Rastreamento com ultra- sonografia abdominal em irmãos de

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Rastreamento com ultrasonografia abdominal em
irmãos de pacientes com
aneurisma de aorta
abdominal
Renato Duarte Barbosa
Maximiliano Rossi Denardi
José Roberto Rossini Sobrinho
Médicos Estagiários do Serviço
Wolfgang G. W. Zorn
Responsável pelo Serviço
Bonno Van Bellen
Responsável pelo Serviço. LivreDocente em Moléstias Vasculares
Periféricas pela UNlCAMP
Para avaliar a prevalência de aneurisma de aorta abdominal (AAA) em parentes de
primeiro grau (irmãos e irmãs) de pacientes com AAA, estudamos 87 parentes (44 irmãos
e 43 irmãs) de 47 pacientes portadores de AAA. O estudo foi baseado em exame ultrasonográfico abdominal ou na própria informação oral dada pela pessoa pesquisada quando
tinha conhecimento da afecção em si próprio ou em seu irmão ou irmã. Treze parentes de
primeiro grau (14,9%) eram portadores de AAA, com incidência de 25% entre irmãos e
4,6% entre irmãs. Esses dados sugerem que irmãos e irmãs de pacientes com AAA são
grupo de risco para desenvolvimento de aneurisma e devem ser encaminhados para programa
de rastreamento com ultra-sonografia abdominal para diagnóstico de AAA.
Trabalho realizado no serviço de
Cirurgia Vascular e Angiologia do
Hospital da Beneficência Portuguesa
de São Paulo
Unitermos: Aneurisma de aorta abdominal, ultra-sonografia, doença familiar.
O
aneurisma da aorta abdominal
(AAA) é uma condição comum
entre as doenças tratadas pelo
cirurgião vascular. Sua incidência tem sido
estimada entre 1,5 e 6,6% e vem se
observando aumento nas últimas três
décadas . Esse aumento na incidência
parece ser real e não meramente decorrente do aumento da idade da população
e da melhora dos métodos diagnósticos .•
A incidência e a prevalência do AAA varia
dependendo da população estudada, sendo
mais baixa em grupos não selecionados e
mais alta em grupos de pacientes com
outras lesões ateroscleróticas 9 •
O tratamento cirúrgico do AAA resulta
em excelente sobrevi da a longo prazo,
com mortalidade operatória menor que 5%
e reposicionamento do paciente a uma
curva de sobrevida da população normal
pareado para idade e sexo. Por outro lado,
o tratamento do AAA roto é acompanhado
de altas taxas de mortalidade. Calcula-se
que 27 a 50% dos pacientes com AAA roto
morrem antes de chegar ao hospital, 24 a
58% morrem depois de chegar ao hospital
antes da intervenção cirúrgica e, daqueles
que chegam à sala de cirurgia, 42 a 80%
morrem no perioperatório, em índice de
mortalidade total de 78 a 94%14.
Fica claro, pois, que o diagnóstico e
tratamento do AAA antes da rotura é a
melhor forma de reduzir os índices de
mortalidade atribuída ao mesmo. Porém,
pelo fato de serem freqüentemente assintomáticos e ser difícil detectá-los somente
em exames físicos, muitos AAA não são
diagnosticados até que ocorra a rotura. O
reconhecimento de grupos de risco para
desenvolvimento do AAA deve levar à
detecção por rastreamento com ultrasonografia abdominal, sendo que isso pode
reduzir o índice de rotura6•
Vários autores na literatura têm mostrado tendência familiar para desenvolvimento do AAA, tentando mostrar que
parentes de primeiro grau de pacientes com
aneurisma são grupo de risco para desenvolver AAA e, como tal, deveriam ser
beneficiados com programa de rastreament06.R, 10. 13, 17.
O objetivo deste trabalho é determinar a
prevalência de AAA em irmãos e irmãs de
pacientes com o problema em nosso meio,
a fim de verificar se podem ser caracterizados como grupo de risco e assim
encaminhá-los para programa de rastreamento para o diagnóstico de AAA.
Foram estudados 87 parentes de primeiro grau (irmãos e irmãs) de 47 pacientes tratados de AAA no Serviço de
Cirurgia Vascular do Hospital da Beneficência Portuguesa de São Paulo, com os
quais'conseguimos contato adequado. Para
ser incluído no estudo o parente de
primeiro grau (PPG) deveria ter realizado
ultra-sonografia da aorta abdominal ou já
ter diagnóstico prévio de AAA. Os
parentes já falecidos de causa ignorada e
aqueles que não realizaram estudo da aorta
abdominal por ultra-sonografia ou outro
método de imagem foram excluídos do
estudo. Os exames ultra-sonográficos
foram realizados em diferentes serviços
especializados, de acordo com as conveniências do indivíduo em estudo. Os
resultados foram analisados utilizando o
teste qui -quadrado.
CIR. VASCo ANGIOL. 11: 68-71, 1995
Rastreamento com ultra-sonografia abdominal
Dos 47 pacientes que formam a base
desta casuística, 39 eram do sexo masculino e oito do sexo feminino, com média
de idade de 65,9 anos. Na ocasião do
diagnóstico do aneurisma, 15 eram
sintomáticos (31,9%) e 32 (68,1%) eram
assintomáticos, tendo procurado atendimento médico por outros motivos não
relacionados ao aneurisma.
Dos 87 PPG, 44 eram do sexo masculino (irmãos) e 43 do sexo feminino
(irmãs). Todos apresentaram idade acima
de 50 anos, com média etária de 64,2 anos.
Aneurisma de aorta abdominal ocorreu em
13 PPG (14,9%). A freqüência entre os
irmãos foi de 25% e entre as irmãs 4,6%.
Todos os parentes afetados pertenciam a
faIlll1ias onde o paciente primariamente
tratado de AAA era do sexo masculino .
Em uma das famílias estudadas havia,
além do paciente, três PPG afetados (dois
irmãos e uma irmã), e em outra farru1ia
dois irmãos apresentaram aneurisma.
A média de idade dos parentes portadores de AAA era de 63,8 anos· e dos
não portadores era de 64,6 anos.
A proposta deste trabalho foi avaliar a
prevalência de AAA em parentes de
primeiro grau de pacientes portadores de
aneurisma, utilizando a ultra-sonograQa
abdominal como método diagnóstico, uma
vez que o aneurisma de aorta pode ser de
difícil detecção pelo exame físico que,
freqüentemente, leva a falso diagnóstico ll •
O exame ultra-sonográfico da aorta
abdominal tem mostrado ser simples, não
invasivo e preciso, tanto no diagnóstico
quanto na determinação do tamanho dos
AAAs, quando realizado por ultrasonografista experiente. Toda a aorta pode
ser examinada e seu diâmetro pode ser
mensurado com margem de erro de 3%18.
Em geral, houve boa aceitação do
estudo por parte dos PPG, embora tenhamos notado ansiedade e preocupação em
alguns deles. Acreditamos que essa
ansiedade e preocupação possa ser
aliviada com adequada orientação por
parte do médico . Adams e cols . ' experimentaram situação semelhante e relataram que o resultado normal da ultrasono grafia contribui para diminuir a
ansiedade dos pacientes.
Não foi encontrada na literatura
consenso com respeito a que grau de
dilatação da aorta deve ser considerado
para definição de aneurisma '8 . Embora os
exames ultra-sono gráficos em nosso
estudo tenham sido realizados por diferentes profissionais da área, consideramos
como conceito de aneurisma o estabelecido pela Sociedade Internacional de
Cirurgia Cardiovascular (Capítulo da
América do Norte) e pela Sociedade Americana de Cirurgia Vascular, que recentemente sugeriram definir um aneurisma
como uma dilatação localizada e permanente de uma artéria com aumento no
diâmetro maior que 50% (1,5 vezes) em
relação ao diâmetro normal 9 •
A ocorrência de AAA em memhros de
uma mesma faIlll1ia tem sido relatada por
vários autores na literatura. Em 1977
Clifton 5 relatou uma família ·com três
irmãos do sexo masculino que foram
operados por AAA roto e que previamente
eram as sintomáticos. Em 1984 Tilson e
cols. relataram 16 fanu1ias '6 e em seguida
50 fanu1ias '7 com um ou mais parentes de
primeiro grau com AAA. Cole e cols. 6
encontraram incidência de 13,4% de AAA
entre pais e irmãos de pacientes com
aneurisma. As informações foram obtidas
através de questionários enviados aos
familiares ou por contato telefônico .
Norrgard e cols. 13 utilizaram a mesma
metodologia e encontraramAAA em 1,9%
dos irmãos de pacientes com AAA.
Johansen e Koepsell 1o compararam a
história familiar de 250 pacientes com
AAA com um grupo controle também de
250 pacientes. Dentre o grupo com aneurisma, a ocorrência de AAA em parentes
de primeiro grau (pais, irmãos e filhos) foi
de 19,2%, comparada com 2,4% para o
grupo controle. Quando ajustado para idade
e sexo, o AAA foi 11,6 vezes mais comum
em parentes de pacientes do primeiro grupo.
Em um estudo similar, Darling e cols. 9
encontraram ocorrência de AAA em 1,8%
CIR. VASCo ANGIOL. 11: 68-71, 1995
Renato Duarte Barbosa e cols.
dos parentes de primeiro grau do grupo
controle e em 15,1 % do grupo de pacientes
com aneurisma. Nesses dois estudos a ultrasono grafia abdominal foi utilizada como
método diagnóstico.
A literatura conta com quatro trabalhos
que estudaram a ocorrência de AAA em
irmãos de pacientes comAAA em que foi
usado rastreamento diagnóstico com ultrasono grafia em todos os irmãos. Collin e
Walton7 encontraram incidência de 16,1%,
sendo 29% entre os irmãos. Nenhum caso
foi detectado entre as irmãs. Adamson e
cols. 2 mostraram que 11 % dos irmãos
(homens e mulheres) de pacientes com
AAA apresentavam aneurisma. Adarns e
cols.' relataramincidênciadeAAA em 17%
dos irmãos e em 4% das irmãs. Bengtsson
e cols. 3 encontraram incidência de 29%
entre irmãos e 6% entre as irmãs.
Os resultados do nosso estudo são
concordantes com os mostrados na literatura. Encontramos incidência de 14,9%
de AAA em PPG de pacientes com AAA
tratados emnosso serviço. Entre os irmãos
a incidência foi de 25% e de 4,6% entre as
irmãs. Esses dados são estatisticamente
significativos quando comparados com
dados de incidência de aneurisma de aorta
em estudos populacionais, como os de
Melton e cols.'2
Da mesma forma que Clifton5, encontramo's uma faIlll1ia onde três irmãos (uma
irmã e dois irmãos) apresentaram aneurisma.
Apesar de ser aceito que a incidência de
AAA na população aumenta coma idade 12,
em nosso estudo não houve diferença na
idade entre os irmãos portadores e aqueles
não portadores de AAA. O mesmo foli
observado por Bengtsson3 e Norrgard ll .
Adams e cols.' e Darling e cols. 8 sugerem
queAAA familiar tende a acometer homens
mais jovens que aqueles com AAA não
familiar.
Os dados de nosso estudo e de outros já
citados tendem a confirmar a tendência
familiar para OS AAA. Nos estudos de
Tilson e cols.'6.17, a participação genética
nos AAAs foram enfatizadas . Nesses
artigos os autores sugeriram uma herança
autossômica dominante, uma herança
ligada ao sexo ou, mais provavelmente,
Rastreamento com ultra-sonografia abdominal
uma herança multifatorial do AAA familiar7 • Existem fatores de risco que
podem aumentar a probabilidade de um
paciente ter um aneurisma, tais como a
idade, sexo, hipertensão , fumo, aterosclerose manifestada em artérias coronarianas ou doença vascular periférica 4 .!8 . Talvez esses fatores, principalmente hipertensão e fumo, devesc
sem ser vistos como promotores de
aneurisma quando superpostos em um
cenário genético ou bioquímico conhecido!5.
Vale ressaltar, por outro, lado que
Darling e cols.8 não encontraram diferenças entre o grupo de AAA familiar e
o grupo controle em relação aos fatores
de risco fumo, hipertensão e diabetes
melito . Adams e cols.! também não
notaram clara influência do fumo,
hipertensão, doença vascular periférica
e hipercolesterolemia na prevalência do
AAA familiar em seu estudo .
Em conclusão, a prevalência de AAA
entre os irmãos e irmãs de pacientes
com o problema parece ser alta e esse
grupo deve ser considerado com sendo
de risco para o desenvolvimento de
AAA. Como tal, deve ser encaminhado
para programa específico de rastreamento para o diagnóstico de aneurisma
de aorta abdominal.
Como ressaltado por Webster e
coJ.18, esses programas derastrearnento
têm pelo menos três propostas:
1) detecção de um aneurisma pre:
viamente desconhecido, para ressecção
ou observação periódica;
2) permitir uma exata identificação
de indivíduos afetados e não afetados
em uma família para permitir a precisa
definição do modo de herança de
susceptibilidade para aneurisma, de
modo que estudos para identificar o
gene específico envolvido possam ser
desenvolvidos;
3) identificar pacientes com aneurismas pequenos, de modo que mais
informações possam ser obtidas sobre
a história natural do crescimento do
aneurisma e sobre os fatores que
possam contribuir para esse crescimento.
Renato Duarte Barbosa e cols.
In order to evaluate the prevalence
of the . abdominal aortic áneurysm
(MA) in siblings of patients with AAA,
we have studied 87 siblings (44
brothers and 43 sisters) of 47 patients
with AAA. This study consisted in an
ultrasonographic evaluation or the oral
information itself, provided by the
person who told us of havingAAA or
who knew that his sibling had it.
Thirteen siblings (14,9%) were affected
(25% of the brothers and 4,6%01 the
1. ADAMS DCR, TULLOH BR,
2.
3.
4.
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screening of the abdominfll aorta
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Key words: Abdominal aortic
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