre
se condicionam ao momento histórico, e isso, na opinião de alguns juristas, tornou-se
uma percepção generalizada, a ponto de ser um dos entraves à aceitação do direito
natural, cuja vigência seria atemporal. Deve ficar bem claro que a separação é entre
ideologia e modelos teóricos, o que condiciona, e muito, a interpretação e aplicação
das normas materiais.
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CAPÍTULO 3
O pensamento sistemático no Direito
A idéia de "sistema jurídico" aparece na filosofia política e na teoria jurídica no século
XVIII. A primeira expressão "systems of law" encontrada foi em Bentham - Of Law in
General, 1782. No entanto, Viehweg (1953) remete a Leibniz, em Dissertatio de arte
combinatoria (1667), a primeira tentativa de entender o Direito como um sistema
articulado.
"A ars combinatoria mostra com especial clareza o esforço de seu autor para fazer
concordar o tradicional estilo de pensamento da Idade Média com o espírito
matemático do século XVII. O jovem Leibniz não diz claramente que para conseguir
uma prova, no sentido antes indicado, seja necessário desterrar a tópica em favor do
sistema, mas admite que a herdada ars inveniendi, como tal, quer dizer, sem eliminar
em absoluto sua estrutura fundamental, pode ser colocada sob controle aritmético. É
necessário, em sua opinião conceber a ars inveniendi como ars combinatoria. Isto é,
Leibniz pretende matematizar a tópica".
Guido Fassò também ressalta o mérito de Leibniz:
"La Nova methodus apunta a reducir el Derecho a una unidad sistemática, mediante
una ordenación de la materia jurídica que conduzca a principios simples, de lo que
extraer leyes no sujetas a excepciones (Leibniz, Nova methodus discendae docedaeque
jurisprudentiae, II, 25). Tal materia es siempre el Derecho romano, vigente entonces en
Alemania como Derecho común, reordenándolo según un método nuevo, gracias al
qual le sea conferida la unidad que el sistema justinianeo no posee, racionalizándolo
(Leibniz, op. cit., II, 10). En su totalidad, el sistema anhelado y propuesto por Leibniz
debe conducir a la solución de todas las cuestiones, mediante argumentaciones
precisas expresadas con lenguaje riguroso, según el método del procedimiento lógico
matemático".
Antes de chegarmos à Puchta e sua jurisprudência dos conceitos do século XIX, é
importante ressaltar a figura de Christian Wolff (1679-1754) na formação do sistema
lógico. Franz Wiacker considera-o de extrema importância:
"Não só o coerente sistema lógico de Wolff forneceu o fundamento de vários códigos
jus-racionalistas e, por intermédio dos seus discípulos juristas e da pandectística, ainda
do Código Civil (Alemão) e das codificações com ele aparentadas, mas constitui
também, a partir do manual de Wolff, o programa de uma dedução lógica da decisão
jurídica a partir de princípios superiores e conceitos gerais com um valor construtivo
previamente fixado que nunca mais abandonou a ciência jurídica especializada. Se o
instrumento metódico da anterior ciência jurídica era constituído pela dedução
analítica a partir de textos isolados dotados de valor autoritário, agora o conceito
jurídico sintético - ou seja, o conceito recondutível aos últimos princípios superiores,
de acordo com as regras de dedução do sistema - tornou-se no último fundamento
científico da decisão. Christian Wolff é o verdadeiro pai daquela "jurisprudência dos
conceitos" ou "construtiva" que dominou a pandectística do séc. XIX, de Puchta a
Windcheid e à "Parte Geral" de Andreas von Thur, e que, apesar de todas as graves
crises metodológicas, ainda hoje conserva valor, embora limitado".
Entretanto, há quem, como Guido Fassò, critique o mérito de Wolff e o esquecimento
de Leibniz: "El pensamiento de Wolf está falto de originalidad, ya que es una
elaboración y sistematización minuciosa y fría de la metafísica de Leibniz".
Foi Puchta o principal representante da escola alemã do séc. XIX que estruturou a
ciência jurídica como um sistema lógico na forma de uma pirâmide de conceitos. (ver
Larenz, Metodologia) Também se destacaram Savigny e Ihering, sendo que este último
tornou-se, posteriormente, um dos principais críticos do sistema formal, partindo para
uma Jurisprudência pragmática, que foi o ponto de partida para a Jurisprudência dos
Interesses de Philipp Heck. A Jurisprudência dos Conceitos cedeu espaço à
Jurisprudência dos Interesses, que se abre às valorações sociais e aos objetivos do
Direito.
No entendimento de Niklas Luhman, a Jurisprudência do Interesses não se opôs à idéia
de sistema de conceitos:
"La polémica de los defensores de una jurisprudencia de intereses en contra de una
jurisprudencia de conceptos, y en favor de una jurisprudencia sociológica, no ha de ser
malinterpretada como si fuera una polémica en contra de la abstracción, en contra de la
conceptualidad y en contra de la dogmática. Desde el punto de vista jurídico, la misma
jurisprudencia de intereses más bien va en contra de la pretensión de una disposición
conceptual autónoma sobre cuestiones jurídicas realizadas sólo en interés del
conocimiento. El paso del pensamiento jurídico de sistemas de conceptos a sistemas de
acciones posibilita una problematización funcional de la dogmática. Esto no significa
que la dogmática pueda ser sustituida por la problemática".
"À Jurisprudência dos interesses correspondeu, na prática jurídica alemã, um sucesso
invulgar. Com o decurso do tempo, revolucionou efectivamente a aplicação do Direito,
pois veio a substituir progressivamente o método de uma subsunção lógico-formal, nos
rígidos conceitos legislativos, pelo de um juízo de ponderação de uma complexa
situação de facto, bem como de uma avaliação dos interesses em jogo, de harmonia
com os critérios de valoração próprios da lei".
Porém, Larenz submeteu-se a sérias críticas devido ao problema da percepção de seus
valores subjacentes, o que dá margem à subjetividade. Outro problema, detectado por
um dos partidários da Jurisprudência dos Interesses, Harry Westermann, é a
indefinição da própria expressão "interesse", entendida, basicamente, de três formas
diferentes: motivação do legislador, objeto das valorações e critérios de valorações.
Assim, Westermann propõe que "Estes não seriam em si propriamente interesses, mas
"corolários da idéia de justiça, inferidos pelo legislador desse fim último". A partir daí
surge a chamada Jurisprudência das Valorações, que continua atual, porém, ainda com
muitos problemas. A questão principal é remanescente do sistema de interesses, isto é,
a existência ou não de critérios objetivos de valoração bem como a possibilidade de
fundamentação racional do uso dos valores.
O sistema aberto e flexivelmente ordenado de Canaris propõe como uma solução para
o problema dos valores um espaço especial concedido aos princípios, dentro do
sistema. Segundo o seu pensamento o princípio ocupa um lugar intermediário entre o
conceito e o valor, pois não se reduz à forma limitada de conceito e tem mais
amplitude que um valor específico. Um princípio explicita um ou mais valores
principais e ainda permite em si a subsunção de valorações parciais autônomas,
resultantes da combinação do princípio e outras normas do sistema sobre o fato. Se,
por um lado, essa previsão dos "pontos de vista valorativamente autônomos"
condecora o sistema de Canaris como diferenciado de um sistema axiomático (rígido e
fechado), por outro, faz apenas reduzir em escala o problema da verificabilidade
racional das valorações. Associar esses pontos de vista a unidades de âmbito parcial
(ver a próxima citação) não retira de deles os seus pesos decisórios e, para piorar,
diminui a visibilidade da argumentação valorativa, o que confronta o próprio autor
quando diz que no conceito a valoração está implícita, em contraposição à explicitude
do princípio. Vejamos:
"Mostra-se, assim, amplamente, que as conseqüências jurídicas quase nunca se deixam
retirar, de forma imediata, da mera combinação dos diferentes princípios constitutivos
do sistema, mas antes que, nos diversos graus da concretização, surgem sempre novos
pontos de vista valorativos autônomos. Em regra, não se pode reconhecer a estes a
categoria de elementos constitutivos do sistema, por causa da sua estreita generalidade
e do seu peso ético-jurídico normalmente fraco: eles não são constituintes da unidade
de sentido do âmbito jurídico considerado, portanto, do Direito privado, nos exemplos
citados. Mas eles podem, naturalmente, ser constituintes da unidade de um âmbito
parcial - em regra pequeno".
Uma pesquisa realizada pelos alunos de graduação em Direito da Universidade Federal
do Paraná analisou estatisticamente as tendências argumentativas e os tipos de
argumentos subjacentes na mentalidade de uma amostra de alunos de cursos jurídicos.
Entre outras conclusões, verificou-se que os juízos de valor predominaram, com uma
boa margem de diferença, sobre os juízos de fato.
A partir dos problemas até então expostos e conhecendo-se um pouco da Teoria Geral
do Direito "como ela é" e "seus agregados", pode-se concluir facilmente que ela deixa
muito a desejar, à prática do jurista, principalmente em suas funções decisórias, mas
que também afeta todo processo de argumentação. A principal lacuna é a falta de uma
Axiologia Jurídica madura e aplicável. A necessidade disso ainda não está muito clara
na consciência jurídica coletiva justamente pela canalização da atenção aos confrontos
entre os extremos formalismo racionalista de direita e subjetivismo retórico de
esquerda.
Como bem diz Guerra Filho,
"É aqui que se faz necessário o exercício de uma crítica da ideologia, que revele
vinculações políticas e éticas, subjacentes a posições assumidas por doutrinadores,
juízes e legisladores, no campo do direito. Com isso, evita-se uma politização
exacerbada da teoria jurídica, que a torna desprovida de um mínimo de objetividade,
outro requisito necessário para que se possa considerá-la científica. [...] Na verdade, a
ciência jurídica - como toda ciência, aliás - não tem como escapar completamente das
influências ideológicas. É certo, também, que para ela é particularmente difícil uma
"neutralização axiológica", e podemos mesmo duvidar de que isso seja desejável, pois
se perseguimos esse já tão desgastado ideal com demasiada obstinação, terminamos
por não cumprir um dos principais compromissos que se deveria assumir, ao fazer a
ciência jurídica: o compromisso com a democracia e emancipação social".
"Nem tanto ao céu, nem tanto ao mar" - desperta uma crítica quase instintiva ao
confortável, morno, medíocre e preguiçoso discurso do meio-termo. Mas é justamente
o ponto médio a posição mais arriscada e difícil, pela sua natural tendência à
mediocridade. É só olhar de relance à história e vemos que as teorias "meio-termo" são
as que mais fracassaram. No entanto, nas pequenas teorias da dogmática jurídica, as
mistas têm grande aplicação, pois se adequam bem à prática, ainda que percam o
glamour da argumentação de uma corrente específica. O que é mais importante é ter
uma visão crítica para perceber se há algo mais que glamour em algumas teorias que
circulam por aí. O que é bom nas teorias de posição intermediária é que elas se
confrontam imediatamente com a realidade, já que seus respaldos teóricos são menores
e, portanto, precisam ser muito boas e práticas para sobreviverem ao parto.
Para Luhman "Los conceptos, teorías, conocimientos dogmáticos no son el sistema,
sino que gobiernam el sistema de derecho. Por esta misma razón tendremos que
ganarnos los puntos de referencia del analices fuera de la sistemática dogmática, en las
funciones sociales del derecho y del sistema jurídico". O papel das teorias gerais da
dogmática jurídica é justamente fazer a ponte entre a prática da aplicação das normas e
o pensamento filosófico sobre os ideais da justiça e função social do Direito.
Há opiniões, no entanto, contrárias à adoção de teorias gerais:
"[...] verifica-se que uma pretensão de uma teoria geral, como suporte de campos
temáticos, constitui formas adequadas para a manutenção da racionalidade ideológica,
a ausência da história e o oferecimento de um objeto de conhecimento que se apresenta
ideologicamente como um discurso científico, manipulado inteiramente pela razão.
Pelo argumento exposto é que rechaçamos o valor metodológico de uma teoria geral
do direito. Uma teoria crítica das racionalizações ideológicas realiza sempre análises
fragmentárias e transformáveis. Toda teoria crítica é provisória, conjuntural e
dependente do estado de desenvolvimento da pesquisa que aceita seus limites e que
responde a uma lógica das contradições. É assim que se constrói um conhecimento
científico, distanciado das ideologias".
Em relação à crítica à racionalidade é interessante perguntar qual alternativa que se
tem à razão, seria o poder? Se assim, estamos em um momento evolutivo de superação
da crise, pois a racionalidade tem sido paulatinamente substituída pelo poder, pois o
que é o movimento em favor das súmulas vinculantes? Como pode haver uma crítica
que não seja racional e sem ideologia? Assim como os cães perseguem a própria
cauda, a crítica provisória e conjuntural, que não se mantém em um lugar próprio, não
consegue libertar-se do papel de contra-discurso, acompanhando o fluxo natural dos
discursos de manutenção das ideologias vigentes, como luz e sombra, sem criar um
espaço diferenciado para uma nova forma de atuação.
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CAPÍTULO 4
Hermenêutica e argumentação
Kaufmann, ao comentar a impossibilidade de um acordo entre positivismo e
naturalismo jurídico, propõe uma terceira via: "Deben nombrarse en este esfuerzo ante
todo la hermenéutica jurídica y la teoría de la argumentación, y seguramente no es
casualidad que justamente ahora, en esta determinada situación filosófico-jurídica, se
perfile un acercamiento conciliatorio de las viejas hermanas enemigas, la analítica y la
hermenéutica. Aquí podría iniciar-se tal "tercer camino". Seguindo o mesmo autor,
vemos o risco da subjetividade que ocorre na interpretação da lei deixada a si própria:
"El derecho es más bien "producto" de un proceso de desarrollo de sentido
hermenéutico y de realización de sentido. Por consiguiente no puede haber
absolutamente ninguna "corrección objetiva" del derecho fuera del proceso de
aplicación jurídica hermenéutica del derecho. Un juez que cree que recibe sus criterios
de decisión sólo de la ley ("sólo sometido a la ley"), sucumbe a un error fatal, pues
(inconscientemente) permanece dependiente de sí mismo".
A prática jurídica através dos tempos e, portanto, através das frustrações nas tentativas
de adequar o Direito a um paradigma hermenêutico específico, seja literal, histórico ou
outro, abriu um espaço, na consciência dos juristas, para a aceitação e investigação da
complexidade dos processos de interpretação. A hermenêutica jurídica, hoje, já não
aceita mais aquela velha divisão simplista entre positivismo e naturalismo.
Segundo Bergel,
"O raciocínio jurídico não é nem uma demonstração matemática nem simples retórica.
É feito de controvérsias, de dialética no sentido aristotélico do termo, mas também
recorre à lógica formal. Inspira-se ao mesmo tempo em princípios abstratos e em
realidades concretas, com um vaivém constante do direito aos fatos. Por conseguinte,
deve-se combinar a abordagem puramente substancial do direito e suas expressões
formais. O pensamento jurídico conduz geralmente a equilíbrios ou escolhas entre
imperativos contrários dos quais uma das resultantes é a solução. As regras ou os
princípios podem nele acumular-se esquematicamente, excluir-se ou conciliar-se. É
necessário, para a apreensão e para a aplicação do direito, estudar pela teoria geral os
princípios, os conceitos, as instituições, os mecanismos etc. que comandam o
pensamento jurídico e são por ele empregados".
O momento hermenêutico é um momento crítico; ali o intérprete defronta-se com toda
a carência epistemológica do Direito, em meio a valores desconfigurados e textos com
conteúdo impreciso, ele encontra na jurisprudência a sua tábua de salvação. Isso
porque, a Teoria Geral e a Filosofia do Direito que estudou encontra-se separada da
prática por um abismo quase que intransponível. Esse vácuo, que conseguiu transpor a
barreira da virtualidade do discurso e tornou-se uma triste realidade, fundamenta-se,
entre outras coisas, na dicotomia entre o "ser" e o "dever ser". Esse pensamento, tão
neutro e bem-intencionado na sua origem acabou por transformar o Direito em dois
mundos divididos: "a ciência perfeita que deveria existir mas nunca existirá" e o
"mundo dos fatos com o qual os juristas devem lidar". A partir daí, com um grau
enorme de exagero (sem más intenções), podemos dividir os juristas em dois grupos:
os filósofos que pensam mas não fazem nada e os práticos que trabalham sem pensar.
Essa dicotomia se traduz, no processo hermenêutico, na dificuldade de integrar
conceitos com valores. Mesmo já admitindo um modelo de sistema jurídico flexível
que integra as valorações, ainda falamos sobre o direito positivo e o direito justo. Pois
se, o aplicador da norma, ao interpretar sistematicamente a lei com os princípios de
justiça, não estaria ele atribuindo ao fato concreto a justiça ideal? Em face disso, essa
dicotomia parece-me mais com um fantasma desvinculado da realidade. Sendo assim,
questionaria-se a necessidade de um direito alternativo, pois seria ele alternativo a
quê?
A questão não está em admitir se os valores assumidos são universais ou históricos,
mas, antes disso, em deixar claro quais, especificamente, os valores eleitos no processo
argumentativo, de modo a impedir "que o lobo se disfarce de cordeiro", pois o senso
comum já tem sua própria moral e julgará por ela. Isso requer uma Jurisprudência de
Valorações operante, de modo que o discurso jurídico argumentativo sirva não para
convencer o receptor, e sim, para esclarecer a posição do emissor. Essa seria a
argumentação da honestidade.
Uma Jurisprudência de Valorações requer uma axiologia jurídica aplicável, onde os
valores possam ser identificados dentro do discurso argumentativo, mesmo que
embutidos em princípios e pressupostos. Isso, evidentemente, pressupõe uma
metodologia de exame da retórica, método esse que ainda está por ser construído,
tendo em vista que os tratados axiológicos tratam os valores sob o ponto de vista
filosófico-ontológico, ou seja, descrevem o seu sentido e significado, o que se atém ao
plano teórico.
Canaris apresenta a necessidade de uma verificação racional de valores, porém seu
sistema aberto às valorações limita a entrada dos mesmos somente através dos
princípios de Direito. No entanto, como Perelman bem demonstra em seus estudos
sobre a retórica, as valorações não se restringem apenas às normas, e sim, permeiam
todo o discurso jurídico. O trabalho de Perelman, bem como todo o estudo da
argumentação, ou melhor, como toda a técnica, pode servir como uma "faca de dois
gumes", pois o conhecimento da inserção dos valores no discurso pode servir tanto
para explicitá-los como para dissimulá-los ainda mais. Isso indica que uma
metodologia que envolve valores deve calcar-se em pressupostos éticos contra a
manipulação através do discurso. É evidente que isso é mais fácil para os profissionais
mais comprometidos com a justiça e a eqüidade dos casos concretos, mas o próprio
advogado, comprometido com objetivos específicos, pode se beneficiar com uma
retórica clara e honesta, cujo significado de verdade certamente terá peso no processo
de convencimento.
Nesse contexto, a lógica é um instrumento muito útil no controle da honestidade da
retórica, pois, normalmente, os embustes, essenciais à manipulação, encontram-se nas
falácias ocultas. A criação de uma cultura, em meio aos juristas, de um pensamento
crítico e análise lógica apurada, dificultaria o mascaramento de decisões políticas com
argumentos jurídicos, o que obrigaria o jurista de má-fé a desenvolver profunda
habilidade e inteligência na manipulação de argumentos sob pena de serem
evidenciados seus verdadeiros pressupostos ideológicos em divergência com os
argumentos e motivos apresentados. Por isso, pode-se dizer que a inteligência é
companheira da ética, sendo que o uso da técnica com finalidades dissimuladas só
persiste enquanto dura a incapacidade crítica do receptor da informação.
É evidente que os métodos de análise de discurso têm uma série de problemas que
devem ser enfrentados, mas não foi por falta de problemas que Albert Einstein, por
exemplo, apresentou sua Teoria da Relatividade.
Os tribunais superiores, com sua função de homogeneizar a jurisprudência, ocupam
um lugar epistemológico que seria o de uma racionalidade teórica e hermenêutica. À
medida que diminui a produção científica de integração e compreensão dos sistemas
normativos aumenta a necessidade do arbitramento, em questões jurídicas, pelas
instâncias superiores do Judiciário. Dessa forma o argumento da razão é substituído
pelo argumento do poder. Isso é claramente percebível, inclusive em meios
acadêmicos, em discussões jurídicas que terminam da seguinte forma: essa questão
resolve-se assim, pois assim entende o Tribunal X. Esse problema agravar-se-á mais
ainda com a aplicação das súmulas vinculantes, o que diminuirá o uso da racionalidade
inclusive nas instâncias inferiores.
A despeito das críticas que envolvem o uso do poder na racionalidade, não se pode
dizer que, mutatis mutandis, a situação é essencialmente a mesma no argumento da
razão e no argumento do poder. Isso porque, a não ser que a retórica dos tribunais
superiores seja de honestidade e coerência inquestionáveis, é evidente que a
descentralização da jurisdição de tribunais especiais para o grande número de juízes de
2ª instância distribuídos pelo país afora, dificultaria muito o controle e pressão
políticos. Isso nos faz indagar até que ponto a Constituição e o estado democrático de
Direito não seriam melhor resguardados nessa forma descentralizada. A razão pode ter
poder, assim como o poder pode (somente pode) ter razão. Logo, cabe ao Judiciário
escolher a sua tônica, na forma em que entende a sua função na tripartição dos
poderes.
Por mais pacífico que seja o entendimento de que o intérprete "cria a norma", é
temerário não estabelecer as diferenças ontológicas entre a hermenêutica da razão e a
"hermenêutica legislativa". O discurso que invoca uma pretensa igualdade entre ambas
pode até justificar-se, parcialmente, com a crise judiciária, no entanto, ele a
retroalimenta, pois torna o jurista cada vez menos independente.
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CAPÍTULO 5
A Teoria do Fato Jurídico
A Teoria do Fato Jurídico, aplicada ao Direito Privado brasileiro, foi desenvolvida, no
Brasil, por Pontes de Miranda, embasada no direito alemão, especificamente na
produção científica dos pandectas. O seu objeto cerne, o suporte fático (Tatbestand) ou
conjunto de fatos, é o material sem o qual não existiria o Direito, pois este, como a
vida, não existiria sem fatos, nem mesmo na esfera do pensamento, onde os fatos são
substituídos por hipóteses de fatos. Portanto, como não existem normas que, na sua
aplicação, não tenham a intenção de regular a vida, real, dos seres humanos, pode-se
afirmar que absolutamente tudo que se refere ao mundo jurídico, mesmo que em
hipótese (abstrato), tem um suporte fático. Esse termo, tão querido por uns e odiado
por outros, representa a mais fina flor do Direito, pois é o germe a partir do qual tudo
acontece. No entanto, para o cansaço e impaciência de alguns, ele exige uma profunda
acuidade analítica, não só do jurista, mas de todo o "operador das normas" que não
queira tratar o Direito de forma grosseira e superficial.
A Teoria do Fato Jurídico pode ser considerada, de fato, uma metateoria, pois sua
função transcende o âmbito teórico de normatização, integração e homogeneização dos
conceitos e proposições. Como metateoria ela tem uma função de organização
cognitiva dos caracteres de existência, validade e eficácia, que são definidos num
âmbito normativo.
Esses níveis - metateórico e teórico - ou, a gosto do leitor - teórico e infrateórico - têm
suas existências indiscutivelmente diferenciadas. Isso se prova pela preexistência dos
requisitos de existência, validade e eficácia à teoria em questão, e esses conceitos são
encontrados em obras sobre o Direito Romano.
Segundo Moreira Alves,
"A teoria dos negócios jurídicos é criação moderna: data da obra dos pandectistas
alemães do século XIX. Os jurisconsultos romanos (embora haja opiniões em
contrário, como a de Dulckeit) não a conheceram. No entanto, tendo em vista que essa
teoria foi elaborada com base nos textos romanos, e que ela põe em relevo, de modo
sistematizado, conhecimentos jurídicos de que os jurisconsultos romanos tiveram
intuição, tanto que emanam de suas obras, os autores modernos geralmente a utilizam
no estudo do direito romano".
Imaginemos, como exemplo, objeções de inexistência jurídica levantadas por
jurisconsultos da antiga Roma, quando solicitados a resolver conflitos de interesse não
tutelados pelo ordenamento da época. Que fariam os juízes, de ontem e de hoje, para
apaziguar contendas entre duas senhoras disputando a exclusividade dos modelos de
seus vestidos? Da mesma forma, pode-se intuir que os critérios de validade e eficácia
das declarações de vontade surgiram com os primeiros negócios jurídicos na época das
tribos. Será que não havia a discussão sobre a validade da venda (ou troca) de arco e
flechas furtados?
A Teoria do Fato Jurídico surgiu muito tempo depois, no século XIX, e apenas
identificou, como critérios fundamentais, a existência e validade jurídica dos fatos.
Não houve criação de critérios, portanto, se ela tivesse surgido em um ramo jurídico
diferente do Privado, a T.F.J. poderia ter identificado critérios diferentes.
Enfim, já discutida a sua função cognitiva, passemos ao estudo de sua finalidade e
aplicação.
Pergunta-se: qual a finalidade de se ter uma forma organizada de observar os planos do
suporte fático sendo que, antes de surgir uma teoria geral, os requisitos já eram
observados do mesmo modo?
Após passar o choque causado em quaisquer ouvidos, tanto da esquerda como da
direita, pelo tom "careta", retrógrado e formalista da resposta que o leitor já intuiu,
enfim, responde-se: não do mesmo modo.
Sem entrar nas questões teóricas já abordadas em outro capítulo, mas dando uma
"pincelada" inevitável, digamos que a clareza da percepção, assim como das lentes dos
óculos, é fundamental para a observação melhor possível dos objetos, ainda que
estejamos vivendo no mundo de Alice, onde a realidade nada mais é do que a projeção
de sonhos apriorísticos. Observar com cuidado é apenas um esforço de não turvar a
vista com as confusões da própria mente, e não, como pode ter pensado o estômago em
sua primeira reação: tentar organizar o mundo em quadradinhos dentro das gavetas
numeradas. Até para perceber-se o verdadeiro estado caótico das coisas é necessário
uma mente não confusa.
Portanto, ao se analisar as condições de um suporte fático, é importante definir
anteriormente o que será analisado, até por uma questão de honestidade retórica. A
identificação ou não de um vício em um negócio jurídico pode decidir uma causa, e
erros desse tipo podem causar sérias injustiças. Como já foi dito anteriormente, a
clareza da retórica na concatenação dos nexos lógico, argumentos teleológicos ou
hermenêuticos dificultam, não só os erros de boa-fé, como os acertos de má-fé nos
processos decisórios judiciais (é claro que supomos a má-fé como mera hipótese).
Quanto à aplicação, a doutrina sobre o fato jurídico é clara e pacífica (pressupõe-se
que o leitor já domina o assunto), o que se reflete na eficácia e eficiência das soluções
jurídicas na esfera jurisdicional. É o que podemos observar nas seguintes ementas
jurisprudenciais:
-Se a escritura pública de compra e venda é lavrada com base em venda que não
existiu e obtida por meio fraudulento, é de ser anulada por vício de consentimento.
(Ap. 1.500/89, 1.11.89, 2ª TC TJMS, Rel. Des. Nelson Mendes Fontoura. RJTJMS, v.
56, p. 14).
- Uma coisa é vício de consentimento, consentimento defeituoso, e, aí, muito diferente,
a ausência absoluta desse consentimento. Num caso, o ato existe, ainda que imperfeito
e, no outro caso, o ato não se constitui, não existe, não se forma, por faltar-lhe a
própria viagens. (RE 9.941, 25.6.46, 2ª T STF, Rel. Min. Orozimbo Nonato. Justiça, v.
30, p. 59).
- Comprovada a transmissão ilícita, é de se declarar a nulidade dos registros das
averbações e de todos os instrumentos admitidos da transmissão viciada. (Ap. 10.877,
10.12.84, 1ª TC TJMT, Rel. Des. Licínio Carpinelli Stefani. Revista dos Tribunais, n.
601, p. 174).
- Ato jurídico. Defeito. Erro pretendido. Escritura de Compra e Venda. Vício de
consentimento inexistente. Alienação, ademais, declarada para fins de imposto de
renda. Tendo o próprio vendedor afirmado em suas declarações para fins de imposto
de renda que o imóvel havia sido alienado, dúvida não paira sobre de que não houve o
assoalhado "erro" que, como vício de consentimento, pudesse invalidar o ato jurídico
perfeito e acabado (Ap. 61.945-1, São Paulo TJSP, 6ª Câm. Revista dos Tribunais, n.
605, p. 86).
- Constatando-se, pelas provas, ter havido artifício astucioso levando os autores a
produzirem declaração de vontade que sem esse artifício não teriam produzido, é de se
dar pela procedência da ação, com a anulação do ato, nos termos dos arts. 92 e 95, c/c
o Art. 147, II, todos do CC. (Ap. 447/77, 18.10.77, 1ª CC TJPR, Rel. Des. Ossian
França. Revista dos Tribunais, n. 522, p. 232)
- Erro essencial, (Art. 88 do CC). Comprovação. Anulação do contrato e dos títulos de
Crédito, emitidos em decorrência dele. Restituição, ainda, das quantias já pagas por
conta do preço. (Ap. 19.278-2, 4.3.82, 9ª CC TJSP, Rel. Des. Salles Penteado. JTJ, v.
79, p. 81).
- Por que ocorra, destarte, erro substancial, basta que, como obstáculo ou como vício,
interesse à natureza do ato, o objeto principal da declaração, ou alguma das qualidades
a ele essenciais (artigo 87, do Código Civil), pouco importando seja, ou não, muito
evidente. Ser, ou não, evidente é questão de valoração da prova, não da
substancialidade do erro. (EI 53.068-1, 1.7.86, 2ª CC TJSP, Rel. Des. Cezar Peluso.
JTJ, v. 105, p. 384).
- É anulável o ato jurídico por erro substancial, escusável e real, capaz de viciar a
vontade de quem o pratica (Art. 147, II do CC). Há necessidade, contudo, de ser
demonstrado por quem o invoca, mas, por ser fenômeno de ordem subjetiva, que
muitas vezes não comporta prova direta, essa demonstração pode ser feita através de
indícios e presunções, devendo ser reconhecido se emergir cristalino de elementos
subjetivos. (Ap. 27.016, 24.5.90, 4ª CC TJSC, Rel. Des. Gaspar Rubick. Revista dos
Tribunais, n. 666, p. 147).
- Ato jurídico. Defeito. Assinatura de documentos em branco por subgerente,
empregado da ré, dispondo de seus bens sob grave ameaça. Conduta decorrente de
acusação dos diretores do estabelecimento comercial de desfalques em seus cofres.
Ocorrência do uso irregular das vias de direitos. Art. 98 do CC. Coação configurada.
Anulatória procedente. (Ap. 390.375, 9.8.88, 7ª C 1º TACSP, Rel. Juiz Francisco de
Assis Vasconcelos. ITA(RT), v. 113, p. 206).
- Propriedades imobiliárias negociadas com enorme desproporção de preço. Fato
decorrente do aproveitamento do estado psíquico desequilibrado do autor-varão
alcoólatra, transmitindo-lhe informação errada sobre o valor de seu imóvel,
envolvendo também sua mulher, semi-analfabeta. (Ap. 34.381-2, 2 1.8.85, 11ª CC
TJSP, Rel. Des. Bueno Magano. JTJ, v. 98, p. 28).
- Hipótese em que o dolo mesmo essencial não basta para ensejar a indenização.
Possibilidade, apenas, de invalidação do ato jurídico. (Ap. 334.997, 28.8.85, 2ª C 1º
TACSP, Rel. Juiz Wanderley Racy. JTA, v. 98, p. 104).
- Dolo de Advogado. Hipótese em que este não pode ser considerado terceiro.
Anulação do negócio, independentemente de o representado ou mandante ter ou não
conhecimento do dolo. Ocorrência deste que torna desnecessária a existência do erro
essencial. (Ap. 107.413-2, 17.9.86, 16ª CC TJSP, Rel. Des. Mariz de Oliveira. JTJ, v.
104, p. 84).
- O dolo essencial, isto é, o expediente astucioso empregado para induzir alguém à
prática de um ato jurídico que o prejudica, em proveito do autor do dolo, sem o qual o
lesado não o teria praticado, vicia a vontade deste e conduz à anulação do ato. (Ap.
1.627/79, 11.3.80, 1ª CC TJPR, Rel. Des. Nunes do Nascimento. Revista dos
Tribunais, n. 552, p.219)
Esses são exemplos que ilustram uma verdadeira teoria geral, onde se vê perfeita
harmonia e confluência entre teoria e prática. A legislação sobre a existência, validade
e eficácia não é extensa, tampouco o é sua doutrina. Mas a sua inteligência e precisão
(da teoria) de âmbito de incidência são tão perfeitos que dispensam que o legislador
seja muito específico. A previsão teórica sobre a tipificação em abstrato encontra um
ponto de apoio na legislação apenas para que seja legitimada. É isso o que devemos
tomar como exemplo de um verdadeiro (sub)sistema jurídico. Guardemos essa
impressão para analisar os mesmos planos no Direito Processual Civil.
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CAPÍTULO 6
Teoria Geral do Processo
Dando seguimento ao ato de remar contra a correnteza contemporânea da
especialização em detrimento do estudo dos objetos em sua totalidade, nossa postura
não poderia ser outra, no Direito Processual, que a de ressaltar a importância da teoria
geral.
Ninguém melhor que Cândido Rangel Dinamarco para explicar a função da Teoria
Geral do Processo:
"A complexa diversidade de espécies de processos é responsável, como facilmente se
compreende, pelo estado de desagregação metodológica no estudo de cada um, contra
o qual se volta a teoria geral do processo. Sem esta, prevalecia a natural tendência a
observar cada ramo processual em particular, como se fosse conceitual e
metodologicamente isolado dos demais. Essa fragmentariedade é alimentada pelas
origens diferentes que os diversos tipos de processos tiveram, evoluções distintas, ao
que se soma o próprio caráter instrumental do processo, na medida em que,
conferindo-lhe permeabilidade às influências do modo de ser do direito substancial
posto à base da pretensão deduzida, induz a ter de cada processo uma visão associada
aos parâmetros jurídico-substanciais do seu objeto; além disso, a construção
diferenciada das diversas espécies de processos segundo a natureza jurídicosubstancial do provimento pedido concorre para fragmentar os conceitos e estruturas,
até mesmo dentro do mesmo ramo do direito processual".
É unânime a compreensão do grande valor do ensino da Teoria Geral do Processo, nos
cursos jurídicos, como propedêutica ao estudo do Processo propriamente dito. Porém,
seria um curioso objeto de estudo investigar quantos desses alunos, após aprenderem a
fazer a distinção entre ação, processo e procedimento e alguns outros conceitos, após
tornarem-se juristas, utilizem em sua prática algo mais que o conhecimento de
requisitos, pressupostos e alguns princípios gerais do Direito Processual.
Sobre a utilidade dos conceitos gerais sobre o processo, não somos nós o culpado pela
crítica, e sim, mais uma vez, o nosso ilustre professor Dinamarco:
"Ora, a teoria geral do processo propõe-se a colher os elementos da diversidade
representada pelas variadas espécies de processos e reduzi-los à unidade, numa
escalada que principia com a sistematização de determinado ramo do direito
processual (v. g., direito processual civil) e tende à universalização. A preocupação
pela unidade metodológica é signo de maturidade científica. Mas é indispensável
definir os limites da síntese útil, sem chegar a extremos de generalização dos quais
nada de proveitoso possa retornar a cada ramo do processo: a exagerada extensão dos
conceitos e princípios seria propícia à diluição da força de agregação, que cada qual
tem, como elemento retor de institutos e critério interpretativo de disposições
endereçadas ao objetivo eleito. A teoria geral do processo, vista pelo estudioso do
processo civil, só é metodologicamente válida na medida em que sirva de apoio a
soluções seguras em processo civil".
Convido agora todos reclamam da necessidade do estudo da TGP, mesmo que não
tenham coragem para uma manifestação acadêmica, a pensarem em como seria uma
TGP com uma presença mais viva na prática processual. Talvez poderíamos dizer que
essa ciência (seja por sua juventude ou outro motivo) tem sido eficiente, porém
insuficiente. Seria mais polido dizer que é uma ciência incompleta, ou então, que está
faltando o "princípio da instrumentalidade da teoria geral do processo".
O professor explica o que seria a TGP ideal:
"Ela não pretende unificar soluções, mas o raciocínio. Os grandes princípios, as
grandes garantias, os grandes conceitos, os grandes esquemas lógicos são comuns.
Servem como leito lógico disciplinador do raciocínio do processualista".
"O que a teoria geral do processo postula é, a visão metodológica unitária do direito
processual. Unidade de método não implica homogeneidade de soluções. Pelo método
indutivo, ela chegou à instrumentalidade do processo como nota central de todo o
sistema e tendência metodológica do direito processual contemporâneo como um todo;
a visão instrumentalista, alimentada pela comprovação que a teoria geral fornece, é o
vento mais profícuo da atualidade, em direito processual. A teoria geral sabe indicar
também, com segurança e generalidade, o modo de ser da relação funcional entre o
processo e o direito substancial, além de definir princípios e seu significado jurídicopolítico e sua amplitude, indicando os institutos fundamentais do direito processual
jurisdicional, definindo o "módulo processual" e construindo os grandes diagramas da
ciência do processo (competência; ação, elementos, condições; procedimento, atos
processuais, forma, vícios, invalidade; partes, capacidade; prova, instrução, decisão;
provimento recurso etc).".
É lamentável ver o desperdício de obras de brilhantes juristas, grandes teóricos do
processo, pela falta de aplicação das suas idéias. Seja o motivo a falta de continuidade
desses trabalhos, ou a falta de sistematicidade, o fato é que o jurista (prático) não tem
segurança para simplesmente ler o Tratado das Ações e sair aplicando a teoria dos
pesos de eficácia. Isso seria temerário, pra não dizer inoperante.
Portanto, a idéia de ser a Teoria Geral do Processo uma "ciência do dever ser feito" é
otimista e visa estimular o pesquisador a desenvolver essa área, cuja importância já foi
ressaltada nos capítulos precedentes. Nossa sugestão, como começo, é o
aprofundamento e sistematização dos planos de existência, validade e eficácia do fato
jurídico processual, aproveitando a oportunidade de ter-se como exemplo a obra
magnífica de Pontes de Miranda: a Teoria do Fato Jurídico.
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CAPÍTULO 7
Existência, validade e eficácia no Processo Civil: desordem e a necessidade de uma
teoria geral
Este capítulo visa a demonstrar, de forma sucinta, o caráter assistemático e, muitas
vezes, aleatório do entendimento (ou desentendimento) da existência, validade e
eficácia no Processo Civil.
Essa confusão, observada na doutrina, tem, na jurisprudência, sua manifestação mais
visível.
Nos próprios escritos de Pontes de Miranda é possível observar incertezas sobre a
matéria. Não só em nível de definição dos planos (da existência, validade e eficácia)
identificam-se problemas, como, também, no âmbito dos remédios processuais: ação
declaratória, ação rescisória e ação ordinária desconstitutiva.
A sistematização desses planos e seus respectivos remédios deve ser entendida como
absolutamente compatível com os princípios gerais do direito processual,
principalmente com o princípio da instrumentalidade. Assim como no direito privado,
a Teoria do Fato Jurídico no direito processual não propõe uma rigidez na observância
de requisitos, mas sim, a organização cognitiva da matéria adequada às suas
peculiaridades. Logo, o entendimento do que é inexistente, nulo e ineficaz no processo
deve ser adaptado à sua teleologia. Exemplifica Perlingeiro:
"Outrossim, não impressiona a alegação de que os vícios da vontade do ato jurídico em
geral, se transportados para o Direito Processual, têm efeito diverso do Direito
Material. De fato, um juiz, se coagido, profere uma sentença absolutamente nula e não
anulável; contudo, isto porque coagir a vontade de um juiz, interferindo em sua
prestação jurisdicional, é o mesmo que ofender uma norma cogente que visa o
interesse público. Já o acordo realizado pelas partes, se viciada a vontade de uma
delas, consistiria ofensa a uma norma permissiva. Assim, não é o vício da vontade que
caracteriza a anulabilidade e sim a natureza da norma ofendida, seja no âmbito
processual seja em qualquer outro ramo do Direito".
É nesse momento que se pode identificar, no plano concreto, a questão aparentemente
apenas abstrata que envolve o encontro entre os pensamentos sistemático e teleológico.
Conforme já discutido na Parte I (nunca é demais ressaltar), a sistemática e o
pensamento orientado a valores não se contradizem, e sim, são complementares. O
problema que identificamos quando tratamos da retórica, a respeito de valores e
pensamento formal, é quando um faz-se passar por outro, o que ocasiona erros de
argumentação. É aí que se mostra a epistemologia jurídica importantíssima, que vai
fazer a integração entre a teleologia do Direito e seu substrato sistemático. Nesse justo
momento a epistemologia se faz aplicável e pragmática, onde o jurista vai confrontarse com um sistema de normas organizadas ou desorganizadas, com uma escolha de
valores clara ou confusa. Pode parecer paradoxal, mas é assim que a abstração
(teórica) facilita a prática, e a pura prática (casuística) torna-se um empecilho.
Assim, também, diz Perlingeiro:
"As nulidades processuais são um dos temas mais complexos do Direito Processual
Civil. O seu estudo deve decorrer de conceitos amplos e genéricos, evitando-se a
enumeração casuística das causas de nulidade. É importante que se estabeleça uma
distinção ontológica entre os vícios do ato processual, de modo a desconsiderar os
conceitos legais que se afastem das regras básicas do sistema de nulidades".
A importância dessa sistematização, além da organização dos planos, reflete-se no
direito de ação, em especial no que se refere a prazos, que se diferenciam na
proposição da ação rescisória (2 anos), dos embargos (10 dias) fundados o art. 741, I,
do CPC, da ação desconstitutiva (20 anos) e da ação declaratória (imprescritível).
Para iniciar o estudo da matéria, é aconselhável seguir os conselhos de Pontes de
Miranda: (Comentários ao CPC):
"Convém não se raciocine, em matéria de nulidades processuais, com os princípios de
direito material (civil, comercial ou administrativo)".
"A simetria entre a espécie de nulidade, ou entre a nulidade mesma, no direito
material, e a espécie de nulidade, ou a nulidade mesma, em direito processual nem
sempre existe".
Segundo o mesmo mestre, há princípios específicos do processo que regem a
determinação das nulidades:
a)"princípio da expressão legal (nulidade cominada);"
b)"princípio da relevância das formas prescritas pela lei (nulidade não-cominada);"
c)"princípio da determinação racional do nulo (compreensão teórico-sistemática). [...]
Esse (princípio) supõe: que o legislador conheça, a fundo, processo, pela história e
comparação dos sistemas, pelos informes estatísticos do funcionamento das regras de
nulidade e das reclamações, pelo valor decorrente e producente das civilizações dos
povos".
Apesar de não ter sistematizado a matéria, Pontes de Miranda, em Comentários ao
CPC, ressalta a importância da diferenciação entre os planos:
"Aliás, dizer que o legislador pode destruir a separação entre inexistência e nulidade é
o mesmo que supô-lo apto a, por exemplo, decretar mudança de sexo ou abrir
audiência na lua".
No Tratado da Ação Rescisória, encontramos algumas sugestões a respeito da
definição dos planos:
"Restam as sentenças inexistentes, que são: a) a sentença proveniente de autoridade
pública não judiciária civil; b) a sentença que não foi publicada, nem consta do jornal
oficial, ou do jornal, em que se costuma publicar o expediente do foro, não consta ter
sido publicada, nem que foi proferida em audiência, posto que tenha sido proferida
(então há, porém não eficaz); c) a sentença publicada, sem ser proferida em demanda
civil a cuja instrução e debate imediatamente se ligue (e.g., proferida ao mesmo tempo
que a pronúncia penal, ou a que se ditou em processo diferente daquele a que se
destinavam as notas; é ineficaz, no caso de impossibilidade física, lógica, jurídica e
moral, no conteúdo da sentença, como a que manda cortar a terra pelo meio, ou
atribuir o domínio a um cavalo, ou decreta a escravidão, ou permite o incesto ou o
castigo a fogo, ou a venda de documentos secretos do Estado a país estrangeiro); d) a
sentença contra pessoa que goze de exterritorialidade, etc".
É evidente que o conceito de inexistência, bem como de validade e eficácia, são os
mesmos do direito material, pois a definição ontológica não muda, já que independe da
aplicação. Nos casos acima citados, encontramos, como elementos essenciais da
sentença: o agente capaz (de sentenciar, no caso, o juiz); a publicação; a possibilidade
jurídica do objeto da demanda; e a subsunção da pessoa à lei do território (questiona-se
se o caso não seria de ineficácia).
Maurino, em Nulidades Procesales, cita a diferenciação de Chiovenda entre o ato
inexistente e o nulo:
"Para Chiovenda, la distinción entre ambos conceptos tiene importancia efectiva en el
proceso. Da como ejemplo de acto inexistente, uma demanda dirigida a un particular,
uma sentencia dictada por quien no es juez, etcétera. Señala como pautas
deferenciadoras, referidas sobre todo a la relación jurídico-procesal, las seguientes: 1)
En caso de inexistencia no hay obligación de resolver. Sí, en el supuesto de acto nulo.
2) La inexistencia no hace nacer la litispendencia. La nulidad, sí".
A partir da análise desses casos, notamos não ser possível identificar um denominador
comum que sustente uma categoria ontológica diferenciada como é observado nos
requisitos de suficiência do suporte fático cível. Isso porque, devido à falta de
conhecimento sistemático do legislador (ver normas no Anexo I), as normas (CPC)
que tratam das nulidades processuais previram hipóteses de nulidade, rescindibilidade,
inexistência e ineficácia, que se inserem, sistematicamente, na mesma categoria
ontológica que é da nulidade.
O artigo 458, ao prever os elementos essenciais da sentença, relatório, fundamentos e
dispositivos, na verdade trata de nulidade, e não de inexistência, já que não se faz
possível o entendimento de haver, na hipótese, insuficiência, (segundo a sugestão de
Pontes de Miranda), pois, se foi dada por juiz, foi publicada e seu objeto é possível,
pode a sentença apenas ser nula ou ineficaz, pois já entrou no mundo jurídico. Além
disso, o artigo 248 retira os efeitos dos atos derivados do nulo, quando na verdade, atos
nulos só podem gerar atos também nulos, e não apenas ineficazes. A respeito da
nulidade dos atos subseqüentes ao nulo, outra lacuna é deixada pela dogmática
processual: não há metodologia que permita avaliar o nexo de subseqüência desses
atos, o que, apesar da aplicabilidade do princípio da instrumentalidade das formas,
deixa o juiz sem um balizamento seguro.
A despeito da adequação teórica ao conceito de inexistência, em que, idealmente, se
faz desnecessária a previsão legal de atos inexistentes, já que a própria insuficiência de
elementos típicos do suporte fático impedem a incidência da norma e, portanto, a sua
caracterização como jurídico, seria interessante, por questões de segurança, que a lei
processual previsse (em sentido amplo, é claro) as hipóteses de insuficiência, por ser
tão delicada e complexa a matéria. Evidentemente, tal distinção far-se-ia com respaldo
na doutrina, pois um mero arrolamento de hipóteses, de forma assistemática, seria não
mais que uma continuação das aporias já encontradas no ordenamento atual.
Outra lembrança importante é a diferença entre as nulidades e as meras
irregularidades, sanáveis a qualquer tempo:
"As irregularidades são vícios de pequena importância, de modo que não têm
potencialidade para trazer prejuízo a qualquer das partes. O ato irregular é existente,
válido e eficaz, sendo passível de regularização de ofício a qualquer tempo e grau de
jurisdição".
Mas, o fator que realmente perturba a vida dos juristas é a separação, na lei processual,
das nulidades e rescindibilidades, que se encontram na mesma categoria ontológica,
apesar das tentativas da doutrina de justificar a diferenciação.
Vejamos, sobre a matéria, os esforços de Pontes de Miranda:
"Ao desconstituir-se a sentença nula não se destroem efeitos, porque a sentença nula
não surte efeitos. A decisão sobre efeitos da sentença nula é que é declarativa, e leva
isso os juristas, por vezes, a graves confusões: como os efeitos não são, concluem que
sentença nula não é. Ora, a sentença nula é, mas é nula e, por ser nula, dela não se
irradiam efeitos. Ao desconstituir-se a sentença rescindível, destroem-se efeitos
produzidos e destroem-se ex tunc. Tudo aproxima da anulabilidade a rescisão, exceto o
que está no cerne mesmo da diferença conceptual: a sentença rescindível é e vale; o ato
jurídico anulável é e não vale".
"O que seria nulo ou anulável para o direito material, não existe, não passa a existir no
direito processual. O que seria nulo ou anulável, para o direito material, não se torna
válido no direito processual civil. Apenas tinha o direito processual civil de legislar
quanto aos ‘atos judiciais, que não dependem de sentença, ou em que esta for
meramente homologatória’ (art. 486), para que caiba o remédio jurídico processual da
ação rescisória. O que é inválido conforme o que se estabelece no direito material e
cuja invalidade pode ser decretada, faz-se, com a processualização, rescindível".
A tentativa de Pontes de Miranda obsta em, na prática, não haver nenhuma diferença
entre a validade (provisória) da sentença rescindível e da sentença anulável; o único
efeito dessa distinção é a confusão em matéria de ações cabíveis. Essa diferenciação
seria possível apenas se a norma que prevê os casos de rescindibilidade (art. 485)
enquadrasse casos de invalidades oriundas da esfera material, deixando a nulidade para
a esfera processual. No entanto, o artigo 485 também prevê invalidades em atos
puramente processuais, a começar por seus dois primeiros incisos. Seria mais acertado
seguir o entendimento de Pontes e ressistematizar a lei processual.
No entanto, é na jurisprudência que o festival de contradições realmente começa.
Ricardo Perlingeiro menciona o dissenso entre STF e STJ a respeito das ações cabíveis
nos casos de nulidade:
"Reconhecemos, contudo, que a questão é de extrema controvérsia, tanto na doutrina
quanto na jurisprudência. De acordo com o nosso entendimento, chegou a decidir o
Supremo Tribunal Federal em sede de recurso extraordinário (RE 62.128. RTJ, v. 42,
p. 270), de que foi relator o Min. Oswaldo Trigueiro, encontrando-se assim ementado
"Ação rescisória e querela de nulidade. No vigente direito processual brasileiro, a ação
rescisória é o único meio admissível para invalidar sentença com trânsito em
julgado"".
"Entretanto, o mais recente julgado (RE 97.589. RTJ, v. 107, p. 778-787) que se tem
notícia do Excelso Pretório a respeito da matéria, é no sentido contrário, o de que a
nulidade da citação pode também ser reconhecida através de ação declaratória e não só
nas hipóteses do art. 741, I do CPC e da ação rescisória. Posteriormente, o Superior
Tribunal de Justiça ratificou tal jurisprudência (RESP 200. GO 4ª Turma), embora nas
instâncias inferiores ainda haja controvérsia".
Antes de tentarmos "dormir com um barulho desses", examinemos uma pequena
amostra das divergências entre diversos tribunais sobre nulidades num sentido amplo.
Declaração, anulação e rescisão das nulidades:
- Declaratória. Objetivo. Nulidade de sentença com trânsito em julgado. Hipótese de
falta de citação. Via processual adequada. Prosseguimento do feito ordenado. (Ap.
131.297-2, 21.6.88, 12ª CC TJSP, Rel. Des. Prado Rossi. JTJ, v. 117, p. 116).
Sentença - nulidade - decretação de ofício pelo juiz – impossibilidade:
- Se o que se busca em juízo é anular a sentença por falta de citação, cabível a ação de
anulação, que apreciará a nulidade da decisão não em sua estrutura mesma, mas como
ato jurídico em geral, desnecessário o uso da via rescisória. (Ap. 97.172-1, 23.6.88, 5ª
CC TJSP, Rel. Des. Silveira Neto. Revista dos Tribunais, n. 636, p. 69).
- Sentença homologatória que se limita a chancelar unicamente as vontades das partes,
apresentando-se como mero ato formal que apenas sacramenta o conteúdo estipulado
pelos interessados, é ato judicial que desafia a ação anulatória e não a rescisória. (Ap.
691/85 "m", 2ª TC TJMS, Rel. Des. Marco Antônio Cândia. DJMS, v. 1776, 14.3.86,
p. 38).
- Anulatória ou rescisória. Possibilidade através da ação anulatória. Art. 486 do CPC.
Ato jurídico de direito material. Recurso provido, para afastar o decreto de carência da
anulatória e determinar o prosseguimento do feito. (Ap. 375.147-7, 17.8.87, 6ª C 1º
TACSP, Rel. Juiz Toledo Silva. JTA, v. 109, p. 71).
- A arrematação é anulável por ação ordinária e não por ação rescisória (RE 87.651,
16.9.84. 1ª T STF, Rel. Min Neri da Silveira. RTJ, v. 113, p. 1085).
- Admite-se a anulação, através de embargos de declaração, de acórdão proferido com
evidente erro. (Emb. Decl. 288.638, 27.10.81, 2ª C 1º TACSP, Rel. Juiz Rangel
Dinamarco. Revista dos Tribunais, n. 562, p. 146).
- Interposição visando decretação de nulidade do processo. Admissibilidade. Falta de
intimação dos advogados dos embargantes dos atos praticados no Tribunal. Nulidade
flagrante. Desnecessidade de recorrerem à ação rescisória ou ao mandado de
segurança. Embargos recebidos. (Emb. Decl. 94.493-2, 17.9.86, 15ª CC TJSP, Rel.
Des. Pinto de Sampaio. JTJ, v. 104, p. 337).
Conciliação
- Conciliação - Tentativa inexistente - Formalidade essencial - Nulidade do processo Aplicação do Art. 3º, § 2º, da Lei 6.515/77. (Ap. 68.982, 22.5.86, 3ª CC TJMG, Rel.
Des. Sálvio de Figueiredo Teixeira. Revista dos Tribunais, n. 616, p. 169).
- Inexiste nulidade por falta de convocação do réu para a conciliação, se desta omissão
não resultou nenhum prejuízo para ele, tendo aplicação, pois, o artigo 244 do Código
de Processo Civil. (Ap. 244.009, 10.7.75, 4ª CC TJSP, Rel. Des. Moretzsohn de
Castro. Revista dos Tribunais, n. 482, p. 87).
Vinculação ao pedido
- Procede a ação rescisória, quando a sentença que se procura rescindir é nula de pleno
direita por falta de citação à pessoa em nome da qual está inscrito o imóvel, no
competente cartório. (AR 83 1.025.23, 16.5.84, TJPB, Rel. Des. Souto Maior Filho. In:
PAULO Alexandre de, op. cit., v. 10, p. 23.035).
- O princípio da legalidade deve inserir-se em todas as relações jurídicas, não podendo
autoridade administrativa ou judiciária deixar de aplicá-lo quando patente a ilegalidade
do ato que por dever de ofício é obrigado a cumprir. Assim, se o magistrado profere
sentença sem observância das normas legais e administrativas pertinentes, estendendo,
conseqüentemente, seus efeitos além da causa petendi e do pedido específico, tal
decisão não é nula, mas inexistente, sendo irrelevante que tenha transitado em julgado.
O manto da coisa julgada - principio estabilizador das relações jurídicas processuais não tem o condão de desrespeitar outros tantos princípios, também constitucionais e
informadores de todas as relações, inclusive as processuais. (MS 198.165-6, 30.3.87,
TP 2ª TACSP, Rel. Juiz Guerrieri Rezende. Revista dos Tribunais, n. 620, p. 130).
- Sendo sucessivos os pedidos formulados na inicial, rejeitado o anterior deve o juiz
apreciar o posterior para não incidir em omissão ou citra petita, e tal falha da sentença
poderá ser atacada por embargos de declaração ou apelação. A omissão da sentença
acerca de questão relevante da inicial acarreta-lhe a nulidade. (AI 186.036.802,
25.8.86, 3ª CC TARS, Rel. Juiz Celeste Vicente Rovani. JTARS, v. 61, p. 192).
- Decisão citra petita. Denunciação da Lide. Honorários de advogado. Decisão omissa
quanto à condenação ou não do denunciado. Nulidade de ofício, decretada. (Ap.
344.759,25.9.85, 5ª C 1º TACSP, Rel. Juiz Marcondes Machado. JTA, v. 99, p. 150).
- Decisão citra petita. Ocorrência. Pedido sucessivo de reivindicatória e indenizatória.
Sentença que deixou de apreciar o segundo pedido, tendo em vista a carência do
primeiro. Hipótese em que o fato jurídico que dá configuração à causa de pedir é o
mesmo em ambos os pedidos. Sentença anulada. (Ap. 91.610-1, 26.10.87, 8ª CC TJSP,
Rel. Des. Jorge Almeida. JTJ, v. 111, p. 244).
Férias forenses
- Despejo. Citação durante as férias forenses. Relação processual inexistente.
Considerando que as ações de despejo não correm nas férias forenses, a citação
efetivada neste período causa evidente prejuízo ao réu, e se este comparecer ao
processo tão-somente para argüir tal nulidade, não pode prosperar o ato judicial que
tem por sanada a nulidade do ato citatório, à alegação de que a parte teria tempo para
responder ao pedido por afrontar o disposto no § 2º do Art. 214 do CPC, e por
desconsiderar que o ônus da contestação ainda não se debitou ao réu, face à
inexistência de relação processual válida (Ap. 32.176, 2ª Câm. Cível do TAMG, de
31.10.1986. RTJE, v. 47, p. 115).
- Em que pese a regra do Art. 173 do CPC, não são nulos os atos processuais
posteriores à penhora realizados em plenas férias forenses, todavia, o prazo somente
começa a correr no dia seguinte ao primeiro dia útil, subentendendo-se que neste o ato
foi praticado. (Ap. 1.574/87, II, "o", 1.3.88, 1ª TC TJMS, Rel. Des. Claudionor Miguel
Abss Duarte. RJTJMS, v. 46, p. 15).
- Despejo. Citação durante as férias forenses. Relação processual inexistente.
Considerando que as ações de despejo não correm nas férias forenses, a citação
efetivada neste período causa evidente prejuízo ao réu, e se este comparecer ao
processo tão-somente para argüir tal nulidade, não pode prosperar o ato judicial que
tem por sanada a nulidade do ato citatório, à alegação de que a parte teria tempo para
responder ao pedido por afrontar o disposto no § 2º do Art. 214 do CPC, e por
desconsiderar que o ônus da contestação ainda não se debitou ao réu, face à
inexistência de relação processual válida (Ap. 32.176, 2ª Câm. Cível do TAMG, de
31.10.1986. RTJE, v. 47, p. 115).
- Não é nula, nem inexistente, a citação feita nas férias, desde que o prazo decorrente
somente comece a ser contado do dia seguinte ao da reabertura dos trabalhos forenses.
(REsp. 3.958, 12.11.90, 3ª T STJ, Rel. Min. Claudio Santos. RSTJ, v. 19, p. 476).
Advertência sobre a não contestação
- A omissão, no mandado citatório, da advertência prevista no art. 285 do CPC não
prejudica a validade da citação. Impede, porém, que a revelia produza o efeito de
dispensar o autor do ônus da prova dos fatos constitutivos de seu direito. (Ap. 1.135/
82, 22.3.83. 1ª CC TAPR, Rel. Juiz Ivan Righi. Revista dos Tribunais, n. 577, p. 234).
- Nula é a citação com inobservância do artigo 285 do CPC. (Ap. 59.061, 28.12.77, 1ª
C 2º TACSP, Rel. Juiz Carvalho Neves. Revista dos Tribunais, n. 511, p. 164).
Firma reconhecida
- O art. 38 do CPC é taxativo a respeito da exigência da firma reconhecida no
mandato. Assim sendo, e em não atendida a determinação judicial para regularização a
nulidade do processo se impõe com aplicação do art. 13, I, do CPC. (Ap. 177.390-1,
12.2.85, 3ª CC 2º TASP, Rel. Juiz Camargo da Fonseca. JTA - Revista dos Tribunais,
n. 97, p. 304).
- A falta de reconhecimento de firma na procuração, por si só, não lhe acarreta a
nulidade, máxime se foi ela passada em papel timbrado do mandante. (Ap. 27.255,
14.6.85, 1ª CC TAMG, Rel. Juiz Corrêa de Martins. Revista dos Tribunais, n. 609, p.
190).
Observando-se essas amostras sucintas, porém, infelizmente, representativas, concluise que tentar estabelecer uma correspondência das definições de existência, validade e
eficácia, no Processo Civil, entre a doutrina, a legislação e a jurisprudência, é uma
tarefa impossível. Essa impossibilidade advém, não da complexidade da matéria, e
sim, do grau e da quantidade de incoerências já estabelecidas. Portanto, a construção
de uma teoria do fato jurídico no Direito Processual Civil é construção stricto sensu,
ou seja, não é apenas uma sistematização de algo previamente dado; o que requer um
estudo aprofundado, não só da dogmática processual, mas de questões sobre
sistemática e teoria geral. Para isso, o pesquisador poderá partir da obra de Pontes de
Miranda, porém, terá de caminhar sozinho, com poucos pontos de apoio, num caminho
novo e em terra desconhecida, o que requer muita coragem e a perspectiva da Ciência
do Direito como uma ciência em construção.
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CAPÍTULO 8
Perspectivas teóricas sobre a construção de categorias do fato jurídico processual
Partindo da conclusão de que é impossível sistematizar uma teoria sobre existência,
validade e eficácia no processo a partir dos elementos já existentes na dogmática
jurídica, resta indagar quais as possibilidades metodológicas de construção de tal teoria
"partindo-se do início". Nesse momento torna-se evidente a necessidade da prévia
discussão dos temas contidos na primeira parte desse trabalho, pois a construção de um
estudo novo não se faz sem a quebra do tabu de que até a criatividade deve basear-se
na cópia, com algumas adaptações do que já existe. Porém, isso não significa "dar asas
à imaginação" e não se fundamentar em nada que já tenha sido estudado. O que é
necessário é a coragem de identificar qual é a metodologia que o assunto requer pela
sua própria natureza, adequar-se à natureza dos fatos, mesmo que não haja discursos
(preferencialmente de autoridades) que possam servir como apoio. Isto é, é preciso
investigar como, por exemplo, Pontes de Miranda pensou para organizar as categorias
do fato jurídico no Direito Privado, mesmo que ele não tenha escrito nada sobre a sua
metodologia. Para isso, é preciso acreditar nos processos da razão, e não apenas na
persuasão do discurso.
A construção de categorias é um problema no mínimo tão antigo quanto Aristóteles.
Baseia-se na identificação da essência dos objetos e sua organização em conjuntos de
acordo com suas semelhanças e diferenças. Cada categoria identifica-se pelo seu
denominador comum. Para falarmos em categorias de seres é preciso deixar bem claro
que elas só existem em função de coisas, e não apenas de palavras, pois, como bem
nos explicaram os lingüistas, uma palavra adquire significados diferentes de acordo
com o contexto no qual se insere. A partir dessa constatação tão óbvia, alguns filósofos
chegaram, inclusive, a negar a realidade das coisas em si, como se os fatos fossem
apenas apêndices da linguagem e não vice-versa Essa discussão matusalêmica será
vista durante o capítulo, e, avisa-se aos navegantes partidários do moderno ceticismo
lingüístico, que se quiserem negar qualquer status de real aos fatos, coloquem desde já
o livro de volta à prateleira.
Como vemos na pesquisa de Gadamer, essas questões sobre as palavras e as coisas são
muito anteriores a Foucault ou Wittgenstein:
"No Crátilo de Platão, são postas em discussão duas teorias que procuram determinar,
por caminhos diversos, a relação de palavras e coisas: a teoria convencionalista vê a
única fonte dos significados das palavras na univocidade do uso lingüístico que se
alcança por convenção e exercício. A teoria contrária defende uma coincidência
natural de palavra e coisa, designada pelo conceito de correctura. É evidente que se
trata de duas posições extremas, e que portanto objetivamente não necessitam se
excluir".
"Platão pretende mostrar que na linguagem, na pretensão da correctura lingüística, não
se pode alcançar nenhuma verdade pautada na coisa, e o ente tem de ser conhecido
sem as palavras, puramente a partir dele mesmo. Com isso se desloca radicalmente o
problema para um novo nível. A dialética, a que aponta esse contexto, pretende
evidentemente confiar o pensamento a si mesmo e a seus verdadeiros objetos
(Gegenstände), abrindo as "idéias", de maneira tal que, com isso, se supere o poder das
palavras e sua tecnificação demoníaca na arte da argumentação sofística. A superação
do âmbito das palavras, pela dialética não quer dizer, obviamente, que exista realmente
um conhecimento isento de palavras, mas, unicamente, que o que abre o acesso à
verdade não é a palavra, mas pelo contrário: que a "adequação" da palavra só se
poderia julgar a partir do conhecimento das coisas".
É possível, a partir dessa explicação, entender que a pesquisa hermenêutica é uma
tentativa de adequação, da melhor forma possível, das idéias ou das coisas com suas
representações verbais. A realidade desse fenômeno pressupõe a possibilidade da
comunicação, e a prova do desentendimento e do equívoco a justifica, pois não pode
haver erro sem um parâmetro de certeza, o que nos remete ao paradoxo do relativismo.
O próprio Platão reconhece a praticidade desse fenômeno:
"E se só o um pouco correto consegue ainda reproduzir em si os contornos da coisa,
isso pode bastar para que seja utilizável".
Voltando a Gadamer e o fenômeno da interpretação:
"Pelo caminho de nossa análise do fenômeno hermenêutico damos de cara com a
função universal da lingüisticidade. Na medida em que o fenômeno hermenêutico se
revela em seu próprio caráter lingüístico, possui por si mesmo um significado
universal absoluto. Compreender e interpretar se subordinam de uma maneira
específica à tradição lingüística. Mas, ao mesmo tempo, vão mais além dessa
subordinação, não somente porque todas as criações culturais da humanidade, mesmo
as não lingüísticas, pretendem ser entendidas desse modo, mas pela razão muito mais
fundamental de que tudo o que é compreensível tem de ser acessível à compreensão e
à interpretação. Para a compreensão vale o mesmo que para a linguagem. Não se pode
tomar, nem a uma nem a outra, somente como um fato que se pudesse investigar
empiricamente. Nenhuma das duas pode ser jamais um simples objeto, mas ambas
abrangem tudo o que, de um modo ou de outro, pode chegar a ser objeto".
Ou seja, para Gadamer, a interpretação depende tanto dos fatos como da linguagem.
No entanto, o hermeneuta volta à Platão para ressaltar a importância da adequação
correta da linguagem com o objeto:
"O uso incorreto da linguagem, pelos sofistas, procede justamente da ignorância desta
genuína possibilidade de verdade da fala. Quando o logos é entendido como
representação de uma coisa, ou seja, como a sua abertura, sem distinguir
essencialmente essa função de verdade da fala, com respeito ao caráter significativo
das palavras, abre-se uma possibilidade de confissão que é própria da linguagem.
Pode-se chegar a crer que a coisa é possuída na palavra. Atendo-se à palavra,
estaríamos pois no caminho legítimo do conhecimento. Só que então vale também o
inverso, onde há conhecimento, a verdade da fala tem de ser construída com a verdade
das palavras, como seus elementos. E assim como se pressupõe a "correctura" dessas
palavras, ou seja, sua adequação natural às coisas nomeadas por elas, estará permitindo
também interpretar os elementos dessas palavras, as letras, na perspectiva de sua
função de ser cópia das coisas. Essa é a conseqüência a que Sócrates obriga o seu
interlocutor a chegar".
"Essa subordinação, que é logos, é pois, muito mais que a mera correspondência de
palavras e coisas, tal como, em última análise, estaria correspondendo à teoria eleática
do ser e como se pressupõe a teoria da cópia. Precisamente porque a verdade que o
logos contém não é a da mera recepção, não é um mero deixar aparecer o ser, mas
coloca o ser sempre numa determinada perspectiva, reconhecendo e atribuindo-lhe
algo, o portador da verdade, e, conseqüentemente também de seu contrário, não é
palavra, mas o logos. Daí segue-se também necessariamente que, a essa estrutura de
relações, na qual o logos articula a coisa e precisamente com isso interpreta, lhe é
inteiramente secundário seu caráter enunciativo, e, por conseguinte, sua vinculação à
linguagem".
Sem adentrar nesse último problema filosófico, sobre a palavra, a verdade e o
conhecimento, restringindo-se apenas à questão da possibilidade de se descrever os
fenômenos de forma correta, é necessário, então, passar ao estudo da percepção e da
natureza das coisas em si. Para isso, remonta-se à Aristóteles e ao estudo da
identificação e caracterização dos seres. As categorias aristotélicas dos objetos do
conhecimento são: Essência, Quantidade, Qualidade, Relação, Lugar, Tempo, Posição,
Estado, Ação e Paixão. O que elas podem informar sobre as categorias de fatos
jurídicos? O tempo de muito estudo dirá. Por enquanto, frise-se o que já foi dito: a
questão é procurar pensar de forma aristotélica, e não apoiar-se em seus discursos. Pois
Aristóteles é um dos melhores, senão o melhor filósofo a tratar de semelhanças entre
gêneros e espécies. Basta verificar que toda a lógica derivou de sua obra.
Como será esse método? É o tema da próxima monografia de qualquer pesquisador
audaz. Para ficar bem claro e evitar erros de princípios fundamentais, vale a dica de
dois historiadores da lógica: Aristóteles trata de categorias de coisas e não de palavras:
"[...]Todavia se ele se pudesse fazer a si mesmo a pergunta, é quase certo que
Aristóteles teria respondido que estava a tratar de coisas e não de palavras. A prova
mais clara disto é a maneira como junta "ser predicado de qualquer coisa" e "estar em
qualquer coisa" como ele faz na caracterização da substância citada acima. Quando ele
ilustra a sua noção de "estar em" dizendo que uma certa questão de gramática está no
espírito não está a falar de expressões lingüísticas. A resolução verdadeira da
ambigüidade parece ser dada por Porfírio quando diz "Porque como as coisas são,
assim são as expressões que primeiro as exprimem". Aristóteles está a classificar tipos
de seres mas usa as diferenças entre regras para expressões lingüísticas diferentes
como chave para as diferenças entre tipos de seres".
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CONCLUSÃO
Ao se fazer a crítica sobre a busca da Jurisprudência (Ciência do Direito) do status de
ciência, contata-se que ela nunca teve um modelo definido a seguir, por isso "vagou"
(e vaga, ainda) por toda a história das sociedades.
A Jurisprudência carece de uma epistemologia, que a faça definir um campo de
atuação, com diversos níveis epistemologicamente distintos. A falta de definição
desses níveis tem causado verdadeira celeuma, onde misturam-se diversas funções:
dogmática, tópicos-retóricos, sistemas normativos, princípios, normas e teorias gerais.
Essa indiferenciação é responsável por problemas cognitivos (de entendimento) na
aplicação do Direito, com conseqüências sérias. A compreensão desordenada dos
fenômenos jurídicos dificulta o trabalho prático dos juristas, gerando infindáveis
controvérsias que abarrotam os tribunais, numa intensidade crescente, com questões
que poderiam ser resolvidas pela racionalidade. A dependência dos juízes de primeira
instância, do "sinal verde" dos tribunais, fomenta uma cultura de insatisfação e falta de
confiança na razão jurídica, o que incentiva a necessidade de decisões proferidas por
instâncias revisoras.
As teorias gerais no Direito, bem como o desenvolvimento de uma cultura, entre os
juristas, mais calcada na racionalidade e menos na casuística, é uma alternativa aos
problemas da "crise do Direito". Essas teorias devem ser entendidas como "camadas
cognitivas" que integram os sistemas de normas com os princípios valorativos e
posturas jurídico-filosóficos.
O Direito Processual, que padece de uma deficiência nas questões de existência,
validade e eficácia, beneficiar-se-ia com a construção de uma Teoria do Fato Jurídico
inspirada no Direito Privado e adaptada aos princípios referentes à função social do
processo. Essa construção deve partir de estudos teórico-sistemáticos criativos, tendo
em vista que as condições de divergência entre a doutrina, legislação e jurisprudência
não possibilitam uma sistematização coerente.
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ANEXO I
Código de Processo Civil
Dispositivos referentes às nulidades
Art. 11. A falta (de outorga do cônjuge), não suprida pelo juiz, da autorização ou da
outorga, quando necessária, invalida o processo.
Art. 13. Verificando a incapacidade processual ou a irregularidade da representação
das partes, o juiz, suspendendo o processo, marcará prazo razoável para ser sanado o
defeito.
Não sendo cumprido o despacho dentro do prazo, se a providência couber:
I - ao autor, o juiz decretará a nulidade do processo;
II - ao réu, reputar-se-á revel;
III - ao terceiro, será excluído do processo.
Art. 113. §2. Declarada a incompetência absoluta, somente os atos decisórios serão
nulos, remetendo-se os autos ao juiz competente.
Art. 122. Ao decidir o conflito, o tribunal declarará qual o juiz competente,
pronunciando-se também sobre a validade dos atos do juiz incompetente.
Art. 214. Para a validade do processo, é indispensável a citação inicial do réu.
§1. O comparecimento espontâneo do réu supre, entretanto, a falta de citação.
§2. Comparecendo o réu apenas para argüir a nulidade e sendo esta decretada,
considerar-se-á feita a citação na data em que ele ou seu advogado for intimado da
decisão.
Art. 243. Quando a lei prescrever determinada forma, sob pena de nulidade, a
decretação desta não pode ser requerida pela parte que lhe deu causa.
Art. 244. Quando a lei prescrever determinada forma, sem cominação de nulidade, o
juiz considerará válido o ato se, realizado de outro modo, lhe alcançar a finalidade.
Art. 245. A nulidade dos atos deve ser alegada na primeira oportunidade em que
couber à parte falar nos autos, sob pena de preclusão.
Parágrafo único. Não se aplica esta disposição às nulidades que o juiz deva decretar de
ofício, nem prevalece a preclusão, provando a parte legítimo impedimento.
Art. 246. É nulo o processo, quando o Ministério Público não for intimado a
acompanhar o feito em que deva intervir.
Parágrafo único. Se o processo tiver corrido, sem conhecimento do Ministério Público,
o juiz o anulará a partir do momento em que o órgão devia ter sido intimado.
Art. 247. As citações e as intimações serão nulas, quando feitas sem a observância das
prescrições legais.
Art. 248. Anulado o ato, reputam-se de nenhum efeito todos os subseqüentes que dele
dependam; todavia, a nulidade de uma parte do ato não prejudicará as outras, que dela
sejam independentes.
Art. 249. O juiz, ao pronunciar a nulidade, declarará que atos são atingidos, ordenando
as providências necessárias, a fim de que sejam repetidos, ou retificados.
§1 O ato não se repetirá nem se lhe suprirá a falta quando não prejudicar a parte
§2 Quando puder decidir do mérito a favor da parte a quem aproveite a declaração da
nulidade, o juiz não a pronunciará nem mandará repetir o ato, ou suprir-lhe a falta.
Art. 250. O erro de forma do processo acarreta unicamente a anulação dos atos que não
possam ser aproveitados, devendo praticar-se os que forem necessários, a fim de se
observarem, quanto possível, as prescrições legais.
Parágrafo único. Dar-se-á o aproveitamento dos atos praticados, desde que não resulte
prejuízo à defesa.
Art. 333. Parágrafo único. É nula a convenção que distribui de maneira diversa ônus da
prova quando:
I - recair sobre direito indisponível da parte;
II - tornar excessivamente difícil a uma parte o exercício do direito.
Art. 458. São requisitos essenciais da sentença:
I – o relatório, que conterá os nomes das partes, a suma do pedido e da resposta do réu,
bem como o registro das principais ocorrências havidas no andamento do processo;
II – os fundamentos, em que o juiz analisará as questões de fato e de direito;
III – o dispositivo, em que o juiz resolverá as questões, que as partes lhe submeterem.
Art. 560. Parágrafo único. Versando a preliminar sobre nulidade suprível, o tribunal,
havendo necessidade, converterá o julgamento em diligência, ordenando a remessa dos
autos ao juiz, a fim de ser sanado o vício.
Art. 618. É nula a execução:
I - se o título executivo não for líquido, certo e exigível;
II - se o devedor não for regularmente citado;
III - se instaurada antes de se verificar a condição ou de ocorrido o termo, nos casos do
art. 572.
Art. 649. São absolutamente impenhoráveis:
I – os bens inalienáveis e os declarados, por ato voluntário, não sujeitos à execução;
II – as provisões de alimento e de combustível, necessárias à manutenção do devedor e
de sua família durante um mês;
III – o anel nupcial e os retratos de família;
IV – os vencimentos dos magistrados, dos professores e dos funcionários públicos, o
soldo e os salários, salvo para pagamento de prestação alimentícia;
V – os equipamentos dos militares;
VI – os livros, as máquinas, os utensílios e os instrumentos, necessários ou úteis ao
exercício de qualquer profissão;
VII – as pensões, as tenças ou os montepios, percebidos dos cofres públicos, ou de
institutos de previdência, bem como os provenientes de liberalidade de terceiro,
quando destinados ao sustento do devedor ou da sua família;
VIII – os materiais necessários para obras em andamento, salvo se essas forem
penhoradas;
IX – o seguro de vida;
X – o imóvel rural, até um módulo, desde que este seja o único de que disponha o
devedor, ressalvada a hipoteca para fins de financiamento agropecuário.
Art. 1.105. Serão citados, sob pena de nulidade, todos os interessados, bem como o
Ministério Público.
Inexistência
Art. 37. Sem instrumento de mandato, o advogado não será admitido a procurar em
juízo. Poderá, todavia, em nome da parte intentar ação, a fim de evitar decadência ou
prescrição, bem como intervir, no processo, para praticar atos reputados urgentes.
Nestes casos, o advogado se obrigará, independentemente de caução, a exibir o
instrumento de mandato no prazo de quinze (15) dias, prorrogável até outros quinze
(15), por despacho do juiz.
Parágrafo único. Os atos, não ratificados no prazo, serão havidos por inexistentes,
respondendo o advogado por despesas, perdas e danos.
Da ação rescisória
Art.485. A sentença de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando:
I – se verificar que foi dada por prevaricação, concussão ou corrupção do juiz;
II – proferida por juiz impedido ou absolutamente incompetente;
III – resultar de dolo da parte vencedora em detrimento da parte vencida, ou de colusão
entre as partes, a fim de fraudar a lei;
IV – ofender coisa julgada;
V – violar literal disposição de lei;
VI – se fundar em prova, cuja falsidade tenha sido apurada em processo criminal ou
seja provada na própria ação rescisória;
VII – depois da sentença, o autor obtiver documento novo, cuja existência ignorava, ou
de que não pôde fazer uso, por si só, de lhe assegurar pronunciamento favorável;
VIII – houver fundamento para invalidar confissão, desistência ou transação, em que
se baseou a sentença;
IX – fundada em erro de fato, resultante de atos ou de documentos da causa;
X – a indenização fixada em ação de desapropriação direta ou indireta for
flagrantemente superior ou manifestamente inferior ao preço de mercado do objeto da
ação judicial.
§1º Há erro, quando a sentença admitir um fato inexistente, ou quando considerar
inexistente um fato efetivamente ocorrido.
§2º É indispensável, num como noutro caso, que não tenha havido controvérsia, nem
pronunciamento judicial sobre o fato.
Art. 486. Os atos judiciais, que não dependem de sentença, ou em que esta for
meramente homologatória, podem ser rescindidos, como os atos jurídicos em geral,
nos termos da lei civil.
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* professora em Brasília DF
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